Síntese, caracterização e estudo da influência de heterociclos e da ligação azo nas propriedades de moléculas líquido-cristalinas

Cristais Líquidos: Síntese e Caracterização

Informações do documento

Autor

Paola Zimmermann Crocomo

instructor Prof. Dr. Alexandre Luis Parize
Escola

Universidade Federal de Santa Catarina

Curso Química - Bacharelado
Tipo de documento Relatório de Estágio Supervisionado II
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 1.60 MB

Resumo

I.Síntese e Caracterização de Novos Azo compostos Líquido Cristalinos

Este trabalho apresenta a síntese e caracterização de três novos azo-compostos contendo diferentes heterociclos (1,3,4-tiadiazol, 1,2,4-oxadiazol e 1,3,4-oxadiazol) com o objetivo de investigar a influência do ângulo de curvatura e momento de dipolo na estabilidade térmica e propriedades líquido-cristalinas. As propriedades líquido-cristalinas foram investigadas por microscopia óptica de luz polarizada (MOLP), calorimetria diferencial de varredura (DSC) e difração de raios X (XRD), revelando comportamento polimesomórfico com mesofases nemática (N) e esmética (SmC), e em alguns casos, uma mesofase SmX ainda não completamente elucidada. A foto-isomerização reversível dos azo-compostos em solução foi demonstrada por RMN de 1H. Os compostos apresentaram bons rendimentos de reação (>80%) e boa estabilidade térmica.

1. Objetivo e Metodologia

O estudo teve como objetivo principal aprimorar o conhecimento sobre a influência de diferentes ângulos de curvatura e momentos de dipolo de heterociclos em propriedades térmicas e líquido-cristalinas de azo-compostos. Para tanto, foram sintetizados três novos azo-compostos, cada um contendo um heterociclo diferente: 1,3,4-tiadiazol, 1,2,4-oxadiazol e 1,3,4-oxadiazol. A estabilidade térmica dos compostos foi avaliada por análise termogravimétrica. Já as propriedades líquido-cristalinas foram investigadas empregando-se técnicas complementares: microscopia óptica de luz polarizada (MOLP), calorimetria diferencial de varredura (DSC) e difratometria de raio X (XRD). A foto-isomerização reversível foi confirmada através de RMN de 1H. O estudo enfatizou a busca por relações entre a modificação estrutural molecular e as propriedades líquido-cristalinas, visando obter moléculas com propriedades desejadas. Todos os compostos apresentaram bons rendimentos de reação, boa estabilidade térmica e comportamento líquido-cristalino polimesomórfico, incluindo mesofases N e SmC, e em alguns casos, uma mesofase SmX não totalmente elucidada.

2. Caracterização das Mesofases

A caracterização das mesofases foi realizada por meio de microscopia óptica de luz polarizada (MOLP), calorimetria diferencial de varredura (DSC) e difratometria de raios X (XRD). A MOLP permitiu a observação das texturas e a determinação das temperaturas de transição de fase. O DSC forneceu informações adicionais sobre as energias envolvidas em cada transição. Já o XRD contribuiu para a elucidação dos tipos de mesofases observadas, complementando os dados da MOLP. Resultados intrigantes obtidos por MOLP, como a formação de domínios claros/escuros que se alternam com a disposição dos polarizadores no composto CL-134O, sugerem a formação de estruturas helicoidais com quiralidades opostas, comportamento não esperado e que requer mais investigação. As mesofases identificadas foram nemática (N) e esmética (SmC), com a presença de uma mesofase SmX, ainda não completamente compreendida, em alguns compostos. Difratogramas de raio X revelaram a aleatoriedade molecular no estado líquido isotrópico e a formação de camadas nas mesofases esméticas, indicando uma inclinação das moléculas em relação ao plano das camadas. Análises posteriores, incluindo estudos da mesofase SmX e comparações com moléculas contendo ligação tripla C≡C, são necessárias para uma compreensão mais completa.

3. Comparação Azo vs Ligação Tripla C C

Uma comparação entre os azo-compostos sintetizados e moléculas similares com ligação C≡C no lugar da ligação N=N foi realizada. Embora as diferenças no tamanho e forma molecular sejam mínimas, observou-se que o grupo conector azo promove um aumento significativo nas temperaturas de transição e na estabilidade das mesofases, expandindo a faixa de temperatura em que o comportamento líquido-cristalino é observado. O grupo azo também favoreceu o aparecimento da mesofase SmX, não observada nos compostos com ligação C≡C. Esse resultado sugere que o efeito retirador de elétrons do grupo azo promove um empacotamento lateral mais eficiente dos mesógenos. Cálculos teóricos estão previstos para confirmar a hipótese de que a maior densidade eletrônica da ligação tripla dificulta o empacotamento das moléculas, contrastando com a eficiência do grupo azo em promover a organização líquido-cristalina. A presença do grupo azo como conector resultou em uma maior estabilidade e em uma faixa de temperatura mais ampla para o comportamento líquido-cristalino, além de favorecer o aparecimento da mesofase SmX.

