O artº. 501º do CSC : uma análise crítica

Análise Crítica do Artigo 501º CSC

Informações do documento

Idioma Portuguese
Formato | PDF
Tamanho 701.44 KB
Escola

Universidade Católica Portuguesa

Resumo

I.Responsabilidade Solidária em Grupos de Sociedades Análise do Artigo 501º do Código das Sociedades Comerciais

Esta dissertação analisa o regime jurídico do artigo 501º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), que estabelece a responsabilidade solidária da sociedade-mãe pelas obrigações das suas sociedades-filhas, em contextos de grupos de sociedades. O estudo foca-se em grupos constituídos por domínio total ou contrato de subordinação, explorando a Direção Económica Unitária como elemento central. A pesquisa investiga a ratio legis, o âmbito de aplicação, as características e as problemáticas práticas deste regime excepcional, que derroga ao princípio da limitação da responsabilidade dos sócios. A análise considera decisões jurisprudenciais e o debate doutrinário, incluindo contribuições de autores como Engrácia Antunes e Ana Perestrelo de Oliveira, para esclarecer a aplicação do artigo 501º em situações complexas, como a execução contra a sociedade-mãe com base em título executivo emitido apenas pela sociedade-filha, e a manutenção da responsabilidade solidária mesmo após o término da relação de grupo.

1. Introdução à Responsabilidade Solidária e ao Artigo 501º

A dissertação inicia-se com a apresentação do artigo 501º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) como foco central. Este artigo estabelece a responsabilidade solidária da sociedade-mãe pelas obrigações de suas subsidiárias, um mecanismo que contrapõe princípios do direito civil e societário, principalmente a limitação da responsabilidade. O objetivo é analisar o regime jurídico deste artigo, considerando sua ratio, âmbito de aplicação, características e implicações práticas. A problemática da possibilidade dos credores de uma filial moverem uma ação executiva contra a sociedade-mãe, utilizando um título executivo onde apenas a filial figura como devedora, é destacada como questão chave a ser explorada. A pesquisa recorre ao debate doutrinário e a decisões jurisprudenciais para uma compreensão completa deste regime de exceção.

2. Evolução dos Grupos de Sociedades e a Necessidade de um Regime Especial

A análise contextualiza a emergência dos grupos de sociedades, descrevendo a transição de um modelo de sociedades independentes para estruturas mais integradas e complexas. Até o final do século XX, a legislação considerava as sociedades como entidades independentes, operando sob regras de concorrência. No entanto, a busca por eficiência produtiva e expansão de mercado impulsionou a formação de grupos de sociedades, caracterizados pela subordinação a uma direção econômica unitária, apesar da manutenção da autonomia jurídica formal de cada sociedade. O estudo menciona o projeto da 9ª Diretiva das Sociedades Comerciais (1984) e a Proposta de Lei Cousté francesa de 1978 como inspirações para a legislação portuguesa neste domínio, destacando a necessidade de proteção da sociedade-filha, sócios minoritários e credores, em face dos riscos inerentes às relações de controle intersocietário. O Título VI do CSC é apresentado como o instrumento legal para a proteção desses interesses, desencadeando medidas para salvaguardar direitos que seriam prejudicados em situações de conflito de interesses dentro do grupo.

3. Grupos de Facto e Grupos de Direito Níveis de Influência e Controle

A dissertação diferencia grupos de facto e grupos de direito. Grupos de facto são relações intersocietárias sem influência ou domínio formal, como participações simples ou recíprocas (art. 482º e seguintes do CSC). A imposição da vontade da sociedade participante depende de fatores como o número de votos em assembleias gerais e a capacidade de eleger administradores. Já os grupos de direito, foco principal do estudo, são regulados no Título VI do CSC e abrangem grupos constituídos por contrato de subordinação e domínio total. Nestes grupos, a influência da sociedade-mãe sobre as subsidiárias é mais intensa, desencadeando diversas consequências jurídicas que modificam princípios gerais de direito civil e societário. A análise exclui grupos paritários, aos quais o artigo 501º não se aplica. A discussão sobre os graus de imposição da vontade e o conceito de influência dominante são fundamentais para esta distinção, salientando as dificuldades de definir e aplicar estes conceitos indeterminados na prática jurídica.

