
Sexualidade e Campesinidade: Jovens no Campo
Informações do documento
Autor | Andréia Belusso |
school/university | Universidade Tecnológica Federal do Paraná |
subject/major | Mestrado em Desenvolvimento Regional |
Tipo de documento | Dissertação |
Idioma | Portuguese |
Formato | |
Tamanho | 1.56 MB |
Resumo
I.Sexualidade na Juventude Rural do Sudoeste do Paraná Saberes Práticas e Desigualdades de Gênero
Esta pesquisa qualitativa investiga a sexualidade de jovens estudantes do ensino médio em uma escola do campo no Sudoeste do Paraná, Brasil (população estimada em 40.000 habitantes em 2018, IBGE). Utilizando grupos focais como metodologia e análise de conteúdo, o estudo busca compreender os saberes e práticas relacionados à sexualidade nesse contexto, considerando as influências da família, escola e religião. Um dos focos principais é analisar como as desigualdades de gênero impactam as vivências sexuais e a permanência ou não desses jovens no meio rural. A pesquisa destaca a escassez de estudos sobre sexualidade rural e a importância de considerar a diversidade sexual, incluindo as experiências de jovens LGBTQ+.
1. Introdução A Sexualidade na Pesquisa
A pesquisa se propõe a analisar a dimensão da sexualidade na juventude rural, especificamente no Sudoeste do Paraná. Observa-se a escassez de estudos sobre o tema em contextos não-urbanos, motivando a investigação sobre os saberes e práticas que os jovens constroem e utilizam para viver sua sexualidade. A metodologia escolhida é a de grupos focais, com interpretação dos dados baseada em análise de conteúdo qualitativa. Os depoimentos dos jovens participantes revelam aspectos significativos sobre a constituição de suas sexualidades no meio rural, destacando a influência de fatores socioculturais, como classe, gênero, geração, religião e território. A pesquisa busca, portanto, preencher uma lacuna na literatura especializada ao analisar a sexualidade em um ambiente rural específico, com foco em como a modernização e a vida no campo afetam suas experiências e concepções.
2. Contexto Histórico e Social Gaia Patriarcado e a Terra
A pesquisa estabelece uma conexão entre a sexualidade e a natureza, recorrendo ao mito de Gaia, a Mãe Terra, para ilustrar a associação histórica da feminilidade com a terra e os instintos. O texto aponta que com o fortalecimento do patriarcado, a associação entre feminilidade e natureza foi silenciada, sendo o instinto sexual, principalmente o feminino, combatido e controlado. Para sobreviver e sentir prazer, nesse contexto, a resistência se torna necessária, assim como a semente resiste para brotar. A conexão entre corpo, terra e sexualidade é um ponto crucial, mostrando a luta contra a opressão que busca controlar e restringir a expressão da sexualidade, especialmente a feminina, em uma sociedade patriarcal. A pesquisa se propõe a investigar como essa dinâmica histórica impacta a vida dos jovens rurais contemporâneos.
3. Objetivos Específicos e Transformações Contemporâneas
A pesquisa define três objetivos específicos: identificar os saberes sobre sexualidade entre estudantes do ensino médio de uma escola do campo (valores, medos, afetividades, desejos e curiosidades); analisar as configurações familiares, as relações conjugais, a divisão sexual do trabalho e as práticas de sexualidade em famílias rurais, no contexto das ruralidades contemporâneas; e analisar a relação entre os saberes e práticas sobre sexualidade e a permanência ou não dos jovens no meio rural. A pesquisa reconhece as transformações sociais, econômicas e culturais das últimas décadas e seu impacto nas práticas, concepções e identidades sexuais da juventude. Louro (2000) é citada para enfatizar as diferentes experiências de jovens de diferentes épocas e regiões, com a pesquisadora destacando as diferenças entre suas próprias experiências de juventude rural e as dos participantes da pesquisa. A revisão da literatura indica a escassez de estudos sobre ruralidade e sexualidade, mesmo após uma década de pesquisas na região Sudoeste do Paraná, reforçando a relevância do estudo presente.
4. Metodologia e Caracterização da População
A pesquisa utilizou a metodologia de grupos focais, realizados em um colégio estadual do campo no Sudoeste do Paraná. Os grupos foram separados por gênero, devido à observação de que as meninas se sentiam mais à vontade para falar sobre sexualidade em um ambiente sem a presença de jovens do sexo masculino. A interpretação dos dados se deu pela análise de conteúdo, seguindo recomendações para pesquisas qualitativas com grupos focais. O estudo considera a cidade do município (com pouco mais de 40.000 habitantes, segundo o IBGE em 2018) como parte do espaço rural, reconhecendo a interação e a falta de completa separação entre os espaços urbano e rural. A pesquisa observa a utilização da palavra “piá” para definir os jovens homens, destacando sua possível conotação de imaturidade e submissão. O grupo de jovens pesquisados se mostrou polarizado entre aqueles que se identificam com a vida no campo e pretendem permanecer e aqueles que buscam oportunidades fora do meio rural.
