Canal de depósitos da política monetária, restrição de crédito bancário e o voo para a qualidade nos empréstimos bancários para empresas

Restrição de Crédito Bancário no Brasil

Informações do documento

Autor

Alex Nery Caetité

Escola

Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA)

Curso Administração
Tipo de documento Tese
Local São Paulo
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 3.02 MB

Resumo

I.Objetivo da Tese e Hipóteses

Esta tese investiga o impacto de mudanças na política monetária, especificamente a taxa Selic, sobre o montante de depósitos bancários no Brasil, considerando um ambiente de altas taxas de juros. A pesquisa testa a hipótese de que aumentos na taxa Selic afetam os depósitos, com impactos diferenciados dependendo do nível de concentração bancária. Um objetivo secundário é analisar como a política monetária influencia o racionamento de crédito, especialmente para empresas High-Agency-Cost (HAC).

1. Objetivo Principal Impacto da Política Monetária em Depósitos Bancários

O objetivo principal da tese é testar a hipótese de que mudanças na política monetária afetam o montante de depósitos bancários, especialmente em um cenário de altas taxas de juros. A pesquisa busca entender como diferentes níveis de concentração bancária, observados entre os municípios, influenciam a magnitude desse efeito. Para isso, a tese utiliza dados do Banco Central do Brasil, abrangendo o período de setembro de 1999 a dezembro de 2018. As variáveis-chave incluem a taxa Selic (taxa básica de juros), o volume de depósitos bancários (depósitos a prazo e poupança), e índices de concentração bancária. A análise considera a influência da política monetária sobre a disponibilidade de crédito para as instituições financeiras e, consequentemente, o seu impacto sobre a capacidade de concessão de novos empréstimos. A pesquisa busca verificar se a concentração bancária atua como fator intensificador ou atenuador dos impactos da política monetária sobre os depósitos.

2. Objetivo Secundário Racionamento de Crédito e Empresas High Agency Cost HAC

Como objetivo secundário, a tese investiga se as ações de política monetária intensificam o racionamento de crédito. A hipótese é de que a capacidade dos bancos em conceder novos empréstimos é afetada pelas políticas monetárias, resultando em restrições de crédito. A pesquisa assume que empresas High-Agency-Cost (HAC) – aquelas com maior risco de inadimplência – são desproporcionalmente afetadas por esse racionamento. Para testar essa hipótese, são utilizadas três bases de dados do Banco Central do Brasil: a Estatística Bancária Mensal por Município (ESTBAN), os balancetes mensais analíticos (Cosif 4010), e o Sistema de Informações de Crédito (SCR). O período analisado é o mesmo do objetivo principal (setembro de 1999 a dezembro de 2018). A pesquisa pretende identificar padrões de comportamento dos bancos e verificar a existência de um possível efeito assimétrico do racionamento de crédito sobre diferentes perfis de empresas, considerando o custo de monitoramento e a capacidade de oferecer garantias.

II.Metodologia

A pesquisa utiliza dados mensais, com periodicidade trimestral, de setembro de 1999 a dezembro de 2018, de três bases de dados do Banco Central do Brasil: ESTBAN (para depósitos e crédito), Cosif 4010 (dados contábeis dos bancos), e SCR (carteiras de crédito ativas). As técnicas econométricas empregadas incluem modelos de regressão em dados em painel, modelos com efeitos fixos de alta dimensão, e o Método dos Momentos Generalizados Sistêmico (GMM-Sys). A análise considera a concentração bancária, medida pelo índice Herfindahl-Hirschman (IHH), tanto em nível local (município) quanto em nível de banco.