4. Análise da Direção Econômica Unitária e suas Implicações

A seção aprofunda o conceito de Direção Econômica Unitária, essencial para entender o regime jurídico dos grupos de sociedades. Engrácia Antunes é citada, definindo o contrato de subordinação como um negócio jurídico bilateral que subordina a gestão da sociedade subordinada à direção da sociedade subordinante, conferindo a esta o poder de emitir instruções vinculativas, mesmo prejudiciais à filial. Esta distinção é crucial para diferenciar relações de grupo em sentido estrito e relações de domínio. A mera potencialidade de exercício de poder na relação de domínio não acarreta a mesma responsabilização da sociedade dominante. A dissertação aborda a ausência de definição legal para Direção Econômica Unitária, mas destaca sua importância para compreender o regime jurídico, citando novamente Engrácia Antunes para descrever como esse poder se traduz na centralização da soberania decisória nas mãos da sociedade-mãe. A análise ainda contempla os mecanismos restritivos da autonomia das sociedades-filhas, como a emissão de instruções vinculativas pela sociedade-mãe e a possibilidade de atribuição de lucros à sociedade-mãe ou outras sociedades do grupo.

5. Alcance e Limitações do Artigo 501º Jurisprudência e Doutrina

Esta seção discute o alcance e as limitações do artigo 501º, abordando a questão da sua compatibilidade constitucional, segundo a perspectiva de Engrácia Antunes e Ana Perestrelo de Oliveira. A análise explora as exceções à autolimitação espacial do Título VI do CSC, considerando a sede das sociedades envolvidas. O dever de comunicação (art. 484º) é considerado excluído do âmbito de aplicação restrito, e a discussão sobre a responsabilização de sociedades indiretamente dominantes é apresentada. A interpretação da alínea d) do nº 2 do art. 481º, que trata de sociedades estrangeiras que constituem sociedades anónimas em Portugal, e sua influência na aplicabilidade do regime especial dos grupos, também é analisada, destacando a divergência doutrinária sobre a matéria. A jurisprudência do Tribunal Constitucional (TC) sobre o tratamento diferenciado de sociedades com sede em Portugal e no estrangeiro é analisada, focando-se na questão da igualdade e dos efeitos dessa diferenciação na esfera dos trabalhadores e credores.

6. Natureza da Responsabilidade da Sociedade Mãe Solidária Objetiva e Automática

A seção aprofunda a natureza da responsabilidade da sociedade-mãe prevista no artigo 501º. É caracterizada como direta, ilimitada, legal, objetiva, solidária e automática pelas obrigações das filiais, subsistindo mesmo após o término da relação de grupo. A irrelevância da natureza, origem e momento da constituição da obrigação da filial são analisadas, considerando as opiniões divergentes entre Engrácia Antunes e Menezes Cordeiro sobre o tipo de débitos abrangidos. A comunicabilidade da responsabilidade em grupos verticais é explicada, mas é advertido que a aplicação do artigo 501º não visa uma desconsideração total da personalidade jurídica. A distinção entre esta responsabilidade e a desconsideração da personalidade jurídica é feita, destacando-se a natureza subsidiária desta última face ao direito positivo. A proteção dos credores e a confiança na aplicação objetiva do direito são os fundamentos da responsabilidade da sociedade-mãe, que se presume ter poder de disposição sobre as filiais, mesmo sem participação direta no nascimento ou incumprimento da obrigação. A natureza solidária da responsabilidade, contrastando com o regime geral e as opiniões de Engrácia Antunes e Januário Costa Gomes, são analisadas.

