O arresto e os terceiros na perda de bens a favor do Estado, na lei nº 5/2002, de 11 de janeiro

Arresto e Terceiros: Lei 5/2002

Informações do documento

Autor

Gonçalo José Almeida Marques Rocha

Escola

Universidade Católica Portuguesa, Centro Regional do Porto, Escola de Direito

Curso Direito Criminal
Tipo de documento Dissertação de Mestrado
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 580.84 KB

Resumo

I.Natureza Jurídica da Perda Alargada de Bens

A doutrina diverge sobre a natureza jurídica da perda alargada de bens, prevista na Lei n.º 5/2002; alguns autores defendem sua natureza eminentemente penal, enquanto outros a consideram administrativa. Augusto Silva Dias, apoiando-se em Figueiredo Dias, argumenta sua natureza penal como efeito patrimonial da pena. José M. Damião da Cunha e Pedro Caeiro, por outro lado, classificam-na como medida materialmente administrativa aplicada em processo penal. João Conde Correia destaca as dificuldades constitucionais de ambas as classificações, enfatizando a necessidade de legitimidade em um Estado de Direito.

1. Divergências Doutrinárias sobre a Natureza Jurídica da Perda Alargada

A principal questão abordada neste segmento é a controvérsia doutrinária em torno da natureza jurídica da perda alargada de bens, prevista na Lei n.º 5/2002. Não há consenso: parte da doutrina defende a natureza penal do confisco ampliado, argumentando que ele cumpre finalidades político-criminais idênticas à perda de bens e vantagens relacionadas com a prática do crime, constituindo um efeito patrimonial (não automático) da pena. Essa perspectiva, defendida por Augusto Silva Dias, baseia-se nos ensinamentos de Figueiredo Dias sobre os efeitos da pena, ressaltando que estes não são penas em si. Contudo, outra corrente doutrinária, seguida por José M. Damião da Cunha e Pedro Caeiro, qualifica o confisco alargado como medida materialmente administrativa, aplicada por ocasião de um processo penal, embora não sendo uma sanção. João Conde Correia, por sua vez, aponta problemas tanto para a classificação penal quanto para a administrativa, considerando que a opção penal levanta objeções jurídico-constitucionais difíceis de superar, enquanto a opção administrativa exige o cumprimento de condicionantes imprescindíveis à legitimidade em um Estado de Direito. Essa divergência inicial estabelece o pano de fundo para a análise mais profunda das implicações da lei.

2. Perspectivas Contrapostas Penal versus Administrativa

A discussão central se concentra na distinção entre a natureza penal e administrativa da perda alargada de bens. A visão penal, sustentada por Silva Dias com base em Figueiredo Dias, destaca a perda como efeito da pena, atingindo o patrimônio do criminoso como consequência de sua condenação, visando neutralizar o lucro ilícito obtido com a atividade criminosa. O argumento se centra na finalidade político-criminal da medida, que se alinha com a prevenção da criminalidade. Em contraponto, a perspectiva administrativa, defendida por Damião da Cunha e Caeiro, considera a medida como parte do processo penal, mas sem o caráter de sanção propriamente dita. A ênfase está no aspecto material da medida, voltado para a recuperação de ativos obtidos ilicitamente. O texto explora as implicações de cada abordagem, identificando as vantagens e desvantagens de se enquadrar a perda alargada em cada uma dessas categorias. A falta de consenso entre as correntes doutrinárias demonstra a complexidade da matéria e a necessidade de análise aprofundada.

3. Implicações da Classificação Jurídica Dificuldades Constitucionais e Legitimidade

A escolha entre a natureza penal ou administrativa da perda alargada de bens apresenta consequências significativas. Conde Correia destaca que a opção por uma natureza penal da medida suscita “inúmeras objeções de índole jurídico-constitucional, dificilmente superáveis”, sugerindo conflitos com princípios fundamentais do direito. A interpretação administrativa, embora pareça solucionar os problemas constitucionais, não está livre de desafios. De acordo com Conde Correia, mesmo nessa interpretação, são necessárias “determinadas condicionantes imprescindíveis à sua legitimidade num verdadeiro Estado de Direito”. A discussão se aprofunda sobre a necessidade de equilibrar a efetividade da medida de combate à criminalidade com as garantias fundamentais de um Estado de Direito, demonstrando que a classificação jurídica não é apenas uma questão acadêmica, mas tem implicações práticas significativas para a aplicação da lei e a proteção dos direitos dos envolvidos. Essa ponderação entre a eficácia do mecanismo e os direitos individuais é fundamental para a compreensão da perda alargada.