1. Fontes de Dados

A metodologia da pesquisa se baseia em dados coletados de três fontes principais do Banco Central do Brasil (BCB). A primeira é o subsistema estatístico do Sistema Cosif, denominado “Estatística Bancária Mensal por Município (ESTBAN)”, que fornece informações sobre depósitos e operações de crédito. A segunda fonte é composta pelos balancetes mensais analíticos (Cosif 4010), que fornecem dados contábeis dos bancos. Por fim, o Sistema de Informações de Crédito (SCR) do BCB contribui com dados sobre os saldos das carteiras de crédito ativas para empresas. O período de análise abrange dados mensais, com periodicidade trimestral, entre setembro de 1999 e dezembro de 2018, totalizando um extenso conjunto de informações para análise. A escolha dessas fontes garante uma abrangência significativa no estudo dos impactos da política monetária sobre depósitos e crédito no Brasil.

2. Técnicas Econométricas

Para analisar os dados e identificar os parâmetros das equações, a pesquisa emprega diversas técnicas econométricas. São utilizadas regressões lineares em dados em painel, reconhecidamente adequadas para este tipo de análise temporal e transversal. Além disso, a pesquisa incorpora modelos lineares de dados em painel com múltiplos níveis de efeitos fixos (High-dimensional fixed effects model), que permitem controlar por um grande número de efeitos fixos e reduzir o viés de variáveis omitidas. Finalmente, o estudo utiliza o Método dos Momentos Generalizados Sistêmico (GMM-Sys), uma técnica robusta para lidar com problemas de endogeneidade e autocorrelação nos dados. A aplicação destas múltiplas técnicas assegura a robustez e a confiabilidade dos resultados, proporcionando uma análise multifacetada dos dados.

3. Variáveis e Indicadores

A pesquisa utiliza diversas variáveis para alcançar seus objetivos. As principais variáveis dependentes são os depósitos de poupança e os depósitos a prazo, obtidos a partir do ESTBAN. A taxa Selic é a principal variável independente, refletindo as ações de política monetária. O índice de concentração Herfindahl-Hirschman (IHH) é empregado para mensurar a concentração bancária, tanto a nível local (município) quanto a nível de banco. Outras variáveis de controle, como o tamanho dos bancos, spread bancário e outras métricas de risco e custos, também são incluídas nos modelos econométricos. A inclusão dessas variáveis permite uma análise mais completa e isenta de vieses, melhorando a interpretação dos resultados. O cuidado na seleção e definição destas variáveis é fundamental para garantir a validade e a precisão das conclusões da pesquisa.

III.Resultados Impacto da Política Monetária sobre Depósitos

Os resultados indicam que aumentos na taxa Selic levam a um aumento nos spreads dos bancos sobre os depósitos, resultando em redução nas captações (depósitos a prazo e poupança) devido à fuga de depositantes. Esse efeito é mais intenso em regiões com maior concentração bancária e/ou em bancos que operam em regiões mais concentradas. Os modelos econométricos, incluindo análise de efeitos fixos, confirmam a relação negativa entre aumentos na taxa Selic e o volume de depósitos, sendo o impacto mais pronunciado em mercados mais concentrados.

1. Impacto de Aumentos da Taxa Selic em Depósitos

Os resultados da pesquisa demonstram uma relação negativa entre aumentos da taxa Selic e o montante de depósitos bancários. A elevação da taxa Selic leva os bancos a aumentarem seus spreads sobre os depósitos, resultando em uma redução nas captações, tanto de depósitos a prazo quanto de poupança. Esse fenômeno é explicado pela fuga de depositantes em busca de alternativas de investimento com maior rentabilidade em um ambiente de juros mais altos. A análise indica que essa redução nos depósitos não é homogênea, sendo influenciada pela concentração bancária. Dados do período entre setembro de 1999 e dezembro de 2018 serviram como base para esta análise, onde as técnicas econométricas empregadas validaram a correlação entre a taxa Selic e a redução dos depósitos bancários.

