
Sentimento Econômico & Preços Imobiliários
Informações do documento
Autor | Marta Andreia Pires Fão |
instructor | Tiago Trancoso, Professor Doutor |
Escola | Escola Superior de Tecnologia e Gestão – Instituto Politécnico de Viana do Castelo |
Curso | Contabilidade e Finanças |
Tipo de documento | Dissertação |
Local | Viana do Castelo |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 2.87 MB |
Resumo
I.Caracterização e Importância do Mercado Imobiliário
O mercado imobiliário, classificado como mercado de consumo e investimento, é um setor base da economia, intrinsecamente ligado à qualidade de vida da população e fortemente impactado por variáveis macroeconômicas como o PIB e a inflação. Sua importância é amplificada pela globalização e a recente crise financeira internacional de 2007. Um estudo do DIW (Instituto Alemão de Investigação Econômica) alertou para uma possível bolha especulativa em 20 países da OCDE, devido à acentuada alta dos preços nos últimos anos. A análise da flutuação dos preços é abundante sob a ótica de fatores fundamentais, porém a influência de fatores não-fundamentais, como o sentimento econômico, tem ganhado destaque nos últimos anos.
1. Definição e Importância do Mercado Imobiliário
O mercado imobiliário é definido como um setor fundamental da economia, atuando simultaneamente como mercado de consumo e de investimento. Sua importância se deve à sua relação intrínseca com a qualidade de vida da população, uma vez que a aquisição de imóveis representa o principal investimento para a maioria dos agregados familiares, afetando diretamente seus gastos com habitação e, consequentemente, seus níveis de consumo e poupança. A interdisciplinaridade do processo produtivo dos bens imobiliários, envolvendo diversos profissionais e setores, contribui para sua relevância econômica. Além disso, sua conexão com o setor bancário e o sistema monetário e político de cada país reforça sua posição central na economia. A globalização e as fortes interações entre mercados internacionais, exemplificadas pela crise financeira internacional de 2007, ampliam ainda mais a importância deste mercado e a necessidade de sua análise aprofundada.
2. O Mercado Imobiliário sob a Ótica da Pesquisa e Alertas de Bolhas Especulativas
Dada sua relevância, o mercado imobiliário é objeto de constantes pesquisas econômicas, financeiras, monetárias, sociais e políticas. Um relatório de 2018 do DIW (Instituto Alemão de Investigação Econômica), baseado em estudo de 20 países da OCDE, alerta para o risco de uma bolha especulativa, justificado pela acentuada alta de preços observada em vários países europeus e na América do Norte nos dois anos anteriores à publicação. O conceito de 'bolha' é explicado como um período em que o preço de um ativo se distancia significativamente do seu valor real. A preocupação reside na sustentabilidade dessas altas de preços, questionando-se se elas são justificadas por aumentos proporcionais nas rendas ou no poder de compra dos consumidores, sugerindo a presença de especulação. A análise da flutuação de preços, embora amplamente estudada com base em variáveis macroeconômicas (fatores fundamentais), carece de pesquisas mais profundas sobre a influência de fatores não-fundamentais.
3. Análises Precedentes Variáveis Macroeconômicas e seus Impactos nos Preços Imobiliários
Diversos estudos incorporam índices de preços gerais e de ações como fatores determinantes dos preços imobiliários. Sutton (2002), em análise de seis economias desenvolvidas, identifica impacto de flutuações no rendimento nacional, preço das ações e taxas de juro nos preços dos imóveis. Himmelberg et al. (2005), em estudo transversal de cidades norte-americanas, atribuem a recente alta de preços a fatores como baixas taxas de juro reais de longo prazo, elevado crescimento de rendimentos e preços de mercado excepcionalmente baixos em meados da década de 90. Os autores destacam o caráter local da dinâmica de preços, com dados agregados escondendo particularidades fundamentais (diferenças econômicas entre cidades). Goodhart & Hofmann (2008) demonstram a relação multidirecional entre preços de imóveis, variáveis monetárias e macroeconômicas, com o crescimento monetário impactando significativamente preços de imóveis e crédito. Zhu & Tsatsaronis (2004) apontam o impacto negativo da inflação nos preços imobiliários e a influência de fatores de financiamento hipotecário (crédito bancário, taxa de juro de curto prazo e spreads), que explicam cerca de um terço da variação de preços de longo prazo. Surpreendentemente, o rendimento familiar apresentou pouco impacto na determinação de preços neste estudo. No mercado português, Figueiredo (2012) demonstra relação positiva entre IPH e PIB, e negativa com a taxa de juro do crédito habitacional.