7. Meios de Defesa da Sociedade Mãe e Implicações Processuais

A análise explora os meios de defesa disponíveis para a sociedade-mãe, considerando a doutrina de Antunes Varela sobre meios de defesa pessoais e comuns em situações de solidariedade. A compensação (arts. 847º e seguintes do CC) é analisada como um meio de defesa pessoal, com limites definidos pela reciprocidade dos créditos. A possibilidade de a sociedade-mãe usar a compensação ou sub-rogação, dependendo da subsistência da relação de grupo, é discutida. A impossibilidade de a sociedade-mãe opor-se ao cumprimento da obrigação da filial invocando garantias reais prestadas pelo credor é analisada, assim como a aplicação dos arts. 752º, nº. 1, do CPC e 697º do CC. A manutenção da responsabilidade após o término da relação de grupo é justificada pela necessidade de proteção dos credores, com referência a Perestrelo de Oliveira. A vedação ao afastamento da responsabilidade por vontade das sociedades é enfatizada. A discussão sobre a renúncia a meios de defesa pela sociedade-filha e as implicações para a sociedade-mãe também são abordadas.

8. Conclusão Proporcionalidade e Harmonização de Direitos

A dissertação conclui que nenhum direito é absoluto e insuscetível de redução, em conformidade com os princípios da proporcionalidade e harmonização de direitos. A responsabilidade direta, ilimitada, legal, objetiva, solidária e automática da sociedade-mãe pelas obrigações de suas filiais é reafirmada, persistindo após o término da relação de grupo, em benefício do credor. A proposta de conciliação entre o direito substantivo e o adjetivo, permitindo a execução contra a sociedade-mãe com base em título executivo que só menciona a filial, desde que as obrigações sejam posteriores à relação de grupo e esta seja comprovada, é apresentada e discutida. A complexidade de ações contra toda a estrutura vertical do grupo e os potenciais obstáculos à efetivação dos direitos do credor são explicitados, analisando o prazo de exigibilidade em grupos verticais. A interpretação analógica do art. 54º do CPC é considerada, bem como a necessidade de equilíbrio entre a proteção do credor e a segurança jurídica da sociedade-mãe. A intenção é transmitir uma visão holística, onde os direitos são ponderados para garantir a justiça e a efetividade das relações contratuais.

II. Grupos de Direito

A dissertação distingue entre grupos de facto e grupos de direito. Nos grupos de facto, a influência dominante de uma sociedade sobre outra é determinada caso a caso, analisando critérios como o número de votos nas assembleias gerais e a capacidade de eleger gerentes. Nos grupos de direito, regulados no Título VI do CSC, a Direção Económica Unitária é mais evidente, principalmente nos grupos constituídos por contrato de subordinação e domínio total, onde a sociedade-mãe exerce maior controlo sobre as sociedades-filhas. Grupos constituídos por contrato de grupo paritário são excluídos da análise por não se enquadrarem no artigo 501º.

1. Grupos de Facto Relações InterSocietárias sem Domínio Formal

A seção inicia a distinção entre grupos de facto e grupos de direito, focando-se primeiramente nos grupos de facto. Estes são definidos como relações intersocietárias que não necessariamente implicam conceitos de influência ou domínio, como no caso de relações de simples participação (alínea a) do art. 482º e art. 483º, nº 1 do CSC) e relações de participações recíprocas (alínea b) do art. 482º e art. 485º, nº 1 do CSC). A imposição da vontade de uma sociedade sobre outra nestes grupos depende de fatores específicos. A influência direta depende do número de sócios com direito a voto em cada assembleia geral; já a influência indireta está relacionada com a capacidade de eleger gerentes ou administradores. O tipo societário também é um fator relevante nesta análise. Em resumo, nos grupos de facto, a subordinação não é pré-definida pela lei, mas sim deduzida de uma análise casuística da relação entre as sociedades envolvidas, considerando a sua interação e o poder de influência de uma sobre a outra.

