Caminhos da escrita no Noroeste de Portugal, na Idade Média : alguns aspectos

Escrita Medieval: Noroeste de Portugal

Informações do documento

Autor

José Marques

Escola

Faculdade de Letras, Universidade do Porto

subject/major Paleografia, História Medieval, História da Escrita
Tipo de documento Artigo de Conferência
city_where_the_document_was_published Porto
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 1.06 MB

Resumo

I.Evolução da Escrita Visigótica para a Carolina e Gótica no Noroeste de Portugal

Este estudo de paleografia investiga a evolução da escrita no Noroeste de Portugal, focando-se nos Mosteiros de Guimarães e de S. Simão da Junqueira. Através da análise de sua rica documentação medieval, o estudo traça a transição da escritura visigótica, em suas variantes cursiva e redonda, para a escritura carolina e, posteriormente, para a escritura gótica. São analisadas as datas e os fatores que influenciaram essas mudanças, incluindo a influência de novas ordens monásticas (beneditina, agostinha e cisterciense) e as relações com a França e a Borgonha. O Livro de Mumadona, importante cartulário do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, é mencionado como fonte que contribuiu para a perda de alguns originais visigóticos. A Catedral de Braga é mencionada como outro importante centro de produção de escrita na região, objeto de estudo futuro.

1. Contexto Regional e Objetivo do Estudo

O estudo, apresentado no Congresso Internacional de Paleografia em Viena (2005), foca a evolução da escrita no Noroeste de Portugal, especificamente a transição da escrita visigótica para a carolina e, posteriormente, para a gótica. A região escolhida é justificada pela existência de mais de setenta mosteiros de tradição visigótica na antiga diocese de Braga, à época da fundação de Portugal, muitos dos quais aderiram a novas observâncias monásticas (beneditina, agostinha e cisterciense) entre o final do século XI e a primeira metade do século XII. O estudo considera o contexto histórico da região após a invasão árabe e sua lenta recuperação socioeconômica. A pesquisa busca analisar a escrita em instituições concretas, numa perspectiva diacrônica, utilizando a documentação disponível, contrastando a riqueza documental de alguns mosteiros com a pobreza de outros, principalmente no Alto Minho. A Catedral de Braga é mencionada como exceção, com acervo mais abundante e objeto de estudo futuro. A análise busca definir as datas e os condicionantes dessa evolução estilística.

2. Mosteiros de Guimarães e S. Simão da Junqueira Dois Casos Paradigmáticos

A escolha dos Mosteiros de Guimarães e S. Simão da Junqueira justifica-se pela significativa quantidade de documentos medievais preservados em cada um, em contraste com a pobreza documental de outras instituições monásticas da região. O Mosteiro de Guimarães, fundado por Mumadona Dias por volta de 950 e transformado em Colegiada entre 1107-1110 (mais tarde Colegiada de Santa Maria da Oliveira), e o Mosteiro de S. Simão da Junqueira, fundado em 1069 e extinto em 1770, constituem casos paradigmáticos para o estudo. Apesar da grande diferença na data de fundação (aproximadamente 119 anos), a quantidade de originais em escrita visigótica não é diretamente proporcional a essa diferença, pois muitos documentos antigos foram transcritos em cópias posteriores, como o Livro de Mumadona (códice em gótica librária, no Arquivo Nacional da Torre do Tombo). A documentação de Guimarães inclui também documentos de outros mosteiros, como o de S. Gens e S. Bartolomeu de Montelongo (Fafe), incorporados após sua extinção. A análise comparativa da documentação desses mosteiros pretende rastrear a evolução da escrita.

