
Corrosão Sob Tensão em Aço Inox 304
Informações do documento
Autor | Thiago Martins Teixeira Braga |
instructor | Prof. Luiz Cláudio Cândido |
Escola | UFOP – CETEC – UEMG |
Curso | Engenharia de Materiais |
Tipo de documento | Dissertação de Mestrado |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 12.14 MB |
Resumo
I. Corrosão sob Tensão CST em Aço Inoxidável AISI 304 Influência de Meios Cloretados e Concentradores de Tensão
Este estudo investigou a corrosão sob tensão (CST) em amostras de aço inoxidável austenítico AISI 304 expostas a diferentes meios cloretados: solução de MgCl2 42% (massa) em ebulição e HCl 1M (pH ≈ 0,00) à temperatura ambiente. Utilizando ensaios de carga constante e deformação constante, avaliou-se a suscetibilidade à CST considerando a influência de concentradores de tensão (entalhes). Resultados indicaram maior suscetibilidade em MgCl2 em ebulição, com tempos de fratura menores em ambos os ensaios, demonstrando a severidade deste meio corrosivo para o AISI 304. Em HCl 1M, o tempo até a fratura por CST aumentou com a diminuição da carga aplicada, e a presença de entalhes acelerou significativamente o processo de trincamento. Ensaios de polarização potenciodinâmica caracterizaram eletroquimicamente os meios, confirmando a agressividade dos cloretos.
1. Introdução e Objetivo
O estudo teve como objetivo principal avaliar o comportamento do aço inoxidável AISI 304 em diferentes meios cloretados, analisando a influência de um concentrador de tensão geométrico (entalhe) no fenômeno de corrosão sob tensão (CST). Foram utilizados dois meios corrosivos: MgCl2 a 42% (em massa) em ebulição (143°C) e HCl 1M (pH ≈ 0,00) à temperatura ambiente. As técnicas de avaliação empregadas foram ensaios de deformação constante e carga constante no eletrodo. Observações iniciais, antes mesmo dos testes detalhados, revelaram que corpos de prova (CPs) expostos à solução de MgCl2 em ebulição apresentaram CST mesmo abaixo do limite de escoamento do material (σe), indicando maior suscetibilidade neste meio. Aumentando o nível de carregamento, o tempo para o desenvolvimento da CST diminuiu, e a presença de entalhes também reduziu esse tempo, facilitando a fratura dos CPs. A utilização do AISI 304 se justifica por sua ampla aplicação em estruturas metálicas, como torres, linhas de transmissão e tanques de armazenamento, onde a durabilidade e resistência à corrosão são fundamentais para garantir a segurança e o retorno do investimento.
2. Fundamentos da Corrosão e Corrosão sob Tensão CST
A seção aborda os fundamentos da corrosão, diferenciando a corrosão química da eletroquímica. A corrosão eletroquímica, foco do estudo, envolve transferência de elétrons através de um eletrólito, sendo comum em soluções salinas, água do mar e ambientes atmosféricos. São mencionados tipos específicos de corrosão localizada, como corrosão por pites (associada à desestabilização do filme passivo por íons cloreto e diminuição do pH) e corrosão por frestas (ocorrendo em regiões com acesso limitado ao eletrólito). A corrosão sob tensão (CST) é detalhada como um fenômeno que causa fratura frágil em materiais dúcteis, mesmo sob tensões abaixo do limite de escoamento, devido à ação combinada de tensão mecânica e ambiente corrosivo. A tensão pode ser residual (de fabricação, soldagem ou tratamento térmico) ou aplicada externamente. O processo de CST envolve reações eletroquímicas anódica e catódica, podendo ocorrer por dissolução anódica do metal ou fragilização por hidrogênio. Aços inoxidáveis são particularmente suscetíveis à CST em soluções aquosas ricas em cloretos em temperaturas de ebulição, embora essa suscetibilidade varie entre ligas. A CST é insidiosa, sem sinais visíveis, e os íons cloreto e hidróxido são considerados os principais agentes deletérios em aços inoxidáveis.