II.Aspectos Metodológicos e Contexto da Pesquisa
A pesquisa foi realizada em um Colégio Estadual do Campo no Sudoeste Paranaense, utilizando grupos focais separados por gênero (meninas e meninos). A escolha por grupos separados se justifica pela maior abertura e diálogo entre as meninas quando o tema é sexualidade. A análise dos dados, baseada em abordagem qualitativa, utilizou a técnica de análise de conteúdo. O estudo considera a cidade do município como um espaço que, apesar de pequeno, representa para os jovens uma experiência distinta do meio rural, onde a relação com a natureza e as relações sociais próximas são mais presentes. A pesquisa leva em conta a variante lexical 'piá', comum no Paraná, para se referir a jovens homens, e sua possível conotação de imaturidade.
1. Localização e População da Pesquisa
A pesquisa foi conduzida em um Colégio Estadual do Campo localizado no Sudoeste do Paraná. A escolha deste local é crucial para o estudo da sexualidade em um contexto específico, considerando a escassez de pesquisas com esta abordagem em áreas rurais. A população estudada consiste em jovens do ensino médio. O município em questão possui uma população estimada em pouco mais de 40.000 habitantes (IBGE, 2018), sendo considerado uma cidade pequena. Essa característica é importante porque a pesquisa considera que o espaço urbano deste município, embora não seja uma grande metrópole, oferece uma experiência diferente da vida estritamente rural para os jovens, criando uma interação entre os mundos urbano e rural nas vivências dos participantes.
2. Metodologia Grupos Focais e Análise de Conteúdo
A coleta de dados se deu por meio de grupos focais. Uma decisão metodológica importante foi a separação dos grupos por gênero (um grupo com jovens mulheres e outro com jovens homens). Essa escolha se justifica pela observação da pesquisadora de que as jovens mulheres se sentiam mais à vontade para expressar suas experiências e concepções sobre sexualidade em um ambiente sem a presença de jovens do sexo masculino. A análise dos dados se baseou na análise de conteúdo, seguindo recomendações para pesquisas qualitativas que utilizam grupos focais. A pesquisadora destaca a dinâmica diferente entre os grupos: o grupo de meninas foi descrito como mais tranquilo e colaborativo, enquanto o grupo de meninos apresentou maior número de interrupções e momentos mais conturbados. Essa diferença também forneceu insights sobre as percepções e vivências de cada gênero no contexto rural.
3. Aspectos Culturais e Linguísticos O Significado de Piá
A pesquisa chama a atenção para o uso da palavra “piá” para se referir aos jovens homens no contexto do estudo. De origem tupi-guarani, a palavra é bastante comum no Paraná, mas a pesquisa levanta a questão de seu possível significado além do regionalismo, sugerindo que a expressão carrega, de forma inconsciente, a ideia de imaturidade e submissão. Essa interpretação se baseia tanto nos discursos dos próprios jovens homens participantes quanto nas falas das jovens mulheres. A pesquisa destaca a importância dessa observação para a interpretação dos dados e para uma compreensão mais ampla da construção de gênero e identidade no meio rural. O uso da palavra 'piá' reflete uma cultura local que pode impactar na autopercepção e na percepção dos outros sobre os jovens homens, influenciando suas experiências.
4. Caracterização dos Participantes Jovens do Campo e a Cidade
A pesquisa caracteriza a população estudada como jovens que vivem no meio rural e que experienciam a fase da juventude em um contexto específico. Observou-se uma polarização entre os jovens que se identificam com o modo de vida camponês, resistindo à racionalidade moderna e buscando manter-se no campo, e os jovens que pretendem deixar o meio rural em busca de novas oportunidades. Essa dicotomia é ilustrada por exemplos de depoimentos dos próprios jovens, como a fala de Iuri que deseja fazer faculdade na UTFPR, mas manter a relação com a propriedade da família, e a fala de Isabele, que valoriza o modo de vida e a justiça social e ambiental do campo. A pesquisa observa também a percepção da cidade como um espaço diferente do rural, a partir das falas dos participantes que demonstram o desejo de mudar para a cidade como uma busca por novas experiências.