II.Fatores Explicativos das Flutuações de Preços Além das Variáveis Macroeconômicas
Estudos demonstram que variáveis macroeconômicas como o PIB, a inflação e as taxas de juro (curto e longo prazo), embora importantes, são insuficientes para explicar completamente as flutuações de preços no mercado imobiliário (Sutton, 2002; Gallin, 2006; Égert & Mihaljek, 2007; Mikhed & Zemčík, 2009; Posedel & Vizek, 2011). A inclusão de variáveis de cariz psicológico e comportamental, como aversão a perdas e efeito disposição, melhora significativamente o poder explicativo dos modelos. Diversos estudos (Neale & Northcraft, 1987; Fudenberg, 2006; DellaVigna, 2009; Rouwendal & Longhi, 2007; Shiller, 2007; Clapp & Lu-Andrews, 2016; Leung & Tsang, 2011; Paraschiv & Chenavaz, 2011; Chang et al., 2017; Seiler & Sun, 2017) confirmam a influência desses vieses comportamentais em diferentes mercados imobiliários, incluindo Hong Kong e Taiwan.
1. Insuficiência de Variáveis Macroeconômicas para Explicar Flutuações de Preços
Estudos demonstram que, apesar da vasta literatura que analisa a flutuação dos preços imobiliários com base em variáveis macroeconômicas (fatores fundamentais), como PIB, inflação e taxas de juros, esses fatores isoladamente se mostram insuficientes para explicar completamente as oscilações de preços. Autores como Sutton (2002), Gallin (2006), Égert & Mihaljek (2007), Mikhed & Zemčík (2009), e Posedel & Vizek (2011) apontam essa limitação em diferentes estudos. A análise da flutuação de preços explicada por fatores não-fundamentais é relativamente escassa em comparação com estudos sobre mercados de capitais, embora essa dinâmica tenha apresentado mudanças significativas nos últimos anos. Essa constatação indica a necessidade de incorporar novas variáveis explicativas para uma compreensão mais completa do fenômeno.
2. O Papel de Variáveis Psicológicas e Comportamentais na Análise de Preços
Considerando a insuficiência das variáveis macroeconômicas clássicas para explicar as flutuações de preços no mercado imobiliário, o texto destaca a importância de incluir variáveis de caráter psicológico, emocional e comportamental. A justificativa reside na aplicação de vieses e desvios comportamentais, observados em estudos de laboratório, ao contexto real do mercado (Neale & Northcraft, 1987). Esses fatores comportamentais surgem como um complemento valioso na análise, enriquecendo a compreensão das flutuações. Diversos estudos citados, (Fudenberg, 2006; DellaVigna, 2009; Rouwendal & Longhi, 2007; Shiller, 2007; Clapp & Lu-Andrews, 2016; Tsai, Chen & Puttonen, 2007; Leung & Tsang, 2011; Paraschiv & Chenavaz, 2011; Chang, Chao & Yeh, 2017; Seiler & Sun, 2017), comprovam a influência desses fatores em diferentes mercados imobiliários globais, indicando a necessidade de modelos mais abrangentes que contemplem tanto os aspectos macroeconômicos quanto os comportamentais.
3. Estudos de Caso Evidências da Influência de Fatores Comportamentais
O texto apresenta vários estudos que demonstram a influência de fatores comportamentais nos preços imobiliários. Gallin (2006), analisando 95 áreas metropolitanas dos EUA, concluiu que fatores fundamentais não explicam totalmente os aumentos de preços. Posedel & Vizek (2011) sugerem que as flutuações de preços não são completamente justificadas por fatores fundamentais, e que a persistência de ciclos de preços pode levar a booms imobiliários. Sutton (2002) observa que os preços subiram além do que as variáveis macroeconômicas conseguem explicar, indicando a presença de especulação baseada em comportamentos instintivos. Estudos em Hong Kong (Leung & Tsang, 2011) e Taiwan (Chang et al., 2017) detecta a presença de efeito ancoragem e aversão a perdas no mercado imobiliário. Einiö et al. (2007) mostram propensão à venda com retorno nulo, influenciada pelo preço original de compra, e aversão a perdas mais pronunciada em imóveis mais baratos e com financiamento social. Paraschiv & Chenavaz (2011) apontam para a miopia dos proprietários, que analisam os resultados em termos nominais, e não reais. A inclusão de variáveis comportamentais melhora o desempenho dos modelos preditivos, como demonstrado em diversos estudos, sugerindo sua relevância na análise de flutuações de preços.
