Mosca-do-Mediterrâneo em Terceira
Informações do documento
| Autor | Reinaldo Macedo Soares Pimentel |
| instructor | Prof. Doutor David João Horta Lopes |
| Escola | Universidade dos Açores, Departamento de Ciências Agrárias |
| Curso | Gestão e Conservação da Natureza |
| Tipo de documento | Dissertação de Mestrado |
| Local | Angra do Heroísmo |
| Idioma | Portuguese |
| Formato | |
| Tamanho | 4.86 MB |
Resumo
I.Distribuição e Comportamento da Ceratitis capitata na Ilha Terceira Açores
Este estudo, realizado sob os projetos Interfruta e Interfruta II, investigou a bioecologia e o comportamento da mosca-do-Mediterrâneo (Ceratitis capitata Wiedemann) na Ilha Terceira, Açores. Utilizando uma rede de armadilhas (Delta e EasyTrap) distribuídas de 0 a 200 metros de altitude, monitorou-se a dispersão e a evolução populacional da praga ao longo de mais de três anos. Amostras de frutos, incluindo infestantes como Solanum mauritianum, foram coletadas para análise de infestação. Os resultados permitiram identificar focos de infestação e os principais hospedeiros, incluindo figos (com 244 larvas/kg em Angra), peras e pessegueiros, fornecendo informações cruciais para o controlo integrado de pragas.
1. Monitorização da Dispersão e População de Ceratitis capitata
O estudo focou-se na monitorização da dispersão e da evolução populacional da mosca-do-Mediterrâneo (Ceratitis capitata) na Ilha Terceira, Açores. Para isso, foi implementada uma rede de armadilhas, estrategicamente posicionadas de 0 a 200 metros de altitude, abrangendo toda a ilha. Esta rede permitiu acompanhar a distribuição real da praga e sua variação populacional mensalmente, durante um período superior a três anos. A escolha das armadilhas, Delta e EasyTrap, baseou-se em estudos anteriores que demonstraram sua eficácia na captura de machos e fêmeas adultas, respectivamente. A monitorização quinzenal e a manutenção regular das armadilhas, com substituição de feromonas e atrativos alimentares a cada 45 dias, garantiram a qualidade dos dados coletados. A utilização de um GPS e do software ArcGIS permitiu um mapeamento preciso da localização das armadilhas, fundamental para a análise espacial dos dados. A análise da Captura Média por Armadilha Dia (MAD) foi crucial para compensar a variabilidade nos dados de captura devido a perdas ou danos em algumas armadilhas.
2. Recolha de Amostras e Identificação de Hospedeiros
Durante o trabalho de campo, foram realizadas coletas aleatórias de frutos próximos da maturação, independentemente do seu valor económico. Adicionalmente, foram recolhidos frutos de plantas infestantes, com destaque para Solanum mauritianum, mesmo sem valor comercial. A inclusão destas amostras foi importante para a compreensão do ciclo de vida da praga, uma vez que a taxa de infestação em Solanum mauritianum revelou-se elevada (150 larvas/kg), indicando seu papel como hospedeiro importante na manutenção das populações de C. capitata, sobretudo na sua sobrevivência durante o Inverno. A identificação dos hospedeiros, incluindo figos (244 larvas/kg em Angra), peras (194 larvas/kg) e pessegueiros (157 larvas/kg) permitiu caracterizar a ocorrência da praga e seus impactos na fruticultura da Ilha Terceira. A identificação de hospedeiros sem valor económico também foi relevante, uma vez que estes podem contribuir para a manutenção da população da praga e para a formação de corredores ecológicos que facilitam a sua dispersão, contribuindo para a compreensão da dinâmica da praga.
