Síntese, caracterização e atividade de catecolase de um complexo mononuclear de cobre com um ligante não-simétrico

Catecolase: Síntese de Complexo de Cobre

Informações do documento

Autor

Sarita Wisbeck

instructor/editor Prof. Dr. Adailton João Bortoluzzi (Orientador)
Escola

Universidade Federal de Santa Catarina

Curso Química - Bacharelado
Tipo de documento Relatório de Estágio Supervisionado II
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 0.93 MB

Resumo

I.Síntese e Caracterização de um Novo Ligante e Complexo de Cobre II com Atividade Catecolase

Este trabalho descreve a síntese e caracterização completa de um novo ligante não-simétrico, N,N,N'-tris(2-metilpiridil)-N'(2-hidróxi-5-metilbenzaldeído)-propano-1,3-diamina (H1L1), projetado para mimetizar o sítio ativo da catecol oxidase. O ligante H1L1 foi sintetizado e caracterizado por diversas técnicas espectroscópicas, incluindo infravermelho (IV), ressonância magnética nuclear de hidrogênio e carbono (RMN), e espectrometria de massas (ESI-MS), confirmando sua pureza e estrutura. A partir de H1L1, um complexo mononuclear de cobre(II) foi preparado e caracterizado por IV, ESI-MS, espectroscopia eletrônica UV-Vis e reflectância difusa, eletroquímica (voltametria cíclica), condutivimetria e titulação espectrofotométrica. As análises revelaram um equilíbrio entre as espécies protonada e desprotonada do fenol no ligante, influenciado pelo pH. A geometria do complexo em solução sugere uma estrutura octaédrica, enquanto no estado sólido, uma geometria piramidal de base quadrada é proposta. O complexo mostrou atividade de catecolase significativa na oxidação do 3,5-di-terc-butilcatecol (3,5-DTBC), sugerindo que pode servir como um modelo funcional para a enzima catecol oxidase.

1. Síntese do Ligante H1L1

A síntese do ligante N,N,N'-tris(2-metilpiridil)-N'(2-hidróxi-5-metilbenzaldeído)-propano-1,3-diamina (H1L1), um composto não-simétrico e multidentado, é detalhada. O processo envolveu etapas sequenciais, iniciando com a adição lenta de 1,3-propanodiamina a uma solução metanólica de 2-piridilcarboxialdeído, sob agitação magnética e banho de gelo. Após a adição, a agitação foi mantida por quatro horas. O solvente foi removido sob pressão reduzida, seguido de uma etapa de hidrogenação utilizando etanol como solvente, com pressão de 45 psi por 15 horas, empregando Pd/C como catalisador. O produto, um óleo amarelado com rendimento de 78,2%, foi caracterizado por espectroscopia de infravermelho (IV) e ressonância magnética nuclear de hidrogênio (RMN 1H). Etapas subsequentes envolveram adição de NaOH 15% (m/v), agitação por 3 horas, remoção do solvente, ajuste de pH para aproximadamente 9, extração com diclorometano, secagem e remoção do solvente resultando num óleo amarelado com 89,5% de rendimento. Finalmente, após reação de abertura de anel, lavagens com solução saturada de bicarbonato de sódio e secagem, obteve-se um óleo amarelo escuro com 94% de rendimento. A caracterização completa do H1L1 incluiu ESI-MS, IV, e RMN 1H e 13C, assegurando sua pureza e adequabilidade para a síntese do complexo de cobre.

2. Síntese e Caracterização do Complexo de Cobre II

O complexo de cobre(II) foi sintetizado adicionando o ligante H1L1 dissolvido em metanol a uma solução metanólica de Cu(ClO4)2.6H2O. A precipitação do complexo iniciou-se com a adição de metade da solução de H1L1 e continuou até o fim da adição do ligante, resultando num pó verde. A caracterização do complexo envolveu diversas técnicas espectroscópicas e eletroquímicas. A espectroscopia de infravermelho (IV) revelou informações sobre as ligações e a coordenação do ligante ao íon metálico, observando-se a banda de deformação axial O-H, indicando a presença de espécies com fenol protonado. A espectrometria de massas (ESI-MS) confirmou a formação do complexo, identificando o íon molecular protonado [C30H32CuN5O2]+ e seus isótopos. A espectroscopia eletrônica UV-Vis, tanto em solução quanto por reflectância difusa, forneceu informações sobre a geometria do complexo, sugerindo uma geometria octaédrica em solução e piramidal de base quadrada no estado sólido. O comportamento redox foi investigado por voltametria cíclica, mostrando um sistema irreversível. A condutivimetria indicou o equilíbrio de espécies protonadas e desprotonadas do fenol. A titulação espectrofotométrica determinou o pKa de desprotonação do fenol coordenado ao cobre(II) como sendo 5,17.

