Contribuição para o controlo biológico de Ceratitis capitata Wiedemann (Diptera: Tephritidae) : ilha de São Miguel, Açores

Controle Biológico de Ceratitis capitata

Informações do documento

Autor

Laura Medeiros Tavares

Escola

Universidade dos Açores

Curso Biologia
Local Ponta Delgada
Tipo de documento Dissertação
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 1.47 MB

Resumo

I.Controlo da Mosca do Mediterrâneo Ceratitis capitata nos Açores Eficácia de Métodos Alternativos

Este estudo avaliou a eficácia de dois métodos alternativos ao uso de insecticidas para o controlo da Ceratitis capitata, vulgarmente conhecida como mosca-do-Mediterrâneo, na ilha de São Miguel, Açores. A pesquisa focou-se numa área de 80 hectares em Rabo de Peixe, região principal de produção de citrinos, onde foram instaladas unidades de controlo ADRESS®, que utilizam esterilização química para reduzir a população da praga. Simultaneamente, foi investigado o impacto de Nematóides Entomopatogénicos (EPNs), especificamente Steinernema carpocapsae e sua bactéria simbiótica Xenorhabdus nematophila, na indução de genes de resposta imune em C. capitata. A avaliação da eficácia dos métodos incluiu o estudo da abundância populacional da praga (utilizando armadilhas Tephri-trap® com trimedlure e DDVP) e a infestação de frutos (Diospyrus kaki, Feijoa sellowiana e Ficus carica), ao longo de dois anos (2009/2010 e 2010/2011). Os resultados preliminares demonstram uma redução significativa na infestação dos frutos e uma diminuição na população de mosca-do-Mediterrâneo no segundo ano, com índices de eficácia do ADRESS® a aumentarem de 36% para 51%. A pesquisa sobre a resposta imune a EPNs forneceu dados para futuros estudos de Controlo Biológico e Gestão Integrada de Pragas (IPM). A presença de hospedeiros silvestres, como Solanum mauritianum, também foi considerada um fator agravante para o controle da praga.

1.1 Aspectos Gerais de Ceratitis capitata

Esta seção descreve a Ceratitis capitata, a mosca-do-Mediterrâneo, como uma praga significativa de frutos em várias regiões do mundo. Pertence à família Tephritidae, que inclui mais de 5000 espécies, aproximadamente 1400 das quais se desenvolvem em frutos carnosos. Os principais géneros desta família são Ceratitis, Bactrocera, Anastrepha e Rhagoletis, incluindo espécies consideradas pragas importantes (White e Elson-Harris, 1992). A expansão geográfica de insetos destes géneros, incluindo C. capitata, é atribuída ao aumento do comércio de frutas e do turismo. A C. capitata, em particular, é uma das espécies mais notórias do género Ceratitis, com padrões comportamentais altamente evoluídos que lhe conferem sucesso reprodutivo, estando distribuída em regiões tropicais e temperadas do mundo (Carey, 1991; White et al., 2000). A sua ampla distribuição e adaptabilidade a diferentes climas tornam-na uma ameaça constante a novas áreas de produção de fruta.

1.2 Importância Económica de Ceratitis capitata

A seção destaca a importância económica da Ceratitis capitata. Endémica da região tropical subsaariana (Gasparich et al., 1997), esta praga pode completar o seu desenvolvimento em mais de 400 espécies de plantas em regiões tropicais, subtropicais e temperadas (Copeland et al., 2002). Considerada uma das mais difundidas e graves pragas de frutos comestíveis (Weems, 1981; Liquido et al., 1990; White e Elson-Harris, 1992), causa danos significativos ao ovipositar sob a casca do fruto, e as larvas subsequentemente alimentam-se da polpa, tornando os frutos impróprios para consumo ou comercialização. A infestação por C. capitata acarreta custos elevados de produção devido às aplicações frequentes de insecticidas e perdas de produção (Nora et al., 2000). Algumas das principais espécies de frutas hospedeiras incluem ameixas, pêssegos e maçãs (Rosaceae), laranjas, limões e toranjas (Rutaceae), café (Rubiaceae), manga (Anacardiaceae) e feijoa (Myrtaceae).