3. Análise da Dinâmica Populacional e Padrões Temporais
A análise dos dados de captura revelou um padrão sazonal na dinâmica populacional da C. capitata, com um pico de captura sistemático em Outubro, nos anos de 2006 e 2007. Observou-se um aumento gradual nas capturas de Maio a Outubro, seguido de um decréscimo acentuado de Outubro a Fevereiro/Março do ano seguinte. Este padrão, similar entre os anos estudados, indica uma dinâmica populacional relativamente previsível, apesar das variações na intensidade das capturas. A análise detalhada permitiu a identificação de focos com elevada densidade populacional de fêmeas, informação crucial para a implementação de campanhas de controlo integrado, permitindo direcionar os recursos para as zonas mais afetadas e otimizar o combate à praga. A utilização da MAD permitiu atenuar o efeito da perda de armadilhas na análise dos dados, fornecendo uma visão mais consistente da variação populacional ao longo do ano.
II.Métodos de Protecção e Controlo da Mosca do Mediterrâneo
Várias técnicas de controlo foram exploradas, incluindo a luta autocida com a libertação de machos estéreis produzidos pela Biofábrica da Madeira (Programa Madeira-Med). Testes de compatibilidade e competitividade sexual foram realizados na Ilha Terceira para otimizar a libertação (modelo uniposto vs. multiposto). Outras abordagens incluíram a utilização de “bait stations” com lufenurão para quimioesterilização. A protecção integrada, combinando medidas diretas e indiretas, foi destacada como a estratégia mais eficaz e sustentável, priorizando a limitação natural da população da Ceratitis capitata. Os resultados de Lopes et al. (2005a; 2005b; 2006) e Costa (2007) são referenciados como fundamentais para a compreensão da infestação e desenvolvimento de estratégias de combate.
III.Modelagem da Dinâmica Populacional e Impacto Climático
Para prever a dinâmica populacional da Ceratitis capitata, modelos matemáticos foram utilizados, considerando fatores climáticos como temperatura, humidade relativa, precipitação e insolação. Análises de correlação revelaram uma forte influência da temperatura (90% para fêmeas e 75% para machos) e uma influência menor da humidade relativa. O impacto da precipitação e insolação foi menos significativo. O modelo resultante, validado com dados de 13 meses e 274 armadilhas, fornece uma estimativa do risco de infestação na Ilha Terceira, mas considera apenas variáveis climáticas globais, sem considerar microclimas locais.
1. Modelos Matemáticos para Previsão da Dinâmica Populacional
O estudo utilizou modelos matemáticos para sintetizar a complexidade das inter-relações entre os componentes do sistema, permitindo prever as respostas inerentes à manipulação desses componentes. Apesar da limitação inicial de informação, os modelos, considerados aproximações grosseiras da realidade, permitiram traduzir as concepções do observador quanto às inter-relações existentes entre os componentes do sistema. Esses modelos podem ser progressivamente melhorados através de estudos de validação e investigações futuras, colmatando lacunas de conhecimento. A proteção integrada, definida por Amaro (2003) e Aguiar et al. (2005), é apresentada como uma modalidade de proteção que considera a estimativa de risco, níveis económicos de ataque e modelos de desenvolvimento dos inimigos das culturas, priorizando medidas indirectas de luta, como a limitação natural e outros mecanismos de regulação natural, recorrendo-se aos métodos diretos apenas quando indispensável.
2. Influência de Fatores Climáticos no Ciclo de Vida de Ceratitis capitata
Para entender a influência de fatores climáticos no ciclo de vida da Ceratitis capitata, o estudo analisou a correlação entre a Captura Média por Armadilha Dia (MAD) e variáveis climáticas, como temperatura, humidade relativa, precipitação e insolação. A temperatura mostrou-se o fator com maior influência, com uma correlação de 90% para fêmeas e 75% para machos, indicando uma forte dependência da atividade das fêmeas em relação à temperatura. A humidade relativa, embora geralmente favorável (ou ótima) na Ilha Terceira, apresentou correlação mais fraca com a MAD, sugerindo uma menor influência nas variações da população. A precipitação mostrou uma correlação muito fraca (21%), enquanto a insolação, analisada isoladamente e em relação à precipitação, apresentou correlações complexas, necessitando de análises mais aprofundadas para determinar sua influência real no ciclo de vida da praga. A influência do vento, considerando a velocidade média e máxima, foi também analisada para avaliar sua possível participação na regulação da temperatura e no ciclo de vida da praga, particularmente em relação à MAD das fêmeas.
