EXPERIÊNCIAS DA SEPARAÇÃO CONJUGAL: MULHERES E AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO ASSENTAMENTO NOVA VIDA (UPANEMA-RN)

Separação Conjugal: Mulheres e Gênero

Informações do documento

Autor

Talita Marques Sena

instructor/editor Kyara Maria de Almeida Vieira
Escola

Universidade Federal Rural do Semi-Árido

Curso Licenciatura Interdisciplinar em Educação do Campo
Tipo de documento Monografia
Local Upanema-RN
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 1.44 MB

Resumo

I. Impacto da Separação Conjugal em Mulheres do Assentamento Nova Vida Upanema RN Uma Análise Qualitativa

Esta pesquisa qualitativa exploratória analisa o impacto da separação conjugal na vida de dez mulheres do Assentamento Nova Vida, em Upanema, Rio Grande do Norte. Utilizando entrevistas semiestruturadas, o estudo investiga os efeitos da ruptura conjugal em aspectos sociais, culturais e econômicos, incluindo a (re)configuração familiar e as práticas de sexualidade e afeto após a separação. A pesquisa contribui para a compreensão das experiências de mulheres do campo, suas lutas e resistências frente às desigualdades de gênero e preconceito social.

1. Objetivo Geral e Objetivos Específicos da Pesquisa

A pesquisa teve como objetivo geral analisar como as mulheres do Assentamento Nova Vida se constituíram enquanto sujeitos após a separação conjugal. Para alcançar esse objetivo, foram definidos objetivos específicos: (A) Identificar os efeitos da ruptura conjugal nas mulheres do Assentamento Nova Vida; (B) Verificar a (re)configuração familiar após a separação, considerando aspectos sociais, culturais e econômicos; e (C) Analisar as práticas de sexualidade e os afetos das mulheres após a separação. A pesquisa, de natureza qualitativa e exploratória, utilizou entrevistas semiestruturadas com dez mulheres do P.A. Nova Vida em Upanema-RN. A metodologia qualitativa permitiu uma profunda investigação das experiências individuais, oferecendo insights valiosos sobre as complexidades da separação conjugal no contexto específico do assentamento. A coleta de dados, realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, priorizou perguntas abertas, evitando respostas curtas e incentivando a narrativa detalhada das experiências das participantes. A escolha por este método permitiu um aprofundamento nas questões levantadas e um rico detalhamento da perspectiva das mulheres envolvidas no estudo.

2. Metodologia da Pesquisa Abordagem Qualitativa e Coleta de Dados

Este trabalho utilizou uma metodologia qualitativa, especificamente uma pesquisa exploratória de campo. A coleta de dados se deu por meio de entrevistas semiestruturadas, conduzidas com dez mulheres do Projeto de Assentamento Nova Vida, localizado em Upanema, Rio Grande do Norte. A opção por entrevistas semiestruturadas permitiu uma maior flexibilidade na condução das entrevistas, permitindo o aprofundamento em temas relevantes que surgiam durante a conversa. Antes de cada entrevista, foi apresentado e assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), garantindo a ética na pesquisa e o direito das participantes à privacidade. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas, utilizando pseudônimos para preservar a identidade das participantes. A análise dos dados focou na transcrição e tematização das entrevistas, buscando identificar padrões e temas recorrentes nas narrativas das mulheres. Para enriquecer a análise, foram consultados autores como Zarias (2010), Silva (2008), Souza, Beleza e Andrade (2012), Coutinho e Menandro (2010), Lamela (2010), Hack (2010), e Vieira (2005) sobre família e divórcio; Oliveira (2003) e Munanga (2013) sobre etnia e identidade; Rago (1998) sobre gênero; e Richardson e Peres (2010) sobre metodologia de pesquisa. A utilização destas referências teóricas contribuiu para a fundamentação teórica do estudo e para uma análise mais aprofundada dos dados coletados.