3. Análise da Evolução da Escrita em Guimarães e S. Simão da Junqueira

A análise da documentação do Mosteiro/Colegiada de Guimarães revela o uso ininterrupto da escrita visigótica redonda até 16 de março de 1135 (documento redigido pelo presbítero Rodrigo). A partir de 1127, documentos em letra carolina aparecem, mas não produzidos na Colegiada. Em S. Simão da Junqueira, o domínio absoluto da escrita visigótica (cursiva) persistiu até 1127, ano do primeiro documento em letra carolina. Apesar disso, a escrita visigótica redonda continuou a ser usada até 1132. A transição para a escrita carolina é mais rápida em Guimarães que em S. Simão da Junqueira. O estudo argumenta que o desaparecimento de originais em visigótica cursiva em Guimarães facilitou a análise da escrita visigótica redonda, a qual, apesar de diferente da cursiva, retém elementos característicos como nexos e letras específicas. A análise compara a escrita dos dois mosteiros, mostrando que apesar das diferenças cronológicas, há semelhanças e diferenças na transição entre as diferentes formas de escrita.

4. Da Escrita Carolina à Gótica Cursiva Influências e Transições

A seção discute o predomínio da escrita carolina ou francesa e a transição para a gótica cursiva, com a minúscula diplomática como elo de ligação. A análise da documentação dos mosteiros revela a persistência de influências visigóticas na escrita carolina, especialmente em nexos e letras nos nomes dos escribas. O estudo observa o surgimento da minúscula diplomática, caracterizada por desvios para a esquerda nas hastes das letras, e seu papel na transição para a gótica cursiva. A análise de documentos, com datas específicas, ilustra a evolução da escrita, desde a escrita carolina até a gótica cursiva inicial (exemplos em 1167, 1172 e 1185 na Colegiada de Guimarães). A influência de escribas como Fernando, um modelo para a minúscula diplomática, é destacada, assim como a contribuição de outros escribas e notários.

5. Documentação do Alto Minho e Fontes Subsidiárias

Em contraste com a riqueza documental dos mosteiros do Baixo Minho, a escassez de documentos originais no Alto Minho para o período estudado levou à utilização de fontes secundárias. O estudo utiliza o Cartulário de Fiães (Arquivo Distrital de Braga), contendo 404 documentos latinos (1168-1267), e as Confirmações de Tui (também no Arquivo Distrital de Braga), com mais de 250 cartas (1352-1366), como fontes paleográficas importantes. O Cartulário de Fiães apresenta uma escrita carolino-gótica librária, com marcas de minúscula diplomática, enquanto as Confirmações de Tui mostram uma gótica cursiva. A análise inclui ainda a escrita humanística cursiva, encontrada na Colegiada de Valença do Minho, onde Francesco Cavalcanti se destaca como escriba. A Colegiada de Valença e sua documentação, incluindo originais em humanística cursiva, são analisadas, com destaque para o papel de Francesco Cavalcanti e a sua influência. O estudo finaliza considerando a importância dessas fontes para o entendimento da história e paleografia da região.

II.O Mosteiro de Guimarães e a Colegiada de Santa Maria da Oliveira

O Mosteiro (posteriormente Colegiada) de Guimarães, fundado por volta de 950 por Mumadona Dias, apresenta um espólio documental significativo, embora parte dele tenha sido transferida para o Arquivo Nacional da Torre do Tombo e para o Arquivo Municipal Alfredo Pimenta. O estudo destaca a utilização ininterrupta da escritura visigótica redonda até 16 de março de 1135. A análise da documentação original permite rastrear a transição para a escrita carolina, com a presença de atos jurídicos em letra carolina a partir de 1127, coexistindo inicialmente com a visigótica. A Colegiada de Santa Maria da Oliveira, em Guimarães, é um caso paradigmático dessa transformação.

