Biossensor à base de nanopartículas de ouro estabilizadas em ciclodextrina e imobilizadas com lacase para determinação de rutina

Biossensor para Detecção de Rutina

Informações do documento

Autor

Patricia Brugnerotto

instructor Profª. Drª. Iolanda da Cruz Vieira
Escola

Universidade Federal de Santa Catarina

Curso Química - Bacharelado
Tipo de documento Relatório de Estágio Supervisionado II
Local Florianópolis
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 1.17 MB

Resumo

I.Resumo do Desenvolvimento de um Biossensor Eletroquímico para Determinação de Rutina

Este trabalho descreve o desenvolvimento e a caracterização de um novo biossensor eletroquímico para a quantificação de rutina em amostras farmacêuticas. O biossensor utiliza nanopartículas de ouro (AuNP) estabilizadas em β-ciclodextrina (β-CD) e imobilizadas com lacase (LAC), uma enzima que catalisa a oxidação de compostos fenólicos, como a rutina. A voltametria de onda quadrada (SWV) foi empregada como técnica eletroanalítica. A síntese das AuNP-β-CD e a imobilização da LAC foram otimizadas, resultando em um biossensor com alta sensibilidade e seletividade para a detecção de rutina. Os resultados demonstram a aplicabilidade do biossensor na análise de amostras reais de cápsulas e cremes contendo rutina, com valores obtidos em concordância com os métodos de referência.

1. Construção do Biossensor

O trabalho centraliza-se na construção de um biossensor inovador para a determinação precisa de rutina em amostras de origem farmacêutica. Este biossensor de pasta de carbono apresenta uma composição única: nanopartículas de ouro (AuNP), estabilizadas com β-ciclodextrina (β-CD) e imobilizadas com a enzima lacase (LAC). A escolha da lacase como bioelemento se justifica pela sua reconhecida capacidade catalítica na oxidação de compostos fenólicos, grupo ao qual pertence a rutina. A síntese das AuNP foi realizada utilizando-se borohidreto de sódio como agente redutor, enquanto a β-CD atuou como agente estabilizante, prevenindo a agregação das nanopartículas. A lacase utilizada, Denilite® II BASE, foi fornecida pela Novozymes e produzida a partir de Aspergillus oryzae geneticamente modificado. Após a síntese e imobilização, o biossensor foi minuciosamente caracterizado através de diversas técnicas, incluindo microscopia eletrônica de transmissão (TEM), medidas espectrofotométricas e análises de potencial zeta, garantindo a eficácia do processo de construção. O método de construção do biossensor inclui a mistura de AuNP-CD-LAC com grafite em pó e Nujol, sendo posteriormente transferido para uma seringa de plástico contendo um fio de cobre para contato elétrico. A otimização das condições experimentais, que inclui a escolha do tampão acetato (0,1 mol L⁻¹, pH 5,0), o volume de AuNP-CD-LAC (50 µL) e a concentração de lacase (1,145 U mL⁻¹), foi crucial para atingir a melhor resposta analítica na voltametria de onda quadrada (SWV).

2. Caracterização e Otimização do Biossensor

Após a construção, o biossensor foi submetido a um rigoroso processo de otimização e caracterização. A atividade enzimática da lacase, tanto na sua forma livre quanto imobilizada, foi determinada por espectrofotometria UV-Vis, utilizando o substrato ABTS. A imobilização da lacase nas AuNP-β-CD resultou em um aumento da atividade enzimática, comprovando a eficácia do processo de imobilização. Um estudo de impedância eletroquímica foi conduzido para avaliar a resistência à transferência de carga (Rct) na superfície dos eletrodos modificados, utilizando o sistema [Fe(CN)6]³⁻/⁴⁻. A otimização dos parâmetros do método eletroquímico, conduzida através da voltametria de onda quadrada (SWV), focou em determinar as condições ideais para a obtenção do melhor sinal analítico. Foram otimizados o pH do tampão (acetato 0,1 mol L⁻¹), a concentração de lacase e o volume de AuNP-β-CD-LAC. A melhor resposta analítica foi obtida em tampão acetato (0,1 mol L⁻¹, pH 5,0), utilizando 50 µL de AuNP-CD-LAC e 1,145 U mL⁻¹ de lacase, com amplitude de 40 mV, frequência de 100 Hz e incremento de 10 mV.

