O artigo 348.º do Código do Trabalho : em particular a sua conformidade com o princípio da igualdade

Igualdade e Artigo 348º do Código do Trabalho

Informações do documento

instructor Prof. Doutora Milena Rouxinol
Escola

Universidade Católica Portuguesa

Curso Direito do Trabalho
Tipo de documento Dissertação para obtenção do grau de Mestre
Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 459.59 KB

Resumo

I.A Idade como Fator de Discriminação no Contrato de Trabalho a Termo em Portugal

Este documento analisa o Artigo 348º do Código do Trabalho português, que converte automaticamente os contratos de trabalho em contratos a termo quando o trabalhador atinge 70 anos ou se reforma. A principal questão discutida é se este regime viola o princípio da igualdade e da não discriminação previsto no Direito do Trabalho. A análise abrange a jurisprudência nacional e internacional, incluindo decisões do TJUE (Tribunal de Justiça da União Europeia), sobre casos de discriminação por idade. Autores como Júlio Gomes, Leal Amado, e outros, são citados para sustentar diferentes perspectivas sobre a segurança no emprego e a flexibilidade do Direito do Trabalho neste contexto. O foco está na interpretação do artigo 348º e sua compatibilidade com a Diretiva da UE sobre igualdade de oportunidades e tratamento em matéria de emprego e ocupação (que aborda discriminação direta e indireta), considerando se a idade em si é justificativa suficiente para a conversão do contrato e analisando os argumentos de solidariedade intergeracional usados para justificar o artigo 348º. O estudo também investiga a situação de trabalhadores que, aos 70 anos, não têm direito à reforma por velhice, analisando as consequências financeiras caso o contrato a termo termine. Finalmente, o documento discute a necessidade de equilibrar os direitos dos trabalhadores com os objetivos dos empregadores, dentro dos limites da liberdade contratual.

II.Análise do Artigo 348º do Código do Trabalho e a Conversão de Contratos

O artigo 348º do Código do Trabalho é o centro da discussão. Ele estabelece a conversão ipso jure de contratos de trabalho a tempo indeterminado para contratos a termo, seja aos 70 anos, seja após 30 dias do conhecimento da reforma por velhice por ambas as partes (empregador e trabalhador). O documento discute se esta conversão é justa à luz do princípio da igualdade, comparando os trabalhadores que atingem 70 anos com aqueles que se reformam antes dos 70. A questão central é: a idade, isoladamente, pode justificar a precarização do vínculo laboral? A análise considera a existência ou não de discriminação direta ou indireta conforme a Diretiva da UE. O estudo também explora a possibilidade de renovação do contrato a termo, mesmo após o limite de prazo estabelecido pela lei. A compensação por caducidade para contratos a termo, especificamente no contexto do artigo 348º, também é examinada.

III.Jurisprudência do TJUE e a Interpretação da Diretiva de Não Discriminação

A jurisprudência do TJUE (principalmente os casos Mangold e Vasil Ivanow Georgiew) é analisada para avaliar se a conversão automática prevista no artigo 348º respeita a Diretiva da UE sobre discriminação por idade. O documento examina se o objetivo de política de emprego (como promover o emprego jovem) justifica a medida, considerando se os meios utilizados são proporcionais, adequados e necessários. O papel dos Estados-membros na transposição da Diretiva e a avaliação da conformidade da legislação nacional são discutidos. São analisados os acórdãos do TJUE relacionados à discriminação em razão da idade, principalmente aqueles que abordam a cessação do contrato de trabalho, apontando para a necessidade de meios proporcionais e o papel da garantia financeira para o trabalhador com o fim da relação laboral. A jurisprudência destaca a diferença entre despedimento e conversão de contrato e as implicações de cada um quanto à legislação e aos direitos do trabalhador. Finalmente, a discussão abrange a necessidade de uma análise casuística para determinar a legitimidade da aplicação do artigo 348º.

1. A Diretiva da UE e a Proibição da Discriminação por Idade

A análise se inicia com a discussão sobre a Diretiva da União Europeia que proíbe a discriminação por idade no emprego. O documento enfatiza a necessidade de permitir que trabalhadores mais velhos continuem a exercer suas atividades de forma digna e estável, contrastando com a instabilidade gerada pelo Artigo 348º do Código do Trabalho Português (CT) ao converter automaticamente contratos em regime de termo ao atingir os 70 anos ou com a solicitação da reforma. A Diretiva define discriminação direta e indireta, sendo a direta um tratamento menos favorável a uma pessoa em situação comparável, e a indireta quando um critério aparentemente neutro coloca pessoas de uma determinada classe etária em situação de desvantagem. O texto argumenta que o artigo 348º pode violar a estabilidade no emprego, mas reconhece que a possibilidade de justificar a discriminação através de objetivos e medidas adequadas e proporcionais pode ser usada como argumento para justificar a conversão para contratos a termo.

2. Jurisprudência do TJUE Objetivos Legítimos e Medidas Adequadas

A jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) é analisada para determinar se os objetivos e as medidas que justificam a diferenciação de tratamento são legítimos e adequados. O documento destaca a necessidade de uma análise casuística, pois o TJUE, em diversos acórdãos, demonstra que a proibição de discriminação por idade não é absoluta, admitindo exceções quando se demonstram objetivos legítimos e a proporcionalidade das medidas. São mencionados casos como Mangold e Vasil Ivanow Georgiew, que, segundo Rita Canas da Silva, demonstram que o regime de conversão do artigo 348º pode ser adequado ao considerar, além da idade, outros elementos como a iniciativa do trabalhador em se reformar e a garantia de uma pensão adequada. O documento destaca o caso em que o TJUE reconheceu a legitimidade de políticas sociais e de emprego que visem a criação de empregos para jovens, mas enfatiza que os meios para alcançar esses objetivos devem ser legítimos, apropriados e necessários, conforme o artigo 6º, nº1 da Diretiva. A análise também considera o caso Deutsche Lufthansa, onde o TJUE proibiu contratos a termo baseados na idade após uma relação laboral prévia.