1. Origem e Evolução do Mosteiro de Guimarães

O estudo analisa o Mosteiro de Guimarães, fundado por Mumadona Dias por volta de 950, posteriormente transformado em Colegiada entre 1107 e 1110, e mais tarde conhecido como Colegiada de Santa Maria da Oliveira. A documentação original deste mosteiro, fundamental para o estudo da evolução da escrita, encontra-se dispersa entre o Arquivo Nacional da Torre do Tombo (Lisboa), o Arquivo Municipal Alfredo Pimenta (Guimarães), e um conjunto de 112 documentos adquiridos pela Universidade de Coimbra em 1944. A dispersão da documentação, resultado de vicissitudes políticas do século XIX, aumentou a complexidade da pesquisa. A análise da documentação do Mosteiro/Colegiada de Guimarães mostra o uso ininterrupto da escrita visigótica redonda pelos escribas até 16 de março de 1135, data de um documento redigido pelo presbítero Rodrigo. A partir de 1127, quatro atos jurídicos em letra carolina foram encontrados cronologicamente inseridos no corpus, embora não redigidos na Colegiada e sem relação direta com ela, o que demonstra a exclusividade da letra visigótica redonda num período de mais de quarenta anos (1092-1135). A importância deste mosteiro reside na sua riqueza documental que permite acompanhar a evolução da escrita numa instituição-chave no contexto histórico e cultural da região.

2. A Transição da Escrita Visigótica para a Carolina em Guimarães

O estudo foca a transição da escrita visigótica para a carolina no Mosteiro/Colegiada de Guimarães. Embora a escrita visigótica redonda tenha sido utilizada até 1135, o aparecimento de documentos em letra carolina a partir de 1127 indica uma mudança gradual. O documento mais antigo em visigótica redonda encontrado data de 20 de janeiro de 1092, representando uma evolução significativa em relação à escrita visigótica cursiva. Apesar da transição para a escrita carolina, o estudo destaca a persistência de características da escrita visigótica, como a profusão de nexos e letras específicas, num processo que não se deu de forma súbita. A análise da documentação, portanto, permite identificar não apenas a adoção da escrita carolina, mas também a coexistência e a influência contínua da escrita visigótica em documentos redigidos no mosteiro. A análise aprofundada dos documentos, com precisão cronológica, permite entender as nuances desse processo de transição de escrita, mostrando que a mudança não foi imediata, mas progressiva.

3. A Documentação de Guimarães Fontes e Desafios

A documentação do Mosteiro e Colegiada de Guimarães, além de conter documentos próprios, inclui cerca de três dezenas de documentos pertencentes ao Mosteiro de S. Gens e S. Bartolomeu de Montelongo (concelho de Fafe), que foi incorporado à Colegiada após sua extinção entre julho de 1159 e março de 1165. Adicionalmente, há vários documentos régios e eclesiásticos dirigidos à instituição. A riqueza documental de Guimarães, apesar das dificuldades em reconstruir a totalidade devido à dispersão de documentos, permitiu um estudo detalhado da evolução da escrita. O estudo aponta para a perda de muitos originais em escrita visigótica cursiva, explicada em parte pela transcrição de documentos antigos no conhecido Livro de Mumadona. A análise da documentação de Guimarães, inclusive a comparativa com a de outros mosteiros, é essencial para compreender a evolução da escrita na região e as particularidades do processo de mudança estilística num centro de produção e difusão escrita tão importante. A existência de documentos em minúscula diplomática, gótica cursiva e carolina evidencia a complexidade da transição gráfica.

III. Simão da Junqueira e sua Documentação

O Mosteiro de S. Simão da Junqueira, fundado em 1069 e extinto em 1770, oferece um rico acervo documental. Apesar de sua fundação posterior à de Guimarães, a análise da documentação mostra o predomínio da escritura visigótica cursiva, com a primeira aparição da escritura visigótica redonda em 7 de outubro de 1074, e a transição para a escritura carolina a partir de 1127. O último documento em escrita visigótica data de 8 de outubro de 1146. A análise compara o desenvolvimento da escrita nos dois mosteiros, destacando semelhanças e diferenças cronológicas na adoção da escrita carolina. O estudo menciona escribas importantes como Odoário e Pedro.