III.Mensuração do Sentimento Econômico e seu Impacto
A mensuração do sentimento econômico é crucial. Baker & Wurgler (2006, 2007) desenvolveram índices compostos para medir o sentimento dos investidores, demonstrando seu impacto significativo nas rentabilidades de ativos, particularmente aqueles mais difíceis de avaliar. Outros estudos utilizam inquéritos (Ling et al., 2015; Heinig et al., 2016) e o Índice de Confiança do Consumidor (ICC) (Rouwendal & Longhi, 2007) como proxies para o sentimento econômico. A análise do impacto do sentimento econômico no mercado imobiliário é ainda relativamente escassa em estudos de âmbito internacional.
1. O Desafio da Mensuração do Sentimento Econômico
A mensuração precisa do sentimento econômico é apresentada como um desafio crucial para o estudo, uma vez que sua definição e quantificação são fundamentais para avaliar seu impacto nos preços do mercado imobiliário. Baker & Wurgler (2007) são citados como exemplo, destacando a dificuldade em medir o sentimento dos investidores e quantificar seus efeitos no âmbito das finanças comportamentais. O texto enfatiza que este desafio se estende a várias formas de mensuração, sendo a escolha do método um elemento crítico para o desenvolvimento da pesquisa. Diferentes abordagens são discutidas na literatura, com alguns autores utilizando índices compostos a partir de diversas proxies (Baker & Wurgler 2006), enquanto outros optam por inquéritos diretos a agentes do mercado (Ling et al., 2015; Heinig et al., 2016).
2. Métodos de Mensuração Utilizados em Estudos Precedentes
Vários métodos de mensuração do sentimento econômico são revisados. Baker & Wurgler (2006, 2007) criam um índice composto a partir de seis proxies, buscando diferenciar o sentimento da componente idiossincrática das variáveis. Eles demonstram que, em períodos com baixa proxy de sentimento, os retornos subsequentes são maiores para ativos menores, recentes, voláteis, pouco lucrativos, sem dividendos ou com crescimento extremo. O método top-down e macroeconômico de Baker & Wurgler (2007) analisa os efeitos do sentimento no rendimento agregado de mercado e em ativos individuais, identificando quais os mais suscetíveis à influência do sentimento. Outros autores utilizam o Índice de Sentimento Econômico (ISE) (Fernandes, 2015) e o Índice de Confiança do Consumidor (ICC) (Rouwendal & Longhi, 2007) como indicadores proxy do sentimento, buscando compreender seu impacto nas rentabilidades futuras de mercados acionistas e de obrigações soberanas. Ling et al. (2015) utilizam inquéritos diretos a compradores, construtores e financiadores, utilizando também os resíduos das regressões como proxies para o sentimento dos agentes. A utilização de Google Trends como proxy também é mencionada (Heinig et al., 2016).
3. Impacto do Sentimento Econômico e Limitações dos Métodos
A revisão de literatura evidencia o impacto do sentimento na formação de preços em mercados financeiros, embora a maioria dos estudos se concentre em mercados de capitais específicos. Ling et al. (2015) concluem que altos níveis de sentimento preveem forte apreciação nos preços imobiliários nos EUA, superando o impacto das variáveis fundamentais. A relação dinâmica entre sentimento, preços e volatilidade é destacada como um feedback importante para a persistência dos movimentos de preços em períodos de expansão e recessão. Por outro lado, a dependência de medidas indiretas ou agregadas de sentimento, como o ICC, pode limitar a análise, especialmente quando esses indicadores deixam de explicar as rendibilidades (Fernandes, 2015). A pesquisa utiliza o ICC como proxy inicial, isolando o 'sentimento irracional' (sentimento econômico) através de regressão, buscando assim mensurar de forma mais precisa a influência deste fator nos preços imobiliários. A pesquisa destaca a escassez de estudos internacionais sobre o impacto do sentimento econômico no mercado imobiliário, tornando a pesquisa inovadora no seu escopo amostral.