3. Metodologia Experimental Ensaios de Corrosão sob Tensão
A metodologia empregou diferentes técnicas para avaliar a suscetibilidade à CST no aço AISI 304. Os ensaios de corrosão sob tensão foram conduzidos utilizando dois meios corrosivos: MgCl2 42% (massa) em ebulição (143°C) e HCl 1M (pH ≈ 0,00) à temperatura ambiente. Foram realizados ensaios de carga constante e deformação constante. No ensaio de carga constante, corpos de prova (CPs) foram submetidos a esforços de tração por um peso morto em uma célula eletroquímica, podendo ou não apresentar entalhe. Este ensaio se aproxima das condições reais de serviço, mas sua limitação reside no tempo necessário para a ocorrência da CST. Os ensaios de deformação constante permitiram avaliar qualitativamente a suscetibilidade à CST. Ensaios de polarização potenciodinâmica, utilizando um potenciostato/galvanostato, foram realizados para caracterizar eletroquimicamente os meios corrosivos, analisando as curvas de potencial x corrente, e assim identificando regiões de suscetibilidade à CST. A influência do nível de carregamento (percentual do limite de escoamento, σe) e a presença de entalhes foram investigadas para avaliar sua influência no tempo de fratura.
4. Resultados e Análise dos Ensaios
Os resultados dos ensaios revelaram que a solução de MgCl2 42% (massa) em ebulição induziu CST no AISI 304 com maior intensidade e em tempos menores do que o HCl 1M à temperatura ambiente. Nos ensaios com HCl 1M, o tempo de fratura diminuiu com o aumento da carga aplicada, atingindo a fratura em 100% de σe e não apresentando trincas em 60% de σe em 1000 horas. A presença de entalhes nos CPs reduziu significativamente o tempo de fratura em HCl 1M, devido à maior concentração de tensões. Observações macro e micrográficas das fraturas revelaram o aspecto frágil característico da CST, com facetas de clivagem. A análise potenciodinâmica mostrou que HCl 1M é mais agressivo que soluções de NaCl 3,5% (massa), sem apresentar zona de passivação. Uma comparação com estudos anteriores (Devasenapathi et al., 1997) confirmou a maior agressividade do MgCl2 em ebulição em relação ao HCl à temperatura ambiente, reforçando a importância da combinação de meio corrosivo e nível de tensão na ocorrência da CST.
II. Metodologias de Ensaio para Avaliação da Corrosão sob Tensão
A pesquisa empregou duas principais metodologias para avaliar a corrosão sob tensão (CST): ensaios de carga constante e deformação constante. Ensaios eletroquímicos, incluindo polarização potenciodinâmica, foram usados para caracterizar o comportamento eletroquímico do aço AISI 304 nos meios corrosivos. A análise considerou a influência de diferentes níveis de tensão aplicada, variando como percentual do limite de escoamento (σe), e a presença ou ausência de entalhes nas amostras. O tempo de trincamento e de ruptura foram os principais parâmetros analisados.
1. Ensaio de Carga Constante
Neste método, o corpo de prova (CP) é submetido a um esforço de tração constante, simulado por um peso morto em um braço de alavanca, dentro de uma célula eletroquímica. O CP pode ou não apresentar um entalhe, definido por conceitos de mecânica da fratura. Essa técnica busca aproximar as condições reais de serviço, em contraste com ensaios de deformação constante, pois representa um ensaio estático. Entretanto, sua principal limitação é o tempo necessário para a ocorrência da corrosão sob tensão (CST), que dependerá da interação entre o material e o meio corrosivo, bem como da intensidade da tensão no vértice da trinca, caso esta se forme. A configuração do sistema permite a aplicação de esforço de tração e a imersão em solução corrosiva simultaneamente, permitindo a observação da ocorrência e a progressão da corrosão sob tensão. A utilização de pesos mortos garante a manutenção da carga constante ao longo do ensaio.
2. Ensaio de Deformação Constante
A técnica de deformação constante permitiu uma avaliação qualitativa da suscetibilidade à corrosão sob tensão (CST) do aço AISI 304. Foram utilizados dois meios: solução de MgCl2 42% (massa) em ebulição e HCl 1M (pH ≈ 0,00). No MgCl2 em ebulição, uma intensa fragilização foi observada após cerca de 2 horas, com o surgimento de trincas na região deformada, levando à ruptura completa em 6 a 8 horas. Este comportamento é consistente com observações anteriores (Cândido et al., 1996). Em contraponto, em HCl 1M à temperatura ambiente, não houve trincamento em 1000 horas de ensaio, mesmo com inspeção visual detalhada. Este resultado dispensou ensaios em soluções menos agressivas. A avaliação qualitativa da suscetibilidade foi possível através da observação direta da formação e propagação de trincas, possibilitando a comparação da velocidade de degradação em diferentes meios corrosivos. A simplicidade do método permitiu um monitoramento contínuo da evolução do processo de CST.
