Os impactos socioeconômicos oriundos da instalação da UHE Itá para o município de Aratiba-RS

Impactos da UHE Itá na Agricultura de Aratiba

Informações do documento

Autor

Edenilson De Oliveira Thomé

Escola

Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) - Campus Erechim

Curso Agronomia
Tipo de documento Projeto de Pesquisa
Local Erechim
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 0.96 MB

Resumo

I.Impactos da Usina Hidrelétrica Itá em Aratiba RS Um Estudo de Caso

Este estudo de caso analisa os impactos socioeconômicos da construção da Usina Hidrelétrica Itá no município de Aratiba (RS), focando nas famílias de agricultores diretamente afetadas pelo reassentamento. A pesquisa investiga a indenização, a mudança na arrecadação municipal e as consequências para a agricultura local, considerando também o papel do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) na defesa dos direitos das populações atingidas. Mais de 30 anos após sua conclusão, a UHE Itá, localizada na bacia do Rio Uruguai, continua gerando impactos, tanto positivos quanto negativos, na vida dos moradores de Aratiba e municípios vizinhos. Foram afetadas 467 famílias em Aratiba, sendo este o município com maior número de núcleos rurais relocados. O estudo utilizou entrevistas com agricultores atingidos e não atingidos, prefeitos, representantes do MAB e da Emater, buscando compreender a complexa relação entre o desenvolvimento econômico proporcionado pela usina e os custos sociais e ambientais envolvidos.

1. Contextualização Histórica da Usina Hidrelétrica Itá

O estudo inicia com a contextualização histórica da implantação da Usina Hidrelétrica Itá, situada no município de Aratiba (RS), na região norte do Rio Grande do Sul. A construção, que se estendeu por mais de 30 anos, gerou impactos significativos na população local, principalmente nos agricultores. A pesquisa aborda o processo de inventário da potencialidade energética do Rio Uruguai, realizado no final da década de 1960, no contexto do chamado 'milagre econômico' brasileiro. A obra, apesar de planejada no contexto de expansão da infraestrutura e do setor elétrico, provocou incertezas e preocupações entre os moradores, que temiam pela perda de terras férteis e a falta de informações sobre o futuro. O estudo destaca a criação de movimentos representativos da população atingida, como a Comissão Regional de Atingidos por Barragens (CRAB), que evoluiu para o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), em resposta à construção de diversas hidrelétricas, incluindo as de Machadinho e Itá. A pesquisa também reconhece que problemas no setor elétrico na década de 80 e início de 90 dificultaram a continuidade de projetos de expansão. A metodologia incluiu entrevistas estruturadas com agricultores atingidos, representantes da população afetada e especialistas (Prefeitos entre 1996 e 2019, representantes do MAB, presidente do sindicato dos trabalhadores rurais, representante da Emater), além de bibliografia disponível, como os livros 'Itá: memória de uma usina' e 'Aratiba: sua saga, seu povo, sua história'. A pesquisa buscou compreender os impactos a longo prazo, uma vez que a obra afetou a vida dos moradores de maneira direta e indireta até os dias atuais. O município de Aratiba foi o mais atingido, com 467 famílias afetadas, algumas comunidades tendo até sua sede transferida, como a Linha Sarandi. A pesquisa apresenta uma caracterização qualitativa, baseada em entrevistas semiestruturadas, com o objetivo de obter uma visão profunda dos acontecimentos.

2. Negociações e Indenizações O Papel do MAB

A seção analisa o processo de negociação entre a população atingida e o consórcio responsável pela construção da UHE Itá. Inicialmente, a Eletrosul definia os atingidos apenas como proprietários com terras diretamente afetadas pela água, diferentemente do que ocorreu na prática devido a mobilização popular e ação do MAB. A pesquisa discute as dificuldades encontradas na obtenção de informações precisas sobre as etapas iniciais do projeto, devido à falta de documentação oficial e à dificuldade de acesso a lideranças da época. A partir da década de 1990, as entrevistas com lideranças e agricultores revelam que o governo municipal se posicionou a favor da construção da usina, enquanto a população rural recebeu a notícia com tensão e descrença. O estudo descreve a experiência de invasão territorial, a falta de clareza na comunicação sobre os limites da inundação e a luta por indenizações justas. Aproximadamente 90% dos proprietários optaram pela indenização em forma de carta de crédito, existindo também a opção de reassentamento para aqueles com propriedades inviabilizadas. A pesquisa ressalta a importância do MAB na garantia de que todos, incluindo agregados e posseiros, fossem tratados de forma igualitária no processo de indenização. A relação entre o consórcio e os representantes da população foi, em momentos, tensa, com relatos de invasões à área da obra e retenção de técnicos durante as negociações. O processo de negociação foi sequencial, comunidade por comunidade, garantindo que a primeira atingida estivesse plenamente indenizada antes do início das negociações com a seguinte. A transparência nas negociações e a busca por indenizações justas, que permitissem aos agricultores a compra de novas terras, são pontos destacados como importantes conquistas.