2. Grupos de Direito Direção Econômica Unitária e Autonomia Jurídica

Em contraste com os grupos de facto, a seção descreve os grupos de direito, regulados no Capítulo III do Título VI do CSC. Estes grupos, formados por contrato de subordinação ou domínio total, representam a forma mais intensa de influência de uma sociedade sobre outra. Engrácia Antunes define o contrato de subordinação (arts. 493º e seguintes do CSC) como um negócio jurídico bilateral onde uma sociedade (subordinada) subordina sua gestão à direção de outra (subordinante), permitindo a esta emitir instruções vinculativas, mesmo que prejudiciais. Esta capacidade de determinar o projeto de vida das sociedades-filhas é fundamental para a distinção entre grupos de direito e relações de domínio. Nos grupos constituídos por domínio total, a sociedade dominante não tem a mesma faculdade de instrução direta; os atos que lesam a autonomia patrimonial das sociedades dominadas são considerados ilícitos. A submissão das filiais à direção econômica unitária e a manutenção da autonomia jurídica de cada sociedade são características essenciais dos grupos de direito. Contratos de grupo paritário, por não se enquadrarem no art. 501º, são excluídos desta análise.

III.Direção Económica Unitária e Autonomia Jurídica

O conceito de Direção Económica Unitária é fundamental. Ele implica a submissão das sociedades-filhas a uma gestão centralizada pela sociedade-mãe, mesmo que cada sociedade mantenha sua autonomia jurídica. A dissertação examina o poder da sociedade-mãe de emitir instruções vinculativas às suas filiais, mesmo que prejudiciais, no contexto do contrato de subordinação, contrastando com a relação de domínio, onde atos que desrespeitam a autonomia patrimonial das sociedades dominadas são ilícitos. O trabalho analisa a compatibilidade da opção legislativa de restringir o âmbito de aplicação do Título VI a certos tipos societários com a Constituição, tendo em conta a opinião de autores como Engrácia Antunes e Ana Perestrelo de Oliveira.

1. Conceito de Direção Econômica Unitária e sua Importância

A seção inicia definindo a importância do conceito de Direção Econômica Unitária para a compreensão do regime jurídico dos grupos de sociedades. Embora não haja uma definição legal explícita, o conceito é fundamental. A ausência de uma definição legal não diminui sua relevância para a análise da relação entre sociedades-mães e subsidiárias. A dissertação destaca a necessidade de analisar este conceito para compreender o funcionamento e as consequências jurídicas dos grupos de sociedades, particularmente no que se refere à responsabilidade da sociedade-mãe pelas obrigações de suas filiais. A citação de Engrácia Antunes ilustra como esse poder de gestão se manifesta na centralização da soberania decisória, transferindo o poder de decisão individual das sociedades agrupadas para a sociedade-mãe. Essa centralização do poder de direção sobre a atividade empresarial das subsidiárias junto do núcleo dirigente da cúpula grupal é analisada como um elemento fundamental para a aplicação das normas legais pertinentes.

2. Direção Econômica Unitária e o Contrato de Subordinação

A seção aprofunda a relação entre Direção Econômica Unitária e o contrato de subordinação, regulado pelos artigos 493º e seguintes do CSC. Segundo Engrácia Antunes, esse contrato é um negócio jurídico bilateral que vincula uma sociedade (subordinada) a subordinar sua gestão à direção de outra (subordinante). Esta subordinação confere à sociedade subordinante o direito de emitir instruções diretas e vinculativas aos órgãos de administração da sociedade subordinada, mesmo que essas instruções sejam prejudiciais. Este poder de determinar o projeto de vida das sociedades-filhas, com base nos interesses do grupo, é fundamental para distinguir o regime jurídico das relações de grupo em sentido estrito da relação de domínio. Em relações de domínio, a sociedade dominante não tem a mesma faculdade de dispor das sociedades dominadas; atos que desrespeitam a autonomia patrimonial são ilícitos e geram obrigação de indenizar.

