
Arte Sacra na Educação Moral
Informações do documento
Autor | Marco António Da Silva Costa |
instructor/editor | Prof. Doutora Maria Isabel Pereira Varanda |
Escola | Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Teologia, Instituto Universitário de Ciências Religiosas |
Curso | Mestrado em Ciências Religiosas, Especialização: Educação Moral e Religiosa Católica |
Tipo de documento | Relatório Final da Prática de Ensino Supervisionada |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 1.27 MB |
Resumo
I.A Arte como Expressão da Imagem de Deus e Domínio Ministerial
Este estudo analisa a teologia da arte cristã, explorando a ideia do ser humano como imagem de Deus (Imago Dei) e seu papel como administrador responsável da criação. A ação humana no mundo é vista não como acessória, mas como parte fundamental da sua realização espiritual. O texto destaca a importância da relação do ser humano consigo mesmo, com os outros, com Deus e com o mundo, enfatizando o seu caráter essencialmente relacional. O domínio ministerial sobre a criação, inspirado em passagens bíblicas como Mateus 24:45, é apresentado como um serviço e não como um poder despótico, justificando o uso dos recursos da criação visível para o desenvolvimento da ciência, tecnologia e arte.
1. O Ser Humano como Imagem de Deus Relação e Responsabilidade
A seção inicia definindo a ação humana no mundo não como um apêndice, mas como o próprio modo de ser, realizar-se e superar-se, tornando-se mais homem. O ser humano, enquanto imagem de Deus (Imago Dei), tem como fim último Deus, mas sua realização se dá através das relações consigo mesmo, com os outros, com Deus e com o mundo. Juan Ruiz de la Pena é citado para reforçar essa ideia, descrevendo o homem como representação do Criador, presidindo e governando a criação, transcendendo a realidade mundana para se aproximar da divina. Essa estrutura serve de fundamento para o exercício da liberdade e responsabilidade. A Constituição Pastoral Gaudium et Spes é invocada, salientando a missão do homem de submeter a terra e governar o mundo com justiça e santidade, orientando tudo para Deus. Este senhorio não é despótico, mas ministerial, um serviço de zelos pela criação, comparável a um servo fiel (Mt 24,45). O ser humano é a única criatura amada por si mesma, expressamente por Deus, ocupando o ápice da criação visível (Gn 1,26; 2,20; Sl 8,6-7; Sb 9,2-3). Deus confia ao homem seus bens (Mt 25) para que os utilize e os faça render com seus talentos através da ciência, tecnologia e arte, aproveitando os recursos da criação visível.
2. O Domínio Ministerial e a Utilização dos Recursos da Criação
O texto aprofunda a noção do domínio ministerial do ser humano sobre a criação, enfatizando que este não se trata de um poder absoluto e despótico, mas sim de um serviço fiel a Deus. A passagem de Mateus 24:45 é usada como referência, comparando o homem a um servo a quem Deus confia o cuidado de sua casa, sua obra criada. Esta responsabilidade implica o uso consciente e responsável dos recursos da criação visível, através do desenvolvimento da ciência, tecnologia e arte. A citação de Gn 1,26; 2,20; Sl 8,6-7; Sb 9,2-3 destaca a posição única do ser humano na criação, sendo a única criatura amada por si mesma, expressamente por Deus. O homem, como administrador dos bens terrenos, deve utilizar os recursos recebidos de Deus (Mt 25) com sabedoria e responsabilidade, para o benefício da humanidade e para a glória de Deus. A ideia central é que a atividade criativa humana, inclusive a artística, é parte integrante deste domínio ministerial, sendo um reflexo da imagem de Deus no homem e da sua capacidade de colaborar com a obra divina.
3. A Arte como Jogo Transformante e a Inquietaçao Existencial
A seção explora a arte como um “jogo” transformante, referenciando Isabel Varanda e sua perspectiva epistemológica e hermenêutica para pensar teologicamente a criação. O foco se desloca para o paralelismo entre arte, jogo e criação, entendendo a arte como uma força dinâmica que, na liberdade individual, nos leva a um dinamismo de transcendência. Essa transcendência nos atravessa, constrói e nos significa uma Alteridade que, paradoxalmente, nos constitui. A inquietação existencial do ser humano, diante do mundo que o desafia, é destacada. Isabel Varanda é novamente citada, afirmando que o homem não se contenta em existir sem questionar a si mesmo, o mundo e o sentido da vida. O início do “jogo” da existência está ligado ao momento em que o ser humano se coloca a primeira questão. Esta perspectiva liga a criatividade artística à busca de significado existencial, transcender a mera animalidade e buscar o inefável, o sublime e o belo como linha orientadora.
