A artropodofauna associada ao olival no âmbito da protecção da cultura contra pragas

Artropodos em Olivais: Bioindicadores

Informações do documento

Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 3.49 MB
Curso Entomologia/Agronomia/Proteção de Culturas
Tipo de documento Tese/Dissertação

Resumo

I.Objetivos e Metodologia do Estudo sobre a Artropodofauna de Olivais

Este estudo, realizado em Ervedal (concelho de Avis, Portugal), investigou o impacto da aplicação de inseticidas em olivais convencionais na composição da entomocenose e a possibilidade de identificar bioindicadores de produção biológica. Foram selecionados dois pares de olivais (um biológico e um convencional em cada par), em locais distintos. A artropodofauna foi amostrada na copa das árvores (técnica das pancadas) e no solo (armadilhas de queda), com amostragens quinzenais entre Março/Abril e Novembro (copa) e Junho/Julho e Novembro (solo) em 1999 e 2000. Um total de 175.350 artrópodes foram identificados, com foco em potenciais predadores de pragas como Bactrocera oleae, Prays oleae, Saissetia oleae, e Euphyllura olivina. ELISA foi utilizado para identificar predadores de pragas chave. A análise estatística utilizou 'Curvas de Resposta Principais' (PRC).

1. Hipótese e Objetivo Principal

O estudo teve como base a hipótese de que a aplicação de inseticidas químicos em olivais convencionais altera a composição da artropodofauna, afetando a entomocenose. O objetivo principal foi identificar potenciais bioindicadores de produção biológica em olivais, onde o uso de inseticidas é proibido. A pesquisa focou-se em analisar se a alteração da artropodofauna presente em olivais convencionais, causada pela aplicação de inseticidas químicos de síntese, permitiria identificar artrópodes que funcionassem como bioindicadores de produção biológica. A escolha da região de Ervedal, no concelho de Avis, permitiu a seleção de dois pares de olivais, um biológico e outro convencional, localizados em diferentes áreas de implantação, facilitando a comparação entre os sistemas de produção. A análise comparativa visou identificar diferenças na composição da artropodofauna, permitindo a identificação de espécies indicadoras do sistema de cultivo biológico.

2. Seleção de Locais e Amostragem

Na região de Ervedal, Avis, foram selecionados dois pares de olivais, cada par composto por um olival biológico e um convencional, situados em locais de implantação diferentes. Em cada olival, três linhas com 20 oliveiras foram amostradas. A artropodofauna da copa foi amostrada usando a técnica das pancadas, batendo-se aleatoriamente dois ramos de cada oliveira, um exposto ao sol e outro à sombra. A amostragem do solo foi realizada com 27 a 28 armadilhas de queda, posicionadas no centro de cada olival, ao redor do tronco e sob a copa de cinco árvores, e nas entrelinhas. As coletas ocorreram quinzenalmente, entre março/abril e novembro na copa, e entre junho/julho e novembro no solo, durante os anos de 1999 e 2000. Os artrópodes coletados foram identificados até o nível de ordem, família e espécie ou morfoespécie, totalizando 175.350 indivíduos. Esta metodologia permitiu uma coleta abrangente, contemplando a diversidade da artropodofauna em diferentes microhabitats e períodos do ano.

3. Identificação de Predadores e Técnica ELISA

Para complementar a análise da composição da artropodofauna, o estudo investigou os potenciais predadores de pragas importantes do olival: Bactrocera oleae (mosca-da-azeitona), Prays oleae (traça-da-oliveira), Saissetia oleae (cochonilha-negra) e Euphyllura olivina (algodão-da-oliveira). Em colaboração com a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), foram produzidos antissoros específicos para cada uma dessas pragas. A técnica ELISA foi empregada para identificar os artrópodes predadores a partir de 328 exemplares coletados nas copas de dois olivais biológicos, utilizando a técnica das pancadas. Este procedimento permitiu avaliar a eficácia dos predadores em controlar essas pragas, fornecendo dados complementares para a compreensão do papel da artropodofauna no equilíbrio ecológico do olival. A utilização da técnica ELISA permitiu uma identificação mais precisa dos predadores, analisando a presença de anticorpos específicos para cada praga nos artrópodes capturados.