1.3 Controlo de Ceratitis capitata Métodos Tradicionais e Alternativos

Esta secção aborda os métodos de controlo da Ceratitis capitata. As moscas-da-fruta afetam a produção e comercialização através dos danos causados pelas larvas e pela imposição de quarentenas por países importadores (Vidal e Silva, 2005). O combate torna-se mais difícil e dispendioso em densidades populacionais elevadas, aconselhando-se uma vigilância permanente e o início do controlo logo que as capturas sejam consistentes, utilizando armadilhas específicas (Shelly e Mcinnis, 2001). Como alternativa aos insecticidas, são mencionados métodos de controlo como a luta biotécnica (uso massivo de armadilhas), a luta autocida (Técnica do Insecto Estéril) e a luta biológica (uso de inimigos naturais, incluindo nematóides entomopatogénicos). A presença de hospedeiros silvestres perto de pomares agrava o problema, uma vez que facilita o aumento populacional e a migração da praga (Malavasi, 1980; Malavasi e Morgante, 1981). A Organização Europeia e Mediterrânea de Protecção de Plantas (OEPP/EPPO) considera C. capitata como praga de quarentena A2, recomendando o desenvolvimento de novos métodos de controlo (OEPP/EPPO, 2006).

2. Métodos de Estudo Armadilhas ADRESS e Amostragem

Este estudo, realizado em Rabo de Peixe, São Miguel (Açores), numa área de 80 hectares de pomares de citrinos, utilizou dois métodos para avaliar a eficácia de controlo da Ceratitis capitata. O primeiro método envolveu a instalação de unidades de controlo ADRESS®, armadilhas de esterilização química. A avaliação da sua eficácia foi feita através da análise da abundância populacional da praga usando 18 armadilhas Tephri-trap®, com isco trimedlure (TML) e insecticida DDVP, durante dois anos (2009/2010 e 2010/2011). Os dados foram recolhidos semanalmente, excluindo os meses de Abril a Julho devido à redução natural da população e à instalação tardia das armadilhas em 2009. O segundo método consistiu na avaliação da infestação de frutos, recolhendo amostras de Diospyrus kaki, Feijoa sellowiana e Ficus carica, pesando-os individualmente e contando as picadas e larvas. Uma zona de controlo (Lagoa) foi usada para comparação. Para avaliar a eficácia anual do ADRESS®, foi usada uma fórmula que compara a população da praga na zona tratada (Rabo de Peixe) com a zona de controlo (Lagoa) (Navarro-Llopis et al., 2007).

3. Resultados e Discussão Análise da Eficácia dos Métodos de Controlo

Os resultados mostraram uma ligeira redução da população de C. capitata em Rabo de Peixe (zona com ADRESS®) no segundo ano de estudo, em comparação com a zona de controlo (Lagoa). A infestação de frutos também apresentou uma redução significativa no número de picadas por grama de fruta. O índice de eficácia anual do sistema ADRESS® aumentou de 36% para 51% entre os dois anos, indicando um efeito cumulativo. No entanto, os resultados são considerados preliminares. A análise da infestação de frutos, embora mostrando redução nas picadas e pupas, necessita de mais dados e outras espécies de fruta hospedeiras para uma avaliação completa. A diversidade de árvores frutíferas na zona de estudo e a presença de hospedeiros silvestres, como Solanum mauritianum (Pimentel, 2010), complicam o controlo da praga. A manutenção do sistema ADRESS® durante o maior período possível, considerando as condições climáticas dos Açores, é crucial para a sua eficácia (Navarro-Llopis et al., 2009). São necessários mais anos de estudo para obter resultados mais confiáveis e demonstrar os benefícios do uso do ADRESS® e de outros métodos de controlo de C. capitata em São Miguel.

II.Eficácia das Armadilhas ADRESS na Redução da População de Ceratitis capitata

A instalação das unidades de controlo ADRESS®, baseadas em esterilização química (através da atração cromática, sexual e fagoestimulante, com o inseticida lufenurón), mostrou resultados promissores na redução da população de Ceratitis capitata em Rabo de Peixe, São Miguel. Embora no primeiro ano (2009/2010) não tenha havido diferença significativa entre a área tratada e a zona de controlo (Lagoa), o segundo ano (2010/2011) registou uma redução clara na dinâmica populacional da praga na zona com ADRESS®. O índice de eficácia anual aumentou de 36% para 51%, indicando um efeito cumulativo da esterilização química. A análise da infestação de frutos mostrou uma redução significativa no número de picadas por grama de fruta colhida. Apesar dos resultados positivos, o estudo destaca a necessidade de mais anos de monitorização para confirmar a eficácia a longo prazo deste método de controlo de pragas.