3. Mecanismos Restritivos da Autonomia das Sociedades Filhas

A seção detalha os principais mecanismos que restringem a autonomia das sociedades-filhas dentro do contexto da Direção Econômica Unitária. O primeiro mecanismo é a possibilidade da sociedade-mãe emitir instruções vinculativas às filiais, mesmo com desvantagens para estas (art. 503º, nºs 1 e 2 do CSC), a menos que o contrato de subordinação estabeleça o contrário. O segundo mecanismo é a inclusão contratual (apenas no âmbito do contrato de subordinação) de uma convenção que obriga a sociedade subordinada a atribuir seus lucros à sociedade-mãe ou a outra sociedade do grupo (art. 508º, nº 1 do CSC). Este último mecanismo não se aplica às relações de domínio total, onde os lucros são distribuídos como dividendos à sociedade-mãe/sócia única, sem transferências interfiliais. A análise destes mecanismos destaca como a Direção Econômica Unitária afeta a autonomia das sociedades-filhas, mesmo que formalmente elas mantenham sua independência jurídica.

4. Debate Doutrinário sobre o Alcance da Legislação e a Constituição

A seção apresenta o debate doutrinário sobre a limitação legal da aplicação do Título VI do CSC apenas a certos tipos societários, questionando sua compatibilidade com a Constituição. Engrácia Antunes questiona a compatibilidade da opção legislativa com a Constituição, argumentando que a restrição pode comprometer a eficácia prática do regime das sociedades coligadas. Ana Perestrelo de Oliveira argumenta em sentido semelhante, defendendo que não há fundamento para a violação do princípio da igualdade e que o regime jurídico das sociedades coligadas deveria se aplicar independentemente da forma do sujeito ativo do controle, incluindo casos onde o sujeito é um sócio pessoa singular. A discussão sobre a “conexão espacial” dos sujeitos, conforme o proêmio do nº 2 do art. 482º, que restringe a aplicabilidade do Título VI às sociedades com sede em Portugal (exceto em casos específicos), também é abordada, destacando a complexidade da legislação e a necessidade de interpretação cuidadosa para garantir sua eficácia e compatibilidade com princípios constitucionais.

IV.Alcance e Natureza da Responsabilidade Solidária Artigo 501º

A responsabilidade solidária prevista no artigo 501º é analisada em profundidade. O estudo aborda a irrelevância da natureza, fonte e momento da constituição da obrigação da sociedade-filha para a responsabilidade da sociedade-mãe. A responsabilidade estende-se a obrigações contraídas antes e durante a vigência da relação de grupo, inclusive em grupos verticais. A dissertação discute a natureza da responsabilidade solidária, contrastando-a com a desconsideração da personalidade jurídica e analisando as opiniões divergentes na doutrina, incluindo as de Engrácia Antunes e Januário Costa Gomes, sobre a solidariedade versus subsidiariedade da dívida da sociedade-mãe. A questão da manutenção da responsabilidade após o término da relação de grupo também é explorada, juntamente com as implicações para os credores.

1. Alcance da Responsabilidade Solidária Obrigações Abrigadas

Esta seção examina o alcance da responsabilidade solidária da sociedade-mãe prevista no artigo 501º do Código das Sociedades Comerciais (CSC). A análise se concentra na abrangência das obrigações da sociedade-filha pelas quais a sociedade-mãe responde. Segundo a interpretação baseada na definição civilística de obrigação (art. 397º do CC), a sociedade-mãe responde por todos os vínculos jurídicos que obrigam a sociedade-filha a uma prestação, como argumenta Engrácia Antunes. Contudo, Menezes Cordeiro discorda, limitando a abrangência a débitos fungíveis e geralmente pecuniários. A irrelevância da natureza, fonte ou origem da obrigação é analisada, assim como a irrelevância do momento de constituição da obrigação (que será detalhada em seção posterior). A comunicabilidade da responsabilidade em grupos verticais também é abordada; a sociedade-mãe responde por todas as obrigações das sociedades com quem mantém uma relação direta de grupo e, indiretamente, pelas obrigações das sociedades que, em conjunto, formam um grupo vertical, independentemente do grau de parentesco. A autora adverte sobre a natureza não absoluta desta responsabilidade, contrastando-a com a desconsideração da personalidade jurídica.

