
Fração de Ferrita em Aço Inox
Informações do documento
Autor | Talita Filier Fontes |
Curso | Engenharia de Materiais |
Tipo de documento | Relatório de Andamento |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 3.16 MB |
Resumo
I.Influência da Fração Volumétrica de Ferrita nas Propriedades Mecânicas e Resistência à Corrosão por Pite do Aço Dúplex UNS S31803 SAF 2205
Este trabalho investiga a influência da fração volumétrica de ferrita nas propriedades mecânicas e na resistência à corrosão por pite do aço dúplex UNS S31803 (SAF 2205). Amostras foram solubilizadas a diferentes temperaturas (1100°C, 1150°C, 1200°C) por duas horas e resfriadas em água, resultando em diferentes microestruturas com variadas porcentagens de ferrita e austenita. A fração volumétrica de ferrita foi determinada por feritoscópio e estereologia quantitativa utilizando microscópio LEICA DMLM. Serão realizados ensaios de tração para avaliar as propriedades mecânicas (limite de escoamento, resistência à tração, ductilidade, resiliência, tenacidade), e ensaios de polarização cíclica em solução 0,6 M (3,5%) NaCl para analisar o comportamento à corrosão por pite. O objetivo é correlacionar a microestrutura (tamanho de grão de ferrita e austenita) com o desempenho mecânico e a resistência à corrosão por pite deste aço inoxidável dúplex.
1. Objetivo e Metodologia
O principal objetivo do projeto é estudar como a fração volumétrica de ferrita influencia as propriedades mecânicas e a resistência à corrosão por pite do aço dúplex UNS S31803 (SAF 2205). Para alcançar esse objetivo, o aço, inicialmente solubilizado a 1060°C por uma hora, passou por um processo de solubilização adicional por duas horas em temperaturas de 1100°C, 1150°C e 1200°C, seguido de resfriamento em água. Esse procedimento gerou amostras com diferentes frações volumétricas de ferrita. Para avaliar as propriedades mecânicas, foram realizados ensaios de tração e análises metalográficas para revelar a microestrutura. A determinação da fração volumétrica de ferrita se deu por meio do feritoscópio e também pela estereologia quantitativa utilizando um microscópio LEICA DMLM. A pesquisa abrange a avaliação do tamanho de grão de ferrita e austenita em cada condição de solubilização, análises detalhadas dos ensaios de tração (determinação de H, n, σf e p), ensaios de polarização cíclica em solução 0,6 M (3,5%) NaCl para investigar o impacto das microestruturas no comportamento à corrosão por pite, revisão bibliográfica complementar sobre corrosão por pite em aços duplex e, finalmente, a análise dos resultados e a elaboração do relatório final.
2. Análise da Microestrutura
A microestrutura do aço dúplex UNS S31803 foi analisada utilizando microscopia óptica após um ataque químico com o reagente de Behara modificado. Essa técnica permitiu a identificação clara das fases ferrita e austenita presentes na amostra. As micrografias obtidas mostraram um aumento nas bandas de ferrita e austenita com o aumento da temperatura de solubilização. Entretanto, o alinhamento longitudinal e a homogeneidade da estrutura permaneceram inalterados com a variação da temperatura de solubilização. A quantificação precisa das porcentagens de ferrita e austenita em cada amostra foi obtida através da estereologia quantitativa, com cinquenta medições realizadas em cada uma. O processo de preparação metalográfica envolveu lixamento para remoção da camada de óxidos, marcação da superfície em intervalos de 2,5 mm para os ensaios de tração, polimento com álcool etílico e ataque químico com o reagente de Behara modificado (20 mL de ácido clorídrico, 80 mL de água destilada e deionizada, 1 g de metabissulfito de potássio e 2 g de bifluoreto de amônio) por 15 segundos.
