
Deformação em Aços Duplex: Cinética de Precipitação
Informações do documento
Autor | Gustavo Balderramas Hulpan Pereira |
instructor/editor | Prof. Oscar Mattos, D.Sc. |
Escola | Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)/Escola Politécnica |
Curso | Engenharia Metalúrgica |
Tipo de documento | Projeto de Graduação |
Local | Rio de Janeiro |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 3.39 MB |
Resumo
I.Influência da Deformação Plástica e Precipitação de Fases Intermetálicas na Resistência à Corrosão de Aços Inoxidáveis Duplex
Este estudo investigou o impacto da deformação plástica e da precipitação de fases intermetálicas na resistência à corrosão de dois aços inoxidáveis duplex: UNS S31803 e UNS S32304 (um aço lean duplex). Amostras foram deformadas em diferentes níveis (5%, 10%, 20%) e submetidas a tratamento térmico a 750°C por 30 minutos (E750-30M), promovendo a precipitação de fases como fase sigma (σ), fase chi (χ) e nitretos de cromo (Cr₂N). A resistência à corrosão foi avaliada utilizando a técnica de DL-EPR (Double Loop Electrochemical Potentiokinetic Reactivation). Os resultados indicaram maior susceptibilidade à corrosão localizada no aço UNS S32304 (menor teor de molibdênio) com maior nível de deformação (20%). A análise microestrutural revelou diferenças na cinética de precipitação das fases intermetálicas entre os dois aços, influenciada pelo teor de Mo e pela deformação aplicada. O estudo destaca a importância do teor de elementos de liga, como cromo e molibdênio, na estabilidade da camada passiva e na resistência à corrosão, e como a precipitação de fases intermetálicas, em particular a fase σ e χ, afeta negativamente as propriedades de resistência à corrosão.
1. Materiais e Metodologia
O estudo analisou a influência da deformação plástica e da precipitação de fases intermetálicas na resistência à corrosão de dois aços inoxidáveis duplex: UNS S31803 e o lean duplex UNS S32304. Amostras de ambos os aços foram submetidas a diferentes níveis de deformação plástica (5%, 10% e 20%). Após a deformação, as amostras foram tratadas termicamente a 750°C por 30 minutos (E750-30M), um processo que permite a precipitação de fases intermetálicas. A técnica empregada para avaliar a resistência à corrosão foi o ensaio de DL-EPR (Double Loop Electrochemical Potentiokinetic Reactivation), que possibilita determinar quantitativamente a suscetibilidade à corrosão localizada. A escolha desses aços e dessa metodologia se justifica pela necessidade de compreender a relação entre processamento (deformação e tratamento térmico), microestrutura (precipitação de fases) e propriedades (resistência à corrosão), particularmente em aços inoxidáveis duplex, que apresentam uma combinação complexa de fases e propriedades mecânicas e de corrosão.
2. Resultados dos Ensaios de DL EPR
Os ensaios de DL-EPR mostraram uma maior suscetibilidade à corrosão localizada na amostra de aço UNS S32304 (lean duplex) com 20% de deformação. Este resultado é atribuído ao menor teor de molibdênio neste aço, elemento crucial para a resistência à corrosão por pites. A otimização do ensaio DL-EPR foi necessária, inicialmente utilizando-se uma solução de HCl 3M, porém, com resultados irreprodutíveis. A solução de HCl 2M apresentou melhor reprodutibilidade, possibilitando uma análise mais precisa da suscetibilidade à corrosão. A análise da razão Qr/Qa (carga de reativação/carga de ativação) permitiu a quantificação da susceptibilidade à corrosão localizada. A comparação entre os dois aços inoxidáveis, com e sem tratamento térmico, evidenciou a influência do teor de molibdênio na resistência à corrosão, corroborando com estudos prévios. O fato do UNS S32304 ser um lean duplex já antecipava sua menor resistência em comparação ao UNS S31803.
3. Análise Microestrutural e Precipitação de Fases
A análise microestrutural, realizada por microscopia óptica e eletrônica de varredura (MEV), quantificou as fases presentes nas amostras. Em amostras do aço UNS S31803, após o tratamento térmico, foram identificadas as fases chi (χ) e nitretos de cromo (Cr₂N). Já no aço UNS S32304, apenas os nitretos de cromo (Cr₂N) foram observados. A ausência da fase χ no UNS S32304 é atribuída ao baixo teor de molibdênio, um componente essencial dessa fase. A análise das micrografias após os ensaios de DL-EPR mostrou que a corrosão ocorreu preferencialmente nas adjacências das fases intermetálicas, indicando que a precipitação dessas fases reduz a resistência à corrosão localizada. A observação de 'vales' entre os contornos de grãos de ferrita e austenita evidencia a degradação do filme passivo nessas regiões, próximas aos precipitados intermetálicos. A quantificação da fração volumétrica das fases intermetálicas em função do nível de deformação indicou uma cinética de precipitação diferente entre os dois aços.