3. Resultados e Discussão Preliminar

A pesquisa conclui que, independentemente da vontade das partes, a separação conjugal transforma completamente a organização familiar, impactando os aspectos sociais, culturais e econômicos dos envolvidos. Os relacionamentos conjugais são marcados por dilemas, entre o desejo de uma relação sólida e a possibilidade de mudança. A pesquisa também destaca a importância de considerar as limitações do estudo, dado o universo restrito de participantes e o contexto social específico. Apesar dessas limitações, os relatos das mulheres participantes fornecem valiosas informações sobre as experiências de separação conjugal no contexto rural, mostrando as complexidades e desafios enfrentados pelas mulheres em diferentes dimensões de suas vidas. O estudo, com enfoque na realidade das mulheres do Assentamento Nova Vida, contribui para o avanço do conhecimento acerca das implicações da separação conjugal em mulheres rurais, e sinaliza a necessidade de pesquisas futuras para investigar mais profundamente as complexidades e consequências deste processo em diferentes contextos socioculturais. As conclusões baseiam-se na análise de dados qualitativos coletados por meio de entrevistas semiestruturadas e considera as diferentes perspectivas das participantes.

II. Efeitos da Ruptura Conjugal Aspectos Emocionais Jurídicos e Sociais

O estudo revela que o processo de separação conjugal é doloroso, mas vivenciado de forma singular por cada mulher. Os aspectos emocionais são marcados pela falta de respeito e diálogo. No âmbito jurídico, muitas mulheres demonstram desconhecimento de seus direitos, limitando o acesso à justiça. Socialmente, as participantes enfrentam preconceito e marginalização, sendo ainda vistas como responsáveis exclusivas pela família, limitando sua participação no mercado de trabalho e em outros espaços da comunidade. A Lei Maria da Penha é mencionada como instrumento importante, mas com acesso ainda limitado devido a fatores como medo, vergonha e dependência econômica e afetiva.

1. Aspectos Emocionais da Ruptura Conjugal

A pesquisa indica que o processo de separação conjugal foi doloroso para as participantes, embora vivenciado de forma individual e única. Aspectos emocionais como a falta de respeito e diálogo na relação foram recorrentes nas entrevistas. A experiência de cada mulher foi profundamente pessoal, revelando a complexidade das emoções envolvidas em um processo de separação. A ausência de suporte emocional adequado e a pressão social contribuíram para a intensificação do sofrimento. Algumas mulheres descrevem sentimentos como solidão, insegurança e medo do futuro após a separação, enquanto outras relatam a superação do trauma e a construção de uma nova vida independente. A pesquisa ressalta a necessidade de suporte psicológico e social adequado para mulheres que passam por essa experiência, considerando as especificidades do contexto rural. A falta de apoio e a estigmatização social podem exacerbar o sofrimento emocional, dificultando o processo de adaptação à nova realidade. A pesquisa demonstra a necessidade de políticas públicas de apoio psicossocial para essas mulheres.

2. Aspectos Jurídicos da Separação Conhecimento e Acesso aos Direitos

Um dos aspectos relevantes levantados pela pesquisa diz respeito ao desconhecimento das mulheres sobre seus direitos legais no processo de separação. Muitas demonstraram falta de informação sobre como acessar a justiça e defender seus interesses. A pesquisa indica que este desconhecimento contribui para que as mulheres se sintam desamparadas e vulneráveis durante e após o processo de separação. A falta de informação jurídica as impossibilita de buscar seus direitos de forma efetiva, tornando-as mais suscetíveis a situações de injustiça e desvantagem. A pesquisa destaca a importância de maior acesso à informação e ao apoio jurídico para que mulheres em situação de separação possam defender seus direitos de forma eficaz. A Lei Maria da Penha, embora represente um avanço significativo na proteção das mulheres contra a violência doméstica, não é suficiente se elas não têm conhecimento de seus direitos e como acessá-los. O estudo ressalta a necessidade de ações que promovam a conscientização jurídica e o acesso à justiça para mulheres em situação de vulnerabilidade.

3. Aspectos Sociais da Separação Preconceito e Marginalização

A pesquisa evidencia a existência de preconceito e marginalização social sofridos pelas mulheres separadas na comunidade. Elas não são vistas como participantes ativas da comunidade e enfrentam dificuldades para se inserir no mercado de trabalho. A pesquisa mostra como a sociedade, muitas vezes, ainda culpabiliza e estigmatiza as mulheres após a separação, limitando suas possibilidades de desenvolvimento pessoal e profissional. O preconceito e a marginalização social geram ainda maior vulnerabilidade para as mulheres que já estão lidando com as dificuldades inerentes ao processo de separação conjugal. A falta de suporte social e a pressão de estereótipos de gênero dificultam a reintegração dessas mulheres na comunidade e a construção de novas redes de apoio. A pesquisa demonstra a urgência de promover mudanças culturais e sociais que combatam o preconceito e a estigmatização das mulheres separadas, criando ambientes de apoio e inclusão na comunidade. A pesquisa defende a necessidade de intervenções que promovam a visibilidade das mulheres e valorizem suas contribuições para a comunidade.