II.O Mistério da Encarnação e a Arte Sacra
O texto argumenta que o mistério da Encarnação, central no II Concílio de Niceia (787), fundamenta a arte sacra. A encarnação tornou a transcendência imanente e visível, permitindo a representação artística de Deus e dos santos. Citando o livro de Génesis e o Catecismo da Igreja Católica, o documento afirma que a arte humana reflete a relação com Deus Criador. A arte sacra é descrita como poética, existencial, simbólica e pedagógica-didática, contribuindo para a compreensão do mistério do ser humano. A experiência existencial da arte é universal, presente desde o início da humanidade e produtora de cultura. O texto enfatiza a arte como forma de expressão que abarca toda a unidade do ser humano, investigando a relação com o meio envolvente, o universo e consigo mesmo.
1. O II Concílio de Niceia 787 e a Justificativa da Representação Artística
A seção argumenta que o mistério da Encarnação, conforme estabelecido pelo II Concílio de Niceia em 787, fornece a base teológica para a representação artística. O concílio justifica a representação artística afirmando que a transcendência divina se tornou imanente, visível e contemplável, tanto para crentes quanto para não-crentes. A transcendência de Deus, sua natureza além da compreensão humana, torna-se acessível através da sua encarnação em Jesus Cristo, possibilitando assim a sua representação artística. Esta ideia central conecta o dogma da Encarnação com a legitimidade da arte sacra, rompendo com a anterior proibição de imagens na cultura judaica. A arte sacra passa a ser compreendida como uma forma de expressar a fé e a relação com Deus, tornando o invisível visível.
2. A Arte como Expressão da Relação com Deus Criador
O texto destaca que, criado à imagem de Deus, o ser humano expressa a verdade de sua relação com o Criador através da beleza de suas obras artísticas. Esta afirmação é baseada em citações do livro de Génesis e do Catecismo da Igreja Católica. A capacidade criativa humana, vista como um talento ou semelhança com Deus, permite a prática da sabedoria, elevando os seres humanos a “construtores geniais de beleza”, como os descreveu João Paulo II. Essa capacidade criativa é descrita como uma relação pericorética (intercompenetração) entre conhecimento e habilidade, inspirada na ideia do belo e verdadeiro, que se encontram em Deus. A criação artística é, portanto, vista como um reflexo da semelhança com Deus, uma demonstração da Imago Dei, presente em cada ser humano e expressa através da arte. A beleza das obras artísticas torna-se um testemunho da fé e da relação do homem com o seu Criador.
3. A Arte Sacra Poética Existencial Simbólica e Pedagógica Didática
A arte sacra é caracterizada como simultaneamente poética, existencial e simbólica, refletindo a densidade da presença divina em toda a criação sacra. No entanto, considerando a economia da salvação e o fato de que a Revelação, embora completa, ainda não está plenamente explicitada (como afirma o Catecismo), é acrescentada a dimensão pedagógica-didática à tríplice identidade da arte sacra. A arte sacra se torna, desta forma, um instrumento de catequese, transmitindo conhecimentos religiosos e aproximando os fiéis da fé. O mistério do Verbo encarnado é fundamental para compreender plenamente o mistério do ser humano, e a arte sacra desempenha um papel essencial nessa compreensão. A arte, portanto, não é apenas estética, mas também um caminho de formação espiritual e transmissão da fé, tornando-se um instrumento poderoso para ensinar e educar.