3. Ensaios de Polarização Potenciodinâmica
Para a caracterização eletroquímica dos meios corrosivos, foram utilizados ensaios de polarização potenciodinâmica com um potenciostato/galvanostato (EG & G Princeton Applied Research, modelo 273A) e software (352 softcorr III). Uma célula eletroquímica contendo três eletrodos – eletrodo de trabalho (o aço AISI 304), contra-eletrodo de platina e eletrodo de referência de calomelano saturado – foi empregada. As curvas de polarização geradas mostraram o comportamento eletroquímico do aço em cada meio, permitindo identificar as regiões de suscetibilidade à CST, observando-se as regiões de ativação, passivação e transpassivação. Embora a técnica indique regiões de suscetibilidade, uma combinação material/meio não suscetível à CST não irá apresentar trincas mesmo nessas regiões. Foram realizados ensaios com MgCl2 42% (massa) a 143°C e HCl 1M (pH ≈ 0,00) à temperatura ambiente, por até 1000 horas. O monitoramento da formação e evolução de trincas determinou o tempo de fragilização e ruptura dos CPs.
III. Resultados e Discussão Suscetibilidade à Corrosão sob Tensão em Diferentes Meios
Os resultados demonstraram que o meio contendo MgCl2 42% em ebulição é significativamente mais agressivo que o HCl 1M à temperatura ambiente para induzir corrosão sob tensão (CST) no aço AISI 304. Em ambos os meios, um aumento na tensão aplicada resultou em uma diminuição do tempo para o início e a propagação de trincas. A presença de entalhes nas amostras também acelerou o processo de CST, devido ao aumento da concentração de tensão na região do entalhe. A análise micrográfica das fraturas confirmou o aspecto frágil característico da CST.
1. Comportamento em MgCl2 42 em Ebulição
Os resultados demonstram uma maior suscetibilidade à corrosão sob tensão (CST) do aço AISI 304 em solução de MgCl2 42% (massa) em ebulição (143°C). Observou-se que a fragilização dos corpos de prova (CPs) se inicia após aproximadamente 2 horas de ensaio, com o aparecimento de trincas na região deformada. Em 6 a 8 horas, as trincas se propagam até a ruptura completa dos CPs. Esse comportamento já havia sido observado por Cândido et al. (1996). A análise demonstra que, mesmo com níveis de carga abaixo do limite de escoamento (σe), a CST ocorre de forma significativa neste meio agressivo. A alta concentração de cloretos e a temperatura elevada contribuem para a desestabilização da camada passiva do aço, acelerando o processo de trincamento. A severidade do meio corrosivo demonstra a importância de se considerar este fator na escolha do material para aplicações específicas, onde a presença de MgCl2 em alta concentração e temperatura é esperada.
2. Comportamento em HCl 1M à Temperatura Ambiente
Em contraste com o MgCl2 em ebulição, o meio corrosivo de HCl 1M (pH ≈ 0,00) à temperatura ambiente mostrou menor agressividade em relação ao AISI 304. Em ensaios com carga constante e com corpos de prova lisos, não foi observado trincamento após 1000 horas nos ensaios com 60% do limite de escoamento (σe). Ao aplicar cargas mais elevadas (100% de σe), a fratura por CST ocorreu, mas em tempos significativamente maiores do que no MgCl2. A análise micrográfica dos CPs fraturados revelou múltiplas trincas e fratura frágil, confirmada por microscopia eletrônica de varredura. Microfratografias ilustram trincas que se desenvolveram durante as 1000 horas de ensaio, mas não levaram à fratura completa, indicando uma dependência crítica entre a carga aplicada e o tempo de ruptura. A desestabilização da camada passiva pelos íons cloreto é um fator essencial, mas a intensidade da carga aplicada é determinante na velocidade da propagação das trincas.