II.Inversão do Ônus da Prova e a Incongruência Patrimonial

O artigo 7º da Lei n.º 5/2002 prevê a inversão do ónus da prova, incumbindo ao arguido demonstrar a origem lícita de seus bens. A incongruência patrimonial é central, exigindo-se a demonstração de que o patrimônio do arguido excede seus rendimentos lícitos. Hélio Rigor Rodrigues e Carlos A. Reis Rodrigues consideram a incongruência autodemonstrável, enquanto João Conde Correia propõe a consideração de rendimentos lícitos como aqueles registados publicamente e declarados fiscalmente. A acusação deve apresentar o valor do patrimônio do arguido, seu rendimento líquido e o valor congruente com o rendimento lícito.

1. Inversão do Ônus da Prova O Artigo 7º da Lei n.º 5 2002

A análise inicia-se com a inversão do ónus da prova, um ponto crucial da Lei n.º 5/2002. O artigo 7º transfere a responsabilidade de comprovar a licitude dos bens para o arguido, ao invés do Ministério Público (MP) ter que provar sua ilicitude. Essa inversão é justificada pela suposta vantagem posicional do arguido, que possivelmente detém provas de aquisição dos bens e tem interesse em preservá-los. Euclides Dâmaso e José Luís F. Trindade corroboram essa ideia, argumentando que o arguido é a parte mais apta a comprovar a origem lícita de sua propriedade. A discussão se concentra nas implicações práticas dessa inversão, considerando as dificuldades que o arguido pode enfrentar para apresentar provas robustas de aquisição lícita, especialmente em casos envolvendo lucros ilícitos de atividades continuadas, onde a ligação entre o crime e os proventos pode ser difícil de estabelecer. A eficácia da lei depende da capacidade do arguido em apresentar provas convincentes, caso contrário, a presunção de ilicitude prevalece.

2. Incongruência Patrimonial Apuração do Patrimônio Lícito

A incongruência patrimonial surge como elemento central na aplicação da lei. A análise se concentra em como determinar se o patrimônio do arguido é compatível com seus rendimentos lícitos. A dificuldade de definição de 'rendimento lícito' é abordada, com João Conde Correia sugerindo como critério legítimo aquele que resulta de manifestação pública, registo e declaração fiscal, em conformidade com os regimes legais aplicáveis. Hélio Rigor Rodrigues reforça essa ideia, indicando as declarações fiscais como base para apurar o rendimento lícito. No entanto, há a complexidade de situações onde investimentos de recursos ilícitos em atividades lícitas geram rendimentos aparentemente lícitos, tornando a análise mais desafiadora. Para Paulo Pinto de Albuquerque, o MP deve apurar e descrever na acusação, de forma precisa, o valor do patrimônio do arguido, seu rendimento líquido no período em questão, e o valor do patrimônio congruente com seu rendimento lícito, levando em consideração despesas e benefícios decorrentes de rendimentos lícitos. O texto destaca a necessidade de um procedimento claro e preciso para estabelecer a incongruência patrimonial, evitando que todo o patrimônio do arguido seja indiscriminadamente considerado como objeto de confisco.

3. O Papel do Ministério Público MP na Demonstração da Incongruência

O papel do Ministério Público (MP) na demonstração da incongruência patrimonial é abordado, mostrando que o MP não precisa provar a ilicitude de todos os bens, mas sim apontar aqueles que considera incongruentes. Hélio Rigor Rodrigues e Carlos A. Reis Rodrigues defendem que a incongruência patrimonial é autodemonstrável, mas o texto reconhece que isso não se aplica a todos os casos. A responsabilidade do MP é detalhada: o MP deve detalhar na acusação (ou adenda) o valor do patrimônio do arguido, seu rendimento líquido, e o valor considerado congruente com o rendimento lícito, considerando despesas e benefícios lícitos. A mera indicação de um patrimônio considerado incongruente não é suficiente; é necessário justificar e detalhar a análise realizada. A presunção do artigo 7º não autoriza o confisco de todo o patrimônio sem uma análise rigorosa da congruência entre patrimônio e rendimentos. Essa abordagem demonstra a necessidade de um procedimento justo e equilibrado, garantindo que a acusação seja fundamentada e transparente.

