
Distúrbios Alimentares: Peso e Insatisfação Corporal
Informações do documento
Autor | Margarida Pocinho |
Escola | Universidade não especificada no documento |
Curso | Toxicodependências e Patologias Psicossociais |
Tipo de documento | Mestrado (Dissertação) |
Ano de publicação | Ano não especificado no documento |
Local | Cidade não especificada no documento |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 2.78 MB |
Resumo
I.Aspectos da Puberdade e Preocupações Corporais
Este estudo investiga a relação entre a puberdade, a imagem corporal e o desenvolvimento de transtornos alimentares em adolescentes. A pesquisa analisa as preocupações específicas de rapazes e raparigas durante a puberdade, destacando a preocupação dos rapazes com os seus órgãos genitais e virilidade, e das raparigas com o desenvolvimento das mamas e a menstruação. A aceitação destas mudanças físicas varia significativamente entre os indivíduos, influenciando a autoestima e a satisfação corporal. A rejeição do próprio corpo é relacionada à angústia da separação dos pais e à busca da identidade.
1. A Puberdade Processo e Variações
O texto inicia abordando a puberdade como um processo que ocorre entre os 11/12 e os 16 anos, com variações individuais na idade de início, ritmo e término. A maturação fisiológica nas raparigas antecede a dos rapazes em 18 meses a dois anos, com a média do crescimento pubertário ocorrendo por volta dos 12 anos nas meninas. A discussão enfatiza a importância do processo de desenvolvimento para a construção da identidade e da imagem corporal, salientando o impacto psicológico e emocional nessa fase da vida. A aceitação das mudanças físicas e o desenvolvimento da identidade de gênero são aspectos centrais do processo de amadurecimento e formação do autoconceito. O texto sugere que a compreensão deste estágio é crucial para a prevenção de problemas relacionados à imagem corporal e transtornos alimentares.
2. Preocupações Específicas de Rapazes e Raparigas
Para os rapazes, as preocupações centram-se essencialmente nos órgãos genitais e na virilidade, sendo comum a comparação entre pares como mecanismo de defesa contra angústias de castração. Já para as raparigas, as principais preocupações giram em torno do desenvolvimento das mamas e da menarca. A reação à própria mudança física é variável, indo desde a dissimulação até à exibição das novas formas corporais. O texto destaca a diversidade de respostas, com algumas raparigas buscando atenuar a feminilidade e outras ansiosamente aguardando a sua manifestação. Esta diversidade de experiências reforça a complexidade da relação entre puberdade, imagem corporal, e construção da identidade feminina.
3. O Corpo como Símbolo de Identidade e Separação
A seção discute a relação complexa do adolescente com seu corpo durante a puberdade, considerando-o um reflexo da hereditariedade parental. O texto argumenta que a rejeição de partes do próprio corpo é vista como um ataque aos objetos internos e figuras parentais, impactando o narcisismo e a representação de si. A busca de independência e separação dos pais é um processo fundamental para a construção da identidade individual, sendo esse um período em que o adolescente frequentemente se confronta com a angústia de não saber o que lhe é próprio (Jeammet, 1994). Esta busca pela autonomia marca as relações familiares e interpessoais, configurando um dos processos mais desafiadores na transição da infância para a adolescência. A capacidade de abstração e a percepção da temporalidade se desenvolvem nesta fase, influenciando a forma como o adolescente percebe a si próprio e o mundo.
4. Autoconceito e Padrões Sociocultureis
O autoconceito é apresentado como um construto multidimensional, formado ao longo da vida e influenciado pela interação com o meio ambiente e pelos outros significativos. A satisfação com a imagem corporal, e consequentemente a autoestima, estão intrinsecamente ligadas à percepção do “corpo ideal”, muitas vezes ditado por padrões socioculturais e pela pressão social. A insatisfação com o peso ou com partes específicas do corpo parece estar mais relacionada a estes padrões socioculturais do que à identificação com grupos de referência ou ao momento pubertário. Indivíduos com baixa autoestima, frequentemente buscando aprovação externa, se mostram mais suscetíveis à influência de tendências da moda, reforçando ainda mais as suas inseguranças e insatisfações. O estudo destaca a influência dos fatores psicológicos e morfológicos na insatisfação com o peso nos adolescentes.
