
Glutationa em Crassostrea gigas
Informações do documento
Autor | Gabriel Delapedra |
instructor | Dr. Rafael Trevisan (Pós-doutorando do Programa de Pós-Graduação em Aquicultura e Recursos Pesqueiros, Centro de Ciências Agrárias – UFSC) |
Escola | Universidade Federal de Santa Catarina |
Curso | Ciências Biológicas |
Tipo de documento | Trabalho de Conclusão de Curso |
Local | Florianópolis |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 1.10 MB |
Resumo
I.Objetivo e Metodologia Estudo do Sistema Antioxidante em Ostras Crassostrea gigas Expostas a Compostos Eletrofílicos
Este trabalho investiga a resposta do sistema antioxidante de ostras Crassostrea gigas a compostos eletrofílicos, focando em dois compostos: 1-cloro-2,4-dinitrobenzeno (CDNB) e N-etilmaleimida (NEM). A pesquisa utilizou biomarcadores como níveis de glutationa (GSH), atividade das enzimas glutationa S-transferase (GST), glutationa redutase (GR) e tioredoxina redutase (TrxR), e níveis de peroxidação lipídica (TBARS) para avaliar o estresse oxidativo em dois tecidos principais: as brânquias e a glândula digestiva. Os experimentos incluíram exposição via água do mar e injeção intramuscular de NEM para comparar vias de exposição e avaliar o papel da brânquia como barreira inicial.
1. Organismos de Estudo e Compostos Eletrofílicos
O estudo utilizou ostras do Pacífico, Crassostrea gigas, como modelo para investigar a resposta do sistema antioxidante a compostos eletrofílicos. O foco principal recaiu sobre a capacidade de dois compostos, o 1-cloro-2,4-dinitrobenzeno (CDNB) e a N-etilmaleimida (NEM), em modular parâmetros relacionados ao sistema antioxidante e à biotransformação de xenobióticos de fase II. A escolha da Crassostrea gigas se justifica pelo seu rápido crescimento e ampla tolerância às condições ambientais, características que a tornam uma espécie preferencial para o cultivo em diversas regiões do mundo (FAO, 2014). A seleção destes dois compostos eletrofílicos permitiu comparar seus padrões de alteração nos níveis de GSH entre brânquias e glândula digestiva. O CDNB é conhecido por sua capacidade de promover distúrbios no sistema antioxidante, enquanto a NEM possui alta reatividade com tióis, alta solubilidade em água e atravessa facilmente membranas biológicas (GIBON et al., 2010), tornando-a ideal para estimar a entrada do composto nos tecidos.
2. Tecidos Alvo e Parâmetros Bioquímicos
As brânquias e a glândula digestiva das ostras foram selecionadas como tecidos alvo devido à sua importância fisiológica e potencial exposição aos contaminantes presentes na água. A escolha destes tecidos permitiu investigar se a exposição a compostos eletrofílicos via água do mar afeta os níveis de glutationa reduzida (GSH), glutationa total (GSH-t) e a atividade das enzimas-chave do sistema antioxidante e de biotransformação, incluindo a glutationa S-transferase (GST), a glutationa redutase (GR), a tioredoxina redutase (TrxR) e a γ-glutamil transpeptidase (GGT). Os níveis de peroxidação lipídica (TBARS) também foram avaliados como indicador de danos oxidativos causados pelo estresse oxidativo. A metodologia incluiu a exposição das ostras ao CDNB via água do mar por até 24 horas e a comparação dos efeitos com a NEM, utilizando-se ainda um delineamento experimental adicional com injeção intramuscular de NEM para analisar o papel da brânquia como barreira de absorção.
3. Delineamento Experimental e Análise Estatística
O estudo utilizou um delineamento experimental que incluiu a exposição das ostras C. gigas a diferentes concentrações dos compostos eletrofílicos. A exposição ao CDNB foi realizada adicionando-o à água do mar, mantendo as ostras em contato com o composto por diferentes períodos (0, 4, 10 e 24 horas), permitindo analisar a cinética de resposta antioxidante. Para a NEM, além da exposição via água, um segundo experimento utilizou a injeção intramuscular no músculo adutor, visando contornar a brânquia como primeira barreira de absorção e avaliar o possível metabolismo de GSH na glândula digestiva. O número total de animais utilizados foi de 110, com controle de variáveis como temperatura (18-20°C) e ciclo de luz (12/12 horas). Para a análise dos resultados, os dados foram normalizados em relação ao grupo controle para cada experimento e posteriormente analisados utilizando os softwares Statistica® e GraphPad Prism 5.0. A normalidade dos dados foi verificada pelo teste de Shapiro-Wilk, sendo utilizados ANOVA de uma via, seguido do teste post hoc de Duncan ou o teste de Kruskal-Wallis, conforme a necessidade.