2. Influência da Concentração Bancária na Sensibilidade dos Depósitos

A intensidade da redução nos depósitos em resposta aos aumentos da taxa Selic varia de acordo com o nível de concentração bancária. A pesquisa evidencia que regiões com maior concentração de depósitos tendem a experimentar reduções mais acentuadas nos depósitos em comparação a regiões menos concentradas. Este resultado sugere que bancos em mercados mais concentrados, com maior poder de mercado, podem ter maior capacidade de repassar o aumento da taxa Selic para os depositantes através de maiores spreads, amplificando a redução das captações. O índice Herfindahl-Hirschman (IHH) foi usado para mensurar a concentração, tanto no âmbito local (município) quanto específico de cada banco, confirmando a relação entre alta concentração e maior sensibilidade dos depósitos às variações da taxa Selic. A análise mostra que tanto a concentração local quanto a concentração em nível de banco influencia a fuga de depositantes.

3. Análise em Subamostras e Tendências Futuras

A análise foi realizada também em subamostras, considerando períodos pré e pós-crise (setembro de 1999 a junho de 2008 e setembro de 2008 a dezembro de 2018, respectivamente). Os resultados apontam para uma menor sensibilidade dos depósitos a prazo e de poupança às mudanças na taxa de juros no período pré-crise, em comparação ao período pós-crise. Esta diferença é atribuída ao nível de taxa de juros, sendo maior a elasticidade dos depósitos aos juros em períodos de taxas menores (pós-crise). A extrapolação deste resultado sugere que, se a tendência de queda nas taxas de juros persistir, os efeitos do canal de depósitos tenderão a se tornar cada vez mais relevantes para a economia brasileira. Este dado indica uma maior importância do canal de depósitos para a dinâmica de crédito no país em cenários de taxas de juros mais baixas.

IV.Resultados Impacto da Política Monetária sobre o Crédito

A redução nos depósitos bancários, consequência da política monetária, leva a uma contração na oferta de crédito bancário. As empresas HAC são mais afetadas por esse racionamento de crédito. A análise revela um comportamento de “voo para a qualidade” dos bancos, concentrando crédito em empresas de menor risco (LAC) em períodos de aperto monetário. A concentração bancária influencia a intensidade desse efeito. A pesquisa utilizou o estimador GMM-Sis para analisar a relação entre a taxa Selic, concentração bancária (nível do banco e nível local) e o crédito para empresas HAC e LAC, encontrando evidências consistentes com a hipótese de assimetria.

1. Redução do Crédito como Consequência da Política Monetária

A pesquisa demonstra que a contração de depósitos bancários, decorrente de aumentos na taxa Selic, leva a uma redução na concessão de crédito. A diminuição das fontes de financiamento bancário força os bancos a restringirem a oferta de crédito, intensificando o racionamento de crédito na economia. Este efeito é consistente com a teoria econômica que prevê uma relação direta entre a disponibilidade de depósitos e a capacidade dos bancos de concederem empréstimos. O estudo considera o período entre setembro de 1999 e dezembro de 2018 para análise. A análise econométrica corrobora a hipótese de que ações contracionistas da política monetária, refletidas no aumento da taxa Selic, resultam em menor disponibilidade de crédito no mercado.

2. Assimetria do Impacto do Racionamento de Crédito Empresas HAC x LAC

Os resultados sugerem uma assimetria no impacto do racionamento de crédito sobre diferentes tipos de empresas. As empresas classificadas como High-Agency-Cost (HAC), ou seja, empresas com maior risco de inadimplência, são mais afetadas pela redução do crédito. Isso se deve à maior dificuldade dessas empresas em obter financiamento em um cenário de aperto monetário, devido aos maiores custos de monitoramento e à maior dificuldade em oferecer garantias. A pesquisa observa um comportamento de “voo para a qualidade” por parte dos bancos, que preferem conceder crédito a empresas consideradas de baixo risco (LAC), demonstrando maior cautela em momentos de contração da oferta de crédito. A análise de dados de carteiras de crédito ativas corrobora esta observação.