3. Curva de Calibração e Estudo de Interferentes

Com as condições otimizadas, foi construída a curva de calibração para rutina utilizando a voltametria de onda quadrada (SWV). A curva apresentou dois perfis lineares distintos, com limites de detecção (LOD) de 1,73 x 10⁻⁷ mol L⁻¹ (primeira faixa) e 5,85 x 10⁻⁷ mol L⁻¹ (segunda faixa), demonstrando a alta sensibilidade do biossensor. A seletividade do biossensor foi avaliada através de um estudo de interferentes, utilizando os excipientes presentes nas amostras de rutina (creme e cápsulas). Os resultados demonstraram que os excipientes não interferiram na determinação de rutina pelo método eletroquímico proposto, comprovando a seletividade do biossensor desenvolvido. Os limites de quantificação (LOQ) também foram calculados para ambas as faixas lineares.

4. Repetibilidade Reprodutibilidade Estabilidade e Aplicabilidade

A avaliação do desempenho do biossensor incluiu estudos de repetibilidade e reprodutibilidade, utilizando o mesmo biossensor e biossensores diferentes, respectivamente. Os resultados mostraram desvios padrão relativos (RSD) menores que 6%, indicando boa repetibilidade e reprodutibilidade. A estabilidade do biossensor foi avaliada durante 180 dias em temperatura ambiente, apresentando um RSD inferior a 2,4%, demonstrando excelente estabilidade a longo prazo. A alta estabilidade observada foi atribuída à eficiência na imobilização da enzima no nanomaterial, mantendo a atividade catalítica da lacase. Finalmente, a aplicabilidade do biossensor foi testada na determinação de rutina em amostras farmacêuticas reais (cremes e cápsulas). Os resultados obtidos mostraram boa concordância com os valores rotulados e com os resultados obtidos por um método de referência, confirmando a precisão e a aplicabilidade do biossensor para análises em amostras reais.

II.Síntese e Caracterização das AuNP β CD e AuNP β CD LAC

As AuNP-β-CD foram sintetizadas utilizando borohidreto de sódio como agente redutor e β-CD como estabilizante. A lacase (LAC), obtida de Aspergillus oryzae (Novozymes, Dinamarca), foi imobilizada nas AuNP-β-CD, formando o nanomaterial AuNP-β-CD-LAC. A caracterização desses materiais foi realizada por microscopia eletrônica de transmissão (TEM), espectrofotometria UV-Vis e medidas de potencial Zeta, confirmando a síntese e imobilização bem-sucedidas. O tamanho das AuNP-β-CD foi determinado, aproximadamente, em 24,3 nm.

1. Síntese das Nanopartículas de Ouro AuNP β CD

A síntese das nanopartículas de ouro (AuNP) funcionalizadas com β-ciclodextrina (β-CD) constitui a etapa inicial crucial deste trabalho. O método empregado envolveu a redução de cloreto de ouro (III) tri-hidratado (HAuCl₄), obtido da Sigma-Aldrich, utilizando borohidreto de sódio (20 mmol L⁻¹, Nuclear) como agente redutor. A β-ciclodextrina (0,5% m/v, Sigma-Aldrich) desempenhou um papel fundamental como agente estabilizante, prevenindo a aglomeração das nanopartículas de ouro recém-formadas. O processo foi realizado sob agitação, resultando numa mudança de cor visível na solução, de amarela para vermelha, que indica a formação bem-sucedida das AuNP-β-CD. Essa alteração na coloração é uma característica típica da formação de nanopartículas de ouro. A concentração utilizada de HAuCl₄ foi de 0,1 mol L⁻¹. A síntese, portanto, foi uma reação de redução química simples, mas que requereu controle cuidadoso das condições reacionais. Os reagentes utilizados são facilmente encontráveis comercialmente.

2. Imobilização da Lacase AuNP β CD LAC

Após a síntese das AuNP-β-CD, a etapa subsequente consistiu na imobilização da enzima lacase (LAC). A lacase empregada foi a Denilite® II BASE, uma enzima produzida pela Novozymes (Dinamarca) a partir de Aspergillus oryzae geneticamente modificado. A atividade enzimática da lacase foi determinada previamente por espectrofotometria UV-Vis, monitorando a oxidação do substrato ABTS (sal de amônio do ácido 2,2'-azino-bis(3-etilbenzotiazolina-6-sulfônico)) a 420 nm. Esta análise foi crucial para determinar a atividade enzimática inicial da lacase antes e após o processo de imobilização. A solução de lacase foi então misturada à dispersão de AuNP-β-CD, realizando a imobilização da enzima no nanomaterial, formando o complexo AuNP-β-CD-LAC. O sucesso da imobilização foi confirmado comparando-se a atividade enzimática da lacase livre e imobilizada, utilizando-se um fator de diluição diferente para cada caso. Um aumento da atividade enzimática após a imobilização indicou a eficiência do processo e a ausência de desnaturação da enzima. A metodologia de imobilização garante uma melhor estabilidade e reutilização da enzima.