II.Resultados Brânquias como Barreira Contra o Estresse Oxidativo
Os resultados demonstram um rápido e significativo consumo de GSH nas brânquias após exposição ao CDNB, com inibição das enzimas GR e TrxR. Ao contrário, a glândula digestiva mostrou-se menos afetada. A atividade da GST aumentou nas brânquias, indicando uma resposta de biotransformação. Experimentos com NEM corroboraram a importância das brânquias como primeira linha de defesa, com depleção de GSH tanto na via ambiental quanto na sistêmica (injeção). A glândula digestiva também apresentou depleção de GSH apenas na exposição sistêmica, indicando um papel secundário neste tecido na neutralização de agentes eletrofílicos. A peroxidação lipídica (TBARS) não se alterou significativamente, exceto em exposição prolongada a CDNB, onde houve mortalidade significativa (33% após 96h).
1. Resposta das Brânquias ao CDNB Depleção de GSH e Inibição Enzimática
A exposição das ostras Crassostrea gigas ao composto eletrofílico 1-cloro-2,4-dinitrobenzeno (CDNB) resultou em uma rápida e significativa diminuição nos níveis de glutationa total (GSH-t) nas brânquias. Observou-se uma redução de aproximadamente 60% após 4 horas de exposição, aumentando para cerca de 79% após 10 horas e atingindo 87% após 24 horas. Paralelamente à depleção de GSH, houve uma diminuição progressiva na atividade das enzimas antioxidantes glutationa redutase (GR) e tioredoxina redutase (TrxR), com inibição de 50-60% após 24 horas. Concomitantemente, a atividade da enzima de biotransformação glutationa S-transferase (GST) apresentou um aumento rápido de 75% ao final do tratamento. Em contraste, a enzima γ-glutamil transpeptidase (GGT) e os níveis de peroxidação lipídica (TBARS) não mostraram alterações significativas durante o período de exposição. Esses achados indicam um impacto direto do CDNB no sistema antioxidante das brânquias, comprometendo sua capacidade de defesa contra o estresse oxidativo. A exposição contínua ao CDNB por 96 horas levou à indução de mortalidade, com 17% após 72 horas e 33% após 96 horas, reforçando o efeito deletério do composto.
2. Resposta das Brânquias e Glândula Digestiva ao NEM Papel da Brânquia como Barreira
Para comparar o padrão de resposta ao estresse oxidativo induzido por compostos eletrofílicos, um experimento adicional foi realizado utilizando N-etilmaleimida (NEM). Na exposição via água do mar, a NEM causou uma diminuição de aproximadamente 70% nos níveis de GSH nas brânquias, chegando a 80% na maior concentração. Para investigar se a glândula digestiva poderia metabolizar GSH na ausência da brânquia como barreira inicial, a NEM foi injetada no músculo adutor. Neste caso, além da expressiva diminuição de GSH nas brânquias (~52%, atingindo ~98% na maior concentração), observou-se também uma redução nos níveis de GSH-t na glândula digestiva nos grupos de maior concentração (aproximadamente 33% e 90%). Em conjunto, os resultados sugerem que as brânquias desempenham um papel crucial na proteção das ostras contra compostos eletrofílicos, atuando como uma barreira inicial de metabolização dependente de GSH, minimizando o impacto em outros órgãos. A glândula digestiva parece ter um papel secundário na detoxificação apenas quando a barreira inicial das brânquias é comprometida.
III.Discussão Mecanismos de Defesa e Implicações Ambientais
A pesquisa demonstra que as brânquias de C. gigas desempenham um papel crucial na proteção contra agentes eletrofílicos, atuando como uma barreira inicial de biotransformação via sistema GST/GSH. A rápida resposta da GST sugere uma indução da transcrição gênica. A inibição de GR e TrxR pelo CDNB evidencia a importância do equilíbrio enzimático para a manutenção da homeostase celular. Os resultados destacam a importância de monitorar a qualidade da água em áreas de cultivo de ostras em Florianópolis, especificamente na região do Ribeirão da Ilha, maior produtora de Crassostrea gigas em Santa Catarina (EPAGRI, 2014). A exposição prolongada a poluentes pode sobrecarregar o sistema de defesa das ostras, levando a danos e mortalidade.
1. Brânquias como Barreira Metabólica Inicial Papel da Glutationa e Enzimas
Os resultados demonstram claramente o papel das brânquias como principal sítio de ação dos compostos eletrofílicos CDNB e NEM, atuando como uma barreira inicial contra o estresse oxidativo. A rápida depleção de glutationa (GSH) nas brânquias, especialmente após exposição ao CDNB (redução de até 87% após 24 horas), indica o envolvimento direto da GSH na conjugação dos compostos através da ação da glutationa S-transferase (GST). O aumento na atividade da GST nas brânquias sugere uma eficiente indução da transcrição gênica em resposta ao estresse, um mecanismo de defesa importante. A inibição concomitante das enzimas glutationa redutase (GR) e tioredoxina redutase (TrxR) nas brânquias, em contraste com a ausência de alterações na glândula digestiva, reforça a hipótese de uma metabolização inicial e eficiente nas brânquias, protegendo outros órgãos. A ausência de alterações significativas nos níveis de peroxidação lipídica (TBARS) em exposições curtas indica que os mecanismos de defesa antioxidante nas brânquias são eficientes em lidar com o estresse oxidativo induzido pelo CDNB em curto prazo. No entanto, a mortalidade observada em exposições prolongadas (33% após 96 horas com CDNB) indica que a capacidade da brânquia em atuar como barreira pode ser sobrecarregada em exposições crônicas.