II.A Anorexia Nervosa Características e Diagnóstico
A anorexia nervosa (AN) é descrita detalhadamente, focando na sua manifestação insidiosa e na busca obsessiva por magreza. O estudo destaca a tríade sintomática de Lasègue (Anorexia, Amaigrissement, Amenorreia), embora reconheça que a amenorreia não se aplica a todos os casos, incluindo os masculinos. A pesquisa menciona o aumento da preocupação com o peso em rapazes, influenciada por novos padrões estéticos masculinos. A pesquisa compara as características de anorécticas restritivas e bulímicas, enfatizando os comportamentos compensatórios das últimas. A prevalência da AN é estimada em 0,6% a 1% das raparigas na puberdade, sendo que um estudo em Lisboa, com 2398 alunas do ensino secundário, verificou 0,4% de casos de AN, 12,6% com alterações na imagem corporal e perda de peso sem amenorreia, e 7% com alterações na imagem corporal sem perda de peso. A pesquisa ressalta a gravidade da doença e a importância do diagnóstico precoce.
1. Manifestações da Anorexia Nervosa
A anorexia nervosa (AN) é apresentada como um transtorno que se inicia de forma insidiosa, muitas vezes disfarçado sob a aparência de um regime de emagrecimento. A busca pela magreza torna-se um objetivo em si mesma, ultrapassando as motivações iniciais. A pessoa anoréctica recusa-se a reconhecer a sua aparência inestética, acreditando que o sucesso está na manutenção do emagrecimento, muitas vezes sem limite inferior. A perda de peso obsessiva é muitas vezes reforçada pela combinação de redução da ingestão calórica com exercícios físicos intensos, podendo esta combinação se iniciar desde o princípio da doença ou ser adotada como mecanismo compensatório em resposta à pressão social ou terapêutica. O texto destaca a dificuldade em distinguir, na fase inicial, a conduta anoréctica dos hábitos de indivíduos que fazem dieta para um corpo esbelto.
2. Histórico e Prevalência da Anorexia Nervosa
A anorexia nervosa é descrita como uma doença médica séria e pouco compreendida, embora se especule que exista há muito tempo. Sua descrição pormenorizada, em França e Inglaterra, ocorre apenas no final do século XIX. Atualmente, a doença se alastra em países industrializados em proporções epidêmicas, ao contrário dos países em desenvolvimento. As estimativas apontam para um caso de AN entre cada 100 a 150 raparigas na puberdade (0,6% a 1%). Um estudo realizado com 2398 alunas do ensino secundário na Grande Lisboa revela uma prevalência de 0,4% de AN, 12,6% com alterações na imagem corporal e perda de peso sem amenorreia, e 7% com alterações na imagem corporal sem perda de peso. Esses dados sugerem uma prevalência mais abrangente de problemas relacionados à imagem corporal e ao peso.
3. Aspectos Diagnósticos e Evolução da Anorexia Nervosa
A tríade sintomática dos três “A” de Lasègue (Anorexia; Amaigrissement; Amenorreia) é mencionada como um importante ponto de referência diagnóstica, embora a amenorreia não seja aplicável aos homens. O texto destaca a visão ultrapassada que associava a recusa de alimentos em rapazes a esquizofrenia, ressaltando a atual compreensão da AN em ambos os sexos. A perda de apetite sexual e de ereção nos rapazes é comparada à amenorreia e à recusa da sexualidade nas raparigas, com quadro clínico, gravidade e evolução semelhantes para ambos os sexos. Apesar da equivalência clínica, a prevalência da AN é muito maior no sexo feminino (90% dos casos), um aspecto que a pesquisa busca entender. O texto também referencia as contribuições de Elysio de Moura (1947) sobre a anorexia mental, destacando a descrição da restrição alimentar insidiosa e a negação da doença pelo indivíduo afetado.
4. Tipos de Anorexia Nervosa e Progressão da Doença
O texto diferencia as anorécticas do tipo restritivo, que mantém uma dieta extremamente reduzida em quantidade e qualidade de alimentos, das do tipo bulímico, que recorrem a comportamentos purgativos como vômitos induzidos, uso de laxantes e diuréticos, ou exercícios físicos excessivos para manter a magreza. A evolução da AN é apresentada como um processo insidioso que pode passar despercebido por muito tempo, com a insuficiência alimentar se manifestando eventualmente através da falha menstrual, da magreza extrema, desnutrição, e outros sintomas físicos graves, como queda de cabelo, unhas quebradiças e descalcificação dentária. A pesquisa aponta para o aumento de preocupações com o físico em rapazes, influenciada por novos padrões estéticos masculinos (modelos como Calvin Klein, em contraste com o exemplo feminino de Twiggy), justificando a necessidade de atenção a estas tendências.
III.Bulimia Nervosa Aspectos Clínicos e Comportamentais
A bulimia nervosa (BN) é abordada como um transtorno distinto, caracterizado por episódios de compulsão alimentar seguidos de comportamentos purgativos, como vômitos induzidos, uso de laxantes e diuréticos, ou exercícios físicos excessivos. A preocupação excessiva com o peso e a forma corporal é central para o diagnóstico. O estudo ressalta que, diferentemente da anorexia, a bulimia pode ser observada em indivíduos com peso normal. A pesquisa destaca a relação entre a bulimia, baixa autoestima, e a insatisfação corporal, e a influência de padrões socioculturais irrealistas de beleza. Um estudo de Pope e cols. mostrou uma prevalência de BN superior entre raparigas ocidentais de classe social elevada (2,1%).
