
Persistência: Vida em Silêncio
Informações do documento
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 1.31 MB |
Resumo
I.Aspectos Concorrenciais das Participações Societárias Minoritárias na União Europeia
Este documento analisa os desafios concorrenciais decorrentes da aquisição de participações sociais minoritárias na União Europeia, focando-se em situações que, apesar de não conferirem controlo direto, podem impactar negativamente a concorrência no mercado interno. A principal questão é a existência de uma lacuna regulatória no Direito da Concorrência Europeu em relação a essas aquisições, e como o Regulamento de Concentrações (139/2004) e os artigos 101 e 102 do TFUE se aplicam a esses casos. O estudo aborda diferentes tipos de participações minoritárias (ativas, passivas, com ou sem influência na política comercial da empresa-alvo), examinando os riscos de redução de incentivos à competição, colusão tácita, e criação de barreiras à entrada no mercado. Casos como Ryanair/Aer Lingus, Tetra Laval/Sidel, e Siemens/VA Tech são analisados como exemplos práticos.
1. Introdução Preocupações com Participações Minoritárias e Concorrência
O documento inicia abordando as preocupações do Direito Europeu em relação às aquisições de participações sociais minoritárias não conferentes de controlo. Estas aquisições, embora legítimas, podem ser nocivas à concorrência no mercado interno. A principal questão levantada é a possível existência de uma lacuna regulatória, justificando uma intervenção para garantir a salutar concorrência. A análise focará a influência dessas participações nas sociedades e como elas podem gerar preocupações concorrenciais a nível europeu, analisando impulsos jurisprudenciais e doutrinais recentes. São mencionados conceitos como Mitgliedschaft (construção germânica) e partecipazione sociale (conceito italiano) como antecedentes históricos da problemática. O documento propõe-se a analisar criticamente as diferentes abordagens e a necessidade de intervenção regulatória face aos desafios colocados pelas partipações minoritárias à concorrência.
2. Participações Sociais Minoritárias Direitos Deveres e Concorrência
Esta seção detalha os direitos e deveres associados às participações sociais minoritárias, destacando a preocupação da Europa com a vulnerabilidade dos sócios minoritários. Menciona os Planos de Ação de 2003 e 2012 (“Modernizar o Direito das Sociedades”), que discutem os direitos destes sócios, incluindo o direito de investigação na vida societária. A análise aprofunda o impacto da dimensão da participação no capital social no poder dos sócios, bem como direitos específicos previstos no Código das Sociedades Comerciais (CSC), como os direitos de requerer a nomeação de um representante da sociedade em processos judiciais (artigo 76º/1 do CSC), propor ações contra gestores (artigo 77º/1 do CSC), e direitos à informação (artigos 289º/3 e 291º/1 do CSC). A atribuição de direitos pode levar a exercícios abusivos, fomentando atuações obstrutivas ou que excedam os direitos conferidos, impactando diretamente a concorrência.
3. Tipos de Participações Minoritárias e seus Efeitos na Concorrência
O documento classifica as participações minoritárias em três grupos: 1) as que conferem controlo (de facto ou de direito); 2) as ativas, não conferentes de controlo, que permitem influenciar a política comercial e aceder a informação relevante; e 3) as passivas, que visam apenas interesses financeiros. O foco principal é nas participações minoritárias ativas não conferentes de controlo, consideradas preocupantes em termos concorrenciais, por não se enquadrarem perfeitamente nos instrumentos regulatórios existentes. A análise destaca os potenciais efeitos negativos na concorrência: redução de incentivos à competição, influência na estratégia comercial, facilitação da colusão tácita, discriminação de concorrentes, e criação de barreiras à entrada no mercado. A intensidade desses efeitos é maior em mercados concentrados e com proximidade entre as partes. Mesmo sem influência decisiva, a influência material é suficiente para gerar problemas de concorrência. Instrumentos quantitativos como o índice Hirschman-Herfindahl (HHI) e o Price Pressure Index (PPI) podem ser usados na avaliação.
