Ideologia ainda? coligações partidárias em cinco municípios  da AMAU de 2004 a 2012

Coligações Partidárias e Ideologia

Informações do documento

Autor

Sonia Maria Tussi

instructor/editor Gustavo Giora
Escola

Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) - Campus de Erechim

Curso Ciências Sociais
Tipo de documento Trabalho de Conclusão de Curso
Local Erechim
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 496.97 KB

Resumo

I. Partidos Políticos no Brasil Contemporâneo e Ideologias Partidárias

Este estudo investiga a ideologia partidária e sua influência nas coligações partidárias no contexto brasileiro. Analisa-se a fragilidade da institucionalização dos partidos políticos brasileiros, a dificuldade de classificação ideológica no sistema partidário atual (esquerda-direita) e a influência do Estado na dinâmica partidária. A pesquisa considera o impacto do fim do comunismo e a crescente dificuldade em classificar os partidos no tradicional espectro esquerda-direita, questionando a utilidade deste modelo para analisar o cenário político contemporâneo. A pesquisa também examina a evolução da ideologia partidária ao longo do tempo e como isso afeta a formação de coligações.

1.1 Partidos Políticos no Brasil Contemporâneo

Esta seção analisa a natureza dos partidos políticos no Brasil contemporâneo, focando em sua fragilidade institucional. A etimologia da palavra "partido", derivada de "parte", destaca seu papel como agente de conflito e integração. O texto discute a evolução do sistema partidário brasileiro, apontando para a desconstituição da matriz bipartidária pós-ditadura militar (1985-1990), a crise do PDS e a implosão do PMDB após a Constituinte, culminando na criação de inúmeros novos partidos. Apesar de uma relativa estabilidade a partir da década de 1990, os partidos ainda enfrentam uma frágil institucionalização. Estudos recentes sobre a dinâmica partidária em democracias ocidentais indicam um crescente papel do Estado na regulação da vida dos partidos, alterando seu perfil e priorizando suas funções. As experiências de governo deslocam o locus de sustentação e legitimação dos partidos para o Estado, ampliando suas bases de desenvolvimento, anteriormente concentradas nos vínculos sociais tradicionais (Meneguello, 1998). A redemocratização e governos como o de Fernando Henrique Cardoso contribuíram para o acesso dos partidos às arenas decisórias e o canalização de recursos para o desenvolvimento organizacional. No entanto, estudos apontam para a fragilidade das organizações partidárias como produto de condições políticas globais e da pouca capacidade de autonomia dos atores sociais, resultando em partidos com fracas relações partido-eleitor e perda de peso político da militância.

1.1.1 Ideologias Partidárias

A seção aborda a complexidade da conceituação de "ideologia", que engloba uma ampla gama de significados e busca manter ou transformar o sistema social, econômico, político e cultural. No contexto da política partidária, observa-se o ceticismo da população quanto à capacidade dos partidos em promover mudanças significativas na sociedade que atendam às suas necessidades. (Heywood, 2010). A pesquisa destaca a dificuldade de classificação ideológica dos partidos atualmente, especialmente pela queda do comunismo e o fim dos modelos estatistas em 1989 que afetaram até os críticos de esquerda. A dicotomia esquerda-direita, relacionada à propriedade privada (Miguel, 2010), se torna menos clara. Apesar disso, uma parte considerável da literatura ainda utiliza a classificação esquerda-direita como um continuum para a análise dos partidos (Carreirão, 2006). Muitos estudos na ciência política brasileira empregam essa classificação, encontrando nela um bom referencial para a atuação partidária. Apesar da tese da indisciplina partidária, estudos demonstram que partidos e coligações seguem a escala esquerda-direita (Figueiredo, Limongi, 1999 apud Carreirão, 2006), identificando partidos de direita, centro e esquerda. A baixa identificação do eleitorado, o personalismo político, a troca constante de legendas por políticos, e a fraca coesão e localismo dificultam a análise partidária com base na antiga divisão esquerda-direita. O texto aponta para a fragilidade dos partidos e a debilidade do sistema partidário como resultado das limitações impostas pelo Estado à dinâmica de organização de interesses sociais. A força partidária está relacionada à capacidade de representação de atores previamente articulados e à vinculação institucional das demandas e interesses não estatais.

II. Coligações Partidárias no Brasil

A pesquisa examina as coligações partidárias no Brasil, focando nas motivações por trás dessas alianças, especialmente a busca por ampliação da base eleitoral e sucesso eleitoral. O estudo discute a relevância da classificação ideológica (consistentes, semiconsistentes e inconsistentes) na análise das coligações e como a busca pela maximização de votos influencia a formação de alianças, mesmo entre partidos com ideologias opostas. Menciona-se a teoria da economia dos esforços como fator explicativo da dinâmica de alianças eleitorais.