III.Relações de Gênero e Sucessão na Propriedade Rural
A pesquisa evidencia a persistência de desigualdades de gênero na transmissão de saberes e no acesso à terra. Os jovens homens são preparados para gerir a propriedade desde cedo, enquanto as mulheres são direcionadas aos trabalhos domésticos e à maternidade. A divisão sexual do trabalho é fortemente marcada pela invisibilização do trabalho feminino na propriedade. O processo sucessório, geralmente, privilegia os filhos homens, perpetuando as assimetrias de gênero e influenciando a decisão dos jovens de permanecer ou deixar o meio rural. A herança da terra, muitas vezes, está condicionada à permanência no campo e à reprodução de padrões tradicionais. As filhas mulheres raramente herdam a propriedade, exceto em casos de ausência de filhos homens.
1. Divisão Sexual do Trabalho e Invisibilidade Feminina
A pesquisa revela uma profunda divisão sexual do trabalho nas propriedades rurais estudadas. Os filhos homens são preparados desde a infância para assumir a gestão da produção agrícola, enquanto as filhas mulheres são destinadas aos trabalhos domésticos e à maternidade. Essa divisão de papéis resulta na invisibilidade do trabalho feminino na produção, sendo frequentemente considerado apenas como 'ajuda'. Um depoimento exemplifica essa dinâmica: “[...] tenho uma irmã e ela ajuda só dentro de casa” (JOÃO, GF, 2018). Essa invisibilidade contribui para a percepção da inferioridade do trabalho feminino, reforçando desigualdades de gênero. A modernização da agricultura, com a introdução de novas tecnologias e equipamentos, intensificou essa segregação, pois a qualificação para a gestão dos novos recursos é quase exclusivamente voltada para os homens, como observado em uma aula do Programa Empreendedor Rural (PER), onde 90% dos participantes eram homens. Essa constatação evidencia a perpetuação de desigualdades estruturais.
2. Sucessão e Herança Privilegiando os Filhos Homens
O processo sucessório nas propriedades agrícolas também demonstra uma forte assimetria de gênero. A herança da terra, elemento central na cultura rural, é predominantemente transmitida para filhos homens, sendo o primogênito em famílias de origem alemã e o caçula em famílias italianas (Carneiro, 2001; Woortmann, 1995; Santos, 1994). A recusa em ceder a terra para os filhos que deixam o campo é usada como uma forma de ameaça pelos pais, como demonstrado pelo depoimento: “meu pai falou que vai me deserdar se eu sair de casa” (RONALDINHO, GF, 2018). A idealização da terra como herança patrimonial reforça a cultura sexista, relegando as mulheres a um papel secundário na sucessão, mesmo que elas contribuam ativamente com o trabalho na propriedade desde a infância. A exceção ocorre apenas quando as mulheres são filhas únicas ou não há descendência masculina, como no caso de Maria Rita (GF, 2018), que descreve o desapontamento do pai em ter que nomeá-la herdeira.
3. Assimetria de Gênero e a Decisão de Permanecer ou Deixar o Campo
A pesquisa analisa a influência das relações de gênero na decisão dos jovens de permanecer ou deixar o meio rural. A exclusão das mulheres do acesso à terra e do conhecimento necessário para o trabalho agrícola contribui para sua busca por oportunidades fora do campo. A fala de Milena, “[...] só fico no campo se casar com um agricultor” (MILENA, GF, 2018), ilustra como a permanência no campo se torna condicionada ao casamento e não a escolhas individuais, refletindo a submissão feminina. A pesquisa destaca a objetificação cultural das mulheres, presente em diversos contextos, mas ressalta que essa objetificação, exploração e violência sofrem nuances devido a fatores como cultura, religião e classe socioeconômica. A análise da assimetria de gênero a partir de suas interseccionalidades é fundamental para o desenvolvimento de políticas públicas mais específicas para as mulheres rurais.
IV.Sexualidade Modernidade e Instituições Reguladoras
O estudo analisa a influência da modernidade e de instituições como a família, escola e igreja na construção da sexualidade dos jovens rurais. A pesquisa aborda a heteronormatividade, o biopoder (Foucault) e a repressão da sexualidade feminina, especialmente fora do contexto matrimonial. A educação sexual na escola, muitas vezes, se limita a uma abordagem médico-biológica e higienista, focando em métodos contraceptivos e doenças sexualmente transmissíveis, em detrimento de uma discussão mais ampla sobre sexualidade, prazer e afeto. O acesso à internet e novas tecnologias aproximam os jovens rurais do espaço urbano e de outras culturas, criando um híbrido entre o rural e o urbano em suas identidades e práticas sexuais.