1. Fundação e Documentação do Mosteiro de S. Simão da Junqueira

O Mosteiro de S. Simão da Junqueira, fundado em 1069 e extinto em 1770, é um dos focos principais do estudo devido à sua significativa documentação medieval. Sua seleção, juntamente com o Mosteiro de Guimarães, se deve à riqueza documental de ambos, em contraste com a pobreza observada em outras instituições monásticas da região. O estudo destaca que, apesar de sua fundação um século depois do Mosteiro de Guimarães, a documentação de S. Simão da Junqueira apresenta uma quantidade considerável de documentos. O documento mais antigo do mosteiro remonta a 5 de junho de 973, sendo que existem mais de dezoito documentos anteriores à data de sua fundação (1069). Todos os documentos analisados até o ano de sua fundação são escritos em visigótica cursiva. A preservação dessa documentação torna o Mosteiro de S. Simão da Junqueira um caso de estudo essencial para compreender a evolução da escrita na região, permitindo acompanhar a transição entre diferentes estilos gráficos num período extenso da história portuguesa.

2. Evolução da Escrita Visigótica para a Carolina em S. Simão da Junqueira

A análise da documentação do Mosteiro de S. Simão da Junqueira revela o predomínio da escrita visigótica até 1127, ano em que surge o primeiro documento redigido em letra carolina (ou francesa). A partir de 7 de outubro de 1074, aparece a primeira manifestação da visigótica redonda, que perdurará até 8 de outubro de 1146 (documento assinado por Odoário, cujo ofício – subdiácono – é incerto). Apesar da presença da escrita carolina, a escrita visigótica redonda continua a ser utilizada até 1132, evidenciando uma transição gradual, marcada pela influência progressiva do novo tipo de escrita. O último ato jurídico lavrado em escrita visigótica data de 8 de outubro de 1146. A análise do sistema braquigráfico da escrita visigótica (cursiva e redonda) é brevemente mencionada, destacando o uso frequente do T visigótico ou do t carolino. O estudo menciona também os presbíteros Árias (12-11-1130) e Trotesindo (02-06-1132), e o presbítero Odório (21-06-1137) como figuras importantes nesse contexto de transição gráfica, acompanhado a partir de 1139 pelo escriba Soeiro.

3. Comparação com Guimarães e Considerações Finais sobre S. Simão da Junqueira

O estudo compara a evolução da escrita em S. Simão da Junqueira com a observada em Guimarães. Enquanto em Guimarães a escrita visigótica redonda foi utilizada ininterruptamente até 1135, em S. Simão da Junqueira o domínio da escrita visigótica se estendeu até 1127, com a coexistência da visigótica redonda e da carolina até 1132. A análise destaca a influência de fatores como as relações com a França, a presença da Ordem Beneditina, e a Reforma Gregoriana (substituição da liturgia hispânica pela romana) na adoção da escrita carolina. Apesar desses fatores favoráveis à escrita carolina, a visigótica redonda persistiu por um tempo considerável. O estudo conclui que, apesar da maior facilidade da escrita carolina, a transição em ambas as instituições foi gradual, com sobrevivências de práticas visigóticas, especialmente em documentos posteriores à adoção da escrita carolina. A análise da documentação de S. Simão da Junqueira, portanto, contribui para uma compreensão mais completa da evolução da escrita medieval em Portugal, fornecendo dados cruciais para uma análise mais detalhada do processo de transição estilística e cronológica.

IV.Da Escrita Carolina à Gótica Cursiva Minúscula Diplomática como elo de ligação

Após a adoção da escrita carolina, o estudo acompanha a evolução para a gótica cursiva, com a minúscula diplomática atuando como elemento de transição. A análise da documentação dos mosteiros mostra a gradual incorporação de características da gótica cursiva, com escribas como Fernando desempenhando um papel crucial na disseminação da minúscula diplomática e, subsequentemente, na transição para a gótica cursiva. O estudo destaca o aparecimento de documentos em gótica cursiva a partir do final do século XII, com exemplos notáveis em 1185 e 1207 na Colegiada de Guimarães.