III. Re Configuração Familiar e a Construção de Novas Identidades

A pesquisa demonstra que a separação não é vivenciada apenas como um evento trágico. Para muitas mulheres, a separação representa uma experiência libertadora, ainda que desafiadora, permitindo a reconstrução da identidade individual. Metade das participantes construiu novos relacionamentos estáveis, enquanto a outra metade optou por não se relacionar, seja por motivos culturais ou por medo de novas experiências negativas. A pesquisa aborda as dificuldades enfrentadas pelas mulheres em conciliar a vida profissional com as responsabilidades domésticas, considerando a divisão sexual do trabalho e a desvalorização do trabalho doméstico no meio rural. A falta de sustentabilidade econômica contribui para a dificuldade em superar o término do relacionamento.

1. Re configuração Familiar após a Separação Aspectos Sociais Culturais e Econômicos

A pesquisa analisou a (re)configuração familiar após a separação conjugal, considerando os aspectos sociais, culturais e econômicos. Os relatos das participantes revelaram que o processo de separação não se limita a um evento isolado, mas sim a um processo de transformação profunda na organização familiar. A nova configuração familiar muitas vezes é marcada por desafios e adaptações, influenciadas por questões financeiras e sociais. A divisão do trabalho doméstico, tradicionalmente atribuída às mulheres, continua a ser um obstáculo para muitas, que precisam conciliar trabalho remunerado com as responsabilidades domésticas, resultando em jornadas extenuantes e falta de tempo para descanso ou lazer. O estudo cita Faria (2009) e Santos (2012) para evidenciar como o trabalho doméstico no meio rural vai além das tarefas tradicionais, incluindo a produção de alimentos e cuidados com animais, sendo muitas vezes considerado uma extensão do trabalho doméstico e desvalorizado socialmente. A falta de uma divisão de trabalho equitativa entre homens e mulheres nos lares impacta diretamente a vida das mulheres após a separação, intensificando suas responsabilidades e dificultando a sua autonomia.

2. Construção de Novas Identidades Desconstrução da Conjugalidade e Reconstrução Individual

Desconstruir a conjugalidade após a separação e reconstruir a identidade individual é um processo lento e difícil, conforme demonstrado pela pesquisa. A experiência de maior liberdade se mistura com o sentimento de solidão nos primeiros momentos após a separação. Enquanto os ex-maridos, na maioria dos casos, rapidamente estabeleceram novos relacionamentos, as mulheres vivenciaram trajetórias distintas. Metade das participantes construiu novas uniões estáveis, entendidas como relacionamentos sem o compromisso formal do casamento, enquanto a outra metade permaneceu sem companheiro, em busca da manutenção de sua honra ou por medo de novas experiências negativas. A decisão de não se envolver em novos relacionamentos está ligada a fatores como a insegurança em relação a novas relações, o medo da solidão, o temor de sofrer novamente e a busca por manter uma imagem social de mulher honrada, resultado de pressões culturais e valores sociais internalizados. A pesquisa destaca a complexidade das escolhas das mulheres após a separação, considerando as diferentes experiências, contextos sociais e suas relações com a construção de sua identidade individual.

3. Separação como Experiência Libertadora Além do Aspecto Trágico

A pesquisa revela que o processo de separação, embora doloroso, não é vivido apenas como um evento trágico. Para muitas mulheres, a separação representou uma experiência libertadora, permitindo a libertação de relacionamentos desgastados, muitas vezes marcados por violência física e/ou verbal. A decisão de se separar tornou-se necessária para garantir a segurança das mulheres e de seus filhos, que viviam em situações de abuso. A separação, portanto, pode ser vista como um ato de empoderamento e busca por uma vida livre de violência, apesar dos desafios enfrentados na construção de uma nova vida. A pesquisa evidencia a necessidade de considerar as diferentes perspectivas e a complexidade do processo de separação, reconhecendo tanto o sofrimento como a possibilidade de libertação e reconstrução pessoal para as mulheres envolvidas. A decisão de se separar, muitas vezes tomada mesmo sem recursos suficientes, demonstra a força e a determinação das mulheres em busca de uma vida melhor para si e para seus filhos.