4. A Experiência Existencial da Arte e sua Relação com a Cultura
A arte é apresentada como inerente à existência humana, presente em todos os contextos de vida desde o início da humanidade. Ela é simultaneamente produto e produtora de cultura, com conceitos sendo incorporados pela cultura de cada povo. O conceito de “arte” é visto como um constructo social e também como um “faber humano”, um processo totalizante que envolve todo o ser humano em sua unidade. A arte não se limita à produção externa de objetos, mas abrange a forma como cada indivíduo se relaciona com o meio ambiente, o universo e consigo mesmo. A arte permite dar forma aos sentimentos, pensamentos e emoções, sendo uma forma de expressão que vai além do mero fazer, penetrando no âmago da própria existência de cada ser humano. É simultaneamente construção, desconstrução e invenção, sendo a execução e invenção inseparáveis. A arte é a forma como o homem dá voz às suas crenças, sonhos e medos, corporizando até o desconhecido e o inexplicável. Essa é uma função fundamental da arte presente em todas as culturas.
III.A Arte Cristã ao Longo da História Da Arte Paleocristã ao Barroco
O estudo traça a história da arte cristã, analisando diferentes períodos e estilos. Na arte paleocristã (arte sacra primitiva), as dificuldades de inculturação e a proibição de imagens (Êxodo 20,4) levaram a uma arte predominantemente simbólica nas catacumbas (ex: peixe, vindimas). A paz constantiniana marcou uma mudança na representação de Cristo, sendo apresentado como kurios. A arte românica, com seu auge nos séculos XI e XII, surge como um estilo universal, resultante da convergência de saberes da Antiguidade, Oriente e povos bárbaros. A arte gótica, exemplificada pela Igreja de Saint-Dénis (Abade Suger, século XII), buscava representar a Jerusalém Celeste através da luz. O Renascimento trouxe o antropocentrismo, celebrando a dignidade humana, com inspiração na arte clássica (Platão, Séneca). O Barroco, surgido após a Reforma, representa uma resposta à Contra-Reforma, caracterizado por opulência e teatralidade (theatrum sacrum), visando impactar o povo (ad maiorem Dei gloriam). O Concílio de Trento (século XVI) teve papel crucial na definição da postura da Igreja em relação às imagens, procurando evitar a idolatria.
1. Arte Paleocristã Arte Sacra Primitiva Contexto e Dificuldades
A seção inicia a análise da arte cristã com a arte paleocristã, também conhecida como arte sacra primitiva, que surge como testemunho da fé da Igreja. As principais dificuldades enfrentadas neste período inicial relacionam-se com as grandes dificuldades de inculturação, ou seja, de adaptação da fé cristã ao meio cultural pagão dominante, e com a própria conceptualização artística por parte dos pensadores cristãos. A proibição de imagens, presente no contexto cultural judaico e radicalizada na expressão bíblica do Êxodo (20:4) – “Não farás para ti imagem de escultura...” – representava um grande desafio à representação plástica da fé cristã. A dificuldade de representar plasticamente o mistério da pessoa de Jesus, devido às restrições culturais e religiosas do judaísmo, levou a uma arte predominantemente simbólica. As catacumbas, espaços de culto clandestino, abrigavam representações simbólicas como o peixe, as vindimas, o pastor e o golfinho, utilizados como códigos de reconhecimento e expressões da fé cristã. O texto menciona ainda a relativa tolerância religiosa em certos períodos, contrastando com perseguições posteriores, e a necessidade de estudos posteriores para melhor compreender a questão da clandestinidade e seus limites na produção artística.
2. Da Paz Constantiniana ao Românico Transformações na Representação Cristã
Após o período de perseguições, a paz constantiniana trouxe mudanças significativas na sensibilidade cristã e na representação de Cristo. A visão de Jesus como Salvador misericordioso, predominante durante a era das perseguições, deu lugar a uma imagem que enfatiza a sua grandeza pessoal, sendo apresentado como kurios. O texto menciona a obra de Daniel Rops, “gesta do sangue”, para descrever o período de perseguições e sofrimento. A evolução da arte cristã é analisada a partir do século X, marcado pelo temor do ano mil e o aumento das peregrinações a Jerusalém, Roma e Santiago de Compostela. Este contexto contribuiu para a ascensão do estilo românico, que se caracteriza como um conglomerado de saberes da Antiguidade pagã (que não eram rejeitados), do Oriente (influência bizantina), e dos povos bárbaros e da Irlanda. A arte românica é descrita por Plazaola como um milagre, fruto de uma convergência de fatores políticos, socioeconômicos e religiosos. A reforma de Cluny impulsionou um extraordinário movimento cultural e artístico, com as grandes peregrinações contribuindo para a disseminação do estilo românico e sua transformação em “arte universal”, servindo a majestade do poder temporal e religioso.