3. Ensaios Mecânicos
Ensaios de tração foram conduzidos de acordo com a norma ASTM –04, utilizando um extensômetro de 25 mm de comprimento útil até 3% de deformação. Um transdutor de posição (LVDT) monitorou a deformação além desse limite. Esses ensaios visaram determinar as propriedades mecânicas do aço dúplex, como o limite de escoamento, resistência à tração, ductilidade, resiliência e tenacidade, em função da variação da fração volumétrica de ferrita obtida nos diferentes tratamentos térmicos. A análise destas propriedades mecânicas em conjunto com a análise microestrutural possibilitará uma melhor compreensão da influência da composição da fase (austenita e ferrita) nas propriedades do material. Os resultados destes ensaios serão essenciais para a correlação entre a microestrutura e o comportamento mecânico do aço.
4. Ensaios de Corrosão
Ensaios de polarização cíclica foram empregados para avaliar a resistência à corrosão por pite do aço dúplex em solução 0,6 M (3,5%) NaCl. O objetivo foi determinar o potencial de pite (Epite) e analisar a influência das diferentes microestruturas obtidas pelos tratamentos térmicos. A técnica de polarização cíclica permite a obtenção de curvas de polarização, fornecendo informações sobre a densidade de corrente em diferentes potenciais aplicados. A partir destas curvas será possível comparar a resistência à corrosão por pite entre as diferentes amostras, correlacionando com a fração volumétrica de ferrita e o tamanho de grão das fases austenítica e ferrítica. A análise do potencial de pite e da densidade de corrente fornecerá dados quantitativos sobre a suscetibilidade à corrosão por pite em cada condição.
II.Propriedades Mecânicas dos Materiais Metálicos
Esta seção define as principais propriedades mecânicas dos materiais metálicos, incluindo rigidez, resistência, ductilidade, resiliência e tenacidade. A análise da curva tensão-deformação obtida em ensaios de tração (ASTM E 8M-04) é crucial para determinar essas propriedades. A relação entre tensões e deformações (engenharia e verdadeiras) é explorada, considerando a deformação elástica e plástica. Métodos para calcular a resiliência e tenacidade são apresentados, incluindo a utilização da relação de Ramberg-Osgood para melhor representar o comportamento do material.
1. Definição das Propriedades Mecânicas
A seção inicia definindo propriedades mecânicas como a descrição do comportamento de materiais sob carregamento mecânico, podendo resultar em deformações reversíveis (elásticas) ou irreversíveis (plásticas). São apresentadas cinco propriedades principais: rigidez, resistência, ductilidade, resiliência e tenacidade. A rigidez, relacionada ao módulo de elasticidade (E), indica a resistência à deformação elástica; quanto maior o módulo, mais rígido o material. A resistência está associada ao limite de escoamento e resistência à tração, indicando a tensão máxima suportada antes da fratura. A ductilidade representa a capacidade de deformação plástica antes da ruptura. A resiliência, mensurada pelo módulo de resiliência, é a capacidade de absorver energia durante a deformação elástica e recuperá-la no descarregamento, calculada pela área sob a curva tensão-deformação na região elástica. Por fim, a tenacidade é a capacidade de absorver energia até a fratura, aproximadamente representada pela área total sob a curva tensão-deformação, porém com aproximações devido ao comportamento não-linear na região plástica. A relação de Ramberg-Osgood é mencionada como um método para melhor representar o comportamento real do material, considerando separadamente as deformações plásticas e elásticas.
2. Curva Tensão Deformação e Regiões de Deformação
A curva tensão-deformação, obtida em ensaio de tração (ASTM E 8M-04), é analisada, dividindo-se em três regiões: elástica, plástica uniforme e plástica não-uniforme. A região elástica caracteriza-se por uma relação linear entre tensão e deformação, com a deformação desaparecendo ao cessar a solicitação. A região plástica uniforme mostra um aumento contínuo da tensão com a deformação, até atingir um ponto máximo (resistência à tração). A região plástica não-uniforme segue após o ponto máximo, com decréscimo de tensão devido à estricção (redução de área da seção transversal do corpo de prova), indicando o início do processo de fratura. Equações são apresentadas relacionando tensões e deformações de engenharia e verdadeiras, considerando deformação uniforme e volume constante. A importância da correção para o comportamento do material na região de estricção é destacada, mostrando a necessidade de utilizar fatores de correção para tensões e deformações, como apresentado pela curva de Bridgman.
