
Mídia, PNPS e Governo Dilma
Informações do documento
Autor | Edivane Tonato |
Escola | Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) |
Curso | Ciências Sociais |
Tipo de documento | Trabalho de conclusão de curso |
Local | Chapecó |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 1.46 MB |
Resumo
I.A Mídia Brasileira e a Política Nacional de Participação Social PNPS Uma Análise da Oposição
Este estudo investiga a relação entre a mídia brasileira e a Política Nacional de Participação Social (PNPS), implementada no governo Dilma Rousseff por meio do Decreto Presidencial nº 8.243/2014. O foco principal é analisar a postura contrária da mídia à PNPS, particularmente dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, questionando se essa oposição contribuiu para restringir a democracia representativa brasileira. A pesquisa qualitativa, realizada entre maio e outubro de 2014, analisou os acervos online dos periódicos, identificando a prevalência de matérias e artigos de opinião contrários à PNPS, com O Estado de S. Paulo mostrando-se mais crítico que a Folha de S. Paulo. A hipótese central é que ambos os jornais defendem uma concepção limitada de democracia, obstruindo a expansão da participação social por meio de mecanismos como conselhos de políticas públicas, conferências nacionais, e orçamento participativo.
1. Objetivo e Metodologia da Pesquisa
O estudo investiga a relação entre a mídia brasileira e a Política Nacional de Participação Social (PNPS) durante o governo Dilma Rousseff, focando na oposição da mídia à PNPS, especificamente a postura de jornais nacionais como a Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. O objetivo é verificar a legitimidade do Decreto Presidencial nº 8.243/2014, que instituiu a PNPS; identificar o surgimento e as implicações das inovações democráticas na democracia representativa brasileira; analisar as posições desses dois jornais em relação à medida presidencial; e, finalmente, identificar os limites dos argumentos críticos à PNPS. A pesquisa utilizou uma metodologia qualitativa, analisando os acervos online dos jornais entre maio e outubro de 2014, período de vigência da PNPS. Os resultados indicam que a atuação dos periódicos contribuiu para obstruir a ampliação da democracia representativa, defendendo uma visão restrita da democracia. A hipótese central é de que a mídia analisada defende uma concepção limitada de democracia no processo de institucionalização da PNPS. A PNPS, como plano de governo, visava ampliar a interlocução entre a sociedade civil e o governo por meio de nove instâncias decisórias, incluindo conselhos de políticas públicas, conferências nacionais e audiências públicas.
2. Análise da Cobertura Jornalística da PNPS
A análise da cobertura jornalística da Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo revela que notícias enquadradas como “matéria sobre o assunto” e, principalmente, “artigos de opinião contrária” foram mais frequentes. Os artigos de opinião, representando a visão de colunistas, refletiram a crítica ao decreto presidencial. A aversão ao decreto também se manifestou, embora com menor intensidade, em editoriais, que expressam a opinião dos jornais. Comparando os dois jornais, O Estado de S. Paulo apresentou uma oposição numericamente mais representativa e contundente à PNPS, enquanto a Folha de S. Paulo, embora tenha emitido posicionamentos críticos, não permaneceu neutra. A pesquisa indica, portanto, que ambos os jornais contribuíram para uma oposição à PNPS, demonstrando uma postura que não se manteve neutra em relação à medida governamental e que a cobertura jornalística dos dois veículos de comunicação analisados colaborou para uma interpretação da democracia mais restritiva. O estudo destaca que a frequência e a intensidade das críticas variaram entre os dois jornais analisados.
3. Argumentos Contrários à PNPS e sua Análise
A seção detalha os argumentos contrários à PNPS presentes nos editoriais e artigos de opinião analisados. As críticas se concentram na ideia de que a PNPS, ao criar instâncias de participação social, enfraqueceria o poder do Legislativo e ameaçaria a independência dos poderes. Argumentos recorrentes incluem a alegação de inconstitucionalidade da medida e a caracterização da participação social promovida pela PNPS como um tipo de “supercorporativismo” ou “boliviarismo”, associando erroneamente o modelo proposto ao de governos de países como Venezuela e Bolívia. A análise refuta essa associação, destacando a diferença entre as estruturas políticas e as diretrizes de governo do Brasil e desses países, e demonstra a parcialidade da mídia na cobertura do tema. O estudo aponta para uma estratégia dos jornais em utilizar artigos de opinião para reforçar e ampliar seus posicionamentos editoriais contrários ao decreto presidencial. A análise dos argumentos críticos revela a existência de uma interpretação enviesada da proposta, que ignora ou minimiza seus objetivos e aspectos positivos da ampliação da participação social.