3. Influência da Concentração Bancária no Racionamento de Crédito

A intensidade do racionamento de crédito também é influenciada pela concentração bancária. A pesquisa mostra que em regiões com alta concentração bancária, o impacto da política monetária sobre o crédito é amplificado. Bancos em mercados mais concentrados, com maior poder de mercado, tendem a reduzir a concessão de crédito de forma mais intensa do que bancos em regiões menos concentradas. A análise considera o índice Herfindahl-Hirschman (IHH) para medir a concentração bancária, tanto a nível local como em nível de banco individual. Este dado reforça a hipótese de que a concentração bancária contribui para a intensificação dos efeitos do racionamento de crédito. O estudo identifica como a concentração afeta diferencialmente o acesso ao crédito para empresas HAC, que são as mais prejudicadas em regiões com alta concentração.

V.Conclusão

A tese oferece evidências empíricas robustas que apoiam a teoria do canal de depósitos da política monetária no contexto brasileiro. Os resultados demonstram que as mudanças na taxa Selic afetam significativamente o volume de depósitos bancários e, consequentemente, o crédito bancário, com a concentração bancária atuando como um fator amplificador. O estudo também revela um comportamento assimétrico no acesso ao crédito, com empresas HAC mais vulneráveis ao racionamento de crédito durante períodos de aperto monetário. A pesquisa contribui para o entendimento dos canais de transmissão da política monetária e seus impactos diferenciais sobre a economia brasileira. Dados mensais, com periodicidade trimestral, entre setembro de 1999 e dezembro de 2018, formam a base de dados utilizada.

1. Confirmação da Hipótese sobre o Racionamento de Crédito

Os resultados da pesquisa fornecem evidências robustas de que aumentos na taxa Selic impactam negativamente tanto o montante de depósitos bancários quanto o volume de crédito bancário. Essa constatação corrobora a hipótese de que ações de política monetária, através do canal de depósitos, intensificam o racionamento de crédito. A relação positiva observada entre depósitos e concessão de crédito demonstra a influência direta da redução de depósitos na diminuição da capacidade de crédito dos bancos. A análise sugere que a política monetária afeta a oferta de crédito de forma significativa, comprometendo a disponibilidade de recursos para empresas, especialmente para aquelas com maior custo de monitoramento (HAC).

2. Assimetria nos Impactos sobre Empresas HAC e LAC

A pesquisa aponta para a existência de assimetria nos impactos do racionamento de crédito sobre empresas de diferentes portes. As empresas High-Agency-Cost (HAC), geralmente micro, pequenas e médias empresas, são desproporcionalmente afetadas pela redução do crédito em períodos de aperto monetário, enquanto que grandes empresas (LAC) enfrentam impactos menos intensos. Esse comportamento assimétrico é explicado pelo fenômeno do “voo para a qualidade”, no qual os bancos concentram seus recursos em ativos e clientes de menor risco, restringindo o crédito para empresas HAC. A análise de variações percentuais nas carteiras de crédito para empresas HAC e LAC ao longo do tempo confirma essa assimetria, demonstrando como a política monetária afeta de maneira diferente a concessão de crédito para esses dois grupos.

3. Relevância e Limitações da Pesquisa

Os resultados encontrados fornecem suporte empírico para a teoria do canal de depósitos, indicando que este mecanismo de transmissão da política monetária é relevante para a economia brasileira, especialmente em períodos de taxas de juros mais baixas. A pesquisa ressalta a importância da concentração bancária como fator amplificador dos efeitos da política monetária sobre os depósitos e, consequentemente, sobre o crédito. No entanto, a análise reconhece a necessidade de investigações futuras para aprofundar a compreensão dos mecanismos de transmissão e para considerar variáveis adicionais que podem influenciar os resultados. Apesar da robustez dos modelos econométricos empregados, incluindo modelos de dados em painel e o método GMM-Sys, a pesquisa destaca a necessidade de futuros estudos para fortalecer a análise dos mecanismos de transmissão de política monetária e seus impactos assimétricos na economia brasileira.