1. O Predomínio da Escrita Carolina e suas Características

Após a transição da escrita visigótica para a carolina (ou francesa), observada nos mosteiros de Guimarães e S. Simão da Junqueira, o estudo analisa o predomínio da escrita carolina. Apesar de sua aparente facilidade, a implantação da escrita carolina demorou consideravelmente em ambas as instituições. O estudo destaca a clareza de seus caracteres, a separação típica entre palavras e letras, a ausência de nexos e a superação de ambiguidades presentes na escrita visigótica (como a confusão entre 'a' aberto e 'u', 't' visigótico e 'a' carolino, 'i' alto e 'l'). A simplicidade do sistema braquigráfico da carolina, já consolidado na época de sua adoção em Portugal, é contrastada com a complexidade do sistema da escrita visigótica, onde sinais de abreviatura eram frequentes, mesmo em estágios intermediários de sua evolução. Embora a escrita carolina tenha alcançado um domínio absoluto, o estudo observa a persistência de algumas práticas típicas da escrita visigótica, especialmente em documentos elaborados por escribas e notários.

2. A Minúscula Diplomática como Transição para a Gótica Cursiva

A seção detalha a evolução da escrita carolina para a gótica cursiva, com a minúscula diplomática atuando como elo de ligação. A minúscula diplomática é caracterizada pelo desvio para a esquerda nas hastes inferiores das letras e pelo prolongamento e desvio para a esquerda na parte final de algumas letras que normalmente não deveriam ultrapassar a linha de base. Numa fase mais avançada, as hastes superiores alongam-se, muitas vezes formando laços. Essa fase intermediária, revelada pela análise das coleções documentais dos dois mosteiros, perdurou várias décadas, contribuindo para uma passagem gradual para a gótica cursiva. A análise da documentação mostra exemplos de escribas com domínio da escrita carolina que ainda apresentavam traços de escrita visigótica, como o traçado do 'd', a nota tironiana visigótica e o uso de maiúsculas como abreviaturas. A persistência desses elementos demonstra a influência da tradição paleográfica visigótica, mesmo após a adoção da escrita carolina.

3. Exemplos e Datas chave da Transição para a Gótica Cursiva

O estudo apresenta exemplos concretos da transição para a gótica cursiva, com datas específicas. Em Guimarães, a escrita visigótica redonda perdurou até 1135, enquanto em S. Simão da Junqueira, até 1146. A influência da escrita visigótica em escribas que já utilizavam a escrita carolina persistiu até 1175, conforme demonstrado numa carta de venda subscrita pelo notário Pedro. Indícios de minúscula diplomática são observados a partir de 1161, com o notário Fernando, a partir de maio de 1172, como principal expoente do estilo durante mais de vinte anos. A transição é ilustrada por documentos específicos: um documento de 1167 que sugere um gótico inicial; documentos de 1178 e 1177 que demonstram a habilidade e consciência estilística do escriba; e documentos de 1185 e 1207, assinados por João e Pedro respectivamente, claramente em gótica cursiva inicial. A partir do final do século XII até 1250, a documentação mostra a consolidação da gótica cursiva, com a coexistência de diferentes tendências e estilos, refletindo a influência de notários e tabeliães régios.

V.Documentação do Alto Minho e o Cartulário de Fiães

A escassez de documentos originais no Alto Minho contrastou com a riqueza dos acervos dos mosteiros do Baixo Minho. No entanto, o estudo utiliza o Cartulário de Fiães (Arquivo Distrital de Braga) e as Confirmações de Tui (também no Arquivo Distrital de Braga) como fontes importantes para compreender a escrita na região. O Cartulário de Fiães, com documentos de 1168 a 1267, apresenta uma escrita carolino-gótica librária com traços de minúscula diplomática, enquanto as Confirmações de Tui (1352-1366) mostram uma gótica cursiva bem cuidada. A análise inclui também a escrita humanística cursiva, observada no contexto da Colegiada de Valença, com a menção de Francesco Cavalcanti como escriba.