III.Liquidação do Patrimônio e o Papel do Ministério Público MP

O MP tem a responsabilidade de liquidar o montante a perder a favor do Estado, na acusação ou em adenda até 30 dias antes da audiência. O cálculo considera bens, benefícios e vantagens na data de aquisição, com enfoque objetivo-individual e valor comercial. João Conde Correia salienta que valorizações ou desvalorizações posteriores não são consideradas. A liquidação abrange bens do arguido e, sob certas circunstâncias, bens de terceiros, conforme a interpretação do artigo 7º, nº2, da Lei n.º 5/2002.

1. O Ministério Público MP e a Liquidação do Patrimônio Momentos e Procedimentos

O artigo 8º da Lei n.º 5/2002 atribui ao Ministério Público (MP) a crucial tarefa de liquidar o montante a ser perdido a favor do Estado. Esse processo de liquidação envolve dois momentos distintos: um primeiro na acusação, e um segundo, até 30 dias antes do início da audiência de discussão e julgamento, caso a liquidação não tenha sido possível durante a apresentação da acusação. É importante notar que, mesmo após a liquidação inicial, o valor pode ser alterado até o prazo limite de 30 dias antes da audiência. Após este prazo, a liquidação se torna definitiva e inalterável. A lei não especifica como o MP deve proceder na determinação do valor da liquidação, sendo necessário recorrer a outras partes do texto para entender melhor. O texto menciona que o montante apurado deve refletir o valor dos bens, benefícios, recompensas ou vantagens na data de sua aquisição, em termos líquidos e com uma perspectiva objetivo-individual, considerando o valor comercial e a repercussão na situação econômica do arguido. João Conde Correia destaca que alterações no patrimônio do arguido após a liquidação não são consideradas.

2. Critérios para Apuração do Montante a Perder Perspectiva Objeto Individual

A apuração do montante a ser perdido a favor do Estado exige clareza nos critérios utilizados. O texto indica que o cálculo deve considerar “bens, benefícios, recompensas ou vantagens à data da sua efetiva aquisição, em termos líquidos e numa perspectiva objetivo-individual, tendo em conta o valor comercial da coisa, mas também a sua real repercussão na situação económica do visado”. Essa abordagem demonstra uma preocupação em avaliar não só o valor de mercado dos bens, mas também o impacto real da perda para o arguido. A orientação para uma perspectiva “objetivo-individual” sugere a consideração de fatores específicos à situação econômica individual do arguido. João Conde Correia defende este critério como o mais correto, contrapondo-se a outras possíveis interpretações que poderiam levar a cálculos imprecisos ou injustos. Essa ênfase no critério de apuração demonstra a preocupação em garantir a proporcionalidade e a justiça na aplicação da medida de perda de bens, evitando arbitrariedades e buscando uma avaliação justa do patrimônio a ser confiscado.

3. Inclusão de Bens de Terceiros no Cálculo O Nexo com o Arguido

A complexidade da liquidação se evidencia pela possibilidade de inclusão de bens pertencentes a terceiros no cálculo do montante a perder. O texto deixa claro que o legislador pretendeu incluir bens de terceiros no cálculo, desde que haja um nexo entre os bens e o arguido. Essa inclusão leva a questionamentos sobre a possibilidade de arrestar esses bens de terceiros. O texto sugere que, mesmo que a lei use a expressão “bens do arguido”, a intenção do legislador pode ter sido incluir também os bens de terceiros em certas situações, como aquelas em que o arguido tenha apenas o “domínio e benefício” sobre os bens ou em casos de transferência fraudulenta para terceiros. A análise de casos com bens de terceiros envolve necessariamente a distinção entre terceiros de boa-fé e de má-fé, exigindo um escrutínio cuidadoso da letra da lei e das implicações práticas para a efetividade da medida. A discussão envolve questões de justiça e proporcionalidade na aplicação da lei.