3. Caracterização dos Nanomateriais

A caracterização completa dos nanomateriais sintetizados (AuNP-β-CD e AuNP-β-CD-LAC) foi essencial para validar o processo de síntese e imobilização. As técnicas empregadas incluíram microscopia eletrônica de transmissão (TEM), espectrofotometria UV-Vis e medidas de potencial zeta. A microscopia eletrônica de transmissão permitiu a visualização direta das nanopartículas, fornecendo informações sobre o tamanho e a morfologia das AuNP, tanto na sua forma pura quanto após a imobilização da lacase. A espectrofotometria UV-Vis contribuiu para a caracterização, possibilitando a avaliação da formação das nanopartículas de ouro e a monitorização das interações entre a β-ciclodextrina e a lacase. As medidas de potencial zeta forneceram informações sobre a carga superficial dos nanomateriais, o que é importante para entender as interações com a lacase e a estabilidade da dispersão. A análise das imagens de TEM permitiu a determinação do tamanho médio das nanopartículas de AuNP-β-CD em aproximadamente 24,3 nm. O tamanho das AuNP-β-CD-LAC aumentou em relação às AuNP-β-CD, devido à interação com as moléculas aniônicas da lacase (pI < 4) na superfície positiva das AuNP-β-CD em pH próximo a 6.0. As medidas de potencial Zeta corroboraram essa análise, mostrando um potencial de +17,7 mV para AuNP-β-CD e -29,5 mV para AuNP-β-CD-LAC.

III.Otimização do Biossensor e Curva de Calibração

Vários parâmetros foram otimizados para maximizar a resposta do biossensor utilizando SWV, incluindo o pH do tampão (acetato 0,1 mol L⁻¹, pH 5,0), a quantidade de AuNP-β-CD-LAC (50 µL) e a concentração de lacase (1,145 U mL⁻¹). Sob condições otimizadas, a curva de calibração para rutina apresentou duas faixas lineares, com limites de detecção baixos, demonstrando a alta sensibilidade do método. A influência de interferentes (excipientes presentes em cremes e cápsulas) foi investigada e não foi observada interferência significativa na determinação da rutina.

1. Otimização do pH e do Tampão

A otimização das condições experimentais foi crucial para o sucesso do biossensor. Inicialmente, o pH e o tipo de tampão foram investigados para determinar as condições ótimas para a detecção de rutina. Foram testados tampões acetato e fosfato, ambos a 0,1 mol L⁻¹, em diferentes faixas de pH. Utilizando a técnica de voltametria de onda quadrada (SWV) com uma solução de rutina 3,0 x 10⁻⁴ mol L⁻¹, os resultados mostraram que a máxima corrente para a rutina foi obtida em tampão acetato 0,1 mol L⁻¹ com pH 5,0. Essa condição foi selecionada como a ideal para os estudos subsequentes, garantindo a melhor resposta analítica do biossensor. A escolha do tampão e do pH influenciam diretamente a atividade enzimática da lacase e a transferência de elétrons, aspectos críticos para o funcionamento do biossensor. A otimização do pH garante a máxima atividade enzimática e eficiência na detecção do analito, enquanto o tampão garante um ambiente eletroquímico estável.

2. Otimização da Concentração de Lacase e Volume de AuNP CD LAC

Após a otimização do tampão e do pH, a concentração de lacase (LAC) e o volume de AuNP-CD-LAC foram investigados para determinar as condições que maximizam a resposta do biossensor. Variando a concentração de lacase, observou-se um aumento na corrente resultante para a rutina até um ponto ótimo de 1,145 unidades de LAC por eletrodo. Acima desse valor, a corrente exibiu uma ligeira diminuição, possivelmente devido ao aumento da resistência à transferência de elétrons. Similarmente, o volume de AuNP-CD-LAC foi otimizado, observando-se que 50 µL forneceu a melhor resposta analítica. Assim, 1,145 unidades de LAC por eletrodo e 50 µL de AuNP-CD-LAC foram as condições selecionadas para a construção dos biossensores. Essa otimização garante a melhor relação entre sensibilidade e ruído do sinal, maximizando a precisão e a confiabilidade das medições.