1. A Pobreza Documental do Alto Minho e a Necessidade de Fontes Subsidiárias

A pesquisa encontrou uma significativa diferença na disponibilidade de documentação entre as regiões do Baixo e Alto Minho. Enquanto os mosteiros do Baixo Minho, como Guimarães e S. Simão da Junqueira, apresentaram acervos ricos para análise, as instituições do Alto Minho revelaram uma impressionante pobreza documental para o período em estudo. Essa escassez de documentos originais dificulta a análise direta da evolução da escrita na região. Para contornar essa limitação, o estudo recorre a fontes subsidiárias, buscando informações sobre a escrita na região através de códices que preservam documentos transcritos. A ausência de documentos originais do Alto Minho para o período em questão reforça a necessidade de se utilizar outras fontes para o estudo da paleografia regional e destaca a importância da preservação de documentos históricos.

2. O Cartulário de Fiães Análise Paleográfica e Contributo para o Estudo da Escrita

O estudo analisa o Cartulário de Fiães, um códice de pergaminho guardado no Arquivo Distrital de Braga, como fonte principal para compreender a escrita no Alto Minho durante a segunda metade do século XII e até o terceiro quartel do século XIII. Este cartulário contém cerca de 404 documentos latinos, transcritos aproximadamente durante um século (1168-1267), representando uma fonte valiosa apesar de não se tratar de originais avulsos, mas de cópias. Paleograficamente, o Cartulário apresenta uma escrita carolino-gótica librária, com algumas marcas de minúscula diplomática, demonstrando uma relativa uniformidade na escrita, indicando possível autoria de poucas mãos. Embora a preferência seria por originais avulsos, o Cartulário de Fiães é considerado um monumento gráfico importante para a região, permitindo inferências sobre os padrões de escrita em uso.

3. As Confirmações de Tui Gótica Cursiva e a Diocese de Tui

As Confirmações de Tui, outro códice em pergaminho conservado no Arquivo Distrital de Braga, são analisadas como fonte complementar. Este códice contém mais de duzentas e cinquenta cartas de confirmação de clérigos, outorgadas entre 1352 e 1366, na diocese de Tui, que abrangia territórios portugueses e galegos. As Confirmações de Tui apresentam uma gótica cursiva bem cuidada, escrita por uma única mão. Apesar da perda de um caderno central, o códice mantém 211 registros, sendo que 37 relativos a paróquias portuguesas foram copiados para um livro posterior (Confirmações de Valença, século XV). Embora as cópias de Valença sejam fiéis ao conteúdo original, a grafia é significativamente diferente, resultante da diferença temporal (cerca de 74 anos). A análise dessas fontes, apesar das limitações inerentes às cópias, fornece informações cruciais sobre a escrita gótica cursiva na região do Alto Minho e sobre a relação entre os centros de produção de escrita portugueses e galegos dentro da diocese de Tui.

4. A Colegiada de Valença do Minho e a Escrita Humanística Cursiva

A análise estende-se à Colegiada de Valença do Minho, criada após a separação de alguns cónegos portugueses da Sé de Tui, durante o Cisma do Ocidente. Além da gótica cursiva do século XV, a documentação da Colegiada de Valença preserva originais em humanística cursiva, escritos por Francesco Cavalcanti, secretário do bispo D. Frei Justo Baldino de Pádua. Essa presença da escrita humanística cursiva, de origem italiana, é considerada uma novidade para Portugal (conforme comunicação apresentada em 1995). A documentação de Valença, juntamente com a declaração juramentada de seu escrivão e membros do cabido, atestam a fidedignidade dos documentos, fornecendo informações sobre padrões de escrita no Alto Minho (final do século XV e início do século XVI) e sobre a transição canónica do território para a diocese de Braga (1514). A inclusão desta informação reforça a importância de fontes diversas para um estudo exaustivo da escrita medieval.