1. Descrição do Sistema ADRESS

O estudo utilizou o sistema ADRESS® como método de controlo da Ceratitis capitata. Este sistema é apresentado como um método poderoso e inovador, baseado na redução populacional da praga através de esterilização. O ADRESS® funciona através de três tipos de atração: cromática (para facilitar a detecção da armadilha pelo inseto), sexual (para atrair os insetos adultos), e fagoestimulante (para induzir a ingestão do composto esterilizante). Este composto, um insecticida (lufenurón), inibe o desenvolvimento dos insetos, especificamente a formação de quitina em estados imaturos (larvas e ninfas) (Aguiar et al., 2005). Através da esterilização, a descendência de C. capitata diminui, levando à redução da população. A eficácia deste sistema foi avaliada num estudo em Rabo de Peixe, São Miguel (Açores), numa área de 80 hectares, principalmente de citrinos, comparando-a com uma zona de controlo (Lagoa) durante dois anos (2009/2010 e 2010/2011).

2. Metodologia Monitorização da População e Infestação de Frutos

Para avaliar a eficácia do ADRESS®, a abundância populacional de C. capitata foi monitorizada utilizando 18 armadilhas Tephri-trap®, distribuídas aleatoriamente na área de estudo em Rabo de Peixe. Cada armadilha continha trimedlure (TML) como atrativo e uma pastilha de insecticida DDVP. Os insetos capturados foram recolhidos e contados semanalmente, e os iscos substituídos a cada 15 semanas. O estudo abrangeu os meses de Agosto a Março, durante os dois anos de estudo. Adicionalmente, para avaliar a infestação de frutos, foram recolhidas amostras de frutos maduros de espécies hospedeiras (Diospyrus kaki, Feijoa sellowiana e Ficus carica) na área de estudo, pesando cada fruto e contabilizando o número de picadas e larvas. Menor número de amostras foi coletado em 2009, devido à menor disponibilidade de fruta. Os resultados obtidos foram comparados com uma área de controlo (Lagoa), onde não foram instaladas as armadilhas ADRESS®.

3. Resultados Eficácia Anual e Impacto na Infestação de Frutos

Os resultados mostraram que, embora no primeiro ano não tenha havido diferença significativa entre Rabo de Peixe e Lagoa, no segundo ano houve uma redução significativa na população de C. capitata na área tratada com ADRESS®, confirmando a eficácia do método. O índice de eficácia anual aumentou de 36% para 51% entre 2009/2010 e 2010/2011, indicando um efeito cumulativo. A análise da infestação dos frutos mostrou uma redução significativa no número de picadas. Apesar dos resultados promissores, os autores reconhecem a natureza preliminar dos dados e a necessidade de mais anos de estudo para uma avaliação completa da eficácia do ADRESS®. A fórmula utilizada para calcular a eficácia anual (Navarro-Llopis et al., 2007) baseou-se na comparação entre o número de adultos de C. capitata capturados em Rabo de Peixe (área tratada) e Lagoa (área de controlo). A previsão da dinâmica populacional, baseada na equação (1) e apresentada na Figura 4, mostra uma redução nos valores de FTD (moscas capturadas por armadilha por dia) a partir da semana 38 do segundo ano.

III.Controlo Biológico de Ceratitis capitata com Nematóides Entomopatogénicos EPNs

A investigação explorou a utilização de Nematóides Entomopatogénicos (EPNs), como método de controlo biológico da mosca-do-Mediterrâneo. Foram testados sete isolados de EPNs recolhidos nos Açores, incluindo Steinernema carpocapsae e Heterorhabditis bacteriophora, em larvas de C. capitata. O estudo focou-se na resposta imune do insecto à infecção, analisando a expressão dos genes cecropina (via Imd) e toll, utilizando RT-PCR. Os resultados revelaram a capacidade de sobrevivência de algumas larvas e adultos mesmo com a presença de EPNs (Steinernema carpocapsae e sua bactéria simbiótica Xenorhabdus nematophila) no seu hemocélio, sugerindo a existência de mecanismos de imunossupressão por parte dos EPNs. Esta investigação sugere novas linhas de pesquisa para otimizar o uso de EPNs em programas de Gestão Integrada de Pragas (IPM) para Ceratitis capitata.