4. Análise Estatística

A análise estatística das capturas de artrópodes utilizou principalmente o teste multivariado 'Curvas de Resposta Principais' (PRC – Principal Response Curves). Este método permitiu comparar o número de artrópodes capturados em olivais biológicos (considerados como padrão, com valor zero) com os capturados em olivais convencionais. Para cada variável (ordem, família, espécie ou morfoespécie), foi calculado um 'score', indicando se a sua presença foi maior (score positivo) ou menor (score negativo) em relação ao padrão biológico. O uso do teste PRC possibilitou a identificação de padrões na composição da artropodofauna associados ao sistema de produção, permitindo avaliar se existiam diferenças consistentes e significativas na composição da entomocenose entre olivais biológicos e convencionais, e se estas diferenças permitiam identificar bioindicadores. A escolha desta técnica estatística foi fundamental para analisar a complexa relação entre a presença dos artrópodes e os sistemas de produção estudados.

II.Resultados da Análise da Artropodofauna na Copa dos Olivais

A análise da artropodofauna da copa revelou maior diversidade em olivais com produção biológica, embora a composição fosse semelhante entre os diferentes tipos de olivais. Coleoptera, Araneae e Hemiptera (sub-ordem Sternorrhyncha) foram as ordens mais abundantes na copa. Espécies como Scymnus (Mimopullus) mediterraneus (Coccinellidae) e Crematogaster scutellaris (Formicidae) foram destacadas. No entanto, não foi possível identificar padrões consistentes que permitissem definir bioindicadores de produção biológica, pois as diferenças na composição da entomocenose variaram entre anos, datas, locais e olivais.

1. Composição da Artropodofauna na Copa

No total, 138.858 artrópodes foram identificados na copa das oliveiras durante os dois anos do estudo, pertencentes a 15 ordens. Coleoptera, com cerca de 35% do total de capturas, foi a ordem mais abundante, seguida por Araneae e Hemiptera (subordem Sternorrhyncha). Opiliones, Dermaptera, Dictyoptera, Orthoptera e Plecoptera foram as ordens menos representadas. A composição da artropodofauna na copa apresentou similaridades com estudos em olivais do norte de Portugal e da região de Granada (Espanha), embora com diferenças na proporção de algumas famílias e espécies. Apesar da maior diversidade observada na copa em comparação com o solo, a composição da entomocenose mostrou-se variável entre os anos, datas e locais de amostragem, dificultando a identificação de padrões consistentes que permitissem definir bioindicadores de produção biológica. A abundância de Coleoptera sugere seu importante papel no ecossistema do olival, enquanto a baixa presença de outras ordens pode indicar fatores ambientais ou de manejo da cultura.

2. Análise da Ordem Coleoptera e Familias Representativas

Dentro da ordem Coleoptera, a presença e abundância de diversas famílias foram registradas. A família Coccinellidae apresentou 11 espécies, com Scymnus (Mimopullus) mediterraneus representando 78% dos exemplares. Este dado destaca a importância desta espécie no ecossistema do olival. A família Formicidae, embora também presente na copa, apresentou menor abundância em comparação com o solo. Foram identificadas 11 espécies de Formicidae na copa, com Crematogaster scutellaris como a espécie mais numerosa. A variação na abundância e composição das famílias de Coleoptera, como Coccinellidae e Formicidae, entre os diferentes olivais e anos, evidencia a influência de fatores ambientais e de manejo na estrutura da comunidade de artrópodes. A alta porcentagem de Scymnus (Mimopullus) mediterraneus sugere um possível papel crucial desta espécie na regulação de populações de pragas, a ser investigado em maior detalhe.

