
Caminho Português: Turismo em Barcelos
Informações do documento
Autor | Ana Catarina Fernandes Duarte |
instructor | Professor Doutor Luís Paulo Saldanha Martins |
Escola | Mestrado em Turismo |
Curso | Turismo |
Tipo de documento | Dissertação |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 1.55 MB |
Resumo
I.O Caminho de Santiago Uma Perspectiva Histórica e Religiosa
O documento discute o Caminho de Santiago, declarado em 1987 como o primeiro Itinerário Cultural Europeu, e sua importância histórica e religiosa. A peregrinação a Santiago de Compostela, Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, remonta aos primeiros séculos do cristianismo, ligada à veneração do Apóstolo Santiago. A lenda da chegada dos restos mortais de Santiago à Galiza, e o subsequente desenvolvimento de Compostela, são detalhados. A obra de Aymeric Picaud, o Codex Calixtinus (ou Liber Sancti Jacobi), é destacada como o primeiro guia de viagens da Europa, enfatizando a longa tradição da Rota Jacobea.
1. O Caminho de Santiago História e Significado Religioso
O Caminho de Santiago, declarado em 1987 como o primeiro Itinerário Cultural Europeu, possui uma identidade religiosa e histórica forjada ao longo de séculos. Sua rota principal culmina em Santiago de Compostela, cidade no noroeste da Península Ibérica, reconhecida como Patrimônio Mundial pela UNESCO em 1993. A peregrinação a este local está profundamente enraizada na veneração ao apóstolo Santiago, cujo corpo, segundo a tradição, repousa na cidade. A narrativa detalha a jornada de evangelização de Tiago Maior na Península Ibérica, sua eventual partida para a Palestina, e o posterior descobrimento de seus restos mortais em Libre-Don (atual Santiago de Compostela), impulsionando a peregrinação ao local. A fé em Santiago se espalhou por toda a Europa, sendo conhecido como Saint Jacques (França), Saint James (Inglaterra, Escócia e Irlanda), e San Giacomo (Itália medieval). A importância histórica do caminho é comprovada por marcos como o Codex Calixtinus, escrito em 1139 pelo monge francês Aymeric Picaud, considerado o primeiro guia de viagens da Europa e um testemunho da trajetória secular da peregrinação a Santiago, com descrições de locais e conselhos para os peregrinos, representando uma tradição antiga e poderosa, fundamental para a compreensão do fenómeno do Caminho de Santiago e sua influência na cultura europeia.
2. O Impulso do Turismo Religioso e o Desenvolvimento de Santiago de Compostela
Embora profundamente enraizada na fé, a peregrinação a Santiago evoluiu e se funde com o turismo moderno. O documento destaca o papel de Manuel Fraga, ministro da informação e turismo do governo de Franco, no impulso da peregrinação como fenômeno turístico após a Guerra Civil Espanhola, mesmo antes da declaração oficial do Caminho de Santiago como o primeiro Itinerário Cultural Europeu em 1987 pelo Conselho Europeu. As décadas de 80 e 90 foram decisivas, impulsionadas pelas visitas do Papa João Paulo II (1982 e 1989) e o reconhecimento da UNESCO. Este reconhecimento, junto com o crescimento do turismo em outras regiões da Espanha (Catalunha e Andaluzia, impulsionadas pelos Jogos Olímpicos de Barcelona e a Expo '92 em Sevilha), levou a Galiza a investir no potencial turístico de Santiago de Compostela. Assim, a peregrinação a Santiago, inicialmente motivada pela fé, hoje engloba uma dimensão turística significativa, com impacto na economia e cultura das regiões envolvidas na Rota Jacobea. A convergência entre fé e turismo é claramente estabelecida, mostrando a complexidade e a riqueza cultural e histórica deste fenómeno.
II.O Caminho de Santiago e o Turismo Motivações e Impacto
O texto analisa a evolução do Caminho de Santiago como um fenômeno turístico, observando a diversificação da oferta turística e a crescente procura por experiências culturais e de natureza. Diversos estudos são citados, mostrando a mudança nas motivações dos peregrinos: enquanto a motivação exclusivamente religiosa representa menos da metade, o turismo cultural, o turismo de natureza, e o turismo ativo (como ciclismo e pedestrianismo) ganham cada vez mais importância. A influência da religião permanece significativa, mas a experiência como um todo – incluindo o contato com a paisagem, patrimônio histórico e cultural – atrai um grande número de turistas/peregrinos.
