Educação Global: Português

A investigação integra um trabalho de mestrado em Educação Pré-escolar e 1º Ciclo do Ensino Básico, realizado no Instituto Politécnico de Viana do Castelo, na Escola Superior de Educação. O estudo sintetiza a prática de ensino supervisionada e uma investigação realizada no mesmo período. O contexto é marcado pela crescente globalização e a necessidade de educar para o desenvolvimento e a cidadania global, combatendo injustiças sociais, respeitando os direitos humanos e promovendo a solidariedade entre povos. A intenção principal foi operacionalizar a integração da Educação para o Desenvolvimento (ED) com os objetivos de aprendizagem em Língua Portuguesa. O estudo justifica-se pela importância da transversalidade da ED no currículo e na ação didática, visando uma intervenção educativa que integre a ED.

O objetivo geral do estudo foi compreender como operacionalizar a integração de aspetos da Educação para o Desenvolvimento (ED) com os objetivos de aprendizagem da Língua Portuguesa. Para atingir este objetivo geral, foram definidos objetivos específicos: i) Caracterizar o conhecimento de uma turma do 3º ano sobre o subtema Direitos, Deveres e Responsabilidades (DDR) do referencial de ED; ii) Descrever a aprendizagem integrativa dos conteúdos do programa de Português com as temáticas de Justiça Social. A escolha por uma metodologia qualitativa interpretativa justifica-se pela busca de uma compreensão aprofundada da integração curricular. Os instrumentos de recolha de dados foram questionários, gravações em vídeo e documentos produzidos pelos alunos. Os resultados esperados apontam para a possível simultaneidade entre o currículo de Português e o referencial da ED, promovendo a aprendizagem sobre Justiça Social.

A investigação ocorreu numa turma de 26 alunos (10 meninos e 16 meninas) de 5 anos (alguns com 4 anos no início do estudo), numa sala de aula com ambiente multicultural: alunos de nacionalidade chinesa, romena, iraquiana, espanhola e russa. Apesar de falarem a sua língua materna em casa, todos falam perfeitamente espanhol. A participação ativa dos pais é destacada, com presença em reuniões, ajuda em trabalhos de casa e comunicação através de uma plataforma online. Uma criança apresentava paralisia cerebral (neuromuscular), com algumas deficiências motoras, mas sem atrasos cognitivos significativos. Outro aluno apresentava um diagnóstico de atraso global a nível intelectual. A turma demonstrava um bom nível de diálogo, desejo de aprender e capacidade de colaboração. A sala de aula era decorada com trabalhos dos alunos, com temas sazonais e religiosos (Maria e Padre Zegri).

A metodologia de investigação foi qualitativa e interpretativa. A recolha de dados envolveu diferentes instrumentos: questionários para avaliar o conhecimento dos alunos sobre Direitos, Deveres e Responsabilidades (DDR) e Justiça Social; gravações em vídeo das atividades em sala de aula, permitindo a observação das interações e dinâmicas de aprendizagem; análise de documentos produzidos pelos alunos, como desenhos, textos e trabalhos realizados ao longo das atividades. Esta combinação de métodos visa uma compreensão holística da integração da Educação para o Desenvolvimento (ED) no currículo de Português e a sua influência no processo de aprendizagem. O foco no estudo da justiça social e a integração com a língua portuguesa são centrais na análise dos dados recolhidos.

As práticas pedagógicas implementadas na sala de aula priorizaram a diversificação de métodos de ensino, buscando sempre a participação ativa e a aprendizagem individualizada dos alunos. Recursos como a biblioteca viajante e a boneca viajante (Aris) foram utilizados para estimular a leitura e a escrita, permitindo que cada aluno trabalhasse num ritmo próprio, de acordo com suas necessidades. Atividades de relaxamento, com música e técnicas de imaginação guiada, foram incorporadas na rotina diária, visando melhorar a concentração e o bem-estar das crianças. A disciplina positiva foi implementada, com ênfase no diálogo, autoavaliação e na busca de soluções conjuntas para os problemas comportamentais. A utilização de cartazes com as regras da sala permitiu aos alunos uma aprendizagem autônoma das normas de comportamento.

A escola utilizava as novas tecnologias de forma integrada ao processo de ensino-aprendizagem, de acordo com a opinião da psicopedagoga Thalita Tomé. O quadro digital era um recurso recorrente, assim como vídeos educativos, filmes e jogos digitais. Canções e vídeos como "Matt, Dream English Kids" e "El mono sílabo" foram utilizados para o ensino de inglês e fonética, respectivamente, estimulando a aprendizagem lúdica e dinâmica. Outras tecnologias, como CDs de histórias e jogos online ("Jogo do Enforcado"), também eram utilizadas, sempre com o intuito de diversificar os métodos e tornar as aulas mais atrativas. A utilização de flashcards para a aquisição de vocabulário e jogos de memória e outros jogos como Hot/Cold também foram parte da metodologia. O uso da tecnologia foi estratégico, respeitando os limites e individualidades dos alunos, motivando-os e enriquecendo o aprendizado, como defende Thalita Tomé.