3. Gótico e Renascimento Escatologia Antropocentrismo e Humanismo
A arte gótica é apresentada como exemplo da função escatológica da arte, buscando representar a Jerusalém Celeste na terra. A Igreja de Saint-Denis, construída no século XII pelo abade Suger, serve de ilustração, com o uso da luz como símbolo da presença divina e da esperança na vida futura. A igreja de pedra se torna uma metáfora da Igreja celeste, criando uma pedagogia mistagógica que conduz o fiel de uma escuridão inicial (ausência de luz) à luminosidade do altar. O texto transita então para o Renascimento, destacando a mudança do pensamento teocêntrico para um antropocentrismo, colocando o homem no centro dos interesses e motivações. Esta nova concepção do homem, em sua grandeza e dignidade, segundo Plazaola, é fundamental para a compreensão da arte renascentista. O humanismo renascentista, com sua veneração pela antiguidade clássica, substitui a autoridade dos Padres da Igreja pela dos sábios antigos (Platão e Séneca em lugar de Agostinho e Tomás de Aquino). O texto destaca a busca da verosimilhança e o realce da beleza das formas corporais, inclusive o nu, e a natureza como pano de fundo. A arte renascentista é caracterizada por racionalidade, simplicidade e humanismo, mostrando uma concepção mais pragmática, influenciada por profundas mudanças socioeconômicas.
4. O Barroco Resposta à Reforma e a Contra Reforma
O período do Barroco surge no final do Renascimento como resposta à Reforma e à Contra-Reforma. A crise religiosa do século XVI e o surgimento de novas ideologias levaram a um “regresso às fontes do cristianismo” e a uma busca pela “pureza absoluta dos ideais evangélicos”. Os líderes da Reforma Protestante (Lutero, Melanchton, Zwinglio e Calvino) se mostraram iconoclastas, rejeitando o uso de imagens na adoração religiosa, visto como idolatria. Este novo surto de iconoclastia contrasta com a postura da Igreja Católica, que, através do Concílio de Trento, reafirmou a importância das imagens na adoração, embora alertando contra o excesso de ornamentação e beleza irreverente. O Concílio de Trento buscava conciliar a tradição da utilização de imagens com a necessidade de evitar a idolatria. O Barroco, em sua exuberância, é analisado em sua dupla função: didática e simbólica. O “theatrum sacrum” é destacado como característica principal, transformando os templos em espaços teatrais para transmitir a mensagem religiosa e envolver os fiéis na experiência sagrada. A Igreja da Contra-Reforma moldou a arte a sua imagem, buscando a glória de Deus através da opulência e do colossal (ad maiorem Dei gloriam).
IV.A Arte na Modernidade o Diálogo Inter religioso e o Desafio Ecumênico
A modernidade trouxe novos desafios à arte religiosa. O Iluminismo e o subsequente Naturalismo, enfatizando a observação minuciosa da realidade material e abandonando a inspiração literária, representaram uma ruptura. O texto aborda o diálogo inter-religioso e o ecumenismo, reconhecendo as dificuldades históricas, especialmente a querela iconoclasta (imperador Leão III) e o papel de João Damasceno na sua defesa. A encarnação é apresentada como elemento central na justificação da arte cristã figurativa, contrastando com o aniconismo de outras religiões (judaísmo, islamismo). O ecumenismo é proposto como um caminho para a unidade através da arte, enfatizando a importância do diálogo, da solicitude e da conversão do coração, conforme o II Concílio Vaticano. O texto conclui com a necessidade de uma arte cristã contemporânea que seja aberta à inovação e à expressão profunda da fé, considerando os desafios da secularização e da subjetividade.