1. A Evolução do Turismo Associado ao Caminho de Santiago
O texto destaca a crescente diversificação da oferta turística, impulsionada por mudanças nos hábitos de consumo de classes média e alta, que buscam experiências mais culturais e autênticas em detrimento do turismo massificado de sol e praia. O Caminho de Santiago se insere nesse contexto, com a sua atração mundial mobilizando milhares de peregrinos. A identidade religiosa e histórica do Caminho, construída ao longo dos séculos e plasmada em diferentes itinerários, se funde com uma atividade turística que engloba motivações culturais, patrimoniais, ambientais, paisagísticas e desportivas. A citação de Torre et al. (2010, p. 11) sobre a revalorização da autenticidade, identidade cultural e consciência ambiental reflete essa mudança de paradigma no turismo contemporâneo, mostrando uma transição para uma experiência mais holística e menos focada em padrões massificados. Este fenómeno demonstra como o turismo se adaptou e evoluiu ao longo dos anos e como a procura por novas experiências se tornou um factor determinante no sucesso do Caminho de Santiago como atracção turística.
2. Motivações dos Peregrinos Além da Religiosidade
A análise das motivações dos peregrinos revela uma mudança significativa em relação ao passado. Embora a motivação religiosa ainda seja importante, estudos citados no documento (Blanco e Garrido, apud Solla, 2006; Álvarez, apud Solla, 2006; Frey, 1998, apud Solla, 2006) indicam uma diversificação de razões para a peregrinação. Estudos demonstram que, para muitos, as paisagens e o patrimônio cultural são fatores predominantes, enquanto a motivação estritamente religiosa ocupa um lugar secundário ou até mesmo irrelevante para alguns peregrinos. Um estudo do Observatório Turístico do Caminho (2006) coloca a religião em sexto lugar na lista de motivações, atrás de fatores espirituais, patrimoniais, desportivos e de contato com a natureza. Essa multifuncionalidade da experiência do Caminho justifica a classificação dos peregrinos contemporâneos como turistas, uma vez que realizam atividades típicas do turismo: visitam monumentos, desfrutam da natureza, utilizam alojamentos e compram lembranças (López et al., 2010). A compreensão desta pluralidade de motivações é crucial para o desenvolvimento de estratégias turísticas eficazes para o Caminho de Santiago.
3. Turismo Religioso e sua Intersecção com Outros Tipos de Turismo
O texto destaca a ligação entre o turismo religioso e outros tipos de turismo, como o cultural e de lazer. Rinschede (1992) exemplifica essa relação com os casos de Lourdes e Fátima, onde peregrinos frequentemente combinam a visita aos locais de culto com turismo de lazer nas proximidades. A mesma intersecção é observada nos Estados Unidos e em Roma, onde locais religiosos também possuem valor cultural significativo. López et al. classificam as funções das peregrinações em seis categorias: suprimento de necessidades humanas (físicas e mentais), função social, função cultural, função econômica, função política e função religiosa. Essa tipificação evidencia a complexidade e a multidimensionalidade da experiência de peregrinação, que transcende a mera prática religiosa e contribui para o desenvolvimento de diversas áreas do setor turístico. A análise desta intersecção demonstra a riqueza e a complexidade da experiência turística relacionada ao Caminho de Santiago, expandindo a sua dimensão e atraindo diferentes públicos.
III.O Caminho Português e sua Importância Crescente
O Caminho Português de Santiago, atualmente a segunda rota mais percorrida (16,44%), após o Caminho Francês (65,61%), é apresentado como um importante motor de turismo sustentável em Portugal. Seu crescimento é atribuído à crescente popularidade de atividades físicas ao ar livre e à busca por experiências autênticas e enriquecedoras. A possível classificação do Caminho Português pela UNESCO é mencionada como um fator de atração adicional.
1. Crescimento e Popularidade do Caminho Português
O Caminho Português de Santiago é apresentado como a segunda rota mais popular do Caminho de Santiago, com 16,44% dos peregrinos a o percorrerem, atrás apenas do Caminho Francês (65,61%). Observa-se um crescimento consistente nos últimos dez anos, em contraste com uma diminuição gradual na afluência ao Caminho Francês, conforme dados da Oficina do Peregrino. Essa tendência de crescimento sustentado indica uma popularização significativa do Caminho Português, tornando-o um importante atrativo turístico, principalmente porque, além dos fatores religiosos e culturais tradicionais, a rota também se beneficia de uma tendência crescente nas sociedades industrializadas: a procura por atividades de natureza física, como o pedestrianismo e o ciclismo, que permite uma conexão direta com a natureza e com os elementos culturais e históricos presentes ao longo do trajeto (Gallegos, 2007). Esta combinação de fatores contribui para o crescimento do Caminho Português, tornando-o um importante foco de turismo sustentável.