4. Efeitos Coordenados e Acordos entre Empresas
Esta seção analisa os efeitos coordenados que podem surgir de participações recíprocas entre empresas concorrentes, especialmente quando há membros comuns nos órgãos executivos. Esses efeitos facilitam acordos expressos ou tácitos prejudiciais à concorrência. São destacados três requisitos cumulativos para o sucesso desses acordos: transparência do mercado, consequências significativas para a quebra do acordo, e impermeabilidade à atuação de consumidores e concorrentes. A partilha de informação confidencial é um fator facilitador. A OCDE alerta que a mera existência de participações minoritárias em empresas concorrentes não é presunção suficiente de acordos prejudiciais. A seção também diferencia acordos entre empresas (contratos, acordos de cavalheiros, etc.) e práticas concertadas, destacando que a troca de informações é um elemento-chave nas práticas restritivas. A possibilidade excepcional de permitir práticas proibidas, mediante os pressupostos do artigo 101.º/3 do TFUE, é mencionada, mostrando a complexidade da matéria e a sua relação com a concorrência.
II.Instrumentos Jurídicos e sua Aplicação às Aquisições de Participações Minoritárias
O documento explora a aplicação do Direito da Concorrência Europeu (Direito da União Europeia) a situações de aquisição de participações sociais minoritárias. Analisa a eficácia dos artigos 101 e 102 do TFUE, bem como o Regulamento 139/2004, na prevenção e sanção de práticas anticompetitivas resultantes dessas aquisições. A análise inclui a discussão sobre o conceito de 'influência material' na política comercial das empresas, e a utilização de instrumentos quantitativos como o índice de Hirschman-Herfindahl (HHI) na avaliação dos efeitos dessas aquisições na concorrência. O papel das Autoridades Nacionais da Concorrência (ANC) é também considerado. A jurisprudência relevante, incluindo os casos Gillette, Philip Morris, e outros, é revisada para ilustrar a complexidade da aplicação da legislação.
1. Artigos 101 e 102 do TFUE e Aquisições de Participações Minoritárias
A análise aprofunda a aplicação dos artigos 101 e 102 do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE) às aquisições de participações sociais minoritárias não conferentes de controlo. O artigo 101º, que aborda práticas restritivas da concorrência, pode ser aplicado se as aquisições resultarem em acordos que afetem a concorrência. No entanto, a sua aplicabilidade tem limites, pois nem sempre existe um acordo formalmente estabelecido. O artigo 102º, que trata do abuso de posição dominante, é discutido no contexto dos casos Gillette e Philip Morris. No caso Gillette, a Comissão considerou que uma participação minoritária passiva, combinada com a dependência financeira de uma concorrente, constituía um abuso de posição dominante. No caso Philip Morris, o Tribunal de Justiça confirmou que a detenção prévia de uma posição dominante e a aquisição de uma participação minoritária que confere influência na política comercial de um concorrente constitui infração ao artigo 102º. O conceito de 'alguma influência' é debatido, com referência à jurisprudência Hoffmann-La Roche.
2. Regulamento 139 2004 Regulamento das Concentrações e Aquisições de Participações Minoritárias
O documento examina o Regulamento 139/2004 (Regulamento das Concentrações) e sua aplicação às aquisições de participações minoritárias. Este regulamento, criado após a abolição das barreiras transfronteiriças, confere à Comissão o poder de intervenção a priori, impedindo concentrações nocivas à concorrência. O princípio do ‘balcão único’ (one-stop merger control) é explicado, mas a competência pode ser partilhada com as Autoridades Nacionais da Concorrência (ANC), dependendo do volume de negócios. O Regulamento também abrange situações de controlo conjunto decorrentes de acordos entre titulares de participações minoritárias, incluindo casos com direitos de veto que impactam a estratégia comercial das empresas. São analisados os casos Siemens/VA Tech, Thyssen/Krupp, e Tetra Laval/Sidel para ilustrar a aplicação do Regulamento a diferentes cenários de aquisições, mostrando como a Comissão pode ordenar a alienação de participações em caso de impacto negativo na concorrência (como no caso Tetra Laval/Sidel). O caso Ryanair/Aer Lingus é analisado em detalhe, confrontando a decisão da Comissão com a do caso Tetra Laval/Sidel e destacando as dificuldades na aplicação do artigo 8º/4 do Regulamento.