3. Construção da Curva de Calibração

Com as condições otimizadas (tampão acetato 0,1 mol L⁻¹ pH 5,0; 50 µL de AuNP-CD-LAC; 1,145 U mL⁻¹ de lacase; e parâmetros da SWV definidos), a curva de calibração para rutina foi construída utilizando-se voltametria de onda quadrada (SWV). Os resultados revelaram duas faixas lineares distintas. A primeira faixa linear (I) estendeu-se de 3,0 x 10⁻⁷ a 1,5 x 10⁻⁶ mol L⁻¹ (r² = 0,9949), com um limite de detecção (LOD) de 1,73 x 10⁻⁷ mol L⁻¹. A segunda faixa linear (II) variou de 2,10 x 10⁻⁶ a 5,0 x 10⁻⁶ mol L⁻¹ (r² = 0,9944), com LOD de 5,85 x 10⁻⁷ mol L⁻¹. Os limites de quantificação (LOQ) também foram calculados para ambas as faixas. Os coeficientes de correlação (r²) próximos a 1 indicam um alto grau de linearidade nas duas faixas, demonstrando a precisão e a confiabilidade do biossensor para a determinação quantitativa da rutina numa ampla faixa de concentrações.

IV.Desempenho Analítico e Aplicabilidade do Biossensor

Estudos de repetibilidade e reprodutibilidade mostraram resultados satisfatórios, com desvios padrão relativos (RSD) abaixo de 6%. A estabilidade do biossensor foi avaliada durante 180 dias, mostrando boa performance. O biossensor foi aplicado com sucesso na determinação de rutina em amostras farmacêuticas (cremes e cápsulas), obtendo recuperações entre 96,2% e 103,8%, demonstrando exatidão e aplicabilidade do método proposto para análise de amostras reais.

1. Repetibilidade e Reprodutibilidade

Para avaliar a confiabilidade do biossensor proposto, estudos de repetibilidade e reprodutibilidade foram realizados. A repetibilidade foi avaliada utilizando o mesmo biossensor para sete medidas consecutivas de SWV, a uma concentração de rutina de 3 x 10⁻⁶ mol L⁻¹ em tampão acetato (0,1 mol L⁻¹, pH 5,0). O desvio padrão relativo (RSD) obtido para as correntes de pico foi de 5,6%, indicando boa repetibilidade. A reprodutibilidade, por sua vez, foi avaliada utilizando três biossensores construídos de forma idêntica. O RSD entre as medidas realizadas com cada eletrodo foi de 6,0%, demonstrando também boa reprodutibilidade. Esses resultados comprovam a consistência e a confiabilidade do método de construção do biossensor e a sua capacidade de gerar resultados reprodutíveis em diferentes experimentos e biossensores.

2. Estabilidade do Biossensor

A estabilidade do biossensor foi investigada utilizando a técnica de SWV com uma concentração de rutina de 8,97 x 10⁻⁷ mol L⁻¹ durante um período de 180 dias. O biossensor foi mantido em temperatura ambiente (aproximadamente 25°C). O RSD entre as medidas realizadas ao longo desse período foi inferior a 2,4%, demonstrando excelente estabilidade. Este resultado indica a alta eficiência do processo de imobilização da enzima lacase no nanomaterial, que preserva a atividade catalítica da enzima por um período prolongado. A longa estabilidade do biossensor é um fator crucial para sua aplicabilidade prática, pois garante a sua viabilidade para uso em análises repetidas sem a necessidade de substituição frequente.

3. Aplicabilidade em Amostras Reais e Exatidão

A aplicabilidade do biossensor foi avaliada na determinação de rutina em amostras farmacêuticas reais, incluindo cremes e cápsulas. Os resultados obtidos mostraram-se em concordância com os valores rotulados e com os resultados de um método de referência, demonstrando a exatidão do método proposto. A alta sensibilidade do biossensor, evidenciada pelo baixo limite de detecção (LOD de 1,73 x 10⁻⁷ mol L⁻¹ para a primeira faixa linear), permitiu a quantificação precisa da rutina mesmo em baixas concentrações. As recuperações obtidas para as amostras reais variaram entre 96,2% e 103,8%, confirmando a ausência de efeitos de matriz significativos e a capacidade do biossensor de fornecer resultados precisos e confiáveis em aplicações práticas. O uso de um método eletroquímico, como o proposto, oferece vantagens sobre outras técnicas por seu baixo custo e simplicidade.