
Pokémon GO e Saúde Mental
Informações do documento
Autor | Andreia Filipe Vieira |
Escola | ISMT |
Curso | Psicologia Clínica |
Tipo de documento | Dissertação de Mestrado |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 631.49 KB |
Resumo
I.Metodologia do Estudo sobre o Impacto do Pokémon GO na Saúde Mental
Este estudo quantitativo, transversal e correlacional, analisou o impacto do jogo Pokémon GO na saúde mental de 480 jogadores portugueses (18 a 60 anos), residentes em diversas regiões do país, incluindo Açores e Madeira. A pesquisa utilizou questionários online, incluindo um questionário sociodemográfico e sobre o uso do Pokémon GO, o NEO-FFI (inventário de cinco fatores de personalidade) e o BSI (Inventário de Sintomas Breves) para avaliar a sintomatologia psicopatológica. A análise estatística empregou testes paramétricos como t-Student e ANOVA.
1. Amostra e Recrutamento
O estudo utilizou uma amostra de 480 jogadores de Pokémon GO, com idades entre 18 e 60 anos (média de 27,30 anos; desvio padrão de 9,86 anos), residentes em vários distritos de Portugal Continental e nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira. A coleta de dados foi realizada através de um protocolo online, composto por um questionário sociodemográfico, questionário de utilização do jogo Pokémon GO, o NEO-FFI (NEO-Five Factor Inventory) e o BSI (Brief Symptom Inventory). A amostragem foi não probabilística por conveniência, com a divulgação do questionário em grupos privados online de jogadores de Pokémon GO. A participação foi voluntária, confidencial e anónima, com uma declaração de consentimento informado no início do protocolo. A distribuição da amostra por sexo foi relativamente equitativa: 43,5% mulheres e 56,5% homens. A distribuição geográfica da amostra abrangeu todo o território português, sendo Lisboa o distrito com o maior número de participantes (26%). Detalhes adicionais sobre o estado civil e nível de escolaridade dos participantes são apresentados no documento original, mas fogem do escopo desta seção focada na metodologia.
2. Instrumentos de Avaliação
Para a recolha de dados, foram utilizados três instrumentos principais: um questionário sociodemográfico e de utilização do jogo Pokémon GO (adaptado de Tabacchi et al., 2017), que recolheu dados quantitativos sobre o comportamento dos jogadores, como horas de jogo diárias, compras na aplicação, entre outros; o NEO-FFI (NEO-Five Factor Inventory), para avaliação da personalidade; e o BSI (Brief Symptom Inventory, versão portuguesa adaptada por Canavarro, 1999), para avaliação da sintomatologia psicopatológica. O BSI avalia a presença e intensidade de sintomas em nove dimensões: somatização, obsessões-compulsões, sensibilidade interpessoal, depressão, ansiedade, hostilidade, ansiedade fóbica, ideação paranóide e psicoticismo. Inclui ainda três índices globais: Índice Geral de Sintomas (IGS), Índice de Sintomas Positivos (ISP) e Total de Sintomas Positivos (TSP). A escolha destes instrumentos permitiu uma avaliação abrangente dos aspetos relacionados com o uso do jogo Pokémon GO e sua relação com a saúde mental dos jogadores, combinando dados sobre o comportamento de jogo com traços de personalidade e sintomatologia.
3. Análise Estatística
A análise estatística dos dados foi conduzida utilizando o programa IBM SPSS Statistics (versão 25). Inicialmente, foi realizada uma análise descritiva e exploratória dos dados, incluindo o cálculo de médias, desvios padrão e frequências absolutas e relativas. Devido ao tamanho da amostra (n>30) e ao Teorema do Limite Central, foram utilizados testes paramétricos, como o t-Student e ANOVA, assumindo-se uma distribuição aproximadamente normal da média amostral. Testes não paramétricos, como o Qui-Quadrado, também foram empregues quando apropriado. Especificamente, testes t-Student e ANOVA, com recurso ao teste Post-Hoc de Tukey, foram aplicados para analisar as diferenças entre grupos (por exemplo, entre homens e mulheres). Esta abordagem permitiu uma análise estatística robusta para verificar as relações entre as variáveis sociodemográficas, padrões de uso do Pokémon GO e níveis de sintomatologia psicopatológica, garantindo a validade dos resultados obtidos no estudo.
II.Resultados Perfil dos Jogadores de Pokémon GO e seus Comportamentos
A maioria dos participantes (63,5%) joga Pokémon GO há 2 ou mais anos e atingiu níveis elevados no jogo, indicando um alto investimento. Apesar disso, a sociabilidade online e presencial não parece ter diminuído; muitos até fizeram novos amigos através do jogo. Mulheres tendem a caminhar mais para alcançar objetivos no jogo, enquanto homens investem mais dinheiro e capturam mais criaturas diariamente. A sintomatologia psicopatológica da amostra é semelhante à da população portuguesa normal e significativamente distante dos níveis observados em pessoas com perturbações emocionais. Algumas variáveis de jogo se associaram a níveis menores de sintomatologia.