1.2.1 Motivações para Coligações Partidárias

A literatura sobre coligações no Brasil aponta a ampliação da base eleitoral e o sucesso eleitoral como as principais motivações para a formação de alianças partidárias (Carreirão, Nascimento, 2010). No entanto, o texto também destaca a função das coligações na demonstração de afinidades com determinados grupos e afastamento de outros, visando estabelecer parcerias tanto no período pós-eleitoral quanto durante um eventual segundo turno. A formação de coligações também pode servir como sinalização política, indicando alianças e rompimentos estratégicos no cenário político. O estudo utiliza a classificação ideológica das coligações (consistentes, semiconsistentes e inconsistentes) como ferramenta analítica, reconhecendo a complexidade das motivações e estratégias envolvidas na formação dessas alianças. A busca pela maximização do número de votos é apresentada como um fator preponderante, influenciando a composição de coligações, mesmo entre partidos com posições ideológicas opostas.

1.2.2 Classificação Ideológica das Coligações e o Espectro Esquerda Direita

O texto argumenta sobre a pertinência do uso da divisão esquerda-direita como forma de mapear o campo político-partidário brasileiro atual. Esta classificação auxilia a análise das diferenças entre grupos de partidos e serve de base para a análise do fenômeno das coligações. A pesquisa destaca que partidos com bases classistas enfrentam restrições ao se coligarem com partidos de classes sociais antagônicas, pois a atração e manutenção do eleitorado dependem da função de representação da classe social. Desvios dessa função resultam em perda de eleitorado (Soares, 1964 apud Carreirão, Nascimento, 2010). Análises de diferentes partidos (PTB, PMDB, PDS/PPR/PPB/PP, PPS) em diferentes períodos eleitorais demonstram a complexidade das estratégias de coligação e sua relação com o sucesso eleitoral. Observa-se que, em alguns casos, as coligações inconsistentes (com partidos de diferentes posicionamentos ideológicos) obtiveram melhores resultados do que as coligações consistentes, sugerindo uma tendência à flexibilização das posições ideológicas na busca por maior sucesso eleitoral. O estudo de Carreirão e Nascimento (2010) aponta para o crescimento das coligações, especialmente para cargos proporcionais, com tendência para as coligações inconsistentes. A teoria da economia dos esforços é mencionada como um elemento explicativo para a dinâmica das alianças eleitorais, apontando para a priorização da maximização de votos.

III. Estudo de Caso Coligações Partidárias em Cinco Municípios da AMAU 2004 2012

O estudo de caso analisa as eleições municipais de 2004, 2008 e 2012 em cinco municípios da AMAU (Erechim, Getúlio Vargas, Estação, Marcelino Ramos e Gaurama), no Rio Grande do Sul. A pesquisa investiga o padrão de coligações partidárias nesses municípios, classificando-as como consistentes, semiconsistentes e inconsistentes em termos de ideologia partidária. A análise se concentra no desempenho eleitoral das diferentes tipos de coligações, analisando a influência da ideologia partidária nos resultados eleitorais. Partidos como o PT, PMDB, PSDB, PP, PTB e PPS são analisados quanto à sua participação e estratégias de coligação.

2.1 Metodologia e Seleção da Amostra

O estudo de caso analisou as eleições municipais de 2004, 2008 e 2012 em cinco municípios da AMAU (Associação dos Municípios do Alto Uruguai/RS): Erechim, Getúlio Vargas, Estação, Marcelino Ramos e Gaurama. A escolha dos municípios foi intencional e não probabilística, selecionando-se os cinco maiores da região. A coleta de dados utilizou procedimentos como coleta documental, análise de conteúdo e verificação ideológica dos partidos e suas trajetórias. Os dados são considerados primários por se tratar de uma investigação inédita, com cunho quantitativo e qualitativo. A análise focou nas coligações partidárias, classificando-as em consistentes, semiconsistentes e inconsistentes, com base na proximidade ideológica entre os partidos envolvidos. O objetivo foi investigar se a consistência ideológica das coligações influenciava o desempenho eleitoral.

2.2 Análise das Coligações em Cada Município

A análise individual de cada município (Erechim, Getúlio Vargas, Estação, Marcelino Ramos e Gaurama) examinou os padrões de coligações em cada eleição. Em Erechim, observa-se a mudança de estratégia do PT, que em 2004 concorreu sem coligação, enquanto em 2008 e 2012 formou coligações, inclusive com partidos de direita. Em Getúlio Vargas, uma candidatura isolada do PT venceu em 2004. Em Estação, as vitórias ocorreram com coligações inconsistentes e semiconsistentes, com o PP e PSDB se destacando. Em Marcelino Ramos, o PT, com coligações inconsistentes, obteve sucesso em todas as eleições. A análise destaca a variedade de estratégias de coligação utilizadas pelos diferentes partidos em cada município, revelando a complexidade do fenômeno.