3. Sistemas de Controlo em Outros Países e Comparação com o Sistema Europeu
O documento faz uma breve comparação do sistema europeu com o sistema alemão (referência à secção 37 do GWB, que considera a influência decisiva na empresa adquirida) e o sistema norte-americano (Clayton Act e HSR Act). No caso alemão, a avaliação das concentrações centra-se no teste da dominância. Nos EUA, o Clayton Act, modificado pelo HSR Act, obriga à notificação de aquisições, com exceções para participações minoritárias abaixo de certos limites, se o objetivo for apenas investimento. O caso United States v. CommScope, Inc. exemplifica a abordagem norte-americana, onde a empresa foi obrigada a alienar uma participação minoritária devido aos potenciais efeitos negativos na concorrência. Esta comparação serve para contextualizar as lacunas e desafios do sistema europeu no controlo de concentrações relacionadas com aquisições de participações minoritárias.
III.Propostas de Alteração da Regulamentação Europeia
Diante das lacunas identificadas, o documento examina propostas para aprimorar o controlo de concentrações em relação às aquisições de participações minoritárias. As propostas incluem a extensão do escopo do Regulamento das Concentrações, a introdução de um sistema de notificação voluntária, e a clarificação das situações que requerem intervenção da Comissão Europeia. A discussão engloba a necessidade de balancear a proteção da concorrência com a necessidade de evitar encargos excessivos para as empresas. O documento também compara o sistema europeu com abordagens de outras jurisdições, como a Alemanha e os Estados Unidos (Clayton Act, HSR Act), destacando as suas melhores práticas. A ponderação entre intervenção ex-ante e ex-post é crucial na avaliação da eficácia dessas propostas, considerando também a jurisprudência de casos como Ryanair/Aer Lingus e Tetra Laval/Sidel.
1. Necessidade de Adaptação do Regulamento das Concentrações
O documento reconhece a necessidade de adaptar o Regulamento das Concentrações para incluir as aquisições de participações sociais minoritárias não conferentes de controlo, uma questão já levantada pelo Green Paper de 2001. A simples sujeição de todas as aquisições a um controlo a priori é considerada desproporcional, enquanto a definição de situações-tipo é vista como de difícil implementação. O SWD 2013 propõe expandir o escopo do Regulamento, mas exclui casos já excluídos, como empresas comuns que não exercem todas as funções de uma entidade económica autónoma. O documento argumenta que o número reduzido de casos problemáticos não justifica um controlo excessivo, priorizando a identificação de situações que realmente afetam a concorrência.
2. Proposta de Sistema de Notificação Voluntária e Transparência
O SWD 2014 (IA) propõe um sistema de notificação voluntária para as partes envolvidas em aquisições de participações minoritárias, buscando garantir segurança jurídica e evitar investigações desnecessárias pela Comissão Europeia. Este sistema, denominado de “sistema de notificação direcionada”, foca-se em aquisições potencialmente problemáticas, melhorando a transparência. A notificação torna-se obrigatória apenas para aquisições que criem uma “relação significativa do ponto de vista concorrencial”, definida cumulativamente pela aquisição de uma participação minoritária num concorrente ou empresa verticalmente relacionada, com uma participação superior a 20% ou entre 5% e 20% acompanhada de fatores adicionais (como o direito de nomeação de membros para o órgão executivo). O objetivo é evitar um controlo excessivo de aquisições puramente financeiras, focando-se nos casos com potencial impacto na concorrência.
3. Alteração ao Artigo 8º 4 do Regulamento das Concentrações e Outras Propostas
Uma alternativa proposta é a alteração do artigo 8º/4 do Regulamento das Concentrações, expandindo os poderes da Comissão para ordenar a alienação de participações minoritárias não conferentes de controlo, caso seja necessário restaurar a situação anterior à operação. Esta solução, inspirada no caso Ryanair/Aer Lingus, é defendida por Walle de Ghelcke, mas também apresenta falhas, como a exclusão de aquisições que não façam parte de uma oferta pública de aquisição para o controlo da empresa. A proposta de um sistema de notificação voluntária é vista como mais adequada, pois se coaduna com os princípios de proporcionalidade e coordenação entre a Comissão e as ANC. A delimitação das operações sujeitas a notificação visa reduzir encargos para as empresas, embora persista alguma incerteza jurídica. A sugestão de Motta para esclarecer o conceito de “relação significativa” através do critério da quota de mercado é mencionada. A opção pela notificação voluntária é defendida por ser mais abrangente que a alteração do artigo 8º/4, e a sua implementação prevê a manutenção do critério do volume de negócios para a divisão de competências entre a Comissão e as ANC.