V.Experiências LGBTQ no Contexto Rural
A pesquisa também explora as experiências de jovens LGBTQ+ no meio rural, destacando a invisibilização e negação da homossexualidade, especialmente a feminina. O estudo apresenta o caso de Andrômeda, um jovem bissexual que revela sua orientação sexual durante o grupo focal, enfrentando preconceitos e a dificuldade de ser compreendido. A pesquisa evidencia a importância do respeito à diversidade sexual e a necessidade de desconstruir os estereótipos sobre homossexualidade e bissexualidade. O estudo também destaca o caso de Maria Eugênia, uma jovem lésbica que encontrou aceitação familiar e uma visão mais progressista sobre gênero.
1. A Invisibilidade da Homossexualidade Camponesa
A pesquisa aponta a invisibilidade e negação da homossexualidade no contexto rural, sendo a homossexualidade feminina ainda mais silenciada. Embora haja um crescente número de trabalhos acadêmicos sobre a mulher no campo, a maioria foca em sua condição vinculada a movimentos sociais e questões de produção e divisão sexual do trabalho. A pesquisa enfatiza a necessidade de interseccionalizar esses estudos com a diversidade sexual das mulheres rurais, dando voz àquelas que não se enquadram na heteronormatividade. Ferreira (2006a) é citado para destacar o obscurecimento das sexualidades que não se encaixam nas normas para o corpo camponês, sendo sexualmente silenciadas em prol da tríade ‘família, terra e trabalho’. A pesquisa reforça a importância de abordar a diversidade sexual para uma compreensão mais completa da realidade rural.
2. O Caso de Andrômeda Bissexualidade e Coming Out
O estudo apresenta o caso de Andrômeda, um jovem bissexual que, durante o grupo focal, revela sua orientação sexual. Seu destaque no grupo, por meio de falas elaboradas e postura diferenciada, chama a atenção para sua decisão de se assumir publicamente. A pesquisadora realiza uma entrevista individual com Andrômeda para aprofundar sua experiência, entendendo as motivações por trás da revelação e o processo de lidar com a sua bissexualidade no meio rural, que demonstra o medo e a inibição em revelar sua sexualidade. Andrômeda evidencia a dificuldade de aceitação familiar e o medo de rompimentos relacionais, justificando a ocultação de sua sexualidade durante anos. A pesquisa analisa a dificuldade de compreensão da bissexualidade, que é frequentemente negada socialmente pela insistência em classificar as pessoas em dois polos (Lewis, 2012), perturbando a ordem binária das redes sociais de Andrômeda.
3. Experiências Homoafetivas Femininas e o Estereótipo
A pesquisa registra experiências homoafetivas relatadas por algumas jovens mulheres, mas sem que essas as definissem como sua orientação sexual. Apesar disso, a pesquisa destaca a necessidade de incluir essas experiências na discussão sobre a sexualidade feminina no campo. A pesquisa aborda estereótipos sobre lésbicas, como a necessidade de se encaixarem em um padrão de mulher com traços mais masculinos (Martins, Santos & Teixeira, 2016). Esses estereótipos ficam evidentes em alguns depoimentos, como o de Nayara, que demonstra curiosidade em relação a experiências homoafetivas, mas também afirma: “nossa eu mesmo que fosse bi ou homo não cortaria meus cabelos, eles são tudo pra mim” (NAYARA, GF, 2018). Coutinho, quando questionado sobre homossexualidade, descreve “uma mulher que cortou o cabelo e se veste como homem” (COUTINHO, GF, 2018), ilustrando a influência desses estereótipos. A pesquisa destaca o conflito entre a vivência da sexualidade e a necessidade de manutenção de uma imagem que não perturbe a família tradicional.
4. O Caso de Maria Eugênia Uma Experiência de Aceitação Familiar
A pesquisa contrapõe a experiência de Andrômeda com a de Maria Eugênia, uma jovem lésbica que, ao chegar na escola do campo, assume sua orientação sexual para seus colegas e encontrou aceitação. Sua experiência é contrastada com a dos outros jovens da pesquisa, principalmente em relação à educação familiar que recebeu. Maria Eugênia relata uma educação familiar que subverteu os padrões sexistas comumente encontrados nas famílias dos outros participantes. O relato enfatiza a importância da educação familiar na formação de uma identidade sexual mais autônoma e livre de preconceitos. Sua mãe é descrita como “muito, muito cabeça aberta” (MARIA EUGENIA, ENTREVISTA, 2018) e sua avó como feminista, influenciando positivamente sua percepção de gênero e sua capacidade de assumir sua sexualidade abertamente. A inclusão deste caso na pesquisa contribui para a riqueza da análise e a diversidade de experiências.