3. Resultados para outras ordens e ausência de Bioindicadores na Copa

A análise da artropodofauna da copa incluiu outras ordens além de Coleoptera, como Araneae e Hemiptera (Sternorrhyncha), que se destacaram pela abundância. A ordem Araneae, embora apresentasse grande quantidade de exemplares, não mostrou diferenças consistentes entre olivais biológicos e convencionais em termos de abundância. Resultados similares foram encontrados para outras ordens, sendo que as variações observadas foram inconsistentes ao longo dos anos, locais de estudo e tipos de olivais. A falta de um padrão consistente nas diferenças entre olivais biológicos e convencionais impede a identificação de artrópodes específicos como bioindicadores de produção biológica na copa. A ordem Hymenoptera, apesar de sua importância em estudos anteriores como agentes de controle biológico, apresentou resultados pouco conclusivos neste estudo, possivelmente devido à técnica de amostragem utilizada ou limitações na identificação taxonômica.

III.Resultados da Análise da Artropodofauna no Solo dos Olivais e Predação

No solo, a família Formicidae representou 91% das capturas, com Formica subrufa como espécie dominante. A ordem Araneae também foi observada, embora menos abundante que em estudos anteriores. A pesquisa de predadores de pragas usando ELISA em 328 artrópodes de olivais biológicos indicou que as famílias Linyphiidae e Theridiidae (Araneae) apresentaram maior número de reações positivas para E. olivina. Outras famílias de Araneae (Araneidae e Thomisidae) e S. mediterraneus mostraram atividade predatória sobre outras pragas. Os Formicidae, apesar de serem considerados predadores, apresentaram baixa atividade predatória confirmada pelo ELISA.

1. Dominância de Formicidae no Solo

A análise da artropodofauna do solo revelou uma composição bem diferente da observada na copa. A família Formicidae foi responsável por 91% das capturas, demonstrando sua grande dominância neste ambiente. Foram identificadas 14 espécies de Formicidae no solo, com Formica subrufa como a espécie mais abundante. Esta alta proporção de Formicidae no solo contrasta com a diversidade de ordens encontrada na copa, indicando diferenças significativas nos nichos ecológicos ocupados pelos artrópodes em diferentes partes do olival. A presença significativa de Formicidae pode estar relacionada com fatores como a disponibilidade de recursos alimentares no solo, a estrutura da vegetação e as condições de umidade. A alta abundância de Formica subrufa sugere um papel importante desta espécie no ecossistema do solo do olival, possivelmente em relação à decomposição de matéria orgânica e à interação com outras espécies.

2. Presença de Araneae no Solo e Comparação com Outros Estudos

Apesar da dominância de Formicidae, a ordem Araneae também esteve presente no solo, embora em menor abundância do que em alguns estudos anteriores. Morris (1997) sugere que a baixa abundância de aranhas em alguns olivais pode ser consequência da elevada presença de Formicidae, competindo por recursos e espaço. No entanto, neste estudo, apesar da alta densidade de Formicidae, um número significativo de Araneae foi observado, indicando que outros fatores também influenciam a sua distribuição e abundância no solo. A influência da mobilização do solo e da remoção da vegetação espontânea na estrutura do habitat, tornando-o menos favorável para as aranhas (principalmente as de grande porte que necessitam de teias), é sugerida como uma possível causa para a variabilidade observada. Esta variabilidade destaca a complexidade das interações entre as espécies e os fatores ambientais.

3. Identificação de Predadores por meio da Técnica ELISA

Para identificar potenciais predadores das principais pragas do olival (Bactrocera oleae, Prays oleae, Saissetia oleae e Euphyllura olivina), foi utilizada a técnica ELISA em 328 artrópodes predadores coletados nas copas de olivais biológicos. As famílias Linyphiidae e Theridiidae (Araneae) apresentaram o maior número de reações ELISA positivas, especialmente com o antissoro para Euphyllura olivina. Araneidae e Thomisidae (Araneae) também reagiram positivamente com os antissoros específicos para Prays oleae e Saissetia oleae, respectivamente. O coccinelídeo Scymnus mediterraneus mostrou reações positivas para Prays oleae e Saissetia oleae, enquanto Anthocoridae reagiram positivamente para Euphyllura olivina e Prays oleae. Surpreendentemente, apenas um indivíduo de Crematogaster sordidula (Formicidae) apresentou reação positiva com o antissoro para Bactrocera oleae, apesar da literatura reportar Formicidae como predadores de diversas pragas do olival. Os resultados do ELISA fornecem informações valiosas sobre as interações tróficas no olival e o potencial de controle biológico de pragas por diferentes grupos de artrópodes.