II.Composição Química e Microestrutura dos Aços Inoxidáveis Duplex
A composição química dos aços inoxidáveis duplex (AIDs) e superduplex (AISDs) influencia diretamente suas propriedades. Elementos como cromo (Cr), molibdênio (Mo) e nitrogênio (N) impactam na estabilidade da camada passiva e na resistência à corrosão localizada. O índice PRE N ([%Cr] + 3,3.[%Mo] + 16.[%N]) é usado para avaliar a resistência à corrosão por pites. Aços inoxidáveis duplex possuem uma microestrutura bifásica, com ferrita (δ) e austenita (γ) em proporções aproximadamente iguais (≈1:1), conferindo boa resistência à corrosão sobtensão. A adição de elementos de liga, como molibdênio e níquel, influencia a quantidade de cada fase e, consequentemente, as propriedades do material. O estudo enfoca a influência de diferentes teores de elementos (especialmente Mo) na formação de diferentes fases intermetálicas.
1. Aços Inoxidáveis Duplex Composição e Microestrutura
A principal diferença entre aços inoxidáveis duplex (AID) e superduplex (AISD) reside em sua composição química. A presença de elementos como cromo (Cr), molibdênio (Mo) e nitrogênio (N) impacta diretamente a estabilidade da camada passiva, a resistência à corrosão localizada e as propriedades mecânicas. O índice PRE N ([%Cr] + 3,3[%Mo] + 16[%N]) quantifica a influência desses elementos na resistência à corrosão por pites. Entretanto, o aumento do PRE N pode estar associado a uma maior suscetibilidade à formação de fases intermetálicas, conforme a norma ISO 15156-3. Os AIDs são caracterizados por uma microestrutura bifásica, contendo ferrita (δ) com estrutura cúbica de corpo centrado (CCC) e austenita (γ) com estrutura cúbica de face centrada (CFC), aproximadamente em proporções iguais (δ/γ ≈ 1:1). Essa relação é alcançada pela adição controlada de elementos de liga estabilizadores de ferrita e austenita, influenciando a quantidade de cada fase e, consequentemente, as propriedades do material. O tratamento termomecânico e o tratamento térmico também são fatores determinantes na microestrutura final.
2. Influência de Elementos de Liga na Microestrutura e Corrosão
O cromo (Cr) é fundamental para a resistência à corrosão, formando um filme protetor de óxido de cromo (Cr₂O₃) responsável pela passivação. Teores mais elevados de cromo melhoram a estabilidade desse filme, mas também podem levar à precipitação de fases deletérias, reduzindo as propriedades mecânicas e a resistência à corrosão. O molibdênio (Mo) estabiliza a ferrita (δ) e apresenta um efeito três vezes mais eficaz que o cromo na resistência à corrosão por pites em soluções contendo íons cloreto, devendo-se respeitar um limite de 3% na sua adição para evitar a formação de fases intermetálicas indesejáveis. O tungstênio (W), até 2%, melhora a resistência à corrosão por pites e frestas, mas em teores maiores, propicia a precipitação de fases intermetálicas (σ e χ). O nitrogênio (N) é um importante estabilizador da austenita (γ), aumentando a resistência à corrosão e a resistência mecânica, além de melhorar a soldabilidade. Elementos como silício (Si) são controlados em baixas concentrações (abaixo de 1%) devido à sua alta susceptibilidade à formação da fase σ; já em teores mais elevados, pode melhorar significativamente a resistência à formação de pites. A adição de cobre promove melhora na resistência à corrosão e endurecimento por precipitação, mas com redução na tenacidade ao impacto.
3. Microestrutura e Propriedades dos Aços Inoxidáveis Duplex
Os AIDs foram desenvolvidos para atender aplicações que demandam elevadas propriedades mecânicas e resistência à corrosão, principalmente à corrosão sob tensão. Sua microestrutura bifásica (ferrita-austenita em proporções aproximadamente iguais) proporciona boa resistência à corrosão sob tensão, resistência à corrosão intergranular, excelentes propriedades mecânicas e boa soldabilidade. O balanço entre as fases δ e γ, obtido pelo controle da composição química e do processamento termomecânico, é crucial para as propriedades finais. Um aumento na proporção de austenita (γ) diminui a resistência à corrosão sob tensão e a resistência mecânica, enquanto o aumento da ferrita (δ) reduz a tenacidade à fratura. A influência da temperatura na microestrutura é significativa, com a precipitação de diversas fases intermetálicas na faixa de 600-1000°C (alta temperatura) durante soldagem ou tratamentos térmicos inadequados, causando fragilização. Em baixas temperaturas (300-500°C), o material pode apresentar fragilização durante o serviço, limitando sua temperatura máxima de aplicação. Parâmetros como Cr eq e Ni eq podem ser usados para estimar o teor de ferrita no diagrama de Schaeffler ou Delong.