2. Potencial de Desenvolvimento Turístico e Projetos de Melhoria
O texto destaca a importância do Caminho Português para o turismo na região Norte de Portugal e no país como um todo, com o presidente do Eixo Atlântico, Ricardo Rio, a considerá-lo “um dos maiores recursos turísticos da região Norte e de todo o país”. A busca pela classificação do Caminho Português pela UNESCO é apresentada como um objetivo crucial, visando atrair um maior número de peregrinos. Melhorias nas infraestruturas, como a eletrificação da Linha do Minho (mencionada como projeto em concurso, ligando o Minho à Galiza), são apontadas como fatores essenciais para um crescimento ainda maior, tornando a peregrinação mais acessível e atractiva. A iniciativa da Direção do Eixo Atlântico do Noroeste Peninsular, com apoio do Ministério da Cultura de Portugal, para a inventariação do patrimônio existente nos municípios atravessados pelo Caminho Português, demonstra o empenho em potencializar o turismo sustentável na região, integrando o patrimônio cultural e histórico na experiência da peregrinação, e se alinha com o propósito de impulsionar o turismo sustentável na região.
IV.O Caminho de Santiago em Barcelos Um Estudo de Caso
Barcelos é apresentado como um ponto crucial no Caminho Português, com sua importância histórica reforçada por eventos como a peregrinação da Rainha Santa Isabel em 1325 e a construção da ponte medieval. A lenda do Galo de Barcelos, ligada a um cruzeiro medieval no Museu Arqueológico de Barcelos, é destacada. A rota em Barcelos é dividida em duas etapas: Rates – Barcelos e Barcelos – Balugães. O documento destaca a importância do Caminho para o turismo local, mencionando iniciativas como a "Barcelos nos Caminhos de Santiago" e a integração com outros atrativos turísticos da região, como a Festa das Cruzes. A necessidade de estratégias turísticas articuladas e a crítica à "corrida política" pelo caminho são também abordadas, enfatizando a importância da preservação da identidade jacobeia e a colaboração entre os municípios.
1. Barcelos e o Caminho de Santiago Um Marco Histórico na Rota
O município de Barcelos desempenhou, e continua a desempenhar, um papel crucial no Caminho Português de Santiago. Historicamente, Barcelos tornou-se um ponto de passagem obrigatório para os peregrinos, superando a antiga rota que passava por Braga (Cleto, 2016). Diversos fatores contribuíram para o crescimento da importância de Barcelos na rota: a peregrinação da Rainha Santa Isabel em 1325, que passou uma noite no hospital de peregrinos da freguesia de Abade de Neiva; a construção da ponte medieval no século XIV, facilitando a travessia do rio Cávado; e a existência, na Idade Média, de duas albergarias e três hospitais para peregrinos, já documentados desde 1177 (Gonçalves, 2012). A lenda do Galo de Barcelos, associada a um cruzeiro medieval no Museu Arqueológico de Barcelos (ruínas do Paço dos Condes de Barcelos), ilustra a importância histórica e religiosa de Barcelos ao longo do Caminho, destacando o seu papel como local de passagem e de acolhimento para os peregrinos e a influência da lenda na identidade local.
2. A Rota em Barcelos Itinerário e Pontos de Interesse
A rota do Caminho Português em Barcelos é dividida em duas etapas: Rates-Barcelos e Barcelos-Balugães. No concelho, a rota passa pelas freguesias de Macieira de Rates, Gural, Pedra Furada, Pereira, Carvalhal e Barcelinhos, culminando no burgo de Barcelos. Na cidade, os peregrinos passam pelo Paço dos Duques de Bragança/Condes de Barcelos (onde se localiza o Cruzeiro do Galo), Largo do Apoio (antigo mercado medieval), Rua Direita, Praça da Porta Nova (com a Torre da Porta Nova e o Templo do Bom Jesus da Cruz), e o antigo convento beneditino do Terço (CMB, 2016). A integração da rota com outros atrativos turísticos locais, como a Festa das Cruzes e a Feira Medieval de Barcelos, é destacada como potencial para a promoção do turismo na região. De acordo com a Estratégia Municipal Barcelos 2020 (Quaternaire Portugal, 2011), o turismo religioso ligado ao Caminho de Santiago é um dos principais atrativos turísticos do concelho, mostrando o potencial de diferenciação da oferta turística local ao articular a rota com outros recursos naturais, patrimoniais e culturais. Este itinerário específico demonstra a riqueza histórica e cultural de Barcelos e seu potencial turístico relacionado com o Caminho de Santiago.