3. Análise Espectroscópica Detalhada

A caracterização do ligante e do complexo utilizou diversas técnicas espectroscópicas. Na espectroscopia de infravermelho (IV), a formação do intermediário 2pyprop foi confirmada pela banda de amina secundária e ausência de bandas de estiramento carbonila e amina primária. Para o ligante H1L1, a banda de estiramento axial C=O em 1675 cm-1 e a banda de deformação axial O-H do fenol em 3423 cm-1 foram características importantes. A RMN 1H forneceu informações detalhadas sobre o acoplamento de spin e deslocamentos químicos, auxiliando na identificação dos produtos em cada etapa de síntese. A RMN 13C complementou a caracterização estrutural. A espectrometria de massas (ESI-MS) confirmou a massa molecular do ligante H1L1 e a composição do complexo, mostrando a razão massa/carga esperada e a distribuição isotópica. A análise dos espectros de RMN, em especial a identificação dos picos da metila (2,24 ppm) e do aldeído (10,28 ppm) no H1L1, ajudou a confirmar a estrutura do ligante final. A espectroscopia eletrônica UV-Vis permitiu identificar transições eletrônicas d-d e de transferência de carga (TCLM) π(fenolato)→Cu(II), fornecendo informações valiosas sobre a geometria e a influência do pH no complexo de cobre.

II.Estudos da Atividade Catecolase

A atividade catalítica do complexo de cobre(II) foi avaliada através de ensaios cinéticos de oxidação do 3,5-DTBC, investigando a influência do pH e da concentração do substrato. Os resultados mostraram uma dependência significativa do pH, com atividade máxima em uma faixa específica. A análise cinética auxiliou na determinação do pKa cinético, revelando informações sobre a espécie do complexo mais ativa na catálise. A comparação com dados da literatura sobre a atividade de catecolase de complexos de cobre mononucleares e binucleares forneceu insights sobre o mecanismo catalítico. A ausência de detecção do intermediário semiquinona sugere um possível mecanismo de transferência de elétrons simultânea por dois centros de cobre, ou formação de dímeros ou tetrâmeros do complexo.

1. Ensaios Cinéticos de Oxidação do 3 5 DTBC

A atividade de catecolase do complexo de cobre(II) sintetizado foi avaliada através de testes cinéticos de oxidação do 3,5-di-terc-butilcatecol (3,5-DTBC), um substrato modelo. Esses ensaios investigaram a influência do pH e da concentração do substrato na velocidade da reação de oxidação. A metodologia envolveu a monitoração da reação em diferentes condições de pH (4,0 a 10,0) e concentrações de 3,5-DTBC, utilizando cubetas de vidro óptico, tampões (MES e TRIS), metanol saturado com oxigênio e soluções do complexo e do substrato em concentrações específicas. A reação foi monitorada durante 15 minutos. Soluções de referência, sem o complexo, foram utilizadas para corrigir a oxidação espontânea do 3,5-DTBC dependente do pH. Os resultados mostraram uma região de atividade nula em pH ácido, uma região intermediária onde a atividade aumenta com o pH e uma região de atividade praticamente constante em pH mais alto. O ponto em pH 10 foi excluído devido à baixa atividade, possivelmente por precipitação ou formação de hidróxido de metal. A análise da curva de atividade em função do pH permitiu a determinação do pKa cinético da reação, embora frequentemente mascarado pelo pKa do próprio substrato.