III.Precipitação de Fases Intermetálicas em Aços Inoxidáveis Duplex
A exposição a altas temperaturas (600-1000°C) leva à precipitação de diversas fases intermetálicas nos aços inoxidáveis duplex, como fase sigma (σ), fase chi (χ), fase R, e nitretos de cromo (Cr₂N). Essas fases, geralmente ricas em cromo e molibdênio, reduzem a resistência à corrosão e as propriedades mecânicas. A cinética de precipitação dessas fases é influenciada pela composição química do aço, principalmente o teor de molibdênio, e pela temperatura e tempo de exposição. O estudo analisou a influência do tratamento térmico E750-30M e da deformação prévia na precipitação dessas fases.
1. Formação e Tipos de Fases Intermetálicas
Além das fases ferrita (δ) e austenita (γ) características dos aços inoxidáveis duplex (AIDs), outras fases intermetálicas podem precipitar em faixas de temperatura entre 300°C e 1000°C, dependendo das condições de serviço, ciclos térmicos de soldagem ou tratamentos térmicos. Essas fases intermetálicas, geralmente não magnéticas, podem reduzir significativamente as propriedades mecânicas do material, causando queda na tenacidade e ductilidade, e aumentando a dureza, além de afetar a resistência à corrosão. As fases mais prejudiciais são as ricas em cromo e molibdênio, pois removem Cr das regiões adjacentes. O texto cita a fase sigma (σ), fase chi (χ), fase R, nitretos de cromo (Cr₂N) e carbonetos como exemplos de fases intermetálicas que podem precipitar, cada uma com características e impactos distintos nas propriedades do aço. A precipitação dessas fases depende de diversos fatores, incluindo a composição química do aço, a temperatura e o tempo de exposição. Uma curva TTT (tempo-temperatura-transformação) ilustra as condições de formação dessas fases.
2. Características e Impacto das Principais Fases
A fase sigma (σ) é a mais importante devido à sua maior fração volumétrica e influência nas propriedades mecânicas. Rica em ferro, molibdênio e cromo, é não magnética e tem estrutura cristalina tetragonal. Sua morfologia varia com a temperatura; em 750°C, apresenta maior dispersão de precipitados. A fase chi (χ), com coloração azulada, precipita principalmente na ferrita e sua formação é mais rápida em aços com tungstênio. A fase R, enriquecida em molibdênio, precipita em pequenas quantidades entre 550-700°C, reduzindo a tenacidade e a temperatura crítica de pite. Os nitretos de cromo (Cr₂N) precipitam preferencialmente nas interfaces δ/γ, podendo também ser encontrados em δ/δ e γ/γ, e em alguns casos, dentro dos grãos. Sua precipitação pode diminuir a resistência à corrosão. Carbonetos precipitam preferencialmente nas fronteiras de grão, mas sua precipitação em AIDs é difícil devido à alta solubilidade do cromo na ferrita. A austenita secundária (γ₂) precipita a partir da ferrita após reaquecimento ou soldagem, podendo apresentar crescimento lamelar com ou sem a presença de carbonetos.
3. Influência da Composição Química e do Tratamento Térmico
A precipitação de fases intermetálicas é fortemente influenciada pela composição química do aço. Elementos como molibdênio (Mo) desempenham um papel crucial na formação de certas fases, como a fase χ, cuja ausência no aço UNS S32304, por exemplo, é relacionada à baixa concentração de Mo. O alto teor de cromo (Cr) contribui para a formação de nitretos de cromo (Cr₂N). O tratamento térmico a 750°C por 30 minutos (E750-30M) foi suficiente para precipitar nitreto de cromo (Cr₂N) no aço UNS S32304 e tanto a fase chi (χ) quanto nitreto de cromo (Cr₂N) no aço UNS S31803. A deformação plástica aplicada às amostras, até 20%, não interferiu na degradação do filme passivo, sem mostrar diferenças significativas nos ensaios DL-EPR para amostras submetidas apenas a deformação, sem tratamento térmico. A cinética de precipitação das fases intermetálicas mostrou-se influenciada pela deformação, com uma relação aproximadamente linear observada no aço UNS S31803, enquanto no aço UNS S32304, um patamar foi atingido acima de 10% de deformação, indicando que o crescimento das fases passa a ser predominante à precipitação.
IV.Ensaios de DL EPR e Análise de Resultados
A susceptibilidade à corrosão localizada foi determinada através de ensaios de DL-EPR. A análise da razão entre as cargas de reativação (Qr) e ativação (Qa) (Qr/Qa) quantifica a suscetibilidade à corrosão. O estudo utilizou solução de HCl 2M para obter resultados reprodutíveis. Resultados mostraram que o aço UNS S31803 apresentou maior resistência à corrosão que o UNS S32304, principalmente devido à diferença no teor de molibdênio. A análise pós-ensaio por microscopia mostrou que a corrosão ocorreu preferencialmente nas regiões adjacentes às fases intermetálicas, confirmando sua influência negativa na resistência à corrosão.