IV.º 5 2002

O arresto preventivo, previsto no CPP, visa garantir o pagamento de dívidas ao Estado, incluindo o valor apurado como vantagem da atividade criminosa. É uma medida cautelar mais grave que a caução económica. A aplicação requer a alegação e prova de justa suspeita da prática criminosa e fundado receio de perda de garantia patrimonial. A legislação processual civil (CPC) influencia o procedimento, e a questão de arrestar bens de terceiros envolve a distinção entre terceiros de boa-fé e terceiros de má-fé, considerando a possível conivência na ocultação de bens. A análise da boa-fé baseia-se na legislação civil, que define terceiro de boa-fé como aquele que desconhecia, sem culpa, o vício do negócio.

1. Arresto Preventivo como Mecanismo Cautelar na Lei n.º 5 2002

A Lei n.º 5/2002 estabelece o arresto preventivo como mecanismo cautelar para garantir o pagamento do montante apurado como vantagem da atividade criminosa. Diferentemente do arresto preventivo geral, previsto no Código de Processo Penal (CPP), que abrange penas pecuniárias, custas processuais e indenizações ao lesado, o arresto na Lei n.º 5/2002 se concentra exclusivamente na garantia do pagamento do valor apurado como lucro ilícito. A imprecisão da legislação quanto ao momento e forma de decretar o arresto gera espaço para diversas interpretações. A intenção é evitar que o arguido dissipe seus bens durante o processo. A lei determina que o MP liquide o montante na acusação, criando um mecanismo cautelar para garantir que o arguido não elimine ou dissipe os bens, protegendo, assim, o interesse público na recuperação do lucro ilícito. A comparação com o arresto preventivo previsto no CPP destaca as diferenças e especificidades do mecanismo na Lei n.º 5/2002, o que evidencia a importância de uma análise detalhada de suas nuances.

2. Requisitos para o Decretamento do Arresto Preventivo

O decreto do arresto preventivo exige o cumprimento de requisitos cumulativos: alegação e prova de fatos que tornem provável a existência de um direito de crédito do Estado e a demonstração de justo receio da perda de garantia patrimonial. O ónus da alegação e prova recai sobre quem requer o arresto. No que concerne à probabilidade de crédito, o legislador não exige a prova da verificação efetiva do crédito, e o receio da perda de garantia patrimonial se caracteriza pelo perigo de atos de ocultação, disposição, alienação ou oneração do patrimônio. Não é necessária a prova de conduta dolosa ou fraudulenta. O texto menciona a novidade introduzida pelo Código de Processo Civil (CPC) de 2013 que elimina a necessidade de demonstração do justo receio em casos de dívida do preço de aquisição de bens transmitidos por negócio jurídico. A análise considera também a necessidade de constituição como arguido do sujeito, conforme o art. 192º, nº 1, alínea d, do CPP, salvo impossibilidade devido a fatores como desconhecimento do paradeiro ou doença do arguido. A decisão judicial deve respeitar os princípios da necessidade, adequação, proporcionalidade, subsidiariedade e precariedade.

3. Arresto e Bens de Terceiros Boa Fé e Má Fé

Uma questão crucial é se todos os bens utilizados para aferir o montante a perder a favor do Estado podem ser arrestados, incluindo bens de terceiros. A interpretação restritiva limita o arresto aos bens do arguido, excluindo aqueles sobre os quais o arguido tenha apenas domínio e benefício ou bens transferidos para terceiros a título gratuito ou com contraprestação irrisória. Entretanto, a lei inclui bens de terceiros no cálculo do montante, o que levanta a questão da possibilidade de arrestar esses bens. A análise passa pela distinção entre terceiros de boa-fé e de má-fé. Terceiros de boa-fé, aqueles que desconheciam, sem culpa, a origem ilícita dos bens, merecem tutela legal. Já os terceiros de má-fé, coniventes com a ocultação de patrimônio, não merecem a mesma proteção. O texto argumenta que os bens de terceiros de má-fé deveriam poder ser arrestados para garantir a execução da sentença, mesmo sem previsão expressa na lei. A discussão também aborda a necessidade de um mecanismo que permita a terceiros de boa-fé intervir no processo para comprovar a licitude de seus bens, apesar da ausência de previsão legal explícita para tal.