1. Perfil dos Jogadores de Pokémon GO Investimento e Duração
Os resultados revelam que a maioria dos 480 jogadores participantes no estudo são jogadores de longa duração e alto investimento no Pokémon GO. Mais de metade (63,5%) joga há pelo menos dois anos, desde o lançamento inicial do jogo em Portugal, e 85,5% se encontram nos níveis mais elevados do jogo (níveis 30-40). Este perfil de jogadores de longo prazo e alto investimento contrasta com os chamados "early users", foco de outros estudos. A longevidade no jogo e o investimento demonstram um engajamento significativo com a plataforma. A pesquisa procurou entender se este alto investimento e tempo de jogo impactam em outros aspetos da vida dos jogadores, nomeadamente na sua sociabilidade e saúde mental. A análise dos dados revelou que, apesar do longo tempo dedicado ao jogo, não houve uma diminuição significativa da sociabilidade. Pelo contrário, uma percentagem considerável dos jogadores relatou ter feito novos amigos através do jogo, sugerindo uma interação social positiva como um dos resultados do jogo.
2. Diferenças de Gênero nos Comportamentos de Jogo
O estudo identificou diferenças significativas entre homens e mulheres em relação a certos comportamentos no jogo. As mulheres tendem a realizar mais caminhadas com o objetivo específico de alcançar metas no jogo, como incubar ovos, demonstrando uma maior utilização do aspecto de realidade aumentada e atividade física do jogo. Por outro lado, os homens demonstram um maior investimento financeiro no jogo e capturam, em média, um número significativamente maior de criaturas por dia. Estas diferenças de género no padrão de jogo indicam diferentes motivações e estratégias de jogo entre os sexos, revelando um comportamento diferenciado em relação aos recursos e objetivos dentro do jogo. Essa observação aponta para uma complexidade na interação entre género e padrões de jogo, que merece consideração em estudos futuros sobre o impacto do Pokémon GO.
3. Sintomatologia Psicopatológica e Variáveis de Jogo
A avaliação da sintomatologia psicopatológica, utilizando o BSI (Brief Symptom Inventory), revelou que as médias em todas as dimensões sintomatológicas na amostra de jogadores se aproximam dos valores normativos da população portuguesa e são significativamente inferiores aos níveis encontrados em pessoas com perturbações emocionais. Isso indica que o tempo dedicado ao Pokémon GO, mesmo sendo extenso em muitos casos, não está associado a um aumento significativo de sintomas psicopatológicos na amostra estudada. Além disso, algumas variáveis de jogo mostraram-se associadas a menores níveis de sintomatologia, sugerindo que certos padrões de interação com o jogo podem ter um impacto positivo, ainda que limitado, no bem-estar dos jogadores. Esta observação reforça a necessidade de uma análise mais profunda da relação entre variáveis específicas de jogo e o bem-estar psicológico, buscando identificar fatores protetivos ou promotores de saúde mental dentro da experiência de jogo em realidade aumentada.
III.Discussão e Conclusões Pokémon GO Saúde Mental e Bem Estar
Os resultados não comprovam a hipótese de que o Pokémon GO melhora substancialmente a saúde mental ou causa efeitos deletérios. Entretanto, a associação positiva entre algumas variáveis de jogo e menor sintomatologia sugere um possível efeito positivo limitado no bem-estar. A pesquisa destaca a permanência no jogo e o investimento prolongado como fatores associados a menores mudanças na vivência social online. Comparando com estudos anteriores sobre os 'early users', este estudo indica uma possível normalização do jogo na rotina diária, sem prejudicar outras áreas da vida. A maioria dos participantes não diminuiu o tempo com amigos e família, e muitos fizeram novas amizades através do jogo. Comparativamente a estudos sobre videojogos tradicionais, os resultados indicam uma divergência, com o Pokémon GO mostrando efeitos menos prejudiciais, ainda que os efeitos sejam difíceis de discernir.
1. Impacto do Pokémon GO na Saúde Mental Ausência de Efeitos Significativos
Os dados do estudo não fornecem suporte empírico para a hipótese de que o Pokémon GO contribui para uma melhoria substancial da saúde mental dos seus jogadores, nem para a hipótese de que o jogo tenha efeitos deletérios sobre a saúde mental. Os níveis de sintomatologia psicopatológica na amostra são semelhantes aos valores normativos da população portuguesa e significativamente inferiores aos encontrados em indivíduos com perturbações emocionais. Embora os resultados não indiquem um impacto significativo na saúde mental, a associação positiva entre algumas variáveis de jogo e menores níveis de sintomatologia psicopatológica sugere um possível efeito positivo limitado, ou seja, um impacto reduzido no bem-estar dos utilizadores. Esta conclusão diverge de estudos sobre videojogos tradicionais, que muitas vezes associam alto investimento em jogos a níveis mais elevados de psicopatologia e menor satisfação com a vida. A peculiaridade do Pokémon GO, como jogo de realidade aumentada que incentiva a atividade física e a interação social presencial, pode explicar esta discrepância.
