
Comportamentos de Risco: Impulsividade e Personalidade
Informações do documento
Escola | Universidade Católica Portuguesa |
Curso | Psicologia Clínica e da Saúde |
Tipo de documento | Dissertação de Mestrado |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 667.57 KB |
Resumo
I.Resumo do Estudo sobre Comportamentos de Risco e Abuso de Substâncias Psicoativas
Este estudo investiga a relação entre variáveis psicológicas (personalidade, impulsividade, autoestima, e humor/depressão) e comportamentos de risco, especificamente o consumo de drogas (lícitas e ilícitas), numa amostra de 155 participantes. Utilizando escalas como a Escala de Autoestima de Rosenberg (RSES), a Escala de Impulsividade de Barratt (BIS-11), e o Perfil de Estados de Humor (POMS), entre outras, a pesquisa busca compreender como essas variáveis impactam o abuso de substâncias. Os resultados indicam correlações significativas entre os níveis de amabilidade (traço de personalidade), neuroticismo, autoestima e os padrões de consumo de álcool e drogas. A impulsividade também se mostrou relacionada aos comportamentos de risco. A escolaridade também apresentou uma correlação negativa com o consumo de substâncias. A pesquisa conclui que um maior nível de amabilidade se correlaciona com um consumo mais baixo de drogas e álcool, ao passo que um maior nível de neuroticismo está relacionado com maiores níveis de consumo. A pesquisa aponta para a necessidade de estudos longitudinais para confirmar essas relações e identificar fatores preditivos de comportamentos de risco.
1. Introdução Abordagem do Problema do Consumo de Drogas
O estudo inicia abordando o consumo de drogas (lícitas ou ilícitas) como um fenômeno que transcende sociedades, faixas etárias e grupos sociais, marcando a história da humanidade. O foco não está nas drogas em si, mas na relação estabelecida com elas, enfatizando os comportamentos de risco associados. O objetivo principal é analisar as relações entre personalidade, impulsividade, humor/depressão e autoestima, investigando seu impacto nos comportamentos de risco relacionados ao uso de substâncias. A Organização Mundial de Saúde define droga como qualquer substância que modifica as funções orgânicas, incluindo álcool, medicamentos e tabaco, além de substâncias ilícitas como cocaína e heroína. A toxicodependência é definida como uma compulsão pelo consumo, buscando o efeito psíquico e evitando o desconforto da abstinência, considerada uma doença potencialmente fatal. O estudo busca contribuir para o conhecimento das variáveis psicológicas nos comportamentos de risco, oferecendo diretrizes para programas de intervenção. A influência do estilo de vida na saúde e qualidade de vida é amplamente documentada e comportamentos de risco, como hábitos alimentares inadequados, tabagismo e uso abusivo de álcool, são considerados prioridades de saúde pública. O uso abusivo de substâncias psicoativas é um grave problema social que afeta famílias e indivíduos, destruindo laços e consumindo recursos emocionais e financeiros. O abuso de substância é diagnosticado através de critérios como tolerância, consumo em quantidades maiores e por períodos mais longos do que o pretendido, e a incapacidade de controlar seu uso. As substâncias psicoativas são classificadas em depressoras, estimulantes e perturbadoras, afetando o sistema nervoso central e o funcionamento cognitivo e comportamental. A toxicodependência envolve variáveis como o prazer na repetição do consumo, descontrole e características de personalidade, além de fatores socioculturais.
2. Estados Afetivos e Comportamentos de Risco Aspectos Psicossociais
A pesquisa destaca a inconsistência nos resultados sobre a associação entre morbidade psicológica e comportamentos de risco. Embora a relação entre abuso de substâncias e estados afetivos seja bem conhecida, a sequência temporal é incerta: a morbidade psicológica precede ou é consequência do consumo? Substâncias como álcool e drogas ilícitas são depressogênicas, causando sentimentos negativos e distúrbios neurovegetativos como insônia, perda de apetite, e déficit cognitivo. O uso de substâncias é visto como um atalho para a felicidade, uma tentativa de aliviar o sofrimento. A distinção entre estados afetivos como perturbação primária e consequência do abuso de substâncias torna-se complexa após anos de consumo, dificultando a determinação da sequência da evolução dos sintomas. Estudos longitudinais sobre correlatos demográficos e psicossociais do abuso de substâncias apresentaram resultados conflitantes. Kaplan (1977) sugere que boa disposição e tranquilidade são fatores protetores contra o consumo. A dependência de substâncias integra-se na personalidade, com traços comuns como humor depressivo, baixa afetividade e alta impulsividade. Indivíduos dependentes apresentam propensão à impulsividade e imaturidade, com dificuldade em lidar com frustrações. Traços como impulsividade, neuroticismo e procura de sensações estão associados à adição. Lavelle, Hammersley e Forsyth (1991) identificam dois perfis de personalidade associados ao consumo de drogas: um neurótico, com depressão, baixa autoestima e ansiedade; e um antissocial, com falta de adesão a regras e histórico de delinquência.