3. Impacto do Caminho no Turismo de Barcelos Perspectivas e Desafios
O documento analisa a relação entre a passagem do Caminho de Santiago por Barcelos e o desenvolvimento do turismo local. Observa-se um aumento significativo na oferta de serviços para peregrinos nos últimos anos: de nenhum albergue há menos de uma década, o concelho agora conta com quatro; hotéis oferecem condições especiais e menus para peregrinos; e há uma melhor sinalização e disponibilização de informação turística (não só no posto de turismo, mas em outros locais). A entrevista com o coordenador dos Serviços Técnicos do Turismo de Barcelos, Dr. Nuno Rodrigues, revela que Barcelos e sua identidade jacobeia são promovidos em feiras de turismo nacionais e internacionais, e eventos como a iniciativa “Barcelos nos Caminhos de Santiago” são realizados. Contudo, o entrevistado expressa preocupação com a falta de uma estratégia comum entre os municípios, criticando a “corrida política pelo caminho” e a necessidade de um planeamento estratégico mais articulado para o desenvolvimento de um turismo sustentável na região, respeitando a cultura local e as necessidades dos peregrinos. A análise do impacto do Caminho de Santiago em Barcelos revela um potencial turístico significativo, mas também destaca a importância da cooperação intermunicipal e de estratégias coerentes de desenvolvimento sustentável.
V.Conclusão O Caminho de Santiago como Oportunidade Turística
O documento conclui que o Caminho de Santiago, em suas diversas rotas, oferece uma importante oportunidade de desenvolvimento turístico sustentável, combinando aspectos religiosos, culturais, históricos e de natureza. O estudo de caso de Barcelos ilustra o impacto positivo da peregrinação no turismo local, porém destaca a necessidade de estratégias colaborativas e planejamento estratégico para maximizar o potencial turístico do Caminho, considerando as diversas motivações dos peregrinos/turistas.
1. Barcelos e o Caminho Uma Relação de Relevância Turística
A conclusão reforça a importância do Caminho de Santiago para a dinâmica turística de Barcelos, mesmo considerando outros fatores atrativos da região. O estudo demonstra que o Caminho, enquanto oportunidade estratégica, merece atenção dos agentes locais, públicos e privados. O crescimento na oferta de serviços para peregrinos em Barcelos – de zero albergues para quatro em menos de uma década, a oferta de menus especiais para peregrinos em hotéis, a melhoria da sinalética e a disponibilização de informações úteis – evidencia a resposta do município às oportunidades que o Caminho oferece. Essa resposta positiva se manifesta também em ações de promoção da identidade jacobeia em feiras nacionais e internacionais e na realização de eventos como o "Barcelos nos Caminhos de Santiago", já na sua 5ª edição, que inclui visitas guiadas e uma cerimônia de bênção de peregrinos. A conclusão ressalta que, embora existam outros atrativos turísticos, o Caminho de Santiago assume um papel fundamental na dinamização turística da região, justificando uma maior acuidade estratégica por parte dos agentes envolvidos, e o impacto do caminho já se faz sentir em regiões e concelhos limítrofes.
2. Desafios e Necessidades para o Desenvolvimento de um Turismo Sustentável
A conclusão aponta para a necessidade de estratégias articuladas e de uma visão de longo prazo para o desenvolvimento de um turismo sustentável relacionado com o Caminho de Santiago. A entrevista com o responsável municipal do turismo de Barcelos destaca a importância da colaboração intermunicipal, sob a supervisão de uma entidade supramunicipal, para clarificar as potencialidades de cada concelho e evitar a competição desorganizada entre eles. A crítica à “corrida política pelo caminho” evidencia a preocupação com estratégias superficiais e não sustentáveis que priorizam a autopromoção em detrimento da experiência do peregrino. A falta de uma “estratégia comum”, o desconhecimento das motivações dos peregrinos e a mediatização de ações de baixo impacto são apontados como obstáculos para o desenvolvimento pleno do potencial turístico. A conclusão reforça a necessidade de uma abordagem estratégica que respeite a cultura e a tradição jacobeia, aproveitando as oportunidades do Caminho para um desenvolvimento turístico sustentável que beneficie a população local e preserve a identidade da região, promovendo a qualidade da experiência do peregrino e, consequentemente, encorajando o seu regresso como turista.