III.Corrosão por Pite em Aços Inoxidáveis Dúplex
Apesar da excelente resistência à corrosão conferida pela camada passiva em aços inoxidáveis, a corrosão por pite é um fenômeno localizado e prejudicial. A presença de íons agressivos, como íons cloreto, pode quebrar a camada passiva, iniciando um processo autocatalítico de corrosão. A polarização cíclica é uma técnica eletroquímica utilizada para estudar este fenômeno, determinando o potencial de pite. A microestrutura do aço dúplex, particularmente a distribuição de ferrita e austenita, influencia significativamente a resistência à corrosão por pite. O efeito de elementos de liga como cromo, molibdênio e nitrogênio na resistência à corrosão por pite também é discutido. A influência do “índice de pite” é relevante para a compreensão da suscetibilidade à corrosão por pite.
1. Mecanismo da Corrosão por Pite
A corrosão por pite, um tipo de corrosão localizada, é caracterizada por um ataque profundo e de pequeno diâmetro que se inicia com a quebra da película passiva protetora em pontos específicos da superfície metálica, como contornos de grão, inclusões ou interfaces. O processo é autocatalítico, com rápida dissolução do metal dentro do pite (ânodo) e redução do oxigênio em superfícies adjacentes (cátodo). A dissolução anódica gera um excesso de cargas positivas, atraindo íons cloreto para manter a neutralidade, aumentando a concentração local de cloreto e causando hidrólise da água, resultando em um pH baixo e intensificando o ataque. A precipitação de fases ricas em cromo, como a fase sigma, em regiões empobrecidas deste elemento, contribui para a perda de resistência à formação de pites. Em aços dúplex solubilizados, a corrosão por pite pode ocorrer tanto na austenita quanto na ferrita; a presença de nitrogênio na austenita aumenta a resistência, enquanto em aços sem nitrogênio, a ferrita apresenta maior resistência devido a teores mais altos de cromo e molibdênio.
2. Fatores que Influenciam a Corrosão por Pite em Aços Dúplex
A resistência à corrosão por pite em aços dúplex solubilizados é fortemente dependente da composição química. O “índice de pite” (IP = (%Cr + 3,3.%Mo + 16.%N)) é um indicador dessa resistência, mostrando que um aumento nos teores de cromo, molibdênio e nitrogênio aumenta a resistência à corrosão por pite. Estudos em aços inoxidáveis dúplex (UNS S31500 e UNS S32404, sem nitrogênio) mostraram que, acima de 800 mV ECS, a nucleação de pites envolve íons cloreto e bolhas de oxigênio, ocorrendo na interface tripla metal-solução-gás. A polarização cíclica em solução 3,5% (0,6 M) NaCl em aços dúplex resulta em potenciais de pite entre 1000 mV ECS e 1200 mV ECS, com alguns pites apresentando morfologia rendilhada devido a processos de passivação e corrosão interna. Observa-se ataque preferencial da ferrita, seguida de ataque a contornos de grão e interfaces, iniciando a formação de pites na ferrita. Resultados em aço 26%Cr – 5,9%Ni – 3,2%Mo – 0,2%N reforçam essa preferência de ataque à ferrita.