3. Desenvolvimento e Validação do Modelo de Risco
Com base nos dados recolhidos, um modelo de risco foi desenvolvido para a Ilha Terceira, prevendo a presença de adultos de C. capitata com base em fatores climáticos. A validação do modelo, utilizando um conjunto de dados de 13 meses obtidos de 274 armadilhas, resultou em uma correlação elevada (90%), embora com tendência a superestimar os valores observados em 25%. Apesar da boa correlação, o modelo apresenta limitações, pois foi desenvolvido com dados da Ilha Terceira como um todo, diluindo o efeito de microclimas associados a depressões geográficas. Considera apenas o risco de presença de adultos, não levando em conta a complexidade da dinâmica populacional em diferentes microambientes. O estudo destaca a necessidade de subdividir os dados em diferentes secções da Ilha Terceira para melhorar a precisão do modelo e sua aplicação em locais específicos. A consideração do raio de dispersão da mosca, tanto em zonas rurais quanto urbanas, reforça a necessidade de medidas anuais de limitação populacional em todas as áreas, incluindo quintais e pomares abandonados.
IV.Resultados e Discussão Dispersão e Modelagem de Risco
A análise dos dados de captura revelou um pico populacional em outubro. A Captura Média por Armadilha Dia (MAD) foi utilizada para minimizar erros relacionados com a perda de armadilhas. Os resultados mostraram a mobilidade significativa dos adultos, inclusive ultrapassando barreiras de altitude. O modelo de risco desenvolvido prevê a presença de adultos de Ceratitis capitata, considerando fatores climáticos. A importância da consideração de áreas urbanas adjacentes, e até mesmo quintais com árvores frutíferas, na gestão da população foi enfatizada.
1. Pico de Capturas e Dinâmica Populacional
A análise dos dados de captura, utilizando a Captura Média por Armadilha Dia (MAD), revelou um pico anual sistemático de capturas de adultos de Ceratitis capitata em outubro, nos anos de 2006 e 2007, embora com intensidades diferentes. A dinâmica populacional mostrou-se semelhante entre os anos, com aumento das capturas de maio a outubro e decréscimo acentuado de outubro a fevereiro/março do ano seguinte. A observação deste pico sazonal consistente, apesar de variações na magnitude, contribui para uma melhor compreensão do ciclo de vida da mosca-do-mediterrâneo e auxilia na previsão de sua atividade. A identificação de focos com alta densidade populacional de fêmeas é crucial para estratégias de controle integrado, permitindo direcionar esforços e recursos para áreas-chave, aumentando a eficácia e reduzindo custos. A constatação de que os picos populacionais ocorrem após o máximo anual da temperatura média mensal, considerando o ciclo de vida de aproximadamente um mês (21 dias), sugere uma influência direta dos fatores climáticos no mês anterior às capturas.
2. Mobilidade da Ceratitis capitata e Interpretação dos Resultados
A redução na intensidade das capturas em determinados meses pode ser explicada pela mobilidade dos adultos, que se deslocam para outros locais. Essa mobilidade foi confirmada pela análise da sequência mensal das capturas, demonstrando a movimentação dos adultos na área de estudo ao longo do período analisado. Em relação aos testes de dispersão realizados em Biscoitos e Angra do Heroísmo, usando o modelo multiposto com círculos concêntricos de armadilhas, observou-se que, em Angra, as capturas ocorreram além de uma barreira natural altimétrica, demonstrando a capacidade de mobilidade e adaptação dos machos esterilizados. A análise da MAD, que considerou o desaparecimento ou desmontagem de algumas armadilhas, foi fundamental para a consistência dos resultados. A libertação de machos esterilizados demonstrou alta mobilidade em apenas 24 horas, ultrapassando uma barreira geográfica. Este dado é relevante para a consideração de estratégias de controlo que abranjam áreas mais amplas, considerando o raio de dispersão dos adultos, para que as medidas de combate sejam eficazes.