3. Impactos na Agricultura e Desenvolvimento Econômico

Esta parte detalha os impactos da UHE Itá na agricultura de Aratiba e a consequente alteração na arrecadação municipal. A perda de terras e o deslocamento de famílias foram os maiores impactos negativos para a agricultura, embora o estudo também aponte a possibilidade de melhora no padrão de vida para posseiros e agregados que se tornaram proprietários de terra. Dados do livro 'Aratiba: sua saga, seu povo, sua história' indicam que cerca de 3.200 famílias viviam na área atingida nos dois estados (SC e RS), e estima-se que 10% da população total dos municípios atingidos se deslocou. A redução da população rural em Aratiba é mencionada como possivelmente relacionada à instalação da UHE Itá, embora a pesquisa não consiga precisar esse dado por comunidade devido à falta de documentos. O estudo observa uma drástica redução na área cultivada de milho e feijão (74% e 84%, respectivamente, em 2013), possivelmente devido ao envelhecimento da população e à expansão de pomares e reflorestamento. O aumento da arrecadação municipal, resultante da construção da UHE, possibilitou investimentos em programas de incentivo à agricultura, incluindo a inseminação artificial de bovinos (Lei Municipal Nº 2.233/2005 e 3.389/2013), a avicultura de corte (Lei Municipal Nº 3.544/2011), a suinocultura (Lei Municipal Nº 3.108/2011), e a silagem (Lei Municipal Nº 3.802/2017). Em 2018/2019, a prefeitura investia em produção agroecológica e na implementação do cultivo de abacaxi. A Lei 13.360/2016, que regula a compensação financeira, é analisada, mostrando que os valores variam de acordo com a produção de energia, regulada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

II.O Processo de Implantação e as Negociações

A construção da UHE Itá, iniciada após estudos na década de 60, gerou incerteza e preocupação entre os moradores de Aratiba e outros municípios atingidos pelo lago (142km² afetando 11 municípios). A falta de informação inicial e a perda de terras férteis foram grandes fontes de conflito. A participação ativa do MAB e a pressão da população atingida foram cruciais para garantir indenizações justas e um processo de reassentamento mais equitativo, embora a relação com o Consórcio Itá tenha sido, em momentos, tensa. O estudo destaca a importância da transparência e da negociação comunitária para minimizar os impactos negativos do projeto. Cerca de 90% dos proprietários optaram por indenização simples (carta de crédito).

III.Impactos na Agricultura de Aratiba

A instalação da UHE Itá causou mudanças significativas na agricultura de Aratiba. Embora alguns agricultores tenham melhorado seu padrão de vida, houve também perdas significativas, incluindo a perda de terras e o rompimento de laços comunitários. O estudo observa uma redução na área cultivada de milho e feijão, atribuída ao envelhecimento da população rural e à expansão de pomares e reflorestamento. Por outro lado, o aumento da arrecadação municipal resultante da UHE Itá permitiu investimentos em programas de incentivo à agricultura, como a inseminação artificial de bovinos, a avicultura de corte e a suinocultura, além de iniciativas em agroecologia.