3. Influência de Entalhes
A presença de entalhes nos corpos de prova (CPs) acelerou significativamente o processo de corrosão sob tensão (CST), principalmente nos ensaios realizados em HCl 1M à temperatura ambiente. Os tempos de ruptura foram menores em CPs entalhados quando comparados aos lisos. A fratura ocorreu na região do entalhe devido à concentração de tensões nesse ponto, causando instabilidade na camada passiva e consequente iniciação e propagação de trincas. O aspecto frágil da fratura, com facetas de clivagem, confirma o mecanismo de CST. As microfratografias dos CPs entalhados fraturados revelam um aspecto frágil com facetas de clivagem, típico de CST. Essa maior suscetibilidade à CST na região entalhada é consistente com a teoria da mecânica da fratura, onde as concentrações de tensão são mais significativas, resultando em um tempo de ruptura mais curto. A comparação entre os resultados com e sem entalhe reforça a importância de se considerar a geometria das peças na avaliação da suscetibilidade à CST.
IV. Conclusão Implicações para a Engenharia e Seleção de Materiais
Este estudo destaca a importância de considerar os efeitos da corrosão sob tensão (CST) na seleção de materiais, especialmente em aplicações que envolvem o aço inoxidável AISI 304 exposto a meios cloretados. A suscetibilidade à CST é significativamente influenciada pela concentração de cloretos, temperatura e pela presença de concentradores de tensão. Os resultados fornecem informações valiosas para a previsão do comportamento do AISI 304 em serviço e para o desenvolvimento de estratégias para mitigação da CST.
1. Suscetibilidade do Aço AISI 304 à Corrosão sob Tensão
Os resultados demonstram que a suscetibilidade do aço inoxidável AISI 304 à corrosão sob tensão (CST) é fortemente influenciada pelo meio corrosivo e pelo nível de tensão aplicado. O MgCl2 a 42% (massa) em ebulição se mostrou um meio significativamente mais agressivo do que o HCl 1M (pH ≈ 0,00) à temperatura ambiente. Em ambos os meios, o aumento da tensão aplicada (como percentual do limite de escoamento, σe) resultou na diminuição do tempo até a ocorrência da CST e a consequente fratura. A constatação da ocorrência de CST em MgCl2 em ebulição mesmo em tensões abaixo do limite de escoamento (σe) reforça a alta agressividade deste meio corrosivo para o AISI 304. Esses achados destacam a importância da cuidadosa seleção do material em função do ambiente de operação, considerando a severidade do meio corrosivo e os níveis de tensão esperados em serviço.
2. Importância da Concentração de Cloretos e da Temperatura
A pesquisa demonstra uma clara correlação entre a concentração de cloretos, a temperatura do meio e a suscetibilidade à corrosão sob tensão (CST). A solução de MgCl2 a 42% (massa) em ebulição, com alta concentração de cloretos e temperatura elevada (143°C), causou CST em tempos muito menores quando comparado ao HCl 1M à temperatura ambiente. Isso evidencia o papel crucial dos íons cloreto na desestabilização da camada passiva protetora do aço AISI 304, que por sua vez acelera a corrosão. A temperatura elevada, em conjunto com a alta concentração de cloretos no meio MgCl2, intensifica esse efeito, conduzindo a uma fragilização rápida e ruptura do material. Esta constatação enfatiza a necessidade de considerar a temperatura operacional e a concentração de cloretos como fatores críticos na previsão de falhas por CST. Mesmo para o AISI 304, que possui boa resistência à corrosão em condições normais, estas variáveis são cruciais para sua performance em serviço.
3. Implicações para a Engenharia e Seleção de Materiais
Os resultados deste estudo têm implicações significativas para a engenharia e a seleção de materiais em aplicações onde o aço AISI 304 está sujeito a tensões e meios corrosivos. A pesquisa demonstra que a presença de cloretos, especialmente em altas concentrações e temperaturas elevadas, é extremamente deletéria para o AISI 304, podendo levar à falha por corrosão sob tensão (CST) mesmo abaixo do seu limite de escoamento. A influência de concentradores de tensão geométricos (entalhes) também foi destacada, reduzindo significativamente o tempo até a fratura. Para garantir a durabilidade e a segurança das estruturas, é fundamental considerar esses fatores na etapa de projeto e seleção de materiais. O conhecimento da agressividade do meio corrosivo, dos níveis de tensão esperados e da influência de descontinuidades geométricas é essencial para evitar falhas catastróficas por CST. A pesquisa reforça a necessidade de testes criteriosos para simular as condições de serviço.