II.Influência dos Heterociclos nas Propriedades Líquido Cristalinas

Um estudo comparativo da influência de cada heterociclo (variando o ângulo de curvatura e momento de dipolo) sobre as propriedades mesomórficas e ópticas foi realizado. Resultados preliminares sugerem que heterociclos com maior ângulo de curvatura, como o 1,3,4-tiadiazol, são mais propensos a exibir propriedades líquido-cristalinas. A comparação com moléculas similares contendo ligação tripla C≡C em vez da ligação azo mostrou que o grupo azo promove aumento nas temperaturas de transição e na estabilidade das mesofases, favorecendo também o aparecimento da mesofase SmX. Estudos teóricos estão planejados para investigar as diferenças nas densidades eletrônicas.

1. Influência do Ângulo de Curvatura e Momento de Dipolo

O estudo focou na influência do ângulo de curvatura e momento de dipolo dos heterociclos nas propriedades líquido-cristalinas dos azo-compostos. A hipótese central era que um maior ângulo de curvatura resultaria em melhor empacotamento molecular, favorecendo as propriedades líquido-cristalinas. Estudos prévios com moléculas similares, variando apenas o heterociclo (de 1,3,4-oxadiazol para 1,3,4-tiadiazol), já haviam demonstrado que compostos derivados do 1,3,4-tiadiazol (com maior ângulo de curvatura) eram mais suscetíveis a apresentar propriedades líquido-cristalinas. Este trabalho buscou aprofundar essa investigação, analisando os efeitos combinados do ângulo de curvatura e do momento de dipolo na formação e estabilidade das mesofases. A escolha de diferentes heterociclos permitiu uma análise comparativa da influência dessas propriedades moleculares no comportamento líquido-cristalino, incluindo as propriedades mesomórficas e ópticas das moléculas-alvo. A expectativa era que essa variação permitisse correlacionar as características estruturais dos heterociclos com as propriedades macroscópicas observadas nos materiais.

2. Comparação com Moléculas Contendo Ligação Tripla C C

Para uma análise mais completa da influência do grupo conector na estrutura dos azo-compostos, uma comparação foi realizada com moléculas similares previamente sintetizadas, onde a ligação azo (N=N) foi substituída por uma ligação tripla carbono-carbono (C≡C). Essa comparação permitiu avaliar as vantagens e desvantagens de cada grupo conector (azo e C≡C) em relação às propriedades térmicas, líquido-cristalinas e fotofísicas. O objetivo era determinar qual grupo conector promove melhores propriedades, considerando a estabilidade das mesofases, as temperaturas de transição e o comportamento fotofísico. Observou-se que, mesmo com tamanhos e formas moleculares similares, o grupo conector azo apresentou resultados distintos, aumentando as temperaturas de transição e a estabilidade das mesofases. O grupo azo também favoreceu o aparecimento da mesofase SmX, não observada nos compostos com ligação C≡C. Essa diferença foi atribuída a um empacotamento lateral mais eficaz proporcionado pelo grupo azo, possivelmente devido à sua menor densidade eletrônica comparada à ligação tripla. Estudos teóricos são propostos para corroborar essa análise.

III.Metodologia Sintética e Caracterização Estrutural

As rotas sintéticas para os heterociclos 1,2,4-oxadiazol e 1,3,4-oxadiazol mostraram-se eficientes na síntese de azo-compostos assimétricos em forma de bastão de hóquei. A síntese do derivado do 1,3,4-tiadiazol (CL-134S) apresentou maiores dificuldades, com a formação de subprodutos 1,3,4-oxadiazol em algumas etapas devido a problemas de solubilidade do intermediário dihidrazida (13). A caracterização estrutural dos compostos foi realizada utilizando técnicas espectroscópicas (infravermelho e UV-Vis), além de MOLP, DSC e XRD para caracterizar as mesofases. Os compostos finais CL-124O, CL-134O e CL-134S foram sintetizados e suas propriedades investigadas.

1. Síntese dos Heterociclos 1 2 4 oxadiazol e 1 3 4 oxadiazol

As rotas sintéticas para a obtenção dos heterociclos 1,2,4-oxadiazol e 1,3,4-oxadiazol se mostraram eficazes na síntese de azo-compostos assimétricos com formato de 'bastão de hóquei'. Os rendimentos das reações foram superiores a 80%, indicando uma boa eficiência do processo sintético. O texto descreve etapas de reação, incluindo reações de refluxo e utilização de solventes como butanona, éter etílico, e metanol, além de reagentes como hidrazina, carbonato de potássio, e cloridrato de hidroxilamina. As etapas envolvem processos como filtração, lavagem com solventes, e recristalização para purificação dos produtos intermediários e finais. A descrição inclui quantidades de reagentes e solventes utilizados, bem como tempos de reação e temperaturas, fornecendo informações detalhadas sobre a metodologia experimental empregada na síntese desses heterociclos.