3. Análise de Acórdãos Relevantes e o Papel do Juiz Nacional

A análise aprofunda acórdãos do TJUE, incluindo o caso Fuchs, Köhler contra Hessen, onde o TJUE reforça a ideia de que a idade como único fator não configura discriminação se o objetivo for equilibrar a estrutura de idades para beneficiar jovens, otimizar a gestão de pessoal e evitar litígios sobre aptidão profissional. No entanto, a medida deve ser adequada e necessária. O documento destaca que o juiz nacional tem um papel crucial na análise da conformidade da legislação nacional com o direito da UE, avaliando a legitimidade dos objetivos e a proporcionalidade das medidas. A jurisprudência do TJUE é apresentada como um guia para a interpretação da Diretiva, mas ressalta-se a importância de uma análise individual de cada caso para determinar se a aplicação do artigo 348º do CT é compatível com a legislação da UE. A questão de se os Estados-membros são obrigados a enumerar as circunstâncias que justificam a diferença de tratamento é esclarecida pela jurisprudência do TJUE como não sendo uma obrigação imposta pela Diretiva. O TJUE enfatiza que a cessação do contrato só é permitida com a garantia financeira da subsistência do trabalhador e com fundamentos além da idade. O documento também cita Paulo Ramos de Faria sobre a necessidade de proporcionalidade nas medidas.

IV.Conclusão Equilíbrio entre Direitos dos Trabalhadores e Objetivos dos Empregadores

A conclusão reitera a complexidade do artigo 348º do Código do Trabalho e sua potencial colisão com o princípio da igualdade. O documento argumenta que a idade, isoladamente, não deve ser critério suficiente para a conversão de contratos. A análise ressalta a necessidade de um equilíbrio entre a flexibilidade desejada pelos empregadores e a segurança e estabilidade no emprego para os trabalhadores, especialmente os mais velhos. A solução proposta é que a aplicação do artigo 348º seja mais criteriosa e contextualizada, evitando a conversão automática apenas com base na idade, e que se considerem sempre as circunstâncias individuais. A pesquisa adicional sobre os aspectos da Segurança Social e seus efeitos sobre os direitos trabalhistas é recomendada.

1. A Necessidade de Equilíbrio entre Direitos e Objetivos

A conclusão reforça a complexidade da discussão em torno do artigo 348º do Código do Trabalho, apontando para a necessidade de um equilíbrio entre os direitos dos trabalhadores e os objetivos dos empregadores. O princípio da igualdade é colocado em xeque pela existência de dois grupos de trabalhadores tratados de forma diferente daqueles que não se enquadram no artigo 348º. O texto reconhece a existência de argumentos que justificam o tratamento diferenciado, mas enfatiza a necessidade de tais medidas serem proporcionais, adequadas e legítimas. A discussão sobre a segurança e estabilidade no emprego ressalta a importância de não violar esses princípios, que seriam comprometidos caso apenas contratos a termo fossem permitidos para trabalhadores com 70 anos ou reformados. A análise considera que o artigo 348º, embora tenha como objetivo facilitar a cessação de contratos em determinadas situações, pode gerar problemas de interpretação e aplicação na prática, exigindo uma análise mais criteriosa caso a caso.

2. A Idade como Fator Único e a Questão da Discriminação

A conclusão argumenta que a idade, por si só, não pode justificar a transformação de um contrato de trabalho. A capacidade de trabalho não é determinada linearmente pela idade, existindo estereótipos negativos associados aos trabalhadores mais velhos (excessiva prudência, inflexibilidade, dificuldades com novas tecnologias). A falta de investimento em formação profissional para trabalhadores mais velhos, conforme mencionado por Júlio Gomes, também contribui para essa percepção errônea. A análise destaca que trabalhadores com 70 anos podem não ter direito à reforma, ficando em situação de vulnerabilidade financeira caso seus contratos a termo sejam rescindidos, ao contrário de trabalhadores reformados que possuem a pensão como garantia econômica. O documento reforça a possibilidade de discriminação indireta em relação a trabalhadores reformados e discriminação direta em relação aos que atingem 70 anos. A idade, portanto, não deve ser o único critério para a conversão de contratos.

3. Perspectivas Futuras e Necessidade de Discussão Contínua

O documento finaliza afirmando que o artigo 348º do CT continuará a gerar discussões doutrinais e jurisprudenciais. A questão central é o tratamento diferenciado dado a dois grupos de trabalhadores (reformados e com 70 anos), questionando se isso configura discriminação direta ou indireta. A conclusão reforça a necessidade de buscar um equilíbrio entre direitos e objetivos, lembrando que a aplicação do artigo 348º deve ser contextualizada e proporcional, evitando sua utilização indiscriminada como único critério para conversão de contratos. A análise reconhece a complexidade da questão e a necessidade de futuras discussões e análises para uma interpretação mais justa e adequada do artigo, considerando as especificidades individuais de cada caso e respeitando o princípio da igualdade entre os trabalhadores. A segurança e a estabilidade no emprego são novamente enfatizadas como princípios essenciais da relação laboral que devem ser preservados.