2. Mecanismo Catalítico e Comparação com Sistemas Conhecidos

A ausência da observação da banda de absorção do intermediário semiquinona durante os ensaios sugere que a transferência de elétrons na oxidação do 3,5-DTBC pelo complexo de cobre(II) pode ocorrer de maneira simultânea por dois centros de cobre, mesmo sendo o complexo mononuclear. Uma hipótese para explicar esse comportamento é a formação de estruturas dímeras ou tetraméricas do complexo em solução, com possível interação de um átomo de oxigênio do substrato com íons cobre de unidades mononucleares adjacentes. Essa hipótese é discutida em comparação com estudos na literatura sobre complexos mononucleares de cobre que apresentam atividade de catecolase. A literatura sugere que, para complexos mononucleares, a reação com catecol resulta na formação da espécie intermediária semiquinona, porém, neste caso, este intermediário não foi observado. A comparação da atividade catalítica e das propriedades físico-químicas do complexo sintetizado com as da enzima catecol oxidase natural fornece subsídios para avaliar sua eficiência como um modelo funcional para a reação de oxidação de catecóis.

III.Técnicas de Caracterização Utilizadas

Várias técnicas foram empregadas para caracterizar completamente o ligante H1L1 e o complexo de cobre(II). A espectroscopia no infravermelho (IV) forneceu informações sobre as ligações funcionais, como a presença de estiramento C=O e O-H. A ressonância magnética nuclear (RMN) permitiu determinar a estrutura e pureza do ligante. A espectrometria de massas (ESI-MS) confirmou a massa molecular do ligante e do complexo. A espectroscopia eletrônica na região do UV-Vis e reflectância difusa forneceram informações sobre as transições eletrônicas e a geometria do complexo. Estudos eletroquímicos (voltametria cíclica) investigaram o comportamento redox do complexo. A condutivimetria foi utilizada para avaliar o equilíbrio iônico em solução. Finalmente, a titulação espectrofotométrica permitiu determinar o pKa de desprotonação do fenol do ligante.

1. Espectroscopia no Infravermelho IV

A espectroscopia no infravermelho (IV) foi crucial para a caracterização do ligante H1L1 e do complexo de cobre(II) em todas as etapas da síntese. Para o intermediário 2pyprop, a presença da banda característica de amina secundária e a ausência das bandas de estiramento carbonila e amina primária confirmaram sua formação e a redução da imina. No ligante H1L1, a identificação da banda de estiramento axial C=O (1675 cm-1) e da banda de deformação axial O-H do fenol (3423 cm-1) foram fundamentais. Adicionalmente, bandas em 1367 e 1220 cm-1, atribuídas à interação entre a deformação angular de O-H e a deformação axial de C-O, também contribuíram para a caracterização. No complexo de cobre(II), a banda de deformação axial O-H indicou que, na coordenação, o fenol permanece parcialmente protonado. A comparação das bandas de estiramento C=N da piridina no ligante e no complexo permitiu observar o enfraquecimento desta ligação após a coordenação ao metal, evidenciando a formação da ligação simples C-N. A análise das frequências de absorção, dependentes das massas atômicas, constantes de força das ligações e geometrias moleculares, possibilitou o acompanhamento da formação dos compostos ao longo da síntese. A variação nas frequências de vibração após a coordenação ao metal confirmou as mudanças na força das ligações.

2. Ressonância Magnética Nuclear RMN

A ressonância magnética nuclear (RMN) de 1H e 13C foi usada extensivamente na caracterização dos compostos. A RMN de 1H forneceu informações detalhadas, indo além das informações do infravermelho e espectrometria de massas, permitindo a observação dos valores de deslocamento químico (δ em ppm) e o número de átomos de hidrogênio correspondentes. O acoplamento de spin, resultante da interação indireta entre os spins dos hidrogênios através dos elétrons de ligação, foi interpretado para elucidar a estrutura. A intensidade dos sinais era proporcional ao número de hidrogênios. Para o ligante H1L1, a RMN 1H ajudou a caracterizar cada produto em todas as etapas da síntese, com os deslocamentos químicos refletidos nos efeitos de blindagem eletrônica sofrida por cada próton. A identificação de picos específicos, como a metila (2,24 ppm) e o aldeído (10,28 ppm) na última etapa, foi crucial para confirmar a estrutura. A RMN 1H também permitiu observar a mudança de CH para CH2 em 3,89 ppm no 3py-A, confirmando a abertura do anel. Hidrogênios ligados a nitrogênio, oxigênio e enxofre, sujeitos a ligações de hidrogênio e influenciados por fatores como concentração e temperatura, não foram usados como critérios principais de caracterização.