2. Síntese do Derivado do Heterociclo Tiadiazol CL 134S

A síntese do derivado do heterociclo 1,3,4-tiadiazol (CL-134S) apresentou maior complexidade em relação aos oxadiazóis. A rota sintética iniciou-se com a alquilação do 4-hidroxibenzoato de metila com 1-bromodecano e carbonato de potássio em butanona. Seguiu-se a reação com hidrazina em etanol para formar a hidrazida, que reagiu com o intermediário cloreto de ácido 5 em diclorometano, formando o intermediário dihidrazida 13. A ciclização de 13 com o reagente de Lawesson forneceu o composto alvo CL-134S. Entretanto, as primeiras tentativas de ciclização, utilizando um frasco de reagente de Lawesson previamente usado, resultaram na formação exclusiva do subproduto 1,3,4-oxadiazol, em duas tentativas consecutivas. Mudanças na metodologia, incluindo a abertura de um novo frasco do reagente e a variação do solvente (de tolueno para THF), foram testadas, porém, com resultados pouco satisfatórios, com baixa formação do produto desejado e predominância do subproduto oxadiazol, indicando que a solubilidade do intermediário dihidrazida (13) no solvente e a temperatura são fatores determinantes para a formação do heterociclo 1,3,4-tiadiazol.

3. Caracterização Estrutural e Técnicas Analíticas

A caracterização estrutural dos compostos foi realizada utilizando diversas técnicas. Além das análises espectroscópicas (infravermelho e UV-Vis), a microscopia óptica de luz polarizada (MOLP), calorimetria diferencial de varredura (DSC) e difratometria de raios X (XRD) foram empregadas para investigar as propriedades e organização molecular. A MOLP, DSC e XRD permitiram a caracterização completa das mesofases, determinando os tipos de mesofases (nemática e esmética) presentes em cada composto. A RMN de 1H e 13C forneceram informações detalhadas sobre a estrutura molecular. A purificação dos compostos sintéticos envolveu cromatografia em coluna de sílica com diclorometano como eluente e recristalizações, para assegurar a pureza dos produtos antes das análises estruturais. As informações obtidas por estas técnicas foram complementares e essenciais para a caracterização completa dos compostos e elucidação de suas propriedades líquido-cristalinas. O software ChemBio3D Ultra foi utilizado para estimar o comprimento molecular, permitindo comparações com dados de difração de raios X.

IV.Resultados e Discussão Análise das Mesofases

As análises de MOLP, DSC e XRD confirmaram a presença de mesofases nemática e esmética (SmC) para os três compostos. A observação de domínios claros/escuros alternantes em MOLP para o composto CL-134O sugere a formação de estruturas helicoidais com quiralidades opostas, um comportamento inesperado que requer investigações adicionais. A mesofase SmX, observada em alguns compostos, apresenta uma organização molecular ainda não totalmente elucidada e necessita de estudos mais aprofundados. A ausência de picos definidos no estado líquido isotrópico em XRD confirma a aleatoriedade molecular, enquanto a formação de picos em baixo ângulo nas mesofases esméticas indica a formação de camadas, sugerindo que as moléculas não estão orientadas perpendicularmente ao plano das camadas.

1. Técnicas de Caracterização

A caracterização das mesofases e propriedades dos compostos sintetizados foi realizada utilizando uma combinação de técnicas analíticas. Microscopia Óptica de Luz Polarizada (MOLP) foi empregada para observar as texturas características das mesofases e determinar as temperaturas de transição. Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC) forneceu dados termodinâmicos das transições de fase, como as energias envolvidas. Difratometria de Raios X (XRD) permitiu investigar a organização molecular nas diferentes mesofases, fornecendo informações sobre o arranjo espacial das moléculas, como a formação de camadas nas fases esméticas. A ausência de picos no estado líquido isotrópico, confirmada pelo XRD, indica a aleatoriedade completa das moléculas nesse estado. Em contraste, a presença de picos em baixo ângulo nas mesofases esméticas indica a formação de camadas, sugerindo uma organização estrutural mais ordenada. O comprimento das moléculas, estimado pelo software ChemBio3D Ultra em aproximadamente 45 Å, foi comparado com os dados de XRD para inferir sobre a orientação das moléculas em relação ao plano das camadas, indicando uma orientação inclinada.

2. Análise das Mesofases Nemática SmC e SmX

As análises revelaram a presença das mesofases nemática (N) e esmética C (SmC) em todos os compostos. Observações por MOLP indicaram texturas Schlieren e mármore. O composto CL-124O apresentou uma faixa de temperatura mais ampla para as mesofases em comparação ao CL-134O. Um comportamento intrigante foi observado na fase SmC do composto CL-134O através de MOLP: a formação de domínios claros/escuros alternantes com o leve descruzamento dos polarizadores, sugerindo estruturas helicoidais com quiralidades opostas. Este comportamento, usualmente observado em cristais líquidos tipo banana com grupos ésteres, é inesperado nesse sistema e requer investigações adicionais. Além disso, foi observada uma mesofase não completamente elucidada, designada como SmX, em alguns compostos. A ausência de picos em uma região específica de 2θ nos difratogramas de XRD para a mesofase SmX nos compostos oxadiazóis sugere que esta não se trata de uma mesofase hexática (SmB, SmI, SmF). Investigações futuras se fazem necessárias para uma completa elucidação da organização molecular nesta fase SmX.