IV. Participação em Movimentos Sociais e Rede de Apoio

O estudo destaca a importância da participação das mulheres em grupos e movimentos sociais, como o Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) e a Marcha das Margaridas, para a construção de redes de apoio e a luta por direitos. A organização de grupos de mulheres no P.A. Nova Vida, inicialmente chamado de Margarida Alves e posteriormente Unidas Venceremos, com apoio do Centro Feminista 8 de Março, demonstra a força da coletividade na superação das adversidades e na busca pela igualdade de gênero. A pesquisa ressalta os avanços conquistados, como o acesso a programas de crédito como o Pronaf Mulher, mas também chama a atenção para os retrocessos sofridos com governos recentes.

1. Organização das Mulheres no Projeto de Assentamento Nova Vida

As mulheres do Projeto de Assentamento Nova Vida em Upanema-RN estão organizadas em grupo desde 2006. Inicialmente, o grupo, formado por apenas três mulheres, participou de encontros em Mossoró através da associação e sindicato dos trabalhadores rurais. A adesão inicial foi baixa, mas o grupo cresceu gradualmente com o incentivo de projetos e programas de crédito, como o Pronaf Mulher, que exigia a organização de um grupo de mulheres. Inicialmente chamado de Margarida Alves, o grupo posteriormente passou a se chamar Unidas Venceremos, após receber assessoria do Centro Feminista 8 de Março. Esse processo de organização fortaleceu as mulheres, tornando-as participantes assíduas da Marcha das Margaridas e da Marcha Mundial das Mulheres. A experiência de Bromélia, uma das participantes, exemplifica o impacto da participação no grupo: ela relata a ajuda e o apoio mútuo, o aprendizado, a troca de experiências e a sensação de não estarem sozinhas na superação de dificuldades. O grupo se consolidou como uma importante rede de apoio para as mulheres do assentamento.

2. Participação em Movimentos Sociais Marcha das Margaridas e outras Mobilizações

A pesquisa destaca a importância da participação das mulheres em movimentos sociais para a luta por direitos historicamente negados. A Marcha das Margaridas, realizada desde 2000, é mencionada como um exemplo de mobilização e organização das mulheres do campo e da floresta. A participação nesses eventos, tanto a nível nacional (Marcha das Margaridas) quanto internacional (Marcha Mundial das Mulheres), é crucial para a luta pela igualdade de gênero, econômica e social. A pesquisa enfatiza a importância desses espaços de articulação para as mulheres, que percebem uma maior força coletiva na luta por seus direitos. Santos (2012) é citado para reforçar que, apesar de conquistas como benefícios previdenciários e licença-maternidade, ainda há muito a ser conquistado em termos de direitos reprodutivos e combate à violência contra a mulher. A pesquisa evidencia a força transformadora da participação coletiva das mulheres na busca por uma maior equidade e bem-estar.

3. Rede de Apoio e Superação de Dificuldades O Papel da Coletividade

A pesquisa evidencia o papel fundamental das redes de apoio na superação das dificuldades enfrentadas pelas mulheres após a separação conjugal. A participação em grupos e movimentos sociais fornece não apenas um espaço de luta por direitos, mas também uma rede de apoio emocional e prático. Os encontros e palestras permitem a troca de experiências, a identificação de problemas comuns e a busca coletiva por soluções. A experiência compartilhada em grupo minimiza a sensação de isolamento e reforça a importância da solidariedade e da união feminina na superação de desafios. A pesquisa destaca o impacto positivo da participação em grupos organizados, como o grupo Unidas Venceremos do Projeto de Assentamento Nova Vida, que, com o apoio do Centro Feminista 8 de Março, promove a conscientização sobre direitos, a troca de experiências e o fortalecimento da autoestima das mulheres. Essa rede de apoio se mostra essencial para a construção de novas identidades e a superação de traumas e dificuldades após a separação.

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