II.Conceitos de Democracia e sua Evolução no Brasil
A pesquisa contextualiza a discussão sobre a PNPS a partir de diferentes teorias da democracia. Autores como T.H. Marshall (com sua abordagem sobre direitos civis, políticos e sociais), Robert Dahl (e seu conceito de poliarquia), e outros, são analisados para compreender a evolução histórica do conceito de democracia no Brasil. As contribuições de autores como José Murilo de Carvalho e Décio Saes, que analisam a trajetória da cidadania no Brasil, destacando os períodos de alternância entre regimes democráticos e autoritários, são também relevantes. O estudo ressalta a complexidade da relação entre democracia, participação política, e as disputas de classe no contexto do capitalismo brasileiro.
1. Teorias da Democracia Uma Abordagem Conceitual
Esta seção apresenta uma breve revisão da teoria democrática, explorando o conceito histórico e multifacetado de democracia na filosofia política e na teoria moderna e contemporânea. A discussão abrange a evolução do pensamento sobre a participação política, contrastando a visão clássica com abordagens mais modernas. O texto menciona a contribuição de teóricos como Carole Pateman, que discute a função educativa e de controle da participação política, destacando a sua importância como antídoto aos regimes totalitários do pós-guerra. A visão de Robert Dahl, que prefere o termo “poliarquia” a “democracia” devido à falta de um significado permanente para este último, também é considerada. A tensão entre a teoria ideal e a teoria normativa da democracia é analisada, mencionando-se a contribuição de Sartori, que identifica três tendências intelectuais distintas a respeito do conceito de democracia: a tentativa de glorificação da democracia, a busca de neutralidade em relação aos valores e a racionalização empírica da democracia. Em suma, esta seção contextualiza o debate em torno da participação política, servindo como base teórica para as análises subsequentes sobre a democracia no Brasil.
2. Democracia no Brasil Uma Trajetória Singular
A seção discute o desenvolvimento peculiar da democracia no Brasil, analisando sua historiografia e destacando as rupturas e continuidades em seu processo de construção. A análise se concentra na evolução da cidadania política no país, considerando a alternância de regimes democráticos e ditatoriais. As contribuições de José Murilo de Carvalho e Décio Saes são apresentadas como fundamentais para a compreensão desse processo. Carvalho apresenta a concepção de cidadania a partir da consolidação cronológica de direitos civis, políticos e sociais, destacando a importância do Estado de bem-estar social para garantir a participação na riqueza coletiva e a justiça social. Já Saes relaciona a evolução da cidadania política com as distintas posições de classe, enfatizando os entraves e disputas políticas oriundas da relação trabalho-capital, que moldam não só as orientações econômicas e políticas, mas a própria cidadania. O trabalho de Saes também demonstra que o desenvolvimento do capitalismo influencia a participação política por meio do ‘sujeito de direito’, ou seja, o indivíduo reconhecido pelo Estado como portador de direitos essenciais.
3. Democracia no Brasil Após 1988 Novas Formas de Participação
Esta seção descreve as mudanças no cenário democrático brasileiro após a Constituição de 1988, analisando as novas formas de participação política. As contribuições de Leonardo Avritzer e de Fátima Anastasia, Mônica Mata Machado de Castro e Felipe Nunes são analisadas para compreender o impacto da Constituição Cidadã. Avritzer destaca a incorporação da participação popular por meio do orçamento participativo, ONGs e conselhos, indicando que a Constituição de 1988 e a sociedade civil contribuíram para formas mais amplas de participação. Anastasia, Castro e Nunes analisam a democracia pós-1988 pela perspectiva de Robert Dahl, enfatizando a importância da institucionalização e da participação política do cidadão, incluindo a garantia de direitos clássicos de associação, liberdade de expressão e controle da agenda pública. Em suma, embora reconheçam limitações sociais e econômicas para o pleno desenvolvimento da democracia, os autores destacam o enriquecimento do sistema democrático brasileiro pós-1988, com novas formas de participação, como conferências nacionais e o orçamento participativo.
III.As Conferências Nacionais e a Participação Social no Brasil Pós 1988
A seção analisa as conferências nacionais como instrumentos de participação social e democracia participativa no Brasil pós-Constituição de 1988. O estudo discute o surgimento e a evolução dessas conferências, sua importância para a relação entre Estado e sociedade civil, e as diferentes perspectivas sobre sua efetividade, citando autores como Leonardo Avritzer. A pesquisa também investiga a participação da população nesses eventos, analisando dados de pesquisas (como a Vox Populi) sobre a representatividade em termos de gênero, raça, e renda dos participantes nas diferentes etapas (local, municipal, estadual e nacional) das conferências. A análise demonstra a complexidade e os desafios de se promover uma democracia participativa genuína por meio das conferências.