2. Comparação com a Desconsideração da Personalidade Jurídica

A seção compara a responsabilidade solidária do artigo 501º com a figura da desconsideração da personalidade jurídica. Embora ambas suprimem a responsabilidade limitada do sócio, a autora destaca que a semelhança se limita à supressão da responsabilidade limitada, pois o artigo 501º se aplica tanto a sociedades-mãe em grupos constituídos por contrato de subordinação quanto a grupos constituídos por domínio total. No caso do contrato de subordinação, a sociedade diretora não precisa ser sócia da subordinada, tornando a analogia com a desconsideração da personalidade jurídica menos direta. A autora argumenta que a desconsideração da personalidade jurídica tem natureza subsidiária, sendo um mecanismo excepcional para situações não abrangidas pelo direito positivo, e não um instrumento para preencher lacunas legislativas. A aplicação do artigo 501º visa, ao contrário, a proteção efetiva dos credores e sua confiança na aplicação objetiva do direito e na conduta das contrapartes, presumindo-se, juris et de jure, o efetivo exercício de um poder de disposição da sociedade-mãe sobre as suas filiais.

3. Natureza da Responsabilidade Solidária ou Subsidiária

Esta seção discute a natureza da responsabilidade prevista no artigo 501º, questionando se ela é solidária ou subsidiária. Engrácia Antunes a qualifica como sui generis, destacando que o regime-regra para obrigações comerciais é o da solidariedade (art. 100º do CCom.), ultrapassando a restrição do art. 513º do CC. A conjugação de diversos artigos do CCom. e CSC é apresentada como argumento favorável à natureza solidária. Januário Costa Gomes, entretanto, discorda, considerando a existência de uma dívida principal (da sociedade-filha) e uma secundária (da sociedade-mãe), o que, segundo ele, o art. 100º do CCom. não explica. Ele aponta a ausência de menção expressa à solidariedade no artigo 501º como um possível indicador de não-solidariedade, embora ressalve que isso não implica um afastamento liminar da solidariedade. A análise de diversos artigos do CSC, que mencionam expressamente a responsabilidade solidária, é utilizada para fortalecer a argumentação de Costa Gomes, contrastando com a ausência dessa menção no artigo 501º.

4. Responsabilidade Solidária e Meios de Defesa da Sociedade Mãe

A seção analisa os meios de defesa disponíveis para a sociedade-mãe em situações de responsabilidade solidária, tendo em conta o disposto no art. 514º do CC e a doutrina de Antunes Varela sobre meios de defesa pessoais e comuns dos condevedores solidários. A compensação (arts. 847º ss do CC) é examinada como um meio de defesa pessoal, sujeito a requisitos objetivos e subjetivos. O estudo sugere que, se a sociedade-mãe tiver que responder por uma obrigação da sociedade-filha que preencha os requisitos da compensação, ela deve ordenar à filial a emissão da declaração de compensação (art. 848º, nº 1 do CC). A utilização da compensação após o término da relação de grupo é analisada, considerando a possibilidade de exercício do direito de regresso contra a ex-filial ou a sub-rogação. A impossibilidade da sociedade-mãe se opor ao cumprimento da obrigação da filial alegando garantias reais prestadas a favor do credor é discutida, assim como o disposto nos arts. 752º, nº 1 do CPC e 697º do CC, que tratam da penhora de bens em casos de garantia real. A manutenção da responsabilidade mesmo após o fim da relação de grupo é justificada pela necessidade de proteger os credores.

V.Procedimentos e Meios de Defesa

A dissertação explora as implicações processuais do artigo 501º, analisando a possibilidade de ação executiva contra a sociedade-mãe com base em título executivo que só nomeia a sociedade-filha como devedora. A pesquisa discute as dificuldades de uma ação contra toda a estrutura vertical do grupo e propõe soluções para conciliar o direito substantivo e o direito adjetivo. Os meios de defesa disponíveis para a sociedade-mãe, como a compensação e a sub-rogação, também são examinados, considerando-se o impacto da renúncia da sociedade-filha a meios de defesa. A análise inclui referências ao Código Civil e ao Código de Processo Civil português (CPC), bem como ao impacto da sucessão na obrigação, e a interpretação analógica do art. 54º do CPC.