VI.Permanência ou Saída do Meio Rural A Influência da Sexualidade e do Gênero
A pesquisa aponta a saída dos jovens do meio rural como um fenômeno complexo, influenciado pelas desigualdades de gênero e pelas oportunidades de trabalho e estudo na cidade. As mulheres, muitas vezes excluídas do acesso à terra e ao conhecimento técnico, buscam melhores condições de vida fora do campo. O estudo destaca a importância de considerar as interseccionalidades entre gênero, classe social e acesso a recursos para entender a permanência ou saída dos jovens do meio rural. A pesquisa alerta para o crescimento do conservadorismo e a necessidade de fortalecer as políticas de educação sexual e de igualdade de gênero em áreas rurais.
1. Homossexualidade Masculina O Caso de Andrômeda
A pesquisa destaca a experiência de Andrômeda, um jovem bissexual que realiza seu coming out durante o grupo focal. Sua decisão de se assumir, mesmo com o receio da reação dos colegas, é analisada como um ato de afirmação da identidade em um ambiente rural. Andrômeda demonstrava uma maturidade e conhecimento sobre sexualidade que contrastava com os outros participantes. A pesquisa aprofunda sua experiência por meio de uma entrevista individual, explorando as dificuldades de lidar com a bissexualidade tanto no ambiente escolar quanto familiar. A invisibilização e negação da bissexualidade, constantemente reduzida a uma escolha entre homossexualidade e heterossexualidade (Lewis, 2012), é analisada. Os comentários de colegas e professores mostram a dificuldade em compreender a bissexualidade, frequentemente interpretada como homossexualidade. A pesquisa enfatiza que o coming out de Andrômeda desestabilizou as normas binárias presentes em suas redes sociais.
2. Homossexualidade Feminina e a Invisibilidade no Meio Rural
A pesquisa destaca a invisibilidade da homossexualidade feminina no meio rural, um tema pouco explorado na literatura. Embora existam estudos sobre a mulher camponesa e sua relação com os movimentos sociais, a interseccionalidade com a diversidade sexual precisa ser ampliada. A pesquisa salienta a necessidade de dar voz e visibilidade às experiências dessas mulheres, que frequentemente não se enquadram nas normas heteronormativas. A dificuldade em abordar o tema se reflete na própria pesquisa, onde algumas experiências homoafetivas femininas são relatadas, mas não necessariamente se configuram como definição da orientação sexual das jovens. A pesquisa critica a falta de trabalhos acadêmicos que abordem a realidade específica da homossexualidade feminina rural, reforçando a necessidade de estudos mais aprofundados.
3. Maria Eugênia Uma Experiência de Aceitação Familiar
Em contraponto às dificuldades enfrentadas por Andrômeda, a pesquisa apresenta o caso de Maria Eugênia, uma jovem lésbica que, ao chegar à escola do campo, assume sua orientação sexual. Sua trajetória de vida, iniciada em ambiente urbano, traz uma perspectiva diferente para a pesquisa. Maria Eugênia destaca a importância de sua criação familiar, que respeitou e acolheu sua orientação sexual, em contraste com o contexto geralmente encontrado entre os demais jovens participantes. A mãe e avó de Maria Eugênia são apresentadas como figuras de forte influência em sua construção identitária, rejeitando os papéis de gênero tradicionais. Essa experiência familiar é apresentada como um fator determinante na sua capacidade de se assumir abertamente, destacando a influência da socialização familiar na construção da identidade sexual e o contraste com as outras experiências apresentadas na pesquisa.
4. Considerações Finais sobre a Diversidade Sexual no Contexto Rural
A pesquisa enfatiza a pluralidade das sexualidades da juventude rural, reconhecendo que cada indivíduo, mesmo dentro de um mesmo contexto sociocultural, possui uma experiência singular. A pesquisa destaca a importância de não generalizar as experiências, observando a influência de diferentes fatores, como família, educação e acesso à informação. Apesar das semelhanças em relação ao modo de vida camponês, as sexualidades não são homogêneas. Cada jovem, a partir de relações de gênero, geração e lugar, constrói um eu sexual individual e único. A pesquisa finaliza destacando a importância de estudos sobre a temática, dada a onda conservadora que ameaça políticas de educação sexual e a necessidade de estudos que contemplem a realidade da diversidade sexual no meio rural e a sua interseccionalidade com outros aspectos da vida.