1. Histórico e Conceito da Bulimia Nervosa
O texto destaca que, diferentemente da anorexia nervosa, cujos estudos médicos remontam ao século XIX, as condutas bulímicas foram inicialmente vistas como sintomas de outras patologias mais graves. O termo bulimia foi originalmente usado para descrever a avidez por alimentos acompanhada de fraqueza. Houve uma longa divergência nosográfica, com diferentes interpretações: neurose (Lasègue, Ferenczi e Freud), sintoma de depressão grave (Jeammet), e relação com toxicodependências (psicanálise). Uma perspectiva contrastante associa a bulimia à obesidade, focando na preocupação excessiva com o peso e a forma corporal. A principal característica do bulímico, nesse sentido, é o temor doentio à gordura, distinguindo-o de quem come em excesso ocasionalmente. Esta diversidade de interpretações demonstra a complexidade na compreensão e classificação da bulimia nervosa ao longo do tempo.
2. Episódios Bulímicos Comportamento e Perda de Controle
A bulimia nervosa se caracteriza por episódios de compulsão alimentar (binges), consistindo no consumo de quantidades de comida superiores às que a maioria das pessoas consumiria em circunstâncias semelhantes, acompanhados por uma sensação de perda de controle. Os alimentos consumidos são tipicamente ricos em carboidratos e gorduras, ingeridos rapidamente e de forma desordenada. Inicialmente, a fome, decorrente de dietas restritivas, atua como gatilho, mas com o tempo, o empanturramento se generaliza como resposta a diversas situações de tensão emocional. O desconforto físico e psicológico intenso após o episódio, juntamente com a depreciação pós-orgia e o desejo de purgar a comida ingerida através de vômitos auto-induzidos, uso de laxantes e diuréticos, ou exercícios físicos excessivos, completam o ciclo bulímico. Este ciclo vicioso é um elemento chave na definição da bulimia nervosa.
3. Bulimia Nervosa Fatores Psicológicos e Sociocultureis
A percepção da obesidade é descrita como altamente aversiva, especialmente para as raparigas (DeJong & Kleck, 1986). Expectativas irrealistas sobre a forma corporal são identificadas como causa principal da bulimia, levando as mulheres a sentirem-se falhadas e culpadas (Bauer & Anderson, 1989). Pinto-Gouveia (2000) relaciona o aumento dos distúrbios alimentares, especialmente da bulimia nervosa, com o ideal contemporâneo de beleza feminina, progressivamente mais magro e irrealista. A diminuição do peso médio das mulheres na população contribui para uma insatisfação generalizada com o peso, tornando mais perceptível a depreciação corporal. A pesquisa de Pope e cols. mostra uma prevalência de bulimia nervosa superior em raparigas ocidentais de classe social elevada (2,1%). Estes dados demonstram a interação entre fatores psicológicos e pressões socioculturais na origem e desenvolvimento da bulimia nervosa.
4. Distinção da Bulimia de Comportamentos Alimentares Disfuncionais
O texto esclarece que a bulimia nervosa não se resume a hábitos alimentares caóticos, mas envolve sofrimento intenso e traços de personalidade específicos. Estes traços incluem baixa autoestima, dificuldades de funcionamento social, e grande necessidade de aprovação externa (Herscovici, 1997). A bulimia é comparada a outros comportamentos alimentares perturbados, enfatizando que o temor de engordar pode estar presente mesmo em indivíduos sem sobreestimação do tamanho e forma do corpo. Indivíduos saudáveis podem apresentar comportamentos alimentares disfuncionais pontualmente, sem configurar um distúrbio. A analogia entre o fumo (fator de risco para o cancro) e a dieta (fator de risco para transtornos alimentares) ilustra que, embora o risco exista, nem todos os que fazem dieta desenvolvem transtornos do comportamento alimentar. A pesquisa sublinha a importância da distinção entre comportamentos transitórios e um quadro clínico de bulimia nervosa.