3. Personalidade Impulsividade e Autoestima Fatores de Risco
O estudo investiga as características de personalidade de indivíduos dependentes de substâncias, reconhecendo a ausência de um único perfil, mas a existência de características comuns. Pagés-Berthier (2002) aponta para traços como procura de sensações, impulsividade e evitação de frustração como propensos ao consumo. O comportamento impulsivo é fundamental no desenvolvimento e manutenção da dependência química, resultando de um desequilíbrio entre sistemas neurais que controlam a tomada de decisão. Bechara (2005) descreve um sistema impulsivo da amígdala e um sistema reflexivo do córtex pré-frontal. A autoestima, autoavaliação do conhecimento de si, é amplamente estudada na psicologia. Altos níveis de autoestima estão associados a bem-estar, ajuste psicológico e boas relações interpessoais, enquanto baixos níveis são associados a saúde precária e comportamento delinquente. Os níveis de autoestima influenciam as estratégias de enfrentamento da autodesvalorização: indivíduos com alta autoestima buscam aperfeiçoamento, enquanto aqueles com baixa autoestima buscam autoproteção. Baixa autoestima aumenta a probabilidade de comportamentos de risco, como consumo de substâncias. A impulsividade em toxicômanos e alcoólicos prevê a capacidade de manutenção em tratamento, dificultando a assimilação de conceitos terapêuticos e a inibição de respostas impulsivas. Fatores como escolaridade, idade e estado civil são variáveis sociodemográficas relevantes. Escolaridade inferior ao ensino secundário constitui um fator de risco para comportamentos de risco, com forte associação ao uso de drogas e conhecimento sobre riscos e consequências do consumo.
II.Metodologia Instrumentos e Análise de Dados
A pesquisa empregou uma metodologia quantitativa, utilizando um questionário sociodemográfico para caracterizar a amostra e seis escalas psicológicas: RSES (autoestima), BIS-11 (impulsividade), POMS (estados de humor), questionário sobre o uso de álcool e drogas, e NEO-FFI-20 (personalidade). A análise estatística utilizou testes não paramétricos (Mann-Whitney e correlação de Spearman) devido à não-normalidade dos dados. O estudo contou com uma amostra de 155 participantes de ambos os sexos.
1. Instrumentos de Coleta de Dados
A pesquisa utilizou uma abordagem quantitativa, coletando dados através de seis instrumentos. Inicialmente, um Questionário Sociodemográfico foi aplicado para caracterizar a amostra, coletando informações sobre idade, residência, escolaridade, origem étnica, situação profissional, estado civil, religião e número de filhos. Uma segunda parte deste questionário abordou o consumo de substâncias, incluindo idade de início do consumo, substâncias consumidas, histórico familiar de problemas com consumo e consequências familiares, sociais e laborais decorrentes do consumo. Para avaliar as variáveis psicológicas, foram utilizadas cinco escalas: a Escala de Autoestima de Rosenberg (RSES), para medir a autoestima; a Escala de Impulsividade de Barratt (BIS-11), para avaliar a impulsividade, com pontuação variando de 30 a 120 pontos, sendo pontuações mais altas indicativas de maior impulsividade; o Perfil de Estados de Humor (POMS), para avaliar os estados emocionais; um Questionário sobre o Uso de Álcool e Drogas, focando na frequência de consumo e uso antes das relações sexuais; e o Inventário da Personalidade NEO-FFI-20, uma versão reduzida do NEO-PI-R, para avaliar as cinco dimensões básicas da personalidade (Neuroticismo, Extroversão, Abertura à Experiência, Amabilidade e Conscienciosidade), com respostas em escala Likert de cinco pontos. O questionário sobre o uso de álcool e drogas avalia a frequência de consumo de diversas substâncias (álcool, drogas) nos últimos dois meses e nas últimas duas semanas, incluindo o uso antes de relações sexuais. O inventário NEO-FFI-20 apresentou boa consistência interna, com coeficientes alfa de Cronbach entre 0,70 e 0,76.