IV.Resultados Empíricos e Conclusões
A pesquisa utiliza dados de painel de 24 países, analisando a relação entre o sentimento econômico (obtido como resíduo da regressão do ICC em variáveis macroeconômicas), o IPH (Índice de Preços da Habitação), o PIB, a inflação e taxas de juro. Os resultados revelam um impacto negativo do sentimento econômico nos preços do mercado imobiliário, diferentemente de estudos que utilizaram indicadores de sentimento específicos para o mercado imobiliário. A inflação mostra relação positiva com o IPH, enquanto o PIB apresentou relação negativa, resultado contraditório à literatura. A pesquisa contribui para a compreensão da formação de preços no mercado imobiliário, focando a influência do sentimento econômico em um contexto internacional, comparando-o à dinâmica observada nos mercados de capitais.
1. Metodologia Empírica e Variáveis Utilizadas
A análise empírica utiliza dados de painel de 24 países, com o objetivo de avaliar o impacto do sentimento econômico nos preços do mercado imobiliário. A metodologia baseia-se no trabalho de Lemmon & Portniaguina (2006), adaptando-a ao contexto específico do estudo. A variável dependente é o Índice de Preços da Habitação (IPH), enquanto as variáveis explicativas incluem o sentimento econômico (obtido como resíduo da regressão do Índice de Confiança do Consumidor - ICC em variáveis macroeconômicas), o PIB, a inflação e taxas de juro (curto e longo prazo). A escolha das variáveis se fundamenta na literatura existente e na relação esperada entre elas e o IPH. A maioria das variáveis é analisada em níveis, para evitar a marginalização dos resultados decorrente da alta volatilidade de algumas delas. Foram estimadas diversas regressões alternativas, considerando diferentes formas de mensuração das variáveis e a inclusão de taxas de juro interbancária como proxy para a taxa de juro do crédito habitacional, com a escolha final baseada na significância estatística das variáveis explicativas.
2. Resultados da Regressão e Comparação com a Literatura
Os resultados da regressão principal revelam um impacto negativo e significativo do sentimento econômico (considerado 'irracional') nos preços do mercado imobiliário, corroborando alguns estudos da literatura (Rouwendal & Longhi, 2007; Zheng et al., 2014). Em contraponto, estudos com indicadores de sentimento específicos para o mercado imobiliário (baseados em inquéritos) encontraram relações positivas (Ling et al., 2015; Marcato & Nanda, 2016). A inflação apresentou uma relação positiva e significativa com o IPH, enquanto a taxa de juro de curto prazo não se mostrou estatisticamente significativa. Dois resultados divergem da literatura: a relação negativa entre PIB e IPH e a positiva entre taxa de juro de longo prazo e IPH. Essas divergências podem ser justificadas pelas diferenças amostrais, horizonte temporal e metodologia, uma vez que o PIB, em particular, é mensurado de forma diversa nos estudos comparados. O estudo apresenta um poder explicativo considerável, justificando-se a moderação em comparação com outros estudos pela maior dimensão e heterogeneidade da amostra (24 países).
3. Conclusões e Contribuições da Pesquisa
A pesquisa contribui para a compreensão da formação de preços no mercado imobiliário em um contexto internacional, focando o impacto do sentimento econômico. O estudo destaca a escassez de pesquisas com essa abrangência geográfica e o impacto do sentimento econômico no mercado imobiliário em comparação com a literatura sobre mercados de capitais. Apesar de o sentimento econômico apresentar um impacto negativo nos preços imobiliários na análise, a pesquisa aponta para a necessidade de aprofundamento em futuros estudos, considerando fatores adicionais do lado da oferta e comportamentos específicos de proprietários, a fim de se obterem resultados mais precisos e abrangentes. O estudo se destaca por sua amplitude amostral, sendo considerado o mais abrangente nesta área, segundo a pesquisa conduzida pelos autores, e abre caminho para futuras investigações que aprofundem a compreensão da interação entre sentimento econômico e dinâmica de preços no mercado imobiliário global.