Nutrientes em Bovinos de Leite

O principal objetivo da pesquisa foi estimar o valor de NDT (Nutrientes Digestíveis Totais) em alimentos utilizados na nutrição de bovinos leiteiros em propriedades que seguem princípios agroecológicos. A escolha por essa métrica, NDT, se justifica pela sua importância na avaliação do valor energético dos alimentos para ruminantes e na formulação de dietas balanceadas. A pesquisa buscou preencher uma lacuna de informações sobre a composição nutricional de alimentos utilizados em sistemas agroecológicos, reconhecendo que a falta dessas informações pode levar a déficits nutricionais e afetar o desempenho animal, principalmente em relação à produção de leite. O foco na agroecologia se justifica pelo crescimento da demanda por produtos de origem orgânica no mercado consumidor e pela importância da agricultura familiar na produção leiteira, buscando reduzir os custos e impactos ambientais.

A coleta de dados ocorreu em dez propriedades leiteiras localizadas no Oeste de Santa Catarina, especificamente nos municípios de Jupiá, Novo Horizonte e São Domingos. Esse foco geográfico indica uma intenção de avaliar as particularidades da região em relação à produção e composição dos alimentos. As coletas foram realizadas em duas etapas distintas: uma em janeiro e outra em julho de 2015, representando as estações de inverno e verão, respectivamente. Essa escolha temporal permite a análise da variação sazonal na composição dos alimentos e sua influência nos valores de NDT. A seleção das propriedades provavelmente considerou a prática de sistemas de produção agroecológicos ou orgânicos, uma vez que o estudo focou em avaliar a alimentação de bovinos nesses sistemas.

Uma ampla variedade de alimentos foi coletada e analisada, incluindo diferentes tipos de pastagens (aveia, azevém, tifton 85, piatã, papuã, paspalum, quicuio, e pastagens em consórcio), silagens (milho e sorgo), concentrados, forragem de milho, MDPS (provavelmente um tipo de concentrado, precisando de maior contextualização para melhor interpretação), abóbora, mandioca e feno de azevém. A diversidade de alimentos estudados indica uma abrangência significativa na pesquisa, buscando cobrir as principais fontes de alimentação utilizadas por produtores de leite em sistemas agroecológicos. A inclusão de alimentos não tradicionais, como abóbora e mandioca, demonstra a busca por alternativas na alimentação animal, potencialmente mais acessíveis e com menor impacto ambiental. A inclusão de silagens de milho e sorgo representa a análise de alimentos importantes na alimentação de bovinos.

As análises incluíram a determinação da composição bromatológica dos alimentos, com foco em matéria seca (MS), proteína bruta (PB), cinzas, fibra em detergente neutro (FDN) e fibra em detergente ácido (FDA). A metodologia empregada para a análise de FDN e FDA seguiu a descrita por Van Soest et al. (1991). Além disso, foi determinada a digestibilidade in vitro da MS e da matéria orgânica (MO). A estimativa do NDT foi realizada utilizando as equações propostas por Cappelle et al. (2001), permitindo a comparação entre o NDT calculado e os valores encontrados na literatura. A utilização de gráficos permitiu uma visualização clara das comparações entre os resultados obtidos e os valores de referência. O método de digestibilidade in vitro, embora simplificado em relação ao in vivo, possibilita a análise de um número maior de amostras simultaneamente, o que é importante dado a diversidade de alimentos analisados.

O texto inicia destacando o aumento significativo da procura por alimentos agroecológicos nos últimos dez anos. No estado de Santa Catarina, a produção de leite é fortemente caracterizada pela agricultura familiar. Essa agricultura familiar busca diminuir os custos de produção por meio da utilização de recursos endógenos, ou seja, recursos disponíveis na própria propriedade, principalmente para a alimentação dos animais. Entretanto, a escassez de informações sobre a composição nutricional desses alimentos resulta muitas vezes em déficits na dieta dos animais, comprometendo seu desempenho. O IBGE (2006) é citado, informando que cerca de 85% das propriedades rurais brasileiras são de base familiar, com a bovinocultura de leite presente em grande parte delas, sendo responsável por 58% da produção nacional de leite. Rosa (2012) acrescenta que, para muitas famílias, a produção de leite é a principal fonte de renda, enquanto em outras atua como complemento, garantindo uma renda mensal e um suporte social.