2. Análise Estatística dos Dados
A análise dos dados foi realizada utilizando o programa SPSS 23. Inicialmente, uma análise exploratória foi conduzida para verificar a normalidade da distribuição das variáveis quantitativas, condição necessária para a aplicação de testes paramétricos. Como essa condição não foi atendida para as variáveis principais (comportamentos de risco), optou-se por métodos estatísticos não paramétricos. Para comparar as diferenças entre dois grupos em relação a variáveis dependentes quantitativas sem distribuição normal, foi utilizado o teste de Mann-Whitney. Para avaliar a relação entre as variáveis psicológicas (personalidade, impulsividade, autoestima e estados de humor) e os comportamentos de risco, foi empregado o coeficiente de correlação de Spearman. A análise de correlação entre comportamentos de risco e dimensões de personalidade revelou correlações negativas significativas entre amabilidade e consumo de álcool e drogas. O neuroticismo mostrou relação positiva com o consumo de drogas. Observou-se também relação negativa entre autoestima e consumo de álcool e drogas, e relação negativa entre amabilidade e todas as variáveis de consumo de substâncias psicoativas avaliadas. Relações positivas foram encontradas entre depressão e hostilidade com o consumo de álcool. A impulsividade mostrou-se relacionada com o consumo de substâncias psicoativas, e a escolaridade apresentou correlação negativa com todas as variáveis de consumo.
III.Resultados Principais Personalidade Impulsividade Autoestima e Comportamentos de Risco
Os resultados demonstram correlações significativas entre variáveis de personalidade e o consumo de substâncias psicoativas. Uma baixa amabilidade se associou a um maior consumo de álcool e drogas. O neuroticismo, por sua vez, apresentou uma correlação positiva com o consumo de drogas. A autoestima mostrou uma relação inversa com o consumo de álcool e drogas: menor autoestima, maior consumo. A impulsividade, medida pela BIS-11, também se mostrou significativamente relacionada ao consumo, corroborando a literatura existente sobre a dependência química e os mecanismos envolvidos na tomada de decisões em situações de risco. Os resultados também indicam que a escolaridade tem uma forte influência negativa no consumo de drogas.
1. Resultados relacionados à Personalidade e Consumo de Substâncias
A análise dos resultados revelou correlações significativas entre traços de personalidade e o consumo de substâncias psicoativas. Especificamente, observou-se uma correlação negativa entre a amabilidade e o consumo de álcool e drogas. Participantes com pontuações mais altas em amabilidade reportaram consumo mais baixo de álcool e drogas, indicando que indivíduos mais amáveis tendem a apresentar menor envolvimento com o abuso de substâncias. Em contraste, uma correlação positiva foi encontrada entre neuroticismo e o consumo de drogas, sugerindo que indivíduos com altos níveis de neuroticismo são mais vulneráveis ao consumo. Esta relação corrobora a literatura que associa o neuroticismo à percepção de ameaça e vulnerabilidade a condições psicopatológicas como depressão e ansiedade. A literatura também demonstra que o neuroticismo é um preditor de sintomas depressivos e ansiosos, envolvendo afeto negativo, ansiedade, instabilidade emocional e insegurança; este traço também se destaca em estudos sobre dependência de substâncias psicoativas e recaídas. Em resumo, os resultados apontam para uma associação entre traços de personalidade e comportamentos de risco, com amabilidade mostrando-se como um fator possivelmente protetor e neuroticismo como um fator de risco para o consumo de drogas.
2. Resultados relacionados à Autoestima e Consumo de Substâncias
Os achados demonstram uma relação negativa entre autoestima e o consumo de álcool e drogas. Indivíduos com menor autoestima tendem a apresentar maior consumo de álcool e/ou drogas, sugerindo que a baixa autoestima pode ser um fator contribuinte para esses comportamentos de risco. Este resultado é coerente com a literatura, que indica que o desenvolvimento de autoestima, através da regulação do autoconhecimento e das competências sociais, contribui para a inibição de riscos relacionados ao uso excessivo de substâncias psicoativas. Em outras palavras, a literatura sugere que uma alta autoestima está relacionada com uma menor frequência de comportamentos de risco e dependência. A análise da amabilidade, além da correlação com o consumo de álcool e drogas, revela que quanto menor o nível de amabilidade maior o consumo de substâncias, sendo concordante com a literatura que indica a amabilidade como traço relacionado à compaixão e interações positivas. A amabilidade, portanto, se relaciona com indivíduos mais atenciosos, amáveis e preocupados com as necessidades alheias, caracterizando-se por generosidade, bondade e altruísmo. Em contraponto, baixos níveis de amabilidade são associados a indivíduos mais frios e indelicados.