1. Perdas e Ganhos na Agricultura de Aratiba

A construção da UHE Itá gerou impactos complexos na agricultura de Aratiba. O estudo destaca a perda de terras e o deslocamento forçado como os principais impactos negativos. Dados do livro 'Aratiba: sua saga, seu povo, sua história' (Prefeitura Municipal, 2012) apontam que cerca de 3.200 famílias viviam na área afetada, e estima-se que 10% da população total dos municípios diretamente atingidos migrou para outras regiões. A pesquisa sugere uma correlação entre a instalação da UHE Itá e a diminuição da população rural, embora a ausência de documentos impeça a comprovação dessa relação por região dentro do município. Observa-se uma drástica redução na área cultivada de culturas como milho e feijão, com quedas de 74% e 84%, respectivamente, em 2013. Esse decréscimo é atribuído ao envelhecimento da população rural e à migração para áreas urbanas, além da expansão de pomares e reflorestamento. Apesar dos impactos negativos, o estudo reconhece ganhos para alguns: posseiros e agregados que antes não possuíam terras se tornaram proprietários, representando uma melhora no padrão de vida. A perda das terras e a necessidade de deslocamento são destacados como os principais impactos negativos, enquanto a aquisição de terras por parte de quem antes não as possuía representa um aspecto positivo.

2. Programas de Incentivo à Agricultura após a UHE Itá

Em resposta aos impactos negativos e com recursos oriundos do aumento na arrecadação municipal, a prefeitura de Aratiba implementou diversos programas de incentivo à agricultura. O estudo cita a Lei Municipal Nº 2.233/2005 (posteriormente revisada pela Lei Nº 3.389/2013), que subsidia 50% do custo da inseminação artificial de bovinos. Outras leis municipais criaram programas de incentivo à avicultura de corte (Lei Nº 3.544/2011), suinocultura (Lei Nº 3.108/2011), e serviços de silagem (Lei Nº 3.802/2017). Em 2018/2019, a prefeitura investia também em produção agroecológica e na implementação do cultivo de abacaxi, demonstrando uma estratégia de diversificação da produção agrícola. O estudo menciona restrições ao uso dos recursos provenientes da compensação financeira pela geração de energia (Lei Nº 7.990/89), proibindo o uso para pagamento de dívidas ou salários de funcionários, com fiscalização pelo Ministério Público Estadual ou Tribunal de Contas. A pesquisa destaca a importância da diversificação da arrecadação municipal e de investimentos contínuos para o desenvolvimento de Aratiba, mostrando que o aumento na arrecadação resultante da UHE Itá possibilitou a criação de programas que mitigaram parcialmente os impactos negativos na agricultura.

IV.Desenvolvimento Econômico e Investimentos em Aratiba

O aumento da arrecadação municipal após a instalação da UHE Itá possibilitou investimentos significativos em diversas áreas, além da agricultura. Houve investimentos em infraestrutura, educação (construção de escolas, bolsas universitárias), saúde (repasses para o hospital, ampliação de especialidades), e transporte (escolar e universitário). A Lei 13.360/2016 define um sistema de compensação financeira baseado na produção de energia, regulada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Apesar dos impactos positivos no desenvolvimento econômico, a pesquisa ressalta a necessidade de gestão transparente e eficiente dos recursos para garantir o bem-estar da população de Aratiba.

1. Aumento da Arrecadação e Investimentos em Infraestrutura

A construção da UHE Itá resultou em um considerável aumento na arrecadação municipal de Aratiba, permitindo ao governo investir em diversas áreas. O estudo destaca que, após a entrada em funcionamento da usina, a arrecadação municipal cresceu significativamente, possibilitando maior investimento público. A maior parte da receita adicional é proveniente da compensação financeira pela geração de energia, regulada pela Lei 13.360/2016 e pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Os valores da compensação financeira são calculados conforme a produção de energia efetivamente gerada, variando ao longo dos anos. Esse incremento permitiu a realização de melhorias na infraestrutura, tanto na área urbana quanto rural. É mencionada a pavimentação asfáltica de vias e a aquisição de veículos e maquinários para as secretarias municipais e setor de obras. A Lei 7.990/89 estabelece restrições ao uso desses recursos, proibindo o pagamento de dívidas e salários, com fiscalização pelo Ministério Público Estadual ou Tribunal de Contas. A diversificação da arrecadação municipal é apresentada como fundamental para garantir a continuidade dos investimentos e o desenvolvimento do município, indicando que os recursos da UHE Itá não são a única fonte, mas contribuíram significativamente para o desenvolvimento.