1. Nematóides Entomopatogénicos EPNs como Agentes de Controlo Biológico

Esta seção introduz os nematóides entomopatogénicos (EPNs) como uma alternativa ao uso de insecticidas no controlo da Ceratitis capitata. Os EPNs, conhecidos desde o século XVII, ganharam destaque na década de 1930 como agentes de controlo de insetos (Smart, 1995). Estes nematóides, que ocorrem naturalmente no solo, juntamente com suas bactérias simbióticas, são patógenos letais para muitos insetos com fases de vida no solo (Griffin et al., 2005). O interesse na utilização de EPNs como agentes de controlo biológico é justificado pela sua segurança, facilidade de produção em massa e aplicação com equipamento padrão (Wright et al., 2005). Várias espécies de insetos, incluindo C. capitata, são suscetíveis a EPNs (Beavers e Calkins, 1984; Lindegren et al., 1990; Patterson e Lacey, 1999; Pionek e Hislop, 1981; Toledo et al., 2006; Yee e Lacey, 2003). O estudo aprofundado de C. capitata, a nível genético e molecular (Gasperi et al., 2002; Gomulski et al., 2004; Malacrida et al., 2007; Gomulski et al., 2008), permite a compreensão de mecanismos biológicos relevantes para o desenvolvimento de estratégias de controlo.

2. Metodologia Infecção de Larvas Bioensaio e RT PCR

A metodologia envolveu a seleção e teste de sete isolados de EPNs da coleção da Universidade dos Açores: Steinernema carpocapsae (Az150, Az157 e R1) e Heterorhabditis bacteriophora (Az29, Az36, Az144 e Az148). Os EPNs foram mantidos em água a 10ºC e cultivados em larvas de Galleria mellonella (Dutky et al., 1964). Um bioensaio foi conduzido a três temperaturas (15, 20 e 25ºC), expondo larvas L3 de C. capitata a 300 IJs (formas infecciosas jovens) de cada isolado. Após o período de emergência, o número de adultos emergidos foi contado e dissecado para verificar a presença de nematóides. As pupas mortas também foram analisadas. Para investigar a resposta imune de C. capitata à infecção, foi realizada RT-PCR em amostras de pupas e adultos, utilizando o TRIzol® (Invitrogen) para extração de RNA total. A retrotranscrição utilizou o SuperScript™ III (Invitrogen) com primers específicos para genes de resposta imune (cecropina e toll), com controlos endógenos (actina e tubulina). As temperaturas de annealing utilizadas foram 60ºC para cecropina e actina e 55ºC para toll e tubulina.

3. Resultados e Discussão Resposta Imune e Implicações para o Controlo Biológico

O estudo mostrou que pupas e adultos de C. capitata infectados com S. carpocapsae sobreviveram, com nematóides e bactérias vivas no hemocélio. Para investigar essa sobrevivência, a expressão de genes de resposta imune (cecropina e toll, como marcadores das vias Imd e Toll, respetivamente) foi analisada. A amplificação dos genes foi confirmada através de electroforese em gel de agarose a 2% (Figura 2). A sobrevivência dos EPNs apesar da resposta imune sugere mecanismos de imunossupressão por parte dos nematóides e bactérias (Karagoz, 2009; Karagoz et al., 2009). O estudo sugere a análise futura da expressão de genes de virulência de X. nematophila, utilizando o primer 16S como controlo endógeno. Conclui-se que o uso de EPNs como método de controlo biológico alternativo aos insecticidas, em programas de proteção integrada, mostra resultados promissores e necessita de investigação adicional, incluindo a otimização de protocolos PCR para amplificação de genes de defesa e a avaliação da expressão de genes de virulência em X. nematophila.