2. Socialização e Comportamentos de Jogo Efeitos da Longevidade e Investimento
A pesquisa analisou a relação entre a duração e o investimento no jogo e a sociabilidade dos jogadores. A constatação de que a maioria dos participantes são jogadores de longa duração e alto investimento, sem impacto negativo na sociabilidade, é um ponto relevante. A maior parte dos participantes não diminuiu o tempo dedicado à família e amigos, e muitos relatam ter feito novas amizades por meio do jogo. Esta observação sugere que, ao contrário de muitos videojogos online tradicionais, o Pokémon GO não está associado a uma diminuição da sociabilidade, podendo até promover a criação de novas relações sociais. Comparativamente a outros estudos, como o de Tabacchi et al. (2017), nota-se que a frequência de lutas em ginásios Pokémon e a realização de caminhadas para chocar ovos diminuíram com o tempo de jogo, sugerindo um efeito de normalização com a utilização prolongada. A preferência por jogar no período pós-laboral indica que o jogo se integra no tempo livre, sem interferir com as obrigações profissionais, confirmando um possível efeito de integração nas rotinas diárias. Apesar disso, uma percentagem significativa (90,6%) afirma interromper o jogo para atender chamadas, destacando um possível conflito entre a prioridade atribuída ao jogo e outras atividades.
3. Limitações do Estudo e Direções para Investigações Futuras
O estudo reconhece algumas limitações. A utilização de instrumentos de auto-relato pode não ser totalmente sensível aos benefícios ou prejuízos que o jogo teve na vida dos participantes. A amostragem por conveniência, realizada em grupos online de jogadores, pode ter enviesado a amostra, incluindo principalmente jogadores experientes e de longa duração, excluindo aqueles que jogam ocasionalmente ou há pouco tempo. A ausência de um grupo de controle de não jogadores também limita a generalização dos resultados, tornando as comparações baseadas em dados de outros estudos. Para superar estas limitações, pesquisas futuras deveriam empregar metodologias qualitativas, como a técnica de incidentes críticos, para obter uma compreensão mais profunda da experiência dos jogadores. A inclusão de um grupo de controlo de não jogadores e uma amostra mais representativa da população de jogadores de Pokémon GO também são essenciais para fortalecer a robustez dos resultados e a generalização das conclusões.
IV.Limitações do Estudo e Sugestões para Pesquisas Futuras
As limitações incluem o uso de instrumentos de auto-relato e a amostragem não probabilística por conveniência, focando-se em jogadores experientes e de longa duração, limitando a generalização dos resultados. Pesquisas futuras podem usar metodologias qualitativas para explorar os benefícios e prejuízos do jogo na vida dos utilizadores. A comparação com um grupo de controle de não-jogadores também se mostra fundamental.
1. Limitações da Metodologia
O estudo apresenta algumas limitações metodológicas que devem ser consideradas na interpretação dos resultados. A utilização de instrumentos de auto-resposta, como questionários, pode apresentar uma menor sensibilidade para captar os benefícios ou prejuízos do jogo na vida dos utilizadores, comparativamente a métodos qualitativos mais aprofundados. A recolha da amostra, realizada através de grupos online de jogadores de Pokémon GO, introduz um viés de seleção, pois a amostra é constituída principalmente por jogadores experientes e de longa duração, excluindo jogadores mais casuais ou recentes. A ausência de um grupo de controlo, composto por indivíduos que não jogam Pokémon GO, dificulta a comparação direta dos resultados e limita a generalização das conclusões para a população em geral. A comparação com estudos anteriores é, portanto, realizada com cautela, considerando as diferenças temporais e metodológicas entre as investigações. Esta limitação torna necessário um maior cuidado na interpretação dos resultados, reconhecendo-se que a generalização dos dados pode estar comprometida devido a essas características da amostragem.
2. Sugestões para Pesquisas Futuras
Para superar as limitações do presente estudo e aprofundar o conhecimento sobre o impacto do Pokémon GO na saúde mental e bem-estar, são sugeridas algumas direções para investigações futuras. A utilização de metodologias qualitativas, tais como entrevistas em profundidade ou a técnica dos incidentes críticos (como no estudo de Kari et al., 2017), permitiria obter informações mais ricas e detalhadas sobre a experiência individual dos jogadores e a perceção do impacto do jogo em suas vidas. A inclusão de um grupo de controlo, constituído por indivíduos que não jogam Pokémon GO, seria fundamental para comparar os resultados de forma mais robusta e tirar conclusões mais sólidas sobre a influência do jogo na saúde mental. Para uma maior generalização dos resultados, a amostragem deveria ser mais abrangente e representativa da população de jogadores, considerando diferentes faixas etárias, géneros e níveis de envolvimento no jogo. Considerando a volatilidade do mercado de videojogos e aplicações, estudos longitudinais seriam especialmente valiosos para monitorizar os efeitos do Pokémon GO ao longo do tempo e acompanhar as mudanças na sua utilização e no impacto na saúde mental dos jogadores.