3. Resultados relacionados à Impulsividade Morbidade Psicológica e Consumo
A análise dos resultados indicou uma relação positiva entre as dimensões depressão e hostilidade e o consumo de álcool, corroborando a literatura que associa o consumo de substâncias psicoativas à depressão. Essa comorbidade entre dependência química e depressão e a associação entre sintomas depressivos e volume de consumo são evidenciadas na literatura. A hostilidade, um traço estável da personalidade caracterizado por desconfiança e cinismo, também se mostra relacionada ao abuso de substâncias. A literatura indica forte comorbidade entre depressão maior, hostilidade e abuso de substâncias. A impulsividade, de acordo com os resultados, se mostrou relacionada ao consumo de substâncias psicoativas, corroborando a literatura que a caracteriza como um conjunto de comportamentos multidimensionais complexos. A impulsividade está relacionada à dificuldade de adiar a gratificação, prejuízos na autorregulação do comportamento e cognição, e ainda, a episódios de agressividade e violência. Portanto, a impulsividade aparece como um fator que pode contribuir para a vulnerabilidade ao consumo de substâncias psicoativas, atuando como um mecanismo de ajustamento a situações imprevisíveis ou como resposta ao consumo dessas substâncias. A escolaridade demonstrou uma relação negativa com todas as variáveis de consumo, indicando que menores níveis de escolaridade estão associados a um maior consumo de substâncias psicoativas.
IV.Limitações e Sugestões para Pesquisas Futuras
O estudo apresenta limitações como o seu caráter transversal e o uso de uma amostra de conveniência. Para fortalecer os resultados, sugere-se a replicação da pesquisa com um design longitudinal, permitindo analisar a causalidade entre as variáveis. Estudos futuros também podem investigar a capacidade preditiva de traços de personalidade, impulsividade e morbidade psicológica em relação aos comportamentos de risco, bem como o papel da autoestima como fator de proteção.
1. Limitações do Estudo
O estudo apresenta algumas limitações importantes que devem ser consideradas na interpretação dos resultados. Em primeiro lugar, trata-se de um estudo transversal, o que significa que os dados foram coletados em um único momento no tempo. Essa característica metodológica limita a capacidade de estabelecer relações causais entre as variáveis investigadas. A natureza transversal impede a observação da evolução dos comportamentos ao longo do tempo e dificulta a determinação da sequência temporal entre as variáveis, ou seja, se a morbidade psicológica precede ou é consequência do consumo de substâncias. Além disso, a amostra utilizada foi de conveniência, ou seja, não representativa da população em geral. Isso pode introduzir vieses na amostra e afetar a generalizabilidade dos resultados. A utilização de uma amostra de conveniência limita a capacidade de extrapolar os resultados para a população geral, pois a amostra pode não ser totalmente representativa da diversidade populacional em relação ao consumo de substâncias e as variáveis psicológicas analisadas. Em suma, as limitações metodológicas do estudo, caracterizadas por seu desenho transversal e amostra de conveniência, influenciam a capacidade de generalizar os resultados e estabelecer relações de causalidade entre as variáveis.
2. Sugestões para Pesquisas Futuras
Considerando as limitações do estudo atual, são sugeridas algumas direções para pesquisas futuras. Para superar as limitações do desenho transversal e fortalecer a análise das relações entre as variáveis, recomenda-se a replicação do estudo utilizando um design longitudinal. Um estudo longitudinal permitiria observar a evolução dos comportamentos de risco e das variáveis psicológicas ao longo do tempo, possibilitando a investigação da causalidade e o aprofundamento da compreensão das relações entre os fatores investigados. Especificamente, seria importante investigar se as dimensões da personalidade, a impulsividade e a morbidade psicológica são preditores positivos dos comportamentos de risco, e se a autoestima atua como preditor negativo. A replicação do estudo com uma amostra probabilística e representativa da população-alvo também é crucial para aumentar a generalizabilidade dos resultados e reduzir vieses. Finalmente, a expansão das variáveis sociodemográficas e a inclusão de outras variáveis relevantes, como o suporte social e o contexto familiar, poderia enriquecer a análise e fornecer uma compreensão mais completa dos fatores que influenciam o consumo de substâncias.