3. Técnicas Eletroquímicas para Estudo da Corrosão por Pite
Apesar das excelentes propriedades protetoras das películas passivas em aços inoxidáveis, a quebra local da passividade pode levar à corrosão por pite. Íons cloreto e brometo podem substituir moléculas de água na película passiva, formando complexos solúveis que são removidos, expondo o metal e iniciando um processo autocatalítico. A corrosão por pite é detectada em curvas de polarização por um grande aumento na densidade de corrente, mesmo abaixo do potencial transpassivo (Etrans), sendo o potencial onde isso ocorre chamado de potencial de pite (Epite). A repassivação dos pites ocorre durante a reversão da varredura de potencial, e a área sob a curva de repassivação representa o trabalho elétrico necessário para impedir o crescimento do pite; quanto maior esse trabalho, menor a resistência à propagação. Técnicas eletroquímicas, como a polarização cíclica, são fundamentais para o estudo da corrosão por pite e sua relação com a microestrutura, permitindo analisar a densidade de corrente e o potencial de pite em diferentes condições.
IV.Aços Inoxidáveis Dúplex Microestrutura e Propriedades
Esta seção descreve os aços inoxidáveis dúplex, sua microestrutura (ferrita e austenita), e a relação entre a composição química, o tratamento térmico e as propriedades mecânicas e de corrosão. A formação de fases como sigma é abordada, juntamente com sua influência negativa nas propriedades. O aço inoxidável dúplex SAF 2205 é apresentado como um exemplo, destacando seu alto limite de resistência à tração, limite de escoamento e alongamento. A influência da microestrutura na superplasticidade também é mencionada.
1. Microestrutura dos Aços Inoxidáveis Dúplex
Os aços inoxidáveis dúplex são caracterizados por uma microestrutura composta por quantidades aproximadamente iguais de austenita (γ) e ferrita (α), obtida através de um balanço preciso de elementos de liga. Sua produção, frequentemente utilizando o processo AOD (descarburação por sopro combinado de oxigênio e argônio), resulta em baixo teor de carbono. No sistema ternário Fe-Cr-Ni, além da austenita (estrutura cúbica de faces centradas) e ferrita (estrutura cúbica de corpo centrado), pode-se encontrar a fase α’ (cúbica de corpo centrado e rica em cromo) e a fase intermetálica sigma (tetragonal), esta última extremamente dura, frágil e não magnética. O desenvolvimento da microestrutura dúplex ferrita-austenita se dá pela escolha correta da composição química e pela aplicação de um tratamento térmico de solubilização seguido de resfriamento rápido. A formação da fase sigma, assim como carbonetos e outros precipitados (exceto martensita), ocorre preferencialmente nos contornos de grão ou nos contornos entre as fases α e γ. Aços inoxidáveis dúplex se destacam por sua alta resistência à corrosão combinada com alta resistência mecânica e tenacidade.
2. Propriedades Mecânicas dos Aços Inoxidáveis Dúplex
As propriedades mecânicas dos aços inoxidáveis dúplex são uma consequência das propriedades das fases individuais α e γ, particularmente a fase α. Os aços inoxidáveis ferríticos, em comparação aos austeníticos, apresentam maior limite de escoamento, com maior dependência da temperatura. A adição de ferrita à austenita aumenta o limite de escoamento em aços dúplex, especialmente em baixas temperaturas. Um endurecimento adicional é atribuído ao refino do tamanho de grão na estrutura dúplex em relação aos grãos mais grosseiros nas fases separadas. O aço inoxidável dúplex SAF 2205, como exemplo, possui limite de resistência à tração de 760 MPa, limite de escoamento próximo de 520 MPa (aproximadamente o dobro de aços austeníticos como AISI 304 e 316), e alongamento em 50 mm superior a 27%. Sua resistência à corrosão também supera a dos aços austeníticos, mesmo os de baixo teor de carbono. A presença de ambas as fases (α e γ) não apenas melhora as propriedades mecânicas, mas também permite deformação superplástica em trabalho a quente, favorecida por pequenos tamanhos de grão (1-10 µm) resultantes das transformações de fase.