V.Terceiros de Boa Fé e Má Fé no Contexto do Arresto

A proteção de terceiros de boa-fé é crucial, impedindo a subtração de sua propriedade baseada em presunção contra o arguido. Terceiros de má-fé, por sua vez, são aqueles que sabiam ou deveriam saber da origem ilícita dos bens. A jurisprudência, como exemplificado por decisões do TRP e STJ, aborda o arresto de bens de terceiros, especialmente em casos de má-fé. A falta de mecanismos processuais específicos para a defesa de terceiros de boa-fé é destacada por Hélio Rigor Rodrigues e Carlos A. Reis Rodrigues

1. Terceiros de Boa Fé Proteção e Limites

A proteção dos direitos de terceiros de boa-fé é um ponto crucial na discussão sobre o arresto. O texto enfatiza que terceiros que adquiriram legalmente bens não podem ter seu direito de propriedade subtraído com base em presunções estabelecidas contra o arguido. A definição de terceiro de boa-fé, na ausência de definição legal específica no âmbito penal, recorre à proteção conferida pelo direito civil, onde é considerado de boa-fé aquele que, no momento da aquisição, desconhecia, sem culpa, o vício do negócio. Transpondo para o âmbito penal, considera-se terceiro de boa-fé aquele que desconhecia, sem culpa, a proveniência ilícita do bem. Jorge Godinho sugere a articulação do regime da Lei n.º 5/2002 com o previsto para a perda de vantagens no Código Penal (CP), que prevê a declaração de vantagens provenientes de facto ilícito a favor do Estado, sem prejuízo dos direitos de terceiros de boa-fé. Hugo Luz dos Santos, referindo-se à doutrina e jurisprudência norte-americana, reforça a necessidade de proteção a esses terceiros, utilizando o termo “bona fide purchaser”. A questão central é a conciliação entre a recuperação de ativos e a salvaguarda dos direitos de quem, de forma legítima, adquiriu bens.

2. Terceiros de Má Fé Conivência e Ausência de Tutela

Em contraponto aos terceiros de boa-fé, a análise aborda a situação dos terceiros de má-fé. Estes são considerados coniventes com a transferência de patrimônio do arguido, visando ocultar bens incongruentes com seus rendimentos lícitos. Embora não haja correspondência expressa na lei, o texto argumenta que os bens de terceiros de má-fé deveriam poder ser arrestados, uma vez que estão incluídos no cálculo do montante a perder a favor do Estado. A não inclusão desses bens frustraria a garantia da execução, pois apenas asseguraria a parte correspondente aos bens do arguido. A definição de terceiro de má-fé, segundo Hugo Luz dos Santos, baseado em doutrina e jurisprudência norte-americana, considera o terceiro de má-fé aquele que, pela proximidade com o arguido, poderia ter conhecimento da origem ilícita do bem. O texto cita decisões do Tribunal Relação de Lisboa (TRP) que reforçam a possibilidade de arresto de bens formalmente detidos por terceiros de má-fé, porém, destaca a ausência de um mecanismo processual específico para que terceiros de boa-fé possam defender seus direitos no processo, o que destaca a necessidade de clareza legislativa.

3. Implicações Práticas e Lacunas Legais

A distinção entre terceiros de boa-fé e má-fé tem implicações práticas relevantes. O texto reconhece a dificuldade e a falta de regulamentação clara quanto ao ónus da prova da proveniência lícita dos bens para terceiros de boa-fé. Apesar de considerar excessivo esse ónus, argumenta que, em razão da facilidade de prova para esses terceiros, seria um mal necessário. A ausência de um mecanismo processual específico para que terceiros de boa-fé possam fazer valer seus direitos no processo é apontada como uma lacuna legal significativa, mencionada por Hélio Rigor Rodrigues e Carlos A. Reis Rodrigues. O texto conclui que a proteção dos terceiros de boa-fé é fundamental, impedindo a subtração de bens legalmente adquiridos com base apenas em presunções contra o arguido, destacando a necessidade de um equilíbrio entre a eficácia da lei e a garantia dos direitos fundamentais. A discussão sobre a complexidade da situação dos terceiros evidencia a necessidade de clarificação e aperfeiçoamento da legislação.