O ensino da leitura e escrita seguiu métodos lúdicos e atrativos para os alunos. O livro didático incluía uma pen-drive com um programa que apresentava cada letra com uma história e canção correspondente, disponíveis também em cartazes para a contação de histórias pela professora. Atividades de memória, o jogo do "Enforcado online", preenchimento de sílabas, e formação de palavras com cartões foram utilizadas, considerando as diferentes habilidades de cada aluno. Para os alunos com maiores dificuldades na distinção de letras, a professora resolvia as atividades no quadro em conjunto com a turma, antes do trabalho individual nos cadernos. A individualização do ensino foi garantida, através de atividades de casa como a leitura e desenho sobre o livro da biblioteca viajante.

A análise dos resultados focou-se na evolução da compreensão dos alunos sobre direitos e deveres, no contexto da cidadania. Utilizando questionários, observou-se uma evolução significativa na distinção entre direitos e deveres ao longo do período de intervenção pedagógica. Inicialmente, a maioria dos alunos conseguia dar exemplos de direitos humanos, mas tinha dificuldade em definir o conceito de Direitos Humanos (DH). Muitos confundiam deveres com direitos. A atividade “Microfone Mágico”, que incentivava a reflexão sobre responsabilidades do cidadão, promoveu uma melhor compreensão dos deveres. Após a intervenção, uma melhoria significativa foi observada na capacidade de identificar e diferenciar direitos e deveres, evidenciando o impacto das atividades propostas. A presença de alunos com TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade) influenciou os resultados, mostrando a necessidade de estratégias de ensino adaptadas a diferentes perfis de aprendizagem.

A tarefa "Microfone Mágico" tinha como objetivo refletir sobre as responsabilidades do cidadão. Os alunos, ao debaterem os cartões com diferentes responsabilidades, demonstraram, mesmo que inconscientemente, a compreensão da necessidade de lutar por um mundo mais justo e sustentável. A atividade revelou a percepção da importância do papel individual na diminuição das desigualdades, pobreza e exclusão social, indicando uma conexão com temas transversais da Educação para o Desenvolvimento (ED), como visões de futuro, alternativas e transformação social, a luta contra desigualdades, construção de justiça social e participação. A análise da tarefa indica que os alunos relacionaram as responsabilidades do cidadão com a construção de uma sociedade justa e sustentável, demonstrando um entendimento básico dos deveres e responsabilidades inerentes à cidadania.

A análise comparativa entre as respostas iniciais e finais revela uma melhoria significativa na compreensão dos conceitos de direitos e deveres. As atividades propostas, como o “Abecedário dos Direitos”, o “Parlamento dos Direitos” e a análise da história dos direitos humanos, contribuíram para a aprendizagem de novos conceitos. A tarefa “Arranjar soluções para o combate dos problemas mundiais” também contribuiu, pois os alunos, ao sugerir soluções, inconscientemente identificavam deveres do cidadão. Apesar de persistirem algumas dificuldades, principalmente entre alunos com TDAH e aqueles que recebiam apoio escolar, a evolução geral demonstra o sucesso da intervenção pedagógica na promoção da aprendizagem sobre direitos humanos e responsabilidades cívicas. A melhoria na capacidade de enumerar exemplos de direitos e deveres e de distinguir entre os dois conceitos é evidente.

A pesquisa analisou a integração da Educação para o Desenvolvimento (ED) com o currículo de Língua Portuguesa, buscando verificar se as atividades desenvolvidas estavam alinhadas com os objetivos específicos das metas curriculares. A análise focou-se nos quatro domínios do currículo: Oralidade, Leitura e Escrita, Educação Literária e Gramática. Verificou-se que as tarefas propostas, como “Decifrar problemas existentes no mundo”, “Jornalistas por um dia”, “Abecedário dos Direitos”, “Arranjar soluções para o combate dos problemas mundiais”, e “Parlamento dos Direitos”, trabalhavam simultaneamente os objetivos da ED e os domínios da língua portuguesa. No domínio da compreensão oral, as atividades promoveram a aquisição de vocabulário e a expressão de sentimentos e opiniões. A análise das tarefas demonstra que houve um trabalho integrado, alinhando as metas da Educação para o Desenvolvimento com as habilidades linguísticas esperadas no currículo de português.

A análise demonstra como as atividades desenvolveram a oralidade e a escrita dos alunos, integrando os objetivos da Educação para o Desenvolvimento (ED). Na oralidade, as tarefas como "Jornalistas por um dia" e "Parlamento dos Direitos" exigiram dos alunos a produção de discursos com diferentes finalidades e o respeito às regras de interação discursiva. A tarefa "Microfone Mágico" promoveu a expressão de opiniões sobre a responsabilidade do cidadão. Na escrita, a atividade "A História dos Direitos Humanos" exigiu que os alunos resumissem um vídeo, trabalhando a síntese de informações. A atividade final, um vídeo para outras escolas, trabalhou a escrita colaborativa de um texto narrativo. Em todas as atividades, a observação mostrou que, inicialmente, os alunos tinham um papel mais passivo, tornando-se mais ativos à medida que o tema era explorado, demonstrando o sucesso da abordagem pedagógica em integrar a ED com a produção textual.