2.3 Resultados Gerais e Interpretação

A análise comparativa das coligações nos cinco municípios da AMAU, entre 2004 e 2012, revela que, das cinco candidaturas isoladas, apenas uma obteve sucesso (PT em Getúlio Vargas em 2004). As coligações consistentes não apresentaram nenhum sucesso eleitoral, enquanto as semiconsistentes tiveram três vitórias e oito derrotas. As coligações inconsistentes obtiveram o maior número de vitórias (onze) e derrotas (dez), sendo o tipo de coligação mais frequente. O PT, inicialmente com postura mais ideológica, passou a formar coligações inconsistentes e semiconsistentes, principalmente a partir de 2002. Nos municípios estudados, a tendência foi de formação de alianças com o PT, mesmo com partidos de ideologias incongruentes, reproduzindo um padrão nacional (Carreirão, 2006). A fragmentação do sistema partidário e a busca por vantagem competitiva são fatores que contribuem para a formação de coligações, mesmo com ideologias opostas. A maximização do voto, como princípio geral, dominou as coligações, com alianças estratégicas visando ganho competitivo. A ideologia não se mostrou critério determinante para a formação de alianças ou escolha do candidato pelo eleitor.

IV.Resultados e Conclusões

Os resultados demonstram que as coligações inconsistentes (entre partidos com ideologias opostas) foram as que obtiveram maior sucesso eleitoral nos municípios estudados. As coligações consistentes, ao contrário, mostraram-se menos eficazes. Este dado sugere uma possível perda da nitidez ideológica dos partidos políticos brasileiros, com a busca pela maximização de votos prevalecendo sobre a coerência ideológica na formação de alianças. A pesquisa aponta para a crescente adoção de estratégias catch-all por parte dos partidos, especialmente o PT, buscando agregar o máximo de eleitores. O estudo contribui para a literatura sobre coligações partidárias, oferecendo dados primários sobre a dinâmica política em municípios do Rio Grande do Sul e destacando a importância de estudos mais aprofundados sobre o tema.

2.4 Resultados da Análise das Coligações 2004 2012

A análise das eleições municipais de 2004, 2008 e 2012 nos cinco municípios da AMAU revela um padrão interessante em relação ao sucesso eleitoral das coligações. Candidaturas isoladas tiveram baixo desempenho, com apenas uma vitória em Getúlio Vargas em 2004 (PT). As coligações consistentes, baseadas em afinidades ideológicas, não obtiveram nenhuma vitória nos três anos analisados. As coligações semiconsistentes alcançaram três vitórias e oito derrotas, enquanto as coligações inconsistentes, que uniam partidos com ideologias divergentes, obtiveram onze vitórias e dez derrotas. Este resultado indica que a coerência ideológica não foi um fator determinante para o sucesso eleitoral. A análise destaca a trajetória do PT, que, após 2002, passou a formar coligações inconsistentes e semiconsistentes, obtendo sucesso com essa estratégia. Nos anos de 2008 e 2012, observa-se uma forte tendência de formação de alianças com o PT, mesmo com partidos de ideologias opostas, corroborando um padrão nacional identificado por Carreirão (2006). O PMDB, por sua posição central no espectro político, foi um parceiro frequente em coligações, com maior sucesso em coligações semiconsistentes e inconsistentes.

2.5 Interpretação dos Resultados e Conclusões

Os dados analisados sugerem uma tendência crescente de formação de coligações inconsistentes ou semiconsistentes nos municípios da AMAU nos anos estudados. As coligações ideologicamente coerentes foram exceção. O sucesso das coligações inconsistentes indica uma possível perda da nitidez ideológica dos partidos, com a priorização de estratégias pragmáticas em detrimento das convicções políticas. A estratégia catch-all, em que partidos se aliam a um grande número de legendas, muitas vezes menos expressivas, também foi observada, especialmente no caso do PT, que obteve sucesso com este tipo de coligação. A pesquisa aponta para a prevalência do oportunismo político e a busca pela maximização de votos em detrimento da coerência ideológica na formação de alianças. A teoria da economia dos esforços, que prioriza a maximização do voto, se mostra um poderoso instrumento para diagnosticar a dinâmica de alianças eleitorais, refletindo a realidade observada nos cinco municípios da AMAU. Embora o estudo se concentre em um número limitado de municípios, os resultados inéditos contribuem para o debate sobre coligações partidárias, destacando a necessidade de pesquisas futuras para expandir a compreensão deste fenômeno no contexto brasileiro.