1. O Diálogo Inter religioso e a Querela Iconoclasta
A seção inicia abordando a complexa relação entre arte religiosa e cultura no diálogo inter-religioso, destacando as dificuldades e conflitos históricos, inclusive dentro do próprio cristianismo. A querela iconoclasta, ocorrida no Império Bizantino, é apresentada como um exemplo marcante desse conflito, com o Imperador Leão III promulgando um édito que proibia o culto às imagens. Teófanes é citado como testemunha dos discursos do Imperador a favor da destruição das imagens. Apesar de diferentes motivações (políticas, econômicas, religiosas), o texto afirma que as razões puramente religiosas não foram as únicas a pesar nessa decisão. A contraposição a essa proibição é exemplificada pela defesa de João Damasceno, que considerava toda imagem como um símbolo e manifestação visível do invisível, atribuindo transcendência à imagem sagrada. Damasceno, citando São Basílio, destaca a função das imagens como substituto dos livros para os analfabetos, ensinando a glória dos santos através de uma palavra tácita. Altaner e Stuiber corroboram essa visão, ressaltando o valor pedagógico das imagens para os que não sabem ler.
2. O Desafio da Encarnação e a Arte Representativa Ocidental
O texto discute os desafios apresentados ao Cristianismo pela proximidade da Encarnação. O Cristianismo, originado no judaísmo, herdou inicialmente uma sensibilidade refratária às imagens, devido ao sentido transcendente da religião judaica e a proibição de imagens de Deus (Êxodo 20:4). No entanto, a Encarnação de Jesus, Deus feito homem, trouxe um novo desafio: tornar visível o invisível. A proximidade da Encarnação permite a demonstração da visibilidade de Deus através de Jesus (Jo 14,8-10). Este paradoxo é central: como representar artisticamente o impronunciável e o inominável que se tornou carne? O “carácter visual da palavra” é central, a ordem visual sendo correlata à inteligível, a imagem sendo correlata à Palavra. Plazaola é citado enfatizando que através do visível, o invisível vem a nós e nos acolhe em sua presença. A Encarnação justifica a arte cristã e seus esplendores. O texto conclui que sem o desafio da Encarnação, a arte representativa ocidental seria provavelmente apenas geométrica, contrastando com o aniconismo de outras religiões como a muçulmana e a judaica, que valorizam a arquitetura e rejeitam a representação figurativa para evitar a idolatria.
3. O Desafio Ecumênico e a Arte Cristã do Século XXI
A seção trata do diálogo ecumênico e o papel da arte nesse processo. Rubio e Plazaola são citados, argumentando que a arte cristã do século XXI será ecumênica ou não será nada. O foco deve estar naquilo que une as diferentes confissões cristãs, em busca de unidade através da arte. Embora existam críticas (mesmo que consideradas ridículas) sobre a crescente influência protestante nas Igrejas cristãs, o II Concílio Vaticano é citado para destacar que a graça do Espírito Santo nos irmãos separados pode contribuir para a edificação de todos. A Igreja propõe a solicitude para a restauração da unidade como ponto de partida para o ecumenismo, consistindo em abrir portas e criar espaços de diálogo. O II Concílio Vaticano enfatiza que o ecumenismo é um trabalho de toda a Igreja, demandando uma renovação da Igreja e a conversão do coração, unida à oração pela unidade. O conhecimento dos irmãos separados é considerado essencial, requerendo estudo e abertura para a visão do “outro lado”. A abertura da Igreja aos artistas e às suas obras é crucial para que uma arte cristã autêntica seja possível na era da secularização, valorizando a beleza como um elemento que desperta o coração humano e promove a experiência espiritual.
V.Arte e Educação Moral e Religiosa Católica
A última seção explora a importância da arte na educação moral e religiosa católica. O texto defende o uso da arte como ferramenta pedagógica, utilizando uma hermenêutica para a interpretação de obras, enfatizando o seu caráter simbólico e a sua capacidade de comunicar realidades transcendentes. A arte é vista como mediação da relação religiosa com Deus, similar à mediação textual. O papel do educador é crucial para auxiliar os alunos na compreensão da arte e da sua ligação com a fé, promovendo um processo de inovação de sentido. A liberdade de ensino, dentro de uma postura aconfessional, é defendida, reconhecendo o direito dos pais na escolha da educação religiosa dos seus filhos. O documento destaca que a arte pode contribuir para a construção de uma identidade cristã e auxiliar na formação de valores, como a verdade e a beleza, num contexto de modernidade marcado por relativismo e vazio.