IV.Efeitos dos Pesticidas na Artropodofauna e Considerações Finais

A aplicação de pesticidas em olivais convencionais teve impacto negativo em várias ordens e famílias de artrópodes auxiliares, especialmente Araneae, Hymenoptera e Coleoptera. Resultados indicaram que a produção biológica pode apresentar uma comunidade de artrópodes mais diversa e abundante, mas a identificação de bioindicadores específicos para certificação de produção biológica apresentou-se complexa. O estudo destaca a necessidade de investigações adicionais para compreender a complexidade das interações ecológicas nos olivais e para o desenvolvimento de métodos eficazes de controle biológico de pragas, minimizando o uso de pesticidas e promovendo a sustentabilidade da olivicultura.

1. Impacto dos Pesticidas na Fauna Auxiliar

Vários estudos demonstram o impacto negativo da aplicação de pesticidas na fauna auxiliar de olivais. A utilização de inseticidas, em especial os de amplo espectro, afeta significativamente as populações de predadores e parasitóides, desequilibrando o ecossistema e favorecendo o aumento de pragas. A comparação entre olivais com proteção convencional (uso de pesticidas de síntese) e olivais biológicos (sem aplicação de pesticidas) revela maior abundância de predadores e parasitóides nos sistemas biológicos. Este efeito é observado tanto na artropodofauna da copa quanto do solo, embora estudos com armadilhas cromotrópicas indiquem que alguns auxiliares podem apresentar maior presença em áreas tratadas com certos inseticidas, possivelmente devido a alterações comportamentais que os levam a evitar as superfícies tratadas. A aplicação contínua e inadequada de pesticidas pode levar à eliminação de parasitóides, predadores e presas alternativas, comprometendo o controle natural de pragas. A redução das populações de artrópodes auxiliares pode causar um aumento na intensidade de ataques de pragas, mesmo que a aplicação inicial de pesticidas pareça eficaz em curto prazo.

2. Estratégias para Minimizar os Efeitos dos Pesticidas

Apesar dos efeitos negativos da aplicação de pesticidas, existem estratégias para minimizar seu impacto na fauna auxiliar. A adição de atrativos alimentares (como proteínas hidrolizadas) às caldas de inseticidas aplicadas contra Bactrocera oleae, por exemplo, pode reduzir a quantidade de produto utilizado, deixando áreas da copa sem tratamento direto. A distinção entre tratamentos preventivo-adulticidas e curativo-larvicidas é crucial: enquanto tratamentos larvicidas cobrem toda a copa, os adulticidas, adicionados de atrativos, podem ser aplicados apenas em áreas específicas, reduzindo o impacto na fauna auxiliar. Esta abordagem demonstra a possibilidade de conciliar o controle de pragas com a conservação da biodiversidade, buscando minimizar os efeitos negativos dos pesticidas nos ecossistemas agrícolas. A implementação dessas técnicas, no entanto, requer um conhecimento detalhado da biologia das pragas e dos artrópodes auxiliares, bem como a adaptação das estratégias ao contexto específico de cada olival.

3. Conclusões e Direções Futuras

Este estudo, realizado em Ervedal (Avis) durante 1999 e 2000, não permitiu a identificação conclusiva de artrópodes como bioindicadores de produção biológica, apesar de observar diferenças na composição da artropodofauna entre olivais biológicos e convencionais. A variabilidade observada na composição da entomocenose, relacionada com fatores como ano, data, local e tipo de olival, dificultou a identificação de padrões consistentes. Os resultados demonstram o impacto negativo dos pesticidas na fauna auxiliar, ressaltando a importância da conservação da biodiversidade para o controle natural de pragas. A pesquisa também destaca a necessidade de estudos mais aprofundados sobre a dinâmica da artropodofauna em olivais, visando o desenvolvimento de estratégias de manejo integrado de pragas que priorizem o controle biológico e a sustentabilidade da olivicultura. Investigações futuras devem focar na identificação de bioindicadores mais robustos, considerando a complexidade das interações ecológicas e as características específicas de cada região.