A pesquisa destaca o papel do professor como um elemento chave na integração da Educação para o Desenvolvimento (ED) com o currículo de Português. Nas diferentes tarefas, o professor atuou em diferentes papéis: questionador, informativo, estimulador, incentivando a participação ativa dos alunos. Em tarefas com temas mais desconhecidos para os alunos, o papel do professor foi inicialmente mais expositivo, tornando-se questionador numa fase posterior. Atividades como o “Abecedário dos Direitos” evidenciaram o papel estimulador do professor, incentivando a pesquisa e o diálogo entre os alunos. A análise do papel do professor nas atividades demonstra a importância de sua capacidade em promover a transversalidade entre áreas curriculares e em adaptar sua atuação ao nível de conhecimento dos alunos e à necessidade de promover o pensamento crítico e a curiosidade, conforme os princípios pedagógicos de Kohan, Lipman e Paulo Freire.

A pesquisa conclui pela viabilidade e importância da integração da Educação para o Desenvolvimento (ED) no currículo do pré-escolar e 1º ciclo do ensino básico. A investigação demonstrou que é possível integrar os objetivos da ED com os conteúdos programáticos de Português, usando metodologias inovadoras e o uso estratégico de tecnologias. A metodologia utilizada, baseada em atividades dinâmicas e participativas, mostrou-se eficaz na promoção da aprendizagem e na motivação dos alunos. Os resultados obtidos indicam que as atividades desenvolvidas estavam alinhadas com os objetivos específicos das metas curriculares do currículo de Português, contribuindo para o desenvolvimento de competências de comunicação oral e escrita, compreensão de textos e expressão pessoal. A integração curricular bem-sucedida demonstra a possibilidade de enriquecer o processo de ensino-aprendizagem, promovendo a formação de cidadãos mais conscientes e engajados.

A pesquisa enfatiza a importância do papel do professor na integração da ED no currículo, destacando a necessidade de formação contínua e de adaptação às novas demandas da educação. O professor precisa ser dinâmico, criativo e capaz de articular diferentes áreas curriculares, promovendo a reflexão crítica e a participação ativa dos alunos. A capacidade do professor em interligar a ED com outras áreas transversais, como a Língua Portuguesa, é crucial para o sucesso da implementação desta abordagem pedagógica. De acordo com a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania (ENEC) de 2017, o professor deve possuir competências específicas, incluindo metodologia de projeto e articulação com a comunidade. A pesquisa destaca que o professor deve evoluir face à educação atual, passando ensinamentos do mundo real para os alunos, incentivando-os a refletir e argumentar. A ED, neste contexto, desempenha um papel fundamental na formação de cidadãos críticos e responsáveis.

A conclusão reforça a importância de planificações ricas em aprendizagens e métodos inovadores para captar a atenção das crianças e promover a aquisição de conhecimentos. As planificações funcionam como instrumentos guia, mas a necessidade de um “plano B” para situações imprevistas também é destacada. As novas tecnologias, como o quadro digital e sites de pesquisa como o dicionário Priberam, são consideradas ferramentas indispensáveis ao ensino atual, mas o uso equilibrado é fundamental para evitar os efeitos negativos do excesso de tecnologia. O estabelecimento de uma boa relação professor-aluno é fundamental para o sucesso do processo de aprendizagem, assim como a promoção da responsabilidade e autonomia dos alunos, preparando-os para a vida adulta. A pesquisa ressalta a importância de integrar a educação para a cidadania no processo de construção da responsabilidade, conscientizando os alunos de seus deveres como cidadãos.

A conclusão aborda a diferença entre as etapas de pré-escolar e primeiro ciclo, destacando a maior predisposição das crianças do pré-escolar para a aprendizagem e a curiosidade inata nesta fase. No 1º ciclo, observa-se uma tendência para maior desmotivação e uma maior preocupação dos pais com resultados quantitativos, em detrimento de abordagens inovadoras e criativas. A pesquisa destaca como, no pré-escolar, a criatividade e os trabalhos manuais são mais valorizados, em contraste com a ênfase nos resultados em testes no primeiro ciclo. A proximidade entre o educador e as crianças também é maior no pré-escolar. A comparação entre os sistemas de pré-escolar da Espanha e Portugal é feita, salientando as diferenças entre as práticas pedagógicas e o nível de estimulação das crianças, com as escolas espanholas apresentadas como mais inovadoras. A experiência foi considerada muito rica em termos de aprendizagem, social e pessoal.