1. A Importância da Arte na Educação Moral e Religiosa Católica
A seção final defende a integração da arte e da arte religiosa na Educação Moral e Religiosa Católica (EMRC), reconhecendo a estreita relação entre arte e religião. João Duque e Rubio são citados, o primeiro afirmando que existe uma estreita relação entre religião e arte, e o segundo, que a arte é a fonte mais antiga do facto religioso. A sala de aula de EMRC é, portanto, o espaço ideal para o debate do facto religioso e a aproximação ao fenómeno artístico e religioso. A arte, como articulação da memória, é apresentada como uma alternativa ao empacotamento de dados e à máquina do esquecimento proporcionados pela tecnologia, mantendo o património cultural. Rubio é citado novamente, afirmando que a arte é um grande arquivo religioso da humanidade, registrando o progresso e a maturação das crenças. A arte, através da sua dimensão simbólica, permite uma aproximação ao divino, transportando o homem para um mundo de fantasia, sonho e ideal, transcendendo o peso do real e a materialidade das coisas, segundo Geraldo Dias.
2. A Hermenêutica da Arte e sua Aplicação na EMRC
O texto propõe um processo hermenêutico para a compreensão da obra de arte na sala de aula, comparando-a a uma mediação privilegiada, como a mediação textual, na construção de uma identidade, neste caso, cristã. A importância do fundo simbólico é enfatizada, pois a simbólica é a linguagem mais eloquente da religião (Geraldo Dias), permitindo falar das realidades místicas e transcendentes. A obra de arte, tal como um texto, lança um apelo e referencia um mundo que não está presente entre os interlocutores (Paul Ricoeur). João Duque é citado novamente, referindo o apelo da obra de arte e a sua capacidade de transcender o seu próprio limite, apontando para o infinito do “outro”. Isabel Varanda e sua “hermenêutica do estranho” também são mencionadas. A arte, enquanto interpretação trinitária do real, é vista como um puro dom recebido e acolhido, que oferece um sentido para além de si mesma. A tarefa do docente de EMRC é educar para ver além do que se vê, fomentando o acolhimento da alteridade e a compreensão da identidade cristã.
3. A Arte na Modernidade e a Construção de Valores na EMRC
O texto aborda os desafios da modernidade e sua influência na arte e na educação. A modernidade é caracterizada como a época do “vale tudo”, com a possibilidade de tudo ser substituído pelo nada. Lipovetsky (“era do vazio”) e Rojas (“Homem light”) são mencionados, ilustrando a crise de valores da época contemporânea. A arte, nesse contexto, torna-se uma ferramenta importante na construção de valores, com a verdade e a beleza como valores prioritários (“a Beleza salvará o mundo”, Dostoievski). Otero é citado, alertando para a perda de valores transcendentes na modernidade e a emergência de alternativas que absorvem parte da religiosidade. A arte é vista como mediação textual (em analogia aos textos religiosos para Ricoeur e Otero) na relação religiosa com Deus, ligada à dinâmica da história humana. A arte se insere num jogo complexo de realidades e acontecimentos que constroem a identidade humana, num emaranhado de tradições. A arte, portanto, é uma ferramenta fundamental na construção da identidade religiosa e na formação de valores no contexto da EMRC.
4. Metas Curriculares Aconfessionalidade e a Liberdade de Ensino
A seção final aborda a questão das Metas Curriculares para a disciplina de EMRC, considerando o Despacho 5306/2012 de 18 de Abril do Ministério da Educação e Ciência. O Secretariado Nacional de Educação Cristã é mencionado como o responsável por definir as metas curriculares, buscando padrões de rigor e coerência no ensino, assegurando que todos os alunos tenham oportunidade de adquirir conhecimentos e desenvolver capacidades fundamentais. O texto ressalta a necessidade de uma postura aconfessional por parte do Estado na educação, enfatizando que este não pode programar a educação segundo quaisquer diretrizes religiosas, filosóficas ou ideológicas. No entanto, reconhece que toda educação tem uma antropologia subjacente, um ideal de ser humano, fundamental para orientar a educação. O II Concílio Vaticano é citado para enfatizar a importância da liberdade de ensino e da família na educação religiosa dos filhos, alertando contra violações dessa liberdade.
Referência do documento
- Carta Encíclica Pacem in terris (João XXIII)