1. Conferências Nacionais Conceito e Evolução
Esta seção discute o conceito e a evolução histórica das conferências nacionais no Brasil, apresentando-as como um mecanismo de participação social e deliberação política. O marco inicial é situado na redemocratização de 1985 e na promulgação da Constituição de 1988, que assegurou direitos políticos como plebiscito e referendo. A análise demonstra como as conferências se tornaram um espaço de reivindicação por autonomia da sociedade civil em relação ao Estado, complementando e impulsionando novos modelos participativos. A seção destaca a contribuição de Leonardo Avritzer, que as denomina como instituições participativas. A origem das conferências nacionais é traçada até a década de 1930, com a Lei nº 378 de 1937, instituindo-as como estratégia de articulação federativa. Inicialmente voltadas para fins de administração centralizada, as conferências evoluíram posteriormente para um modelo descentralizado, com maior foco na participação social. São apresentadas diferentes perspectivas sobre as conferências nacionais: como espaço público ampliado, canais de participação legitimados, instâncias imersas em arranjos institucionais, interfaces sócio-estatais, espaços integrados de participação, deliberação e representação, e, finalmente, como um sistema integrado de participação, deliberação e representação.
2. Dinâmica e Participação nas Conferências Nacionais
A seção descreve a dinâmica de funcionamento das conferências nacionais, que seguem uma cronologia dividida em etapas escalonadas, começando com conferências locais e pré-conferências, seguidas por conferências municipais, estaduais e nacionais. A pesquisa abrange os diferentes níveis de participação, desde a preparação até a aprovação de documentos finais, com ênfase em dados de pesquisa da Vox Populi de 2011. Os resultados indicam que a participação é maior nas etapas preparatórias (local, distrital ou regional) e menor nas etapas nacionais. A análise da pesquisa Vox Populi, sistematizada por Avritzer e Cunha, evidencia disparidades de gênero, raça e renda entre os participantes. Cunha destaca que a participação feminina diminui conforme aumenta a escala, enquanto negros e pardos apresentam maior participação nos níveis local/regional e estadual, mas menos no nível nacional. Em relação à renda, há maior inclusão de pessoas com renda baixa e muito alta, enquanto que a participação daqueles com renda média é menor. As novas conferências, que abordam temas como direitos humanos, meio ambiente, juventude, saúde, entre outros, possuem menor participação devido à menor estruturação de conselhos internos.
3. Impacto das Conferências Nacionais na Legislação
A seção final analisa o impacto das conferências nacionais na produção legislativa brasileira, com base em uma pesquisa que abrange o período de 1988 a 2009. A pesquisa de Pogrebinschi e Santos analisou a relação entre as resoluções das conferências e a produção legislativa do Congresso Nacional, identificando que 7,2% dos projetos de lei aprovados demonstraram alguma pertinência temática com as resoluções das conferências. Os autores reconhecem, no entanto, a limitação dessa análise, apontando a possibilidade de relações aleatórias entre os textos e a dificuldade em estabelecer uma relação direta e causal entre as conferências e a produção legislativa. A análise de uma amostra de doze meses revela um impacto ainda mais reduzido (0,3% das leis aprovadas). Os autores discutem a possível influência de fatores externos, como financiamento da pesquisa pela Secretaria Geral da Presidência da República, e a consequente restrição à autonomia dos pesquisadores para problematizar a efetividade das decisões das conferências, levando a um comportamento de 'intelectuais de governo'.
IV.A PNPS e a Reação do Legislativo Argumentos Contrários
O estudo examina a oposição da mídia brasileira à PNPS, destacando a cobertura jornalística de Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. A análise abrange os principais argumentos usados contra o decreto, incluindo a alegação de inconstitucionalidade e a crítica ao sistema de representação proposto pela PNPS. A seção explora a forma como os jornais utilizaram editoriais e artigos de opinião (de colunistas como Ives Gandra da Silva Martins e Demétrio Magnoli) para veicular essas críticas, frequentemente associando a PNPS ao “bolivarianismo”, termo utilizado para descrever governos de países como Venezuela e Bolívia, e destacando a diferença entre a estrutura política brasileira e desses países. A pesquisa ressalta a falta de neutralidade da mídia nesse processo.