2. Comparação entre CDNB e NEM Vias de Exposição e Resposta Tecidual
A comparação entre os efeitos do CDNB e do NEM evidencia a importância da via de exposição na resposta tecidual. A exposição via água do mar levou à diminuição dos níveis de GSH principalmente nas brânquias, tanto para o CDNB quanto para o NEM, confirmando o papel central deste tecido na resposta inicial ao estresse oxidativo. Porém, a injeção intramuscular de NEM, que contorna a barreira inicial das brânquias, revelou uma diminuição nos níveis de GSH-t tanto nas brânquias quanto, em menor grau, na glândula digestiva. Este dado demonstra que, embora as brânquias sejam o principal sítio de metabolização e detoxificação, a glândula digestiva também pode participar deste processo, mas de forma secundária, quando a capacidade de defesa das brânquias está comprometida ou quando a exposição ocorre por via sistêmica. Esses resultados destacam a complexidade das defesas antioxidantes nos bivalves e a importância de considerar a via de exposição na avaliação dos riscos ambientais.
3. Implicações Ambientais e Necessidade de Estudos Complementares
Os resultados deste estudo possuem importantes implicações para a compreensão dos impactos de poluentes ambientais em ecossistemas aquáticos e na saúde de organismos como as ostras Crassostrea gigas, principalmente em regiões de cultivo como Florianópolis, SC. A identificação das brânquias como um tecido altamente sensível à exposição a compostos eletrofílicos destaca a necessidade de monitorar a qualidade da água e o nível de contaminação por substâncias com potencial pró-oxidante. A pesquisa também destaca a necessidade de estudos complementares para investigar o metabolismo dos conjugados de glutationa pela via do ácido mercaptúrico em diferentes tecidos (brânquias, glândula digestiva e hemolinfa), para uma melhor compreensão do sistema de defesa em bivalves e dos efeitos a longo prazo de exposição crônica a poluentes. A análise de outros parâmetros e a investigação do papel da via Nrf2 em bivalves são cruciais para um entendimento mais completo da resposta antioxidante frente ao estresse oxidativo.
IV.Informações Adicionais
A pesquisa foi realizada com ostras C. gigas adultas (110 animais), obtidas na Fazenda Marinha Atlântico Sul, localizada na Costeira do Ribeirão da Ilha, Florianópolis/SC. Os dados foram analisados utilizando o software Statistica® e GraphPad Prism 5.0, empregando ANOVA de uma via e testes post hoc (Duncan e Kruskal-Wallis).
1. Origem das Ostras e Condições Experimentais
As 110 ostras Crassostrea gigas utilizadas neste estudo, com tamanho entre 7 e 12 cm e ambos os sexos, foram obtidas na Fazenda Marinha Atlântico Sul, localizada na Costeira do Ribeirão da Ilha, Florianópolis, Santa Catarina. Antes dos experimentos, as ostras passaram por um período mínimo de aclimatação de 7 dias em aquários com 1 litro de água do mar filtrada e esterilizada por radiação ultravioleta por animal, mantendo salinidade entre 32 e 35‰. O ambiente de aclimatação contou com um ciclo de luz de 12 horas claro/escuro e temperatura controlada entre 18-20°C. As ostras foram alimentadas com ração à base de fitoplâncton comercial (SeraCoraliquid) a cada dois dias, e a água dos aquários trocada com a mesma frequência. Esta fase de aclimatação foi crucial para garantir a saúde e o bem-estar dos animais antes da exposição aos compostos eletrofílicos, minimizando o impacto de fatores externos que poderiam interferir nos resultados.
2. Métodos de Análise Bioquímica e Estatística
A atividade enzimática da glutationa redutase (GR) foi determinada através da mensuração do consumo de NADPH a 340nm, utilizando um ensaio enzimático realizado por 5 minutos em meio de reação com KPi 100 mM, EDTA 1 mM, pH 7,0, contendo 0,2 mM de NADPH e 1 mM de GSSG como substrato. Uma leitura sem substrato foi realizada para correção de reações inespecíficas. Os níveis de produtos finais da peroxidação lipídica (TBARS) foram medidos por um método modificado que usa substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBA), medindo-se a absorbância a 532 nm. Os dados obtidos foram normalizados em relação ao grupo controle (100%) para cada experimento. A normalidade dos dados foi testada pelo teste de Shapiro-Wilk, e as análises estatísticas foram realizadas utilizando os softwares Statistica® e GraphPad Prism 5.0, por meio de ANOVA de uma via seguida do teste post hoc de Duncan ou pelo teste de Kruskal-Wallis, conforme a necessidade. A escolha dos testes estatísticos apropriados garantiu a confiabilidade da análise e interpretação dos resultados.