3. Modelagem de Risco e suas Limitações
O modelo de risco desenvolvido, baseado em dados de 274 armadilhas distribuídas de 0 a 200 metros de altitude na Ilha Terceira, apresenta correlação significativa entre a MAD e fatores climáticos. Embora o modelo tenha sido validado, apresentando uma correlação de 90% para fêmeas (temperaturas do mês anterior) e 75% para machos, ele tem limitações. O modelo, sendo uma aproximação grosseira da realidade, não considera a influência de microclimas locais. A precisão do modelo é afetada pela variabilidade nos dados e pela sua escala, abrangendo a Ilha Terceira como um todo. A consideração do raio de dispersão do adulto de Ceratitis capitata, tanto em zonas rurais como urbanas, enfatiza a necessidade de medidas de controlo anuais, não apenas nas áreas de produção, mas também nas zonas urbanas adjacentes e em quintais com árvores frutíferas, para evitar a perda de eficácia do controlo.
V.Conclusão e Perspectivas Futuras
O estudo concluiu que o controlo integrado de pragas, utilizando métodos como a luta autocida (com machos estéreis) e estações quimioesterilizantes, é mais eficaz e sustentável que os métodos químicos tradicionais. Como perspectivas futuras, sugere-se a validação mais ampla do modelo de risco, a sua subdivisão em zonas específicas da Ilha Terceira e um estudo mais aprofundado da infestação em plantas infestantes produtoras de frutos para a compreensão completa da dispersão da mosca-do-Mediterrâneo.
1. Conclusões sobre o Controle da Ceratitis capitata
O estudo conclui que o uso de meios biotécnicos, como a libertação de machos estéreis e o uso de estações quimioesterilizantes, é fundamental para implementar uma proteção integrada contra pragas, ao contrário dos métodos tradicionais baseados apenas em produtos químicos. O recurso a métodos biotécnicos permite a concretização do objetivo de implementar uma proteção integrada contra pragas na Ilha Terceira. Campanhas de combate utilizando a luta autocida, com a libertação de machos estéreis, ou estações quimioesterilizantes, são consideradas a forma mais eficaz de se conseguir o objetivo de controlar a população da mosca-do-Mediterrâneo. O conhecimento da gravidade da infestação, obtido pelos projetos Interfruta I e II, resultou na criação de uma lista de potenciais hospedeiros e suas flutuações de infestação ao longo do ano. A inclusão de hospedeiros sem importância económica na lista é crucial, pois estes permitem a sobrevivência da praga e a formação de corredores ecológicos que facilitam a dispersão. Este conhecimento é uma ferramenta importante para a tomada de decisões no combate à praga.
2. Perspectivas Futuras para o Controlo e Monitorização
Como perspectivas futuras, o estudo sugere a realização de trabalhos adicionais para testar a fiabilidade do modelo de risco desenvolvido. Apesar do sucesso na validação do modelo utilizando dados de 13 meses, uma análise mais extensa é necessária para garantir sua confiabilidade. O modelo, atualmente direcionado à Ilha Terceira como um todo, deve ser subdividido em diferentes zonas para uma maior adequação às condições locais, considerando microclimas. A recolha de frutos de plantas infestantes é proposta para determinar possíveis infestações de Ceratitis capitata, complementando o conhecimento sobre os hospedeiros da praga. Finalmente, considerando os mapas de localização dos focos de infestação e alta densidade de fêmeas adultas, e a possibilidade de implementação da luta autocida na Ilha Terceira, sugere-se a realização de trabalhos de limitação nestes locais utilizando machos esterilizados produzidos na Biofábrica da Madeira, para reduzir a densidade populacional selvagem.