3. Espectrometria de Massas ESI MS

A espectrometria de massas (ESI-MS) foi empregada principalmente para a caracterização do ligante H1L1 e do complexo de cobre(II). Para o ligante, o espectro de massas mostrou um pico de maior intensidade com razão m/z = 496,26, correspondente ao íon molecular protonado [496,26]+, confirmando sua massa molecular. A distribuição isotópica simulada pelo software “Mmass” e comparada ao espectro experimental validou a composição do ligante. No complexo, o pico de maior intensidade foi atribuído ao íon molecular [C30H32CuN5O2]+, indicando a coordenação do ligante ao íon metálico e a desprotonação do fenol durante a análise. A presença dos isótopos de menor abundância nos picos de m/z = 558,19; 559,19; 560,19; e 561,19, também simulados pelo software, reforçou a formação do complexo. Em resumo, a ESI-MS foi fundamental na confirmação da massa molecular e da composição tanto do ligante como do complexo, fornecendo evidências importantes para a caracterização estrutural.

4. Espectroscopia Eletrônica UV Vis e Reflectância Difusa

A espectroscopia eletrônica UV-Vis foi utilizada para investigar as transições eletrônicas no complexo de cobre(II). A análise em solução revelou uma banda com comprimento de onda máximo de 630 nm, correspondente à transição eletrônica interna d-d do Cu2+. O coeficiente de absorção calculado (ε = 101 L mol-1 cm-1) indicou transições permitidas por spin e proibidas por Laporte, sugerindo uma geometria octaédrica, possivelmente com uma molécula de solvente ocupando a sexta posição de coordenação. A espectroscopia de reflectância difusa, realizada no estado sólido, apresentou um comprimento de onda máximo deslocado para 750 nm, indicando um ambiente de coordenação diferente do observado em solução. O alargamento das bandas impossibilitou prever a transferência de carga no estado sólido. Entretanto, a presença de um ombro em menor energia no espectro de reflectância difusa sugere uma geometria piramidal de base quadrada para o complexo no estado sólido. A análise combinada da espectroscopia UV-Vis em solução e reflectância difusa permitiu a proposição de diferentes geometrias do complexo em diferentes estados físicos.

5. Condutivimetria e Titulação Espectrofotométrica

A condutivimetria e a titulação espectrofotométrica forneceram informações complementares sobre o complexo de cobre(II). As medidas de condutividade molar indicaram um equilíbrio entre espécies protonadas e desprotonadas do fenol em solução, dependendo do solvente (CH3CN e MeOH). A titulação espectrofotométrica, realizada em um espectrofotômetro UV-Vis Varian Cary 50 BIO acoplado a um banho termostatizado a 25°C, investigou esse equilíbrio de espécies em função do pH. O deslocamento do comprimento de onda máximo da transferência de carga ligante-metal (TCLM) com o aumento do pH e a presença de pontos isosbésticos confirmaram a existência de um equilíbrio entre as espécies com fenol protonado e desprotonado (fenolato). A análise da curva sigmoidal de absorbância vs pH permitiu a determinação do pKa de desprotonação do fenol como 5,17, um valor consistente para fenóis coordenados ao íon Cu2+ na posição axial, influenciados pelo efeito Jahn-Teller. Em resumo, ambas as técnicas forneceram informações valiosas sobre a influência do pH na estrutura e no equilíbrio de espécies em solução.

6. Medidas Eletroquímicas Voltametria Cíclica

A voltametria cíclica foi empregada para investigar o comportamento redox do complexo de cobre(II). Os experimentos foram realizados em um potenciostato/galvanostato modelo Epsilon, utilizando uma célula eletrolítica com eletrodo de referência Ag/AgCl (BASi), eletrodo de trabalho de carbono vítreo e eletrodo auxiliar de platina. O complexo foi analisado em solução aquosa (1,0 x 10-3 mol L-1) com NaClO4 (0,2 mol L-1) como eletrólito suporte, sob atmosfera de argônio. Os resultados mostraram um sistema redox irreversível, atribuído à mudança no ambiente de coordenação dos íons Cu(II) e Cu(I) durante o processo redox. O estudo eletroquímico forneceu informações importantes sobre o potencial redox do complexo, que é um parâmetro relevante para entender sua capacidade de transferência de elétrons e sua atuação como um catalisador na reação de oxidação do 3,5-DTBC.