2. Investimentos em Educação Saúde e Cultura

O aumento na arrecadação também permitiu investimentos significativos nos setores de educação, saúde e cultura. No setor educacional, o município investe em escolas de educação infantil, ensino fundamental e médio, incluindo a construção de uma nova escola municipal de ensino fundamental no início dos anos 2000. A merenda escolar prioriza a aquisição de 30% dos produtos de produtores locais. O município oferece bolsas universitárias (Lei Municipal Nº 2.759/2009), subsidiando 35% da mensalidade do primeiro curso superior em instituições particulares, com um teto semestral de R$ 1.800,00, e também subsidia o transporte universitário. No setor de saúde, foram realizados repasses à Associação Comunitária Hospitalar de Aratiba (ACHA) para fortalecer o hospital municipal, além da ampliação de especialidades médicas, programas de concessão de exames e consultas, e subsídios para cirurgias. O transporte escolar é totalmente gratuito para alunos da zona rural. O incentivo à cultura também é citado, demonstrando uma aplicação diversificada dos recursos adicionais gerados pela UHE Itá. A pesquisa destaca a melhoria na qualidade de vida da população de Aratiba como resultado dos investimentos feitos com os recursos da usina, transformando um município predominantemente rural em um com proporções urbana e rural mais equilibradas.

V.Considerações Finais Legado da UHE Itá em Aratiba

A UHE Itá teve um impacto profundo e duradouro em Aratiba (RS). Embora tenha contribuído para o desenvolvimento econômico e melhoria da infraestrutura, o processo de construção gerou conflitos e impactos sociais e ambientais. O estudo conclui que, apesar dos impactos negativos, principalmente o reassentamento de famílias e a perda de terras, os impactos positivos, a longo prazo, superaram os negativos, melhorando a qualidade de vida da população, embora haja necessidade de atenção contínua aos aspectos sociais e ambientais. O estudo destaca a importância de considerar as experiências de atingidos por barragens em futuros projetos hidrelétricos.

1. Balanço Geral dos Impactos Positivos x Negativos

A construção da UHE Itá representou um marco histórico para Aratiba, com impactos socioeconômicos de longo alcance. O estudo conclui que, apesar dos impactos negativos, principalmente relacionados ao reassentamento da população rural e às perdas na agricultura, os impactos positivos a longo prazo superaram os negativos. A melhoria na qualidade de vida da população aratibense, tanto urbana quanto rural, é destacada como resultado do desenvolvimento econômico impulsionado pela usina. O aumento considerável na arrecadação municipal, devido aos royalties da geração de energia, possibilitou investimentos significativos em infraestrutura, educação, saúde e outros setores. O município, inicialmente predominantemente rural, passou a ter uma proporção mais equilibrada entre população urbana e rural, indicando um processo de transformação socioeconômica. A pesquisa enfatiza a importância da diversificação na arrecadação municipal para a manutenção dos investimentos e o desenvolvimento contínuo de Aratiba. A conclusão destaca a magnitude do empreendimento, que levou mais de 30 anos para ser concluído e afetou de diversas formas a população, demonstrando a necessidade de um planejamento estratégico e de uma gestão transparente dos recursos gerados pela usina.

2. Lições Aprendidas e Perspectivas Futuras

O estudo da UHE Itá em Aratiba oferece lições importantes para futuros empreendimentos de grande porte. O processo, que passou por momentos de incerteza e turbulência nas negociações, culminou em indenizações consideradas justas, destacando a importância da transparência e da participação da população afetada. A luta travada durante a construção da usina representou um marco para uma nova forma de negociação, mais justa e transparente, valorizando o ser humano e seu trabalho. No entanto, as perdas e ganhos para a agricultura demonstram a complexidade dos impactos, com a necessidade de políticas públicas que minimizem os efeitos negativos do reassentamento e promovam a sustentabilidade. A experiência de Aratiba demonstra a necessidade de considerar os impactos sociais e ambientais em projetos de grande escala, reconhecendo a importância de negociações equitativas e de uma participação efetiva da população afetada em todas as etapas do processo. A melhoria na qualidade de vida da população, embora significativa, não deve obscurecer a necessidade de uma gestão eficiente e transparente dos recursos gerados, buscando um desenvolvimento sustentável e inclusivo para toda a comunidade.