1. Ação Executiva Contra a Sociedade Mãe e o Título Executivo

A seção inicia analisando a problemática da ação executiva movida por credores de uma filial contra a sociedade-mãe. O foco é a possibilidade de utilização de um título executivo onde apenas a sociedade-filha figura como devedora, uma situação que apresenta complexidades. A dissertação destaca esta questão como um aspecto relevante da aplicação prática do artigo 501º do CSC, demonstrando a necessidade de uma análise profunda dos procedimentos e meios de defesa disponíveis para a sociedade-mãe neste contexto. A análise da viabilidade desta ação executiva é central para compreender as implicações práticas do regime de responsabilidade solidária estabelecido pelo artigo 501º, considerando as circunstâncias específicas em que tal procedimento pode ser considerado válido. A discussão sobre a eficácia da ação executiva e as garantias dos credores são elementos cruciais desta parte da análise.

2. Meios de Defesa da Sociedade Mãe Compensação e Sub rogação

A seção detalha os meios de defesa de que a sociedade-mãe pode se valer face à responsabilidade solidária, abordando a compensação (arts. 847º e seguintes do CC) e a sub-rogação. A compensação é analisada como um meio de defesa pessoal, operando dentro de limites estreitos, e dependendo da reciprocidade dos créditos. A sua aplicação é condicionada pela vigência da relação de grupo. Se a relação já tiver cessado, a oposição deste meio de defesa pelo credor é considerada ilícita. A sub-rogação surge como alternativa caso o direito de regresso contra a ex-filial se revele improvável. A ineficácia da oposição ao cumprimento da obrigação com base em garantias reais constituídas pela sociedade-filha é discutida, referindo os artigos 639º, nº 1, do CC, 101º do CCom, 752º, nº 1, do CPC e 697º do CC. A análise enfatiza que a sociedade-mãe não pode se valer de garantias reais da filial para se eximir da responsabilidade solidária.

3. Manutenção da Responsabilidade Após o Término da Relação de Grupo

A seção analisa a manutenção da responsabilidade da sociedade-mãe pelas obrigações da filial mesmo após o término da relação de grupo, uma questão crucial para a proteção dos credores. Citando Perestrelo de Oliveira, a dissertação argumenta que a sociedade-filha continua a sofrer os efeitos do poder de direção exercido pela sociedade-mãe durante a vigência dessa relação. A cessação da relação de grupo não restaura automaticamente as garantias dos credores, sendo a manutenção da responsabilidade essencial para a efetiva proteção destes. Apesar de opiniões doutrinárias contrárias, a jurisprudência tende a confirmar a manutenção dessa responsabilidade, vedando o afastamento por vontade das sociedades envolvidas. A seção explora a questão da renúncia da sociedade-filha a meios de defesa, suas implicações para a sociedade-mãe e a possibilidade desta evitar a renúncia por via contratual ou instruções vinculativas. A compensação da sociedade-filha por perdas decorrentes do exercício do direito de regresso pela sociedade-mãe também é brevemente abordada.

4. Propostas de Conciliação Entre Direito Substantivo e Adjetivo

A seção final apresenta uma proposta de conciliação entre o direito substantivo e o direito adjetivo, buscando melhorar a eficácia da ação executiva contra a sociedade-mãe. O autor critica a complexidade de ações contra toda a estrutura vertical do grupo, que dificulta a realização do direito ao crédito. Uma solução proposta é a possibilidade de execução contra a sociedade-mãe baseada em título executivo que só menciona a sociedade-filha como devedora, porém, limitada a obrigações contraídas durante a vigência da relação de grupo e enquanto esta perdurar. Esta solução visa facilitar o acesso à justiça para os credores, ao mesmo tempo que proporciona maior segurança jurídica à sociedade-mãe. A análise considera a interpretação analógica do art. 54º do CPC, buscando equiparar o caso de sucessão na obrigação à extensão ope legis da responsabilidade, sem contudo propor uma interpretação contra legem. A conclusão reitera a importância do princípio da proporcionalidade e harmonização de direitos, buscando um equilíbrio entre a proteção dos credores e a segurança jurídica das sociedades.