A pesquisa aborda o modelo de criação agroecológica, que vem ganhando espaço na cadeia produtiva devido à sua preocupação com a preservação ambiental e a saúde do produtor (Ferreira, 2004). Apesar do potencial para exportação, esse sistema ainda é pouco explorado internacionalmente devido à falta de políticas públicas e normas institucionais (Bell, 2009). O texto destaca a agricultura familiar como um sistema com grande diversidade na disponibilidade e uso de recursos (terra, trabalho e capital), e a agroecologia como um esforço para sistematizar a produção em um modelo tecnológico abrangente, socialmente justo, economicamente viável e ecologicamente sustentável (Carmo, 2008). A Instrução Normativa de 17 de junho de 2014, do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), estabelece normas para a produção orgânica animal, incluindo a utilização prioritária de alimentos da própria unidade de produção ou de outras propriedades orgânicas. O uso de alimentos não-orgânicos é limitado a 15% da matéria seca da dieta, e o sistema de pastagem deve constituir ao menos 60% da matéria seca da dieta (50% para animais em lactação nos três primeiros meses).

Honorato (2011) aponta os principais desafios na transição para sistemas agroecológicos: a produção de alimentos em propriedades de pequeno porte e a dificuldade de aquisição de alimentos em períodos críticos do ano. A produção de cereais orgânicos (milho, soja, trigo) para alimentação animal é pouco competitiva devido aos custos da certificação. Uma alternativa apontada é o uso de alimentos não convencionais produzidos na propriedade, visando diversificação, rotação de culturas, fixação de nitrogênio, gestão do nitrogênio e carbono, e melhoria da estrutura do solo (Soares et al., 2011). A baixa produtividade de pastagens no Brasil é mencionada como uma das causas da baixa rentabilidade e competitividade dos sistemas de produção animal (Barbosa et al., 2007), enfatizando a necessidade de estudos sobre a estacionalidade da produção e o valor nutritivo das forrageiras. Conhecer o valor nutricional dos alimentos é fundamental para a formulação de dietas precisas (Watanabe et al., 2010).

A seção destaca a importância crucial da avaliação dos alimentos na nutrição de ruminantes, especialmente bovinos leiteiros. A alimentação representa o maior custo em sistemas de produção, tornando a avaliação nutricional uma ferramenta imprescindível para otimizar o desempenho animal, minimizar custos e reduzir impactos ambientais. Conhecer o valor nutricional dos alimentos é fundamental para vacas em lactação, pois dietas deficientes em energia reduzem a produção de leite, causam perda de peso, problemas reprodutivos e diminuem a resistência a doenças. O excesso de energia, por outro lado, aumenta o custo da alimentação, leva ao acúmulo de gordura e causa problemas metabólicos. O método proposto por Van Soest (1991) para o fracionamento dos componentes fibrosos é mencionado como um avanço na estimativa do valor nutritivo das forrageiras, permitindo maior precisão. A concentração de FDN (Fibra em Detergente Neutro) na dieta de ruminantes é considerada um fator limitante ao consumo devido à sua lenta degradação e reduzida taxa de passagem pelo rúmen (Carvalho et al., 2007).

A técnica de digestibilidade in vitro, proposta por Tilley & Terry (1963), é descrita como um método amplamente utilizado por apresentar vantagens como rapidez e a possibilidade de avaliar uma grande quantidade de amostras simultaneamente. O método envolve dois estágios: fermentação anaeróbica em solução tampão com fluido ruminal (48 horas) e digestão ácida com pepsina (48 horas). Apesar das vantagens, a digestibilidade in vivo é mencionada, mostrando que a acurácia dos resultados in vitro é restrita ao nível de consumo, tipo de animal e alimento utilizado. A digestibilidade in vivo, por sua vez, demanda mais tempo, tem custos mais altos e permite avaliar um número limitado de alimentos (Berchielli, 2011). A escolha da espécie forrageira, a adubação das pastagens e a melhoria do manejo são fatores que influenciam a produtividade e a persistência dos pastos (Lima et al., 2003).

A seção discute a variabilidade dos valores nutricionais dos alimentos encontrados em tabelas, influenciada por fatores como tipo de solo, clima, chuva e ponto de colheita. Essa variabilidade torna o uso de valores tabelados inseguro para a indústria, sendo que submeter todas as matérias-primas a ensaios in vivo seria muito oneroso. Como alternativa, o estudo propõe o uso de equações de predição baseadas em análises químicas simples, como teores de proteína, fibra e extrato etéreo (Nascimento et al., 2011). A equação proposta por Cappelle et al. (2001) para a obtenção do NDT (% de NDT = 3,71095 - 0,129014 FDN + 1,02278 MOD) é utilizada no estudo, mostrando que é possível estimar valores de NDT com precisão por meio de análises laboratoriais mais simples e menos onerosas que os experimentos de digestibilidade in vivo (Costa et al., 2006). Zonta (2004) reforça a importância dessas equações de predição devido à dificuldade de realizar bioensaios e à escassez de calorímetros em laboratórios.

Uma das principais conclusões do estudo foi a grande variação observada na composição bromatológica dos alimentos analisados. Essa variação foi constatada tanto entre diferentes amostras do mesmo alimento quanto em comparação com dados da literatura. Essa alta variabilidade entre amostras reforça a necessidade de análises locais para a formulação de dietas precisas para bovinos leiteiros, uma vez que os dados tabelados, na maioria das vezes, não refletem a composição do alimento disponível nas propriedades. A variação na composição bromatológica pode ser influenciada por diversos fatores, incluindo as condições de manejo, clima, solo e estádio de desenvolvimento da planta. A grande diferença encontrada destaca a necessidade de uma avaliação criteriosa dos alimentos em cada propriedade, visando garantir a adequação nutricional dos animais. A análise da composição bromatológica é crucial para entender os teores de nutrientes e ajustar as dietas, assegurando o desempenho animal ótimo e a eficiência da produção leiteira.

A análise do NDT (Nutrientes Digestíveis Totais) em diferentes alimentos mostrou variações consideráveis. Na silagem de milho, por exemplo, a variação do NDT está relacionada à porcentagem de grãos, com maior porcentagem de grãos levando a menores teores de FDN e FDA e, consequentemente, a maior digestibilidade e maior valor de NDT. Em silagens de sorgo, os valores de NDT são, em média, inferiores aos de silagem de milho, possivelmente devido à menor porcentagem de grãos (Demarchi et al., 1995; Neumann et al., 2004; Taylor, 2008). O azevém apresentou valores de NDT superiores a 80% em algumas amostras, o que foi associado a maior teor de proteína bruta (PB), mostrando uma relação entre a composição nutricional e o NDT. O Tifton 85, segundo Aguiar et al. (2006), apresentou menor valor de NDT na primavera, com média de 61,56%, podendo ser explorado ao longo do ano. As pastagens em consórcio mostraram variação no NDT, PB, FDN e FDA relacionada à idade de rebrota da forrageira (Oliveira et al., 2000).

O estudo incluiu a avaliação de alimentos alternativos, como abóbora e mandioca. A abóbora, por ser rica em água e energia e ter sabor adocicado, mostrou-se altamente digestível (Gomes et al., 2014), com valores de NDT superiores a 80%. A mandioca e seus resíduos foram considerados fontes alternativas ao milho, principalmente devido ao alto custo da terminação intensiva de animais (Prado et al., 2006). A pesquisa aponta que a literatura é escassa sobre o uso desses ingredientes alternativos in natura na dieta de bovinos de leite, indicando uma necessidade de mais pesquisas nessa área. O uso de feno de azevém como alternativa para épocas de escassez de forrageiras verdes também foi mencionado. Em resumo, a pesquisa ressalta a grande variabilidade encontrada na composição bromatológica dos alimentos, tanto entre diferentes alimentos quanto entre amostras do mesmo alimento e a necessidade de considerar essas variações na formulação de dietas para bovinos leiteiros em sistemas agroecológicos.