IV.Metodologia e Resultados Avaliação de Atitudes e Comportamentos Alimentares
O estudo utilizou uma metodologia quantitativa, empregando instrumentos como o Inventário dos Distúrbios Alimentares - versão 2 (EDI-2), a Escala de Auto-Estima de Rosenberg (RSES) e o Inventário Depressivo de Beck (BDI) para avaliar adolescentes e adultos jovens (12 a 22 anos) de Lisboa. O EDI-2 foi traduzido e adaptado, com a participação de um júri de especialistas, incluindo uma pessoa com experiência em anorexia. A pesquisa investigou os comportamentos alimentares, as atitudes em relação ao corpo e à alimentação, o nível de satisfação/insatisfação corporal, e a relação entre estes fatores com a autoestima. Foram analisados dados como Índice de Massa Corporal (IMC), frequência de dietas e preocupações com o peso. Os resultados indicam maior insatisfação corporal nas raparigas, com uma forte correlação entre insatisfação e IMC. O estudo também investigou a prevalência de AN e BN na amostra, utilizando os critérios diagnósticos do DSM-IV e da CID-10.
1. Instrumentos de Avaliação e População Alvo
O estudo, de caráter empírico e exploratório, utilizou o Inventário dos Distúrbios Alimentares - versão 2 (EDI-2), a Escala de Auto-Estima de Rosenberg (RSES) e o Inventário Depressivo de Beck (BDI) para avaliar atitudes e comportamentos alimentares em uma população de adolescentes e adultos jovens (12 a 22 anos). O EDI-2 passou por um processo de tradução e adaptação para a população alvo, com a participação de um júri de especialistas, incluindo uma pessoa com experiência em anorexia. A escolha dos instrumentos visou investigar comportamentos alimentares, atitudes em relação ao corpo e à alimentação, o nível de satisfação/insatisfação corporal, e a relação desses fatores com a autoestima. A pesquisa também objetivou identificar a existência de anorexia, bulimia, ou outras perturbações do comportamento alimentar na população em estudo. O tempo médio de preenchimento da bateria de testes oscilou entre 40 a 60 minutos, sendo maior para os grupos etários mais baixos e para o gênero feminino.
2. Coleta de Dados e Características da Amostra
A metodologia de coleta de dados buscou uniformidade em todas as escolas, embora as aulas de Educação Física, inicialmente planejadas, não tenham sido sempre utilizadas devido a restrições curriculares. Quando possível, os questionários foram aplicados nessas aulas, facilitando a obtenção de medidas de peso mais fidedignas devido ao uso de roupas leves. Em outros casos, foram tomados cuidados para minimizar a interferência de roupas extras nas pesagens e medidas. Todos os inquiridos foram pesados e medidos com roupas leves e calçado raso. A análise socioeconômica da amostra, baseada na profissão dos pais, sugere uma predominância da classe média, embora com variações individuais. A análise do Índice de Massa Corporal (IMC) revelou 8,6% de indivíduos com subpeso (IMC ≤ 17,5), 85,1% com peso normal, e 6,4% com sobrepeso (IMC > 25), com diferenças significativas entre os sexos no que se refere a subpeso e peso normal.
3. Análise de Resultados Insatisfação Corporal e Peso
O estudo analisou a relação entre a insatisfação corporal (IC do EDI-2) e o IMC, por sexo. Os resultados indicam maior insatisfação corporal nas raparigas, com uma forte correlação entre insatisfação e IMC. A análise comparativa entre os sexos mostrou diferenças estatisticamente significativas na insatisfação corporal, exceto para o IMC inferior ou igual a 17,5 kg/m². Observou-se maior insatisfação em rapazes com IMC entre 17,5 e 20 kg/m² (magreza), enquanto o maior número de satisfeitos foi encontrado em rapazes com IMC entre 20 e 25 kg/m². Nas raparigas, a insatisfação corporal aumentou progressivamente com o aumento do IMC entre 20 e 25 kg/m². A pesquisa considerou relevante analisar a história do peso dos indivíduos e a redução da ingestão alimentar como fator de risco para descontrole alimentar, levando em consideração a idade de início das preocupações com o peso e a frequência de redução da ingestão alimentar nos últimos 6 meses.
4. Considerações Finais sobre a Metodologia e Limitações
A análise dos escores do EDI-2 foi realizada por subescala, dada a avaliação de traços conceitualmente diferentes em cada uma delas. O cálculo dos escores totais seria problemático para a interpretação (Garner, 1991). A pesquisa menciona a consistência interna do EDI-2, comparando os resultados com outros estudos. As fidedignidades mais baixas foram observadas em adolescentes (Shore e Porter, 1990), com valores abaixo de 0,70 para as subescalas de BN e MM. O estudo utilizou também a Escala de Auto-Estima de Rosenberg (RSES) e o Inventário Depressivo de Beck (BDI) para avaliar a autoestima e sintomas depressivos, frequentemente associados a distúrbios alimentares. O texto conclui alertando para a importância de considerar a idade (dividida em grupos ≤16 e >16 anos) na análise dos resultados, e para a necessidade de cautela na interpretação dos dados, dada a complexidade das relações entre os fatores analisados e a possibilidade de comportamentos alimentares disfuncionais em